Contexto da one:

Agora demos um pulo no tempo e temos uma Laura, a filha dos dois, com cinco anos mais ou menos.

Nove anos após formatura e juntos há quatorze anos, com nove de casados (phew!).

Vamos conhecer essa fofura que é a menina (mimada -q) Laura.

***

Apaguei a luz do quarto e finalmente me deitei na cama, sentindo a cabeça doer e o corpo cansado depois de um dia estressante na editora mais trabalho em casa. Lysandre estava já na cama, porém continuava acordado, pois a luz do abajur permanecia acesa.

— Você tem trabalhado demais — comentou em um sussurro, com um tom de preocupação. Me cobri e me aproximei dele, que me abraçou pelo ombro, aproximando-me de si. É, certas coisas permanecem as mesmas, mesmo depois de anos.

— Eu sei, mas tem autores novos chegando. Não é minha culpa. — Fechei os olhos, tentando acalmar minha mente, que parecia não parar com tantas preocupações e coisas pra fazer no dia seguinte.

— Não disse que era sua culpa. — Deu um beijo sobre meus cabelos, acariciando-os com a mão em seguida. — Apenas me preocupo que esteja sobrecarregada.

Não tive tempo de responder, pois ouvimos uma batida na porta do quarto. E continuou batendo insistentemente. Lysandre começou a se mexer, porém fui mais rápida.

— Deixa que eu vou.

Joguei as cobertas de lado e sai. Abri a porta e dei de cara com Laura, com seus cabelos bagunçados, os olhos verdes arregalados, aquela almofada de dragão que ela sempre dormia abraçada, presente da Stelfs que minha filha usava até hoje, além de um biquinho. Lá vem...

— Que foi, mein Lieben? — Usei o nome que eu costumava chamá-la em casa. Enquanto usava o inglês “my dear” pro Lys, acabei optando pelo alemão pra ela. Mãe poliglota é isso aí.

— Não consigo dormir, mãe. — E continuava me encarando com aquela cara pidona. Gato de botas teria inveja dessa menina. — Posso dormir com vocês?

— Não sei o que dormir com a gente iria te ajudar. — O bico dela aumentou. — Quer que eu fique lá no seu quarto até você dormir?

— Laura, pode vir. — Ouvimos Lysandre dizer e Laura passou pelo espaço entre mim e a porta, indo como um furacão até a cama. Largou os chinelos de qualquer jeito na beirada da cama e se jogou nela, indo se deitar ao lado do pai, que abraçou a filha. Tá explicado porque a menina é mimada desse jeito. Fechei a porta e balancei a cabeça. — Por que não consegue dormir? — ele perguntou e voltei pra cama. Cobri a mim e a Laura.

— Sem sono.

— Certeza que é isso mesmo? — perguntei, pensando que era só uma desculpa dela pra não dormir sozinha.

Laura murmurou um “hum hum”, coçando os olhos. Tá, digamos que eu acreditei nisso.

— Você quer uma música antes de dormir? — Lys perguntou pra menina. Ele tinha o costume de cantar pra ela desde que era um bebê e ainda nos acostumávamos ao novo. Quando ainda nos acostumávamos a ela. Mas tudo isso com muito amor, claro.

— Conta uma história? — Nós dois nos surpreendemos com esse pedido. — Prometo que depois eu durmo. — Troquei olhares com Lysandre, com seu rosto visível pela meia luz do abajur, e seguramos o riso.

— E o que você gostaria de ouvir? — ele questionou a ela, sorrindo fraco.

— Uma história bem legal. Com muita aventura — pediu entusiasmada e continuei olhando para meu marido, segurando o riso.

— Acho que dessa vez vou deixar o seu pai contar pra você. Vamos ver o que ele tem na manga. — Brinquei com os cabelos escuros de Laura, que riu. Continuei com a mão ali, fazendo um cafuné nela, uma das maneiras mais eficazes pra fazer alguém dormir.

Lysandre pareceu pensativo por uns instantes, até começar a falar.

— Era uma vez...

E então começou a contar um daqueles contos de fadas, com sua voz grave e envolvente, enquanto Laura se encostou nele. Continuei com a minha mão nos cabelos dela, vendo toda a cena, permanecendo calada.

Há alguns anos atrás, eu não teria imaginado que viveria um momento como esse. A maternidade era algo que eu queria evitar a todo custo.

Até que um dia, ela simplesmente bateu à nossa porta. Me desesperei, porque eu não sabia o que fazer, não sabia como seria dali pra frente e acima de tudo: sentia que não estava preparada pra isso. Meu medo parecia maior do que tudo.

Mas ele não me venceu. O medo não nos venceu. Porque passamos por isso juntos. A cada surto de ansiedade e de desespero meu, meu marido estava lá, comigo. Com ele, consegui forças de onde eu achei que não tivesse.

Claro, o período de gravidez não foi apenas de momentos ruins. Houveram coisas boas, como a felicidade do Lysandre ao descobrir que seria pai de uma menina. Os momentos divertidos enquanto pensávamos em como ela seria e escolhiamos as coisas para o quarto e o enxoval. As músicas que ele cantava para Laura, antes mesmo dela nascer. O amor que nos unia, antes mesmo de ela estar junto de nós.

Passamos por tudo isso e quando eu achei que não aguentaria mais… Ela nasceu. Por opção minha, e devido à minha própria segurança e a dela, Laura veio ao mundo através de uma cesárea.

Aquele momento… Eu realmente não sei como descrever. A única coisa que posso dizer é que chorei. Chorei sem medo em frente a outras pessoas. Lysandre também não segurou as lágrimas, sutilmente. Claro, a mais emotiva era sempre eu.

Depois disso, foram meses de aprendizado, de tentar entender o que acontecia comigo e como seria a vida dali pra frente. E aceitar. Aceitar que agora eu vivia uma nova vida e que o novo não é ruim. Ele pode ser assustador no começo, porém, quem não se assusta com novidades? É inevitável, acho.

Quando Laura chegou, nossas vidas e rotinas mudaram. Com uma criança, além de nós mesmos, tínhamos que nos preocupar com alguém que precisaria de nós, que precisaria de cuidados e, acima de tudo, de amor e carinho. Foi um período estressante aqueles primeiros meses, não nego. Mas gosto da minha vida como ela é e não a trocaria por nada.

— E todos viveram felizes para sempre. — Lysandre terminou de contar a história e olhou para Laura, que estava calada. Nos encaramos e sorrimos, preparando para dormir, quando...

— Também teve uma bruxa má tentando separar você e a mãe? — Laura perguntou baixinho de repente, surpreendendo a nós dois.

— Uma bruxa, não. Mas quase ficamos longe por um tempo — contei pra ela, que ficou quieta por alguns instantes, talvez pensando na informação.

— Por quê?

— Creio que essa história terá que ficar para outro dia. A senhorita prometeu que tentaria dormir depois de uma história, não duas — Lysandre afirmou e Laura reclamou com um “hum” baixo. — Boa noite — desejou, dando um beijo nos cabelos dela.

— Conta amanhã?

— Se você não dormir, mein Lieben, não terá amanhã — brinquei e ela ficou calada um pouco, talvez tentando entender a lógica da frase.

— Então se eu ficar sem dormir, não vai ter amanhã e eu não vou precisar ir pra escola? — questionou na sua lógica torta, se referindo à aula na pré-escola.

— Durma, Laura. — Também dei um beijo nos cabelos dela. — Boa noite.

E ficamos os três em silêncio, tentando dormir. Laura se aconchegou a Lysandre, colocando a almofadinha sobre o peito dele e a cabeça por cima, e pareceu adormecer. Finalmente relaxei.

— Pai, tenho mesmo que ir pra escola amanhã?

E lá vamos nós de novo...