Olá Mike.

Bom, antes de tudo eu quero dizer uma coisa. Eu sei que disse que ia escrever uma carta cada semana, mas eu acabei me contradizendo, isso porque eu estou escrevendo essa mais ou menos um mês depois de ter escrito a última.

Durante esse tempo, muita coisa aconteceu, mas eu vou falar sobre isso no decorrer da carta.

Uma coisa que eu notei lendo as cartas anteriores, é o quanto eu criava problemas em cima de problemas, quer dizer, eu não procurava soluções sobre esses problemas.

Em todas as cartas eu estava reclamando sobre a minha vida, dizendo as milhares de coisas ruins que me aconteciam, e o quanto eu queria você comigo (parecia um daqueles filmes de ação exagerados, em que a cada minuto surge uma coisa nova que parece ter sido super improvisada e inventada pra gerar mais audiência). Eu notei que eu pegava os meus problemas, e deixava eles ainda maiores, eu só olhava pra eles, coisa que você sempre me disse pra não fazer.

Uma coisa interessante, é que eu notei que todas as pessoas que eu reclamava, as pessoas que me causaram problemas, não são todas necessariamente pessoas ruins... quer dizer, quase todas. Meu "pai", ele realmente é uma pessoa ruim e tudo mais, mas eu finalmente consegui tirar aquela magoa e raiva que a minha vida toda eu senti por ele. 

A minha vida toda, eu acreditava que eu era obrigado a amar ele, por ele ser meu pai biológico, que eu era obrigado a aturar ele, isso porque todos falavam coisas desse tipo, todos diziam coisas assim, do tipo "você não pode tratar ele assim, ele é seu pai" ou "você tem que se esforçar pra se aproximar dele, ele é seu pai" (mas eu nunca vi ninguém exceto minha mãe cobrando ele assim). Mas eu notei que não, que eu não sou nenhum pouco obrigado a amar ele como um pai, se ele nunca esteve comigo como um pai. Ninguém tem o direito de dizer o que acha sobre isso, apenas nós dois devemos tomar nossas decisões. Nesse longo mês, eu tive uma conversa com ele, mas ele logo parou de falar comigo de novo, e eu tentei insistir, tentei falar com ele, mas isso só me fazia o odiar mais. Eu também percebi que eu não preciso dele, eu nunca precisei dele, então eu simplesmente decidi não me esforçar mais pra nada relacionado a isso, decidi que se ele quiser se aproximar, ele que deverá fazer isso por conta própria.

Outra coisa que eu mudei de perspectiva durante esse tempo, é sobre minha mãe, eu acabei notando o quão egoísta eu poderia ser a respeito dela, apesar de não ter acontecido nada específico sobre ela, eu percebi que tudo que ela faz é por puro medo de que eu faça algo que ela não ache certo, e por mais que isso tenha me causado muitos problemas, eu estou me dando ao máximo para entender o lado dela.

Já o "incidente do pastor", digamos que aconteceu de novo, mas é claro que eu me arrependi de novo, as vezes me pergunto se isso é um ciclo vicioso que todo homem carente irá passar.

 Ah, e a respeito da Joyce. Quase duas semanas depois do dia em que eu conversei com ela, ela explicou toda a situação pra mim, e confesso que ela estava bem tensa, mas no fim conseguimos resolver aos poucos. Eu notei que desde o dia em que você foi embora, eu parei de me importar com os outros, eu simplesmente fiquei cego e só me importei com a dor de você não estar comigo. Mas eu também parei de me importar comigo, todos os meus sonhos e objetivos ficaram completamente de lado quando você foi, eu parei de ligar pra mim também, e não me importei mais com nada. 

E quando percebi que estava deixando tudo de lado (inclusive minha saúde), eu decidi voltar a me dedicar as coisas que me faziam bem, voltei a desenhar, escrever músicas, pelo menos tentar me dedicar. E felizmente voltei a ter contato com pessoas, Gustavo e Wendy me ajudam muito nisso e realmente me fazem ter esperança.

E bom, é assim que minha vida está Mike.

Eu realmente estou melhor do que antes, mas eu estaria mentindo se dissesse que não sinto mais sua falta, que não quero mais ter você comigo...

Eu te amo, e provavelmente eu sempre vou te amar, mesmo que no mais profundo do meu ser, esse amor não vai embora, e eu realmente não quero que vá. Mesmo que ame qualquer outra pessoa, meu amor por você sempre existirá, e o amor que sentirei por futuras pessoas também vai coexistir com você.

Eu acredito que todas as pessoas que passam nas nossas vidas, tem uma grande importância nelas, e caso o relacionamento (seja amizade, amor ou até família) acabe, não quer dizer que não deu certo, quer dizer que estava na hora.

Mike, tudo o que passamos juntos, tudo, sempre vai ser muito especial, e talvez em alguns momentos da minha vida, aquela dor que eu senti vai sim voltar, por um tempo. Mas eu precisava deixar de ter você como o centro da minha vida... eu precisava olhar pra frente... precisava de parar de sofrer por isso, eu cansei da angústia, me entediei dela.

Outra coisa que eu percebi, é que um dos meus erros foi ter permitido o amor que eu sinto por você ter ficado maior do que o amor próprio que eu devo ter e criado em você quase um Deus e indiretamente exigir perfeição de você com as minhas expectativas, isso me fez sofrer, mas hoje eu entendo tudo Mike.

Eu não tenho ideia do que aconteceu com você, mas talvez eu saiba e esteja negando, ou talvez, eu não queira saber, talvez eu prefiro não saber se você me abandonou, se mudou repentinamente, teve algum problema com a família... ou simplesmente se foi...

Pensar que alguém vai estar com você para sempre, é a forma mais pura de esperança e amor que alguém pode sentir por outra pessoa, todos querem entrar em um relacionamento para sempre, e mesmo que esta ideia seja extremamente lúdica, eu acredito que é verdade. Eu acredito que todas as pessoas que possuímos um relacionamento vão estar com a gente para sempre, da mesma forma que nós estaremos com ela, e eu acredito nisso porque essas pessoas, que passam nas nossas vidas sempre vão nos acrescentar algo (se esse relacionamento for um relacionamento não problemático).

Mike, desde a primeira carta eu acreditei fielmente que eu estava escrevendo elas para você.

Mas não.

O tempo todo a eu sabia que eu estava escrevendo estas cartas para uma pessoa.

Para mim.