Campo Santo escrita por BurnedGravy


Capítulo 2
129 Steps


Notas iniciais do capítulo

Hey! Como eu disse, os capítulos de depois do epílogo vão seguir como se ele não tivesse existido (até que a narrativa chegue naquele momento). Sem mais enrolação: boa leitura! s2



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— Er... 

A voz no rádio era ruidosa e, mesmo assim, transmitia doçura. O aparelho, em cima de uma velha mesa de madeira escura e envernizada, se moveu com o limpar de garganta que a mulher transmitiu. Brook não se moveu um centímetro; recuperava o fôlego em uma posição bastante digna: de quatro, com ambas as mãos apoiadas no chão de madeira. Estava bastante vermelho, com a barba e os cabelos longos e descuidados encharcados de suor. A camiseta cinza que usava já estava manchada em quase sua totalidade. Não haviam passado dois minutos que chegara à cabana e já havia se arrependido de ter aceitado aquele emprego. 

Contraiu a ponta dos dedos sobre o piso velho, fazendo uma leve menção de se levantar. Sabia que deveria se reerguer e atender o rádio, mas também sabia que estava a dois passos de um ataque cardíaco e a um passo de pedir demissão do emprego (e potencialmente receber uma menção honrosa no Guinness Book como a pessoa que passou menos tempo em um emprego). Passaram-se apenas um ou dois minutos desde que a mulher ("Evelyn", pensou Brook, amaldiçoando a insistência dela) limpou a garganta no rádio, mas o chão já estava com diversas gotas de suor. "Em que momento eu virei um maldito pug obeso?", Brook se perguntou, lembrando que um dia, em um passado não tão distante, ele já havia corrido uma maratona de 20 quilômetros tranquilamente. 

— Bom dia, Brook? Tudo certo aí? 

Evelyn não conseguia nem mesmo fingir que não estava rindo. Brook demorou para entender o motivo e, honestamente, preferia que não tivesse entendido; seu orgulho estava ferido. Ergueu o braço, agarrando a mesa, e tomou um impulso com as pernas, ficando de pé. As suas coxas arderam como se estivessem em fogo. Precisou olhar três vezes em volta de si mesmo para conseguir se localizar. O rádio, alaranjado e parecendo bastante moderno, estava acoplado em uma base de recarga. Uma pequena luz azul indicava que o canal estava aberto. Não era o rádio que ele queria no momento, era água. Evelyn poderia esperar, afinal não havia nada a se fazer no alto da montanha onde ela estava.  

A cabana era bastante pequena. Faz sentido, porque, sendo uma estrutura suspensa no ar, como uma torre, ela precisava ser leve. Isso não a tornava uma cabana melhor. A mesa do rádio, que também abrigava um notebook bastante arcaico (Brook desconfiava que ele não funcionava), estava encostada em uma das "paredes", era difícil para Brook pensar em outra definição, mas não pareciam paredes. As laterais da cabana eram bonitas e únicas; a madeira das paredes estava em apenas um metro acima do piso e um metro abaixo do teto. O centro, entre as duas partes de madeira, eram painéis de vidro retráteis (janelas gigantes) que cobriam o centro das paredes. As janelas estavam em perfeito estado. Juntas, davam vista panorâmica permanente em todos os ângulos, sem a necessidade de sair da cabana. O ponto negativo era que a torre era visível de fora, e era assim que Evelyn estava observando Brook. 

Outra mesa de madeira, um pouco menor, repousava na parede oposta à do rádio, inteiramente coberta com um mapa da reserva. À esquerda de Brook estava a pia, bastante simples, e a direita estava a cama, ao lado da porta. Caminhou, um pouco recuperado, para a torneira. Sentiu imediato alívio ao colocar a nuca embaixo do fluxo de água gelada. 

Segundos depois, agarrou o walkie-talkie, finalmente dando um fim à espera de Evelyn.  

— Eu realmente acho que as paredes de vidro daqui não combinam com o espírito de privacidade norte-americano, chefe — disse, em tom de ironia. Riu imaginando a reação de Evelyn, que, mesmo sendo sua chefe, odiava ser chamada assim. 

— Eu sou paga para tomar conta da reserva. Por um segundo eu achei que teria que chamar os bombeiros. Tudo bem que eles demorariam algumas horas. — ela respondeu, rindo. Brook se lembrou de quando a conheceu, semanas atrás, tentando convencê-lo a não aceitar o emprego. Evelyn é uma pessoa de sorriso fácil, Brook havia concluído de imediato. 

— Eu passei dois dias, dois dias, caminhando em uma trilha malcuidada para chegar aqui. E quando cheguei, descobri que minha cabana fica suspensa no ar. Você deveria ter usado os 100 degraus como argumento quando tentou me convencer a não aceitar vir para cá. — Brook brincou, mas realmente odiava escadas. Ele, esperando Evelyn responder, puxou uma cadeira e se sentou, olhando pelas janelas. Via o horizonte ao longe, encoberto timidamente pela copa de alguns dos maiores pinheiros da floresta. O céu estava pintado com as cores do pôr-do-sol; era lindo. Virou-se para encarar a paisagem imediatamente atrás de si. Não era tão linda. Era uma montanha maior, ao longe. No topo, conseguia ver uma pequena estrutura; era lá que Evelyn estava, pelo que ela lhe havia dito. 

— São 129 degraus. Eu não usei de propósito, eles têm história aqui — ela disse, tentando forçar seriedade na própria voz. 

— Famosos? — perguntou Brook, com tom de falsa curiosidade. 

— Muito. Alguns chamam de Degraus da Redenção, eu os chamo de 13º Trabalho de Hércules. Acho que você entende o porquê dos nomes. É o desafio. Se você encara esses degraus, para subir nessa torre que vai ser sua casa, depois de dois dias de caminhada, você é mais do que apto para o trabalho. Entendeu por que sua entrevista foi tão simples? — ela explicou.  

— Eu bem que desconfiei. — respondeu, com um sorriso. Fez-se silêncio, até que ele mesmo acabasse com esse momento de quietude — Então... eu começo a trabalhar amanhã, certo? — perguntou, legitimamente animado. 

— Yep. Tudo aquilo que eu disse; patrulhar, ajudar, assegurar, rondar e muitos outras ações cujo verbo termine em ar. Você realmente deveria ir dormir agora. 

— Essas são as melhores palavras que eu poderia ouvir — Brook já estava aéreo. Estava pensando no próximo dia e, mais que isso, estava pensando em dormir. Antes, uma voz surgida de seu subconsciente o lembrou de que ele tinha duas perguntas muito importantes para fazer. 

— Evelyn? — chamou. 

— Sim? — a voz no rádio era ruidosa, isso dava uma certa agonia a Brook. 

— Tenho duas perguntas importantes que eu me esqueci de fazer antes —meçou, franzindo a sobrancelha. 

— Diga. 

— Quais são meus equipamentos? Quero dizer, além desse rádio, da mochila e das cordas. 

— Bem... como você cumpre todos os critérios e certificados, você também terá uma arma. Eu comentei isso contigo, tenho certeza. Ela deve estar aí na cabana, em uma caixa metálica. A mesma chave da porta abre o cadeado. Além disso, você vai ter alguns equipamentos básicos, como lanterna e faca, e alguns itens de sobrevivência na selva, como pederneira. E não se esqueça de sempre levar um sinalizador, não podemos confiar nesses rádios. E tem também seu uniforme e crachá, é assim que os pesquisadores, e as potenciais ameaças, vão saber que você é um dos nossos. — Evelyn, pela primeira vez naquele dia, soou genuinamente séria. Isso atordoou Brook, que estava acostumado a vê-la sorridente, risonha e brincalhona. Perceber que ele conhecia tão pouco dela o fez se sentir enjoado; a relação deles era muito, muito mais superficial do que ele estava, de algum modo, pensando ser. — Qual a outra pergunta, Brook? — ela indagou, depois de algum tempo de silêncio. 

— ... eu vou ter mesmo, mesmo, que percorrer 129 degraus para ir e vir do banheiro? 


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Notas finais do capítulo

Hey! Espero que você tenha gostado do capítulo s2
Aceito sugestões e críticas!
Abraços :)



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