Enquanto a Neve Cai escrita por Machene


Capítulo 5
Obscuras Revelações Familiares




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Cap. 5

Obscuras Revelações Familiares

 

Já passava das onze da noite quando no templo da gata Hitomi, também morada de Yumi e Katsu, os presentes na sala silenciaram com a mais recente revelação da loba. De muitas maneiras, as novas descobertas de antigos crimes causavam várias agitações.

— Katsu? Aquele garoto? Mas, ele não é seu irmão de verdade, é?! – Yuzuki indagou.

— Não, mas é como se fosse. Também considero a Tomi uma irmã mais nova, mesmo ela sendo marrenta igual uma velha. – ela riu ao receber, no braço, um tapa da felina.

— “Velha” é a vovozinha! Não interessa se sou mais nova, porque fui eu que achei esta casa, então vocês é que moram comigo, não o contrário! Portanto, sou a responsável!

— Certo. Pode continuar dizendo isto para si mesma, apesar de todos saberem que a matriarca desta família é mesmo a Jessie, por nos unir.

— Como é? – Hiroshi interrompeu – Foi você que escondeu os três aqui?

— Bem, como Hitomi disse, foi ela quem encontrou este esconderijo depois de Yumi fugir consigo novamente, da última vez também levando Katsu. E não foi sequestro, antes que pensem mal dela, porque a própria mãe do garoto permitiu que fosse levado.

— Ela sabia o que aconteceria, tanto com ela quanto com a criança. – Yumi fez um complemento em voz baixa, perdida em lembranças – E a Tomi só tinha cinco anos.

— Dane-se! Você gostou do lugar quando eu apontei para o templo na época.

— Enfim... – Jessie tossiu antes de prosseguir – Dois amigos meus, que moram no Reino Unido, me informaram do ocorrido aqui quando estava de serviço. Meu chefe deu autorização para que viesse investigar, e então, com a ajuda de outra amiga, pude localizar os três neste lugar. Me propus a ajuda-los e contei com o apoio dos meus aliados. Agora, sempre que precisam de qualquer coisa, basta falarem com um de nós.

— Espere um pouco. Em quantos vocês estão? – foi a vez de Valentino perguntar.

— Quer dizer nosso time? – Hitomi questionou retoricamente – Eu diria que podemos contar, sem medo de colocar a mão no fogo, com cinco pessoas: Jessie, Bridgit, Shiori, Michi e Toshio. Os dois últimos foram aqueles que avisaram Jessie do que nos aconteceu.

— Então vocês já conheciam eles antes de conhecerem ela? – Kuniharu quis saber.

— Não. – Ryan respondeu – É que os dois são detetives e parceiros, encarregados de encontrar todos os nascidos com DNA animal para fornecer suporte. A instituição onde trabalho colabora com a ONG na qual eles atuam, portanto sempre trocamos informações. Admito que, quando vim para cá desta última vez atrás de Munir Kaifeng, já sabia do seu envolvimento com a família Valentino. E que estão ligados também à NORA.

— Estávamos sabendo da existência de vocês antes mesmo de formarem uma aliança. – a loba confessou, mostrando os caninos ao sorrir – E nem notaram que estava de olho.

— Então você andou nos espionando? – Yuta indagou com alguma surpresa, sorrindo com malícia – Deve ser mesmo muito boa rastreando para eu não ter te visto.

— Eu só deixo que me percebam se eu realmente quiser ser vista.

— Neste caso, você é a pessoa que pode nos ajudar a encontrar Kaifeng?

— Sim, cara estranho com um saco na cabeça. Caçadas são o meu ponto forte.

— E... É, assim... Não se sinta ofendida, mas... – Ogata sorriu um tanto nervoso – A sua habilidade de reunir informações... Não é pelo sangue, ou é?!

— Eu sou, tecnicamente, a matriarca dos Dobermanns Secretos. Os recém-criados é que possuem a capacidade de coletar informes através da característica física de alguém. Não tenho como fazer tal coisa, mas posso usar minhas técnicas de loba para encontrar o bandido em qualquer lugar onde ele esteja escondido. Só preciso saber de algo sobre ele que o diferencie de outros humanos comumente. O que o detetive dos cabelos conseguiu?

— Bom... Eu disse que não poderia saber muito mais com o fio de cabelo que recebi, porque não estava nas melhores condições, mas tem uma chance de ele estar doente.

— Hipoparatireoidismo. – a britânica complementou – Considerando a tatuagem que ele possui no pescoço, pode ter sido resultado de uma radioterapia. Ele vai precisar tomar remédios que contenham PTH, pra evitar as dores pela queda do nível de cálcio no sangue.

— Então deve estar sofrendo espasmos musculares e arritmia cardíaca. Perfeito! Com isto, eu consigo rastreá-lo usando a audição e o olfato.

— Vocês parecem ter o costume de fazer coisas assim com frequência. – Gabriella comentou, de braços cruzados – Por que estavam nos espionando? Por causa dos lobos?

— Sim. – a gata continuou – Como a Jessie falou antes, tem muita coisa mal resolvida envolvendo vocês, mesmo se for só por conhecerem alguns ex-membros dos Dobermanns Secretos. Quando ela nos achou, podíamos ter saído do Japão e nos mantido em segurança com a ONG que nos defende, mas decidimos ficar para dar um fim à guerra travada entre a polícia e os lobos. Na verdade, o bode e seus amigos são um extra na história. – a boca de Don abriu em incredulidade, e logo ele foi consolado pelos aliados igualmente tristes.

— Estou com um pouco de pena agora. – Kei mencionou, com um sorriso de canto.

— Quem é a outra pessoa que vocês alegaram ser do seu grupo de aliados? – Ogino prosseguiu, retomando a uma informação anterior.

— A Shiori? – a ruiva estrangeira pôs um indicador no queixo, pensativa – Bom, ela é uma amiga minha de longa data, desde a época em que comecei no meu trabalho. Não precisam se preocupar com a Shiori por enquanto. Com sorte, talvez nem precisemos da sua ajuda. E isto ia ser benéfico para mim, porque eu meio que venho perturbando a sua privacidade demais nos últimos tempos. Me sinto mal. – ela riu inocentemente, colocando uma mão atrás da cabeça – Acho que deveria comprar um presente para ela na próxima.

— Certeza que ela vai adorar arranjos de cabelo. – a risonha Hitomi opinou.

— Ei, um segundo! – Natsuki pediu, estendendo a palma esquerda – Ainda há dúvidas para serem respondidas. Primeira: qual o real motivo de nos reunirem aqui? Querem que desistamos dos nossos objetivos depois de ouvir a sua história?

— Vocês me prometeram que se aliariam quando estávamos no hospital. Até fizeram o pacto de sangue que eu propus. Querem desfazer o acordo?

— Eu não quero virar um lobo! – o bode exclamou de repente – Eu mantenho o pacto!

— O que isto quer dizer? – Yuzuki perguntou baixinho à Kuniharu.

— Que essa garota tem um poder de persuasão maior do que imaginamos. – ele disse num outro sussurro, franzindo o cenho.

— Todos estão aqui com uma meta em comum: encontrar Munir. – Jessie prosseguiu – Ele está com um aliado da NORA e da família Valentino, Soumei, e depois que os dois forem localizados, os policiais poderão prendê-lo. Claro, no final o Munir precisará voltar ao Reino Unido comigo, para prestar esclarecimentos.

— Se ele é apenas um ladrão, e, segundo Valentino, não veio ao Japão para se aliar aos terroristas, não deveria ser enviado ao seu país de origem, a China, para ser preso? – Ogino questionou desconfiado, porém Ryan somente sorriu.

— Munir Kaifeng deixou sua marca em muitos países, que na verdade não considero marcas de vandalismo. Seu maior crime, de fato, é ter roubado material pra pintar diversas obras. Ele retornará à China para ser julgado devidamente, por certo; porém, o que exige sua volta ao Reino Unido primeiro é a circunstância de agora ter se envolvido com lobos. A única organização que protege as vítimas híbridas de laboratórios clandestinos e outros grupos criminosos se encontra na minha terra natal, portanto, Munir terá que ir comigo.

— Por quê? – o inspetor insistiu – Você trabalha para a polícia? – a moça silenciou, fitando-o, bem como as suas amigas, com ar analítico, e foi quando uma risada soou.

— O que importa se ela trabalha ou não? – todos se voltaram para a porta que dividia a sala do resto dos cômodos da casa, de onde surgiu um rosto pela fresta de modo aterrador – Um emprego não define quem a pessoa é. Você não sabe quem é bom ou mal, tio?

— Katsu, saia de trás da porta. Parece um fantasma. Está assustando os convidados.

— A intenção era esta. – o menino respondeu com desdém, passando do corredor pro interior do aposento e fechando a porta de correr – Você reclama muito, nee-san.

— Eu não mandei você ficar junto da Stella?! Cadê ela?

— Ficou com o Fenrir no meu quarto. Ele está distraindo ela, então não tem perigo de vir para cá. Eu fiquei entediado e queria saber se já chegaram na parte boa da conversa.

— Que “parte boa”? – Nozaki indagou com desconfiança e receio.

— Sobre como vão recuperar o Presa Negra e contar para a turma do bode que NORA é uma organização de lobos. – no mesmo instante, o clima no ambiente se tornou tenso e estático, no que as cabeças se moviam para fitar os alvos do assunto.

— Como é? – Gabriella levantou sua arma em ameaça – Vocês são do time do lobo?

— Não! – Natsuki se apressou em dizer, abanando as mãos – Estamos do seu lado!

— Então que história é esta de serem lobos também? Mentiram para nós!

— Isto é uma traição à família Valentino! – o irado Lorenzo se levantou – Don, diga alguma coisa! – Don apenas abria a boca, sem conseguir proferir palavras pelo choque.

— Katsu, você não devia ter contado isto! Principalmente dessa forma!

— Mas Jessie, se eles não souberem, como é que pretendem fazê-los cooperar para capturar o tal Kaifeng? O cara quer todo mundo reunido.

— Do que está falando? – Kuniharu ficou de pé dessa vez, seguido dos outros ainda sentados, e Katsu se virou para as visitas.

— Ué, ainda não adivinharam? O meu palpite é que ele sequestrou o chefe deles para pintar a sua obra prima suprema, a que ainda não conseguiu criar por falta de inspiração, mesmo tendo percorrido tantos países. – todos se voltaram ao garoto.

— O que você quer dizer com isso, Katsu? – a britânica se aproximou dele.

— É um raciocínio simples: o que você faria se fosse uma artista famosa gravemente doente, e descobrisse por acaso uma família de híbridos, humanos com DNAs de lobos, separados por uma rixa entre criminosos e policiais? – os ouvintes absorveram a pergunta por um momento, compreendendo a lógica – Ele quer reuni-los para pintar um retrato. Se der certo, é bastante provável que fique imortalizado por conseguir representar a tragédia grega dessa história em uma obra verídica.

— Oh meu Deus, você está certo! – a ruiva vibrou – Só pode ser isto! Desde o início, Munir não tinha a intenção banal de viajar pelo mundo de graça para roubar coisas e só sinalizar os lugares onde esteve! Ele quer mostrar para o mundo algo nunca antes visto, e provar para as pessoas que já tentaram comandar seu talento que é o único capaz de expor suas obras da maneira mais apropriada!

— Então, se fizermos o jogo dele, podemos prende-lo e leva-lo à justiça! – Hiroshi finalizou o pensamento, tão alegre quanto ela, e ambos bateram as mãos em acordo.

— Ei, ei, esperem aí! Eu não disse que entraríamos nesta! – Valentino se pronunciou – Acham que vamos ignorar esta traição? Don Valentino não perdoa fácil!

— Mas Don-san, precisamos da sua ajuda. – Jessie se aproximou dele, inclinando-se com as mãos nos joelhos – Os meus amigos da ONG chegarão do Reino Unido daqui três dias, então, se puder fazer o favor de colaborar conosco para encontrar o Munir Kaifeng, eu sei que eles ficarão muito gratos. – ela pôs a mão direita ao lado da boca, sussurrando em seu ouvido – Podem até gratifica-lo com uma estátua em sua homenagem.

— Don, não se deixe enganar! Nós vamos estar ajudando nossos inimigos!

— Mas Lorenzo-san, não tem razão para sermos inimigos. – Ryan logo ficou atrás dele, colocando as mãos sobre seus ombros – Imagine um mundo melhor para todos nós, onde você, Don-san e toda a família Valentino serão reconhecidos por quem são, e não pelo que parecem. Não é o que querem? Provar seu valor? Os lobos também só precisam de respeito. Cada um vem defendendo aquilo em que acredita e protegendo aqueles com quem mais se importa. Se ficarmos juntos, Lorenzo-san logo poderá viver tranquilo em uma casinha no campo, aproveitando os frutos do seu trabalho duro ao lado do Don-san.

— A-Ao la-lado do Don? – o homem gaguejou, perdendo-se numa fantasia onde ria despreocupadamente em uma fazenda, perseguindo o líder mafioso por um campo verde.

— Não sei no que vocês estão pensando, mas estou com uma vontade louca de atirar nos dois. – a assassina do time resmungou, puxando o gatilho do seu revólver.

— Gabriella-san, eu soube que gosta de rapazes de pequena estatura. – a britânica foi até ela, pegando o seu celular no bolso do vestido e clicando na tela – O que acharia de curtir umas merecidas férias em algum lugar divertido depois de tanto trabalho? E eu até conheço alguém perfeito para lhe apresentar! – a ruiva declarou, mostrando a foto de um jovem com olhos azuis-esverdeados e uma expressão apática, que rapidamente captou o interesse da mais velha a ponto de largar sua arma pra pegar o telefone das mãos da dona.

— Que deus é esse? – ela começou a ofegar – Eu preciso conhecê-lo! Quem é ele?

— É o meu amigo, Toshio. Eu terei o maior prazer em apresenta-los quando ele vier ao Japão. Ah, e Don-san... – a moça tomou o celular de volta, arrastando o indicador sobre o visor e indo para perto do bode – Esta é a minha outra amiga, que vem com ele, a Michi. – dessa vez, a imagem apresentada era a de uma garota com chifres na cabeça, sorrindo amigavelmente, e quando viu a cena, não apenas ele como todos ficaram surpresos.

— Existem mais pessoas com DNA de animal, além de gatos e lobos?

— Sim Yuta-kun. A Michi é uma cordeirinha muito fofa, tanto que nem aparenta a idade que tem. Bom, o que acham gente? Posso contar com vocês para o trabalho, pra eu poder relatar cada maravilha que fizemos juntos quando meus amigos chegarem aqui?

— SIM! CONTE COM A GENTE! – o trio declarou empolgado.

— E Natsuki-chan, Yataro-kun... – Jessie sorriu para os dois – Não serão forçados a participar, especialmente porque deve ser difícil tomar alguma decisão sem seus parceiros saberem, mas eu garanto que esta pequena aventura pode ajudar demais ao Haruka-san e ao Soumei-san. Todos queremos o melhor para nossas famílias, né?! – a dupla a fitou em dúvida e se entreolhou, sem saber como responder, mas passado um tempo, concordou.

— Que droga de poder é esse que ela exerce sobre os outros? – o pasmo Kei indagou.

— É algo natural, que transpira dela. – Katsu respondeu com as mãos nos bolsos da calça, em um diálogo ouvido por poucos – A Shi-san diz que poucas pessoas são como a Jessie, capazes de conquistar os outros pelo valor da impressão.

— “Shi-san”... É a amiga de vocês, Shiori? – o menino confirmou com a cabeça – E o que é esse “valor da impressão”?

— O valor que alguém adquire de nascença, um carisma natural apresentado quando uma pessoa enfrenta algum obstáculo de maneira incomum. Shi-san diz que não se pode ensinar alguém a possuir o valor da impressão, mas é possível aprender com alguém que o possua. A Jessie sempre consegue deixar sua marca com a melhor impressão possível. – enquanto os ouvintes pensavam nisso, o celular de Lorenzo tocou e Ryan olhou a tela.

— Ah, perfeito! A última integrante da equipe, Noah. Vamos encontrá-la amanhã!

 

Continua...


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