O mundo parou e eu aproveitei. O beijo deve ter durado alguns minutos, mas parecia que nem se durasse horas seria o suficiente. Paramos para tomar um pouco de ar, e a realidade me atingiu como um soco no estômago. Nós dois estávamos bêbados e rindo à toa, fazendo coisas que amanhã talvez quiséssemos esquecer. Isso já aconteceu antes, e eu ficaria chorando no meu quarto, sozinha, de novo.  

—Por que você fez isso? - perguntei fechando a cara. 

Ele me olhou confuso e, talvez um pouco magoado.  

—O que?  

—Você me ouviu! Por que me beijou? Para segunda chegar na escola dizendo que estava bêbado demais para lembrar do que aconteceu? - eu disse, as lágrimas começaram a queimar meus olhos, mas eu tentava mandá-las embora. 

Ele ficou quieto e não conseguia me olhar nos olhos, o que me fez jogar tudo o que estava entalado em mim por quase um ano.  

—Eu tenho certeza que você se lembra daquela festa ano passado! Percy, você não estava tão bêbado para ter esquecido tudo assim. Você me beijou naquela noite e depois agiu como se nada tivesse acontecido, eu me senti humilhada, para dizer o mínimo. Por que você mentiu? Eu não entendo... 

—Eu não queria que isso interferisse na nossa amizade – ele disse e eu não podia acreditar nessa desculpa, o quão trouxa ele acreditava que eu era? 

—Ah, me poupe Percy! Você preferiu mentir para mim ao dizer a verdade. Se você quisesse mesmo manter nossa amizade, teria me contado isso. Fala sério, nos conhecemos há cinco anos, mas as vezes penso que você não me conhece, não de verdade.  

Nesse momento as lágrimas teimaram em cair, ele fez menção de me abraçar, mas recusei me levantando. Olhei para ele me sentindo inútil, mas queria arrancar a verdade dele. 

—Por favor, me conta a verdade – disse, pronunciando cada palavra o mais claro possível.  

Ele olhou para as mãos pensando no que deveria dizer, e eu esperei. Respirando profundamente e me obrigando a parar de chorar. Apesar de eu estar magoada não queria que ele me visse chorando, mais do que já viu.  

—Eu estava confuso sobre tudo o que aconteceu – ele começou e eu sentei na tampa da privada de frente para ele, encarando seus olhos. Apesar de ele desviar constantemente, mantinha os dele nos meus também - Fiquei confuso pelo que estava sentindo e por nossa amizade – bufei, mas ele continuou - é sério, eu não saberia o que fazer se tentássemos alguma coisa e depois não desse certo. Estaria perdido – e foi a vez dele de falhar a voz, não amoleci e o incentivei a continuar - não tenho muitas pessoas em quem confiar, desde que meu pai foi embora. Só você, minha mãe e o Tyson. E se a gente se distanciasse depois, eu nem sei mais...  

—Para com isso! Você sabe que eu não deixaria isso acontecer. Mas não fui eu que se distanciou depois de começar a namorar.  

—O que você quer que eu diga?  

—Vá a merda – eu disse sussurrando, nem sei se ele escutou. 

Fechei os olhos e respirei fundo. Precisei de todas as minhas forças para me levantar e sair daquele maldito banheiro. Não sabia o que pensar, estava magoada e confusa. Fui até onde Luke estava, ele continuava naquele sofá. Entendeu assim que me olhou que eu precisava ir embora. Ele continuava bêbado, então guardamos o carro na garagem do Trevor e pegamos um uber até minha casa.  

Não falei nada o caminho inteiro, só deixei as lágrimas caírem silenciosamente, enquanto eu me sentia ridícula e triste. Chegamos em minha casa, Luke me olhou, pagou o motorista e abriu a porta para mim.  

Esperei o carro sair e sentei na calçada. Meu amigo me acompanhou e eu apoiei minha cabeça em seu ombro.  

—O que ele fez dessa vez? – Luke me perguntou e eu nem sabia o que responder. 

—Me beijou.  

Não conseguia nem olhar para ele. Não sabia se ficaria bravo, magoado ou os dois. Mas ele não me afastou, o que já fez eu ficar agradecida e esperançosa para não ter outra DR.  

—Então por que está tão triste? Achei que fosse o que você queria – ele disse. 

—Eu também, ele ainda confessou que se lembra te ter me beijado na festa ano passado. Mas começou com o discurso de que não queria que nossa amizade mudasse, e que não sabia o que queria que dissesse.  

Ele me abraçou e eu continuei a falar.  

—Além de tudo isso parecer um monte de desculpas, ele deixou claro que não quer nada comigo.  

—Não acho que seja o caso. Ele deve estar com medo de onde isso vai dar. Se não, por que te beijaria? - ele disse como se doesse falar a verdade para mim.  

—Quando foi que ficou tão inteligente – dei um sorriso murcho, mas sincero.  

Ficamos ali mais um tempinho. Refleti sobre tudo o que aconteceu, e não sabia o que fazer. Como eu o encararia na segunda? Respirei fundo ainda apoiada no Luke, e beijei seu rosto.  

—Fica comigo hoje? - eu disse, não queria transar nem nada do tipo. Só ficar com alguém. Ter com quem conversar e não me sentir sozinha.  

—Tem certeza? - ele estava um tanto esperançoso, o que achei fofo.  

—Tenho.  

Abri a porta e fomos para meu quarto. Tomei um banho e coloquei um moletom. Ele tinha uma troca de roupas no meu armário, que colocou enquanto eu estava no banheiro. Estava sentado na cama, olhando algumas mensagens.  Sentei ao seu lado, tentando digerir o que foi o dia de hoje. 

—Não pense que será tão fácil me seduzir. Tem que pagar uma bebida pelo menos – ele disse dando um sorriso zombeteiro. Lhe dei uma almofadada na cara e ri um pouco. Só ele mesmo para me fazer rir naquela hora.  

—Cala boca, idiota. Você que não tente nenhuma gracinha durante a noite. 

Ele me olhou maliciosamente, o que me deu vontade de socá-lo.  

—É sério! 

—Estava só brincando, Annie. Nunca faria isso, ainda mais, você está bêbada.  

Deitei na cama e ele deitou do meu lado. Colocou o cobertor sobre nós, e me olhou. Senti como se minha cabeça pesasse uma tonelada. Fechei e abri os olhos devagar. Lhe dei um leve beijo nos lábios, inocente, sem segundas intenções.  

—Obrigada por tudo – disse, e continuei a olha-lo. Ficamos ali por algum tempo olhando um para o outro, até que adormeci.