Galhos Suicidas escrita por Vatrushka


Capítulo 8
Poliana




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Só concederam à Poliana a permissão para viajar rumo à Terra quando foi publicada a oficial notícia de que Victriz seria destronada.

Poliana não estava surpresa. O Parlamento sempre teve um histórico muito rigoroso com seu monarcas. Uma falha, qualquer deslize sequer que te afastasse da perfeição e você estava fora. Queriam passar a imagem de uma Terra forte e imponente - e assim teria que ser seu representante.

Estava ansiosa para ver sua irmã, não apenas para prestar-lhe apoio emocional - devia estar precisando: por mais que soubesse o quanto Driano se importava, às vezes seu afeto assemelhava-se ao de uma pedra - mas também para descobrir o que Victriz planejava com tudo aquilo.

Conhecia a irmã que tinha. Ela era tudo, menos ingênua ou descuidada. O ocorrido definitivamente não era um acidente.

Também estava louca de saudades de sua filha, Flora. Queria poder agarrá-la e expremê-la que nem fazia quando ainda era um bebê.

“Mamãe, quando vai poder vir? Sinto sua falta.” Era uma mensagem que recebia quase todo o dia. ‘Que gracinha.’

Iria para a Terra para próximo de Flora, mas precisava parar na Lua antes. Depois de sua longa temporada de férias em Júpiter, seguida de uma temporada mais longa ainda de trabalho intenso em Saturno, sua vida real parecia lhe convocar - sugar - com ainda mais força.

Poliana trabalhava como engenheira nos gigantescos, ousados e famosos projetos de megaestrutura utilizados na maior parte do Sistema Solar. Quando criança, Flora falava com orgulho: “Minha mãe é cientista maluca!”

Cientista… Era sim. Já maluca… Não faltava muito.

Trabalhava para a mesma companhia centenária que havia inaugurado as primeiras megaestruturas habitáveis implantadas em outros planetas, permitindo sua povoação por humanos de forma segura. Atualmente, a companhia estava mais focava em elaborar formas de extração do minério dos anéis de Saturno - trabalho encarregado à Poliana e sua equipe nos últimos meses - ou em formas de tornar o planeta Netuno habitável.

Sempre que tinha a oportunidade, Poliana caçoava seus irmãos. “E vocês achando que têm um trabalho difícil.”

Pensando nesta lembrança com carinho, entrou na sala onde Victriz se encontrava algemada.

As duas irmãs se encararam, imóveis, por bastante tempo. Poliana entristeceu-se ao ver Victriz daquela forma. Enjaulada. Justo ela. Com tanta vida e determinação - um espírito livre.

Se bem que todos da família Umbrana tinham um espírito livre.

Poliana reparou que não via sua irmã vestindo uma roupa branca haviam anos. Era uma tradição da Casa Umbrana sempre vestir-se de preto. Era a cor de seu brasão, a sua identidade.

Claro que nem sempre levavam a regra à risca. Driano, por exemplo, pouco se importava com esta tradição em particular. Poliana confessava fazê-lo mais por questão de estilo e praticidade. Victriz, entretanto, desde que virara rainha, só aparecia de preto. Deslumbrante e em tecidos caros, mas todos eram pretos.

Ismália parecia ter pegado a mania - não conseguia lembrar-se da sobrinha usando outra cor. Brianna, filha de Driano, era muito nova para ter esse tipo de preocupação.

Já a Flora, sua filha, parecia ser sempre a exceção para todas as regras. Se todos usavam preto, ela era colorida. Se todos eram sérios, ela era alegre e espontânea. Se todos tinham um gênio forte e uma personalidade difícil de se lidar, Flora se mostrava leve como uma pluma.

Se Flora não tivesse a semelhança física com sua mãe, Poliana começaria a ter dúvidas se ela realmente era a sua filha.

‘Isso deve ter saído do gene do pai doador, só pode. Mas o que o pai era, então, um unicórnio?’

Os olhos verdes de pantera da Victriz se fixaram nos de Poliana. Quando os guardas robôs deixaram as duas a sós, Victriz se rendeu. Relaxou os ombros e finalmente desistiu da postura impecável.

Poliana correu para abraçá-la, dando cafuné. Não sabia o que dizer.

“Vim assim que pude.” Foram as palavras que saíram.

“Eu sei.” Ela sussurrou. “Você sempre vem.”

Poliana mordeu o lábio. Apesar de rainha, era sua irmã caçula, afinal.

“Se… Algum dia, você sair daqui… E vai por mim, vou mover montanhas pra que isso aconteça…” Começou Poliana. “Vou te levar pra longe daqui. Você vai continuar seu curso de medicina, e tudo vai continuar sendo como deveria ter sido… Se não fosse o papai nos obrigando a participar daquela porcaria daquele Nodos…”

Victriz segurou as lágrimas. Queria contar-lhe, queria. ‘Quando eu sair daqui, será para morrer.’

Ergueu a cabeça, olhando no fundo dos olhos de Poliana. Ismália estava certa. Sacrificara tudo: sua vida, sua felicidade, sua relação honesta com a própria irmã pela maldição daquela coroa.

“E para onde você me levaria?” Provocou Victriz. “Em que lugar do Sistema Solar alguém iria querer se consultar comigo?”

Poliana revirou os olhos. “Nem que seja Plutão, Victriz.”

‘Plutão.’ Pensou Victriz. ‘É para onde Ismália sempre ameaçou fugir.’

“Poliana…”

“Sim?”

“Como… Você consegue? Ter uma relação tão boa com a sua filha?”

Poliana inclinou a cabeça. “Já que você quer saber a minha opinião, eu vou falar a minha opinião…”

Victriz revirou os olhos. Estava quase se arrependendo de ter feito aquela pergunta.

“Eu acho que a minha relação com a Flora porque eu sempre a tratei como uma pessoa. E não um soldado de guerra.”

Victriz continuou olhando fixo para o nada. ‘Quando o pior acontecer, minha irmã, veremos qual das nossas filhas vai sobreviver inabalável.’

Vendo a reação de Victriz, Poliana preferiu mudar de assunto. “E a Olga, eim?”

Victriz deu de ombros. Sua irmã continuou. “Inicialmente, ela realmente estava disposta a te defender.”

A rainha revirou os olhos. “Lógico. A validez dela dependia da minha. Pelo menos até ela conseguir provar que o Nodos do nosso ano não foi fraudado nem teve nenhuma falha de execução… Aí, ela voltou a ter a vantagem.”

“Quando ela propôs que você poderia ter sido afetada negativamente pelo peso do cargo e pela situação da Ismália, eu gargalhei.” Confessou Poliana.

Victriz continuou impassível. Poliana estranhou: “Você não se sentiu traída?”

“Pela Olga? Claro que não. É exatamente o que eu esperava que ela fizesse. É o que eu faria no lugar dela… Continuar com a confiabilidade no sistema, culpar as circunstâncias. Traída eu me senti quando o Jade começou a sair com ela.”

Poliana sorriu, orgulhosa. “Sempre te avisei para oficializar com ele enquanto pôde.”

‘É exatamente por gostar dele demais que não o faço.’ Admitia para si mesma.

“Aliás, o Jade já veio te visitar?”

Victriz riu. “E você acha que ele ia perder mais uma oportunidade de ficar no fogo cruzado?” Sua irmã tomou a expressão de quem queria mais detalhes. Impaciente, continuou: “Ele estava furioso. Perguntou aonde eu estava com a cabeça. Me chamou de inconsequente… Tentou arrancar a verdade de mim com todas as chantagens emocionais possíveis. ‘Eu sei que você tem um plano, Victriz. Tem que me contar!’ Ele disse. Veio com aquele papinho de que era dever dele me proteger de mim mesma.”

Poliana não reagiu. Victriz provocou: “Você não está revoltada.”

“Lógico que não.” Retrucou a mais velha. “Teria feito a mesma coisa se fosse menos paciente. E se não soubesse que uma abordagem direta não vai funcionar com você.”

Poliana se aproximou ainda mais seu rosto do de Victriz. “Eu vou descobrir o que você está aprontando, Victriz.”

A rainha retrucou com um olhar ainda mais intimidante. “Você pode tentar.”


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