Galhos Suicidas escrita por Vatrushka


Capítulo 9
Glaura




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Glaura havia percorrido todo o caminho até o gabinete com o estado emocional perturbado.

Não achava que viveria para assistir tantas transformações históricas.

O dia anterior havia sido agitado. O julgamento havia sido concluído e Victriz fora destronada. Na semana seguinte abririam as inscrições para o Nodos, e este começaria no outro mês.

Mal conseguia acreditar. Não sabia o que sentir.

A opinião pública estava dividida. Com o decorrer do julgamento e a publicação de provas contra Victriz, muitos haviam desistido de defendê-la; alguns optaram por repudiá-la e declará-la como traidora.

A maior dúvida que se instaurara na mente de todos foi o aspecto não esclarecido no julgamento: as reais motivações de Victriz. Muitos, todavia, concordaram com a conduta da Justiça - o crime já estava no ato de a rainha agir sem o consentimento do Parlamento, independentemente dos motivos.

Não se poderia negar, entretanto, a sensação de algo mal resolvido. Era comum ouvir grupos de teorias da conspiração alegando que Victriz retomaria o poder à força com a ajuda de grupos criminosos.

Glaura revirou os olhos. ‘Mas que gente dramática’. Há semanas já desistira de entender o que estava acontecendo. As pretensões de Victriz, o motivo do contato. No geral, apenas lamentava. Sempre admirara Victriz.

Glaura só queria focar-se na realidade: haveria um novo Nodos. Um novo monarca assumiria o poder.

E faria de tudo para ser a próxima rainha.

Acreditava ter nascido para aquilo. Era uma Clarson. Sua linhagem diplomata a obstinava para esse destino. A sede de justiça corria em seu sangue.

Glaura interrompeu seus passos ao encontrar Graco deitado sobre os próprios braços, em bruços sobre a própria mesa. Parecia exausto. Estava com a mesma roupa do dia anterior.

Havia passado a noite ali. A mesa de Graco ainda estava com múltiplos arquivos abertos. Perfis de redes sociais de parlamentares, manchetes, simulações 3D do caso de Victriz.

Concluiu que, quaisquer tentativas de Graco de ajudar Victriz falharam. Glaura pôs a mão em seu ombro, gentilmente. Graco acordou abruptamente. Não se virou. Continuou a encarar as telas abertas à sua frente.

O rapaz suspirou. “Eu sou inútil.”

Glaura aproximou-se com outra cadeira. Sentou-se ao seu lado, consolando-o. “Você se exige demais, Graco. Isso tudo... Estava além da sua capacidade de sua resolução.”

‘Você é só um estagiário.’ Pensou em acrescentar, mas segurou-se. Não seria de grande ajuda naquela hora.

“Não te… Frustra? Ver isso tudo acontecer, estar tão próximo, e ao mesmo tempo não poder fazer nada?” Os olhos de Graco encontraram os de Glaura. Ele estava desesperado.

Glaura havia se perguntado se não teria sido uma melhor ideia deixar Flora acalmar Graco, por serem amigos mais próximos. Mas lá no fundo, Glaura sabia que só ela poderia fazer aquela conversa.

Eles se entendiam. Eram, de certa forma, parecidos. Os dois eram terrivelmente ambiciosos. Sabiam que uma mera mão no ombro e um “Vai ficar tudo bem” nunca seriam o suficiente.

Nunca.

“E horrível.” Admitiu ela. “Não tem um só dia na minha em que eu não dedique toda a minha energia em ser alguém aqui dentro.”

Graco bufou. “Você é alguém. Você é uma Clarson.”

Glaura ergueu a sobrancelha. “Eu sou mais que o meu sobrenome.”

O rapaz suspirou, forçando um sorriso. Não queria entrar naquele mérito. Ele desligou as telas, com os ombros murchos. A ruiva incentivou-o: “Você sabe que o destronamento de Victriz, por mais lamentável que seja, nos dá uma oportunidade única.”

Graco cerrou o maxilar. Lógico que sabia. E adorava a ideia. Mas ao mesmo tempo, não podia deixar de se sentir revoltado.

‘Nodos.’

Glaura afastou-se, indo em direção à sala de Jade. Sabia que Graco não estava fazendo aquilo somente em apoio à Victriz. Era principalmente pela Ismália. Ele não era do tipo que fugia dos problemas - o amigo da até então princesa queria que esta fizesse as pazes com a mãe de forma digna. Que Ismália aprendesse a lidar com o próprio estilo de vida.

Este era um dos maiores defeitos de Graco, na visão de Glaura. Achar que todos eram iguais a ele.

A ruiva confessava preocupar-se com a situação de Ismália. Mas já havia desistido de ser próxima dela há muito tempo.

Jade estava sentado em sua cadeira, alisando a própria testa. “Aí está.”

Seu tutor era uma pessoa... Enigmática. Ao mesmo tempo que era gentil, era distante. Ao mesmo tempo que amava, era frio. Que se importava, mostrava-se indiferente. Era assim com Victriz, Olga, Ismália, com ela mesma… Parecia ter construído ao redor de si barreiras de contato com outras pessoas, por sempre temer o pior. A convivência com Jade parecia só intrigá-la mais, ao invés de ajudá-la a compreender o que de fato estava atrás daqueles tempestuosos olhos.

Glaura tinha a teoria de que tal comportamento devia-se à morte de seu pai, Ivan Clarson, um amigo realmente próximo de Jade. Deve tê-lo abalado imensamente, a ponto de se oferecer para criar sua filha.

Jade nunca foi muito carinhoso ou acolhedor. Nem mesmo com Glaura, que estava mais próxima de ser sua filha que Ismália. Era como se ele tivesse receio de se aproximar, de se afeiçoar demais e não conseguir realizar suas obrigações.

Definitivamente, a morte de Ivan o traumatizara. Se bem que, Jade era tão fechado quanto ao seu passado antes de ingressar ao Parlamento…

“Nós vamos visitar Ismália hoje.” Declarou Jade.

Glaura sorriu de leve. Isso queria dizer que a situação dela estava melhorando. “Nós quem?”

“Eu, Poliana, Flora, Driano, Brianna… Você também, se quiser. É um convite.”

Glaura ficou tensa. “Acho melhor que seja um momento da família.”

Jade ergueu a sobrancelha. “Você é da família.”

Glaura sabia que não tinha nenhum motivo racional para se sentir excluída assim. Driano e Victriz sempre a trataram muito bem. Poliana, que aparentava ser a mais calorosa dos Umbrana, sempre lhe dava atenção toda vez que a via. Flora era simplesmente adorável demais. Brianna também.

Normalmente diria que esta sensação se deve à Ismália, mas por mais que Glaura estivesse ciente do seu desconforto, nunca realmente se importou com sua opinião.

Talvez seu sangue fosse forte demais. Ou o legado Clarson, pesado demais.

“Obrigada, Jade, mas prefiro não ir.”


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