Mistério em Alto Monte escrita por HugoMartins


Capítulo 3
O abismo


Notas iniciais do capítulo

Ligia está algemada, sendo transportada para o pé do monte. Mas ela não irá permitir que Camila morra sangrando.



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Através do monitor que está na cabine, Ligia e os seguranças olham atônitos, uma onda gigante cobrir a cidade de Alto Monte. Os frangalhos de concreto que sobraram da represa, não conseguiram conter a força das águas.

Os olhos dourados de Ligia enchem-se de lágrimas. As gotas de chuva escorrem pelo vidro do carro e testemunham a tristeza dela.

O segurança abre rapidamente a porta da cabine e em seguida entra no jipe. O homem sardento vem logo atrás e, se aproxima da janela do carro. Ele observa Camila com a mão na barriga, se contorcendo de dor.

— Eu sinto muito pelo que aconteceu com vocês. Minha filha tem sua idade - diz o homem sardento olhando para Camila.

— Sente nada - Camila responde indiferente.

O homem sardento entrega um rádio para o segurança mal encarado.

— O que você vai fazer? - pergunta o homem sardento.

— Vou deixá-las no pé do monte. O chefe não quer que elas fiquem aqui. - responde o segurança dando partida no jipe.

— Você viu o que aconteceu? Lá embaixo deve estar tudo submerso. Não existe mais Alto Monte. Nós só escapamos por que estamos aqui. O melhor a se fazer é levá-las pra mansão e cuidar dos ferimentos - aconselha o sardento.

O segurança guarda o rádio no porta-luvas e acelera sem olhar para trás.

  

As mãos sujas de sangue de Camila, pressionam a região abdominal. Ela geme sentindo dor.

— Não podemos ficar na beira da estrada. Ela precisa de ajuda médica. Se você nos deixar no pé do monte ela vai morrer! - Ligia fala preocupada.

O segurança observa Camila pelo retrovisor do meio.

— Ela vai ficar bem - ele diz indiferente.

Ligia mesmo algemada, avança em direção ao segurança e grita: - Para esse carro! Volta pra mansão e nos ajuda!

Ela tenta segurar as mãos dele que perde a direção do carro. O segurança tenta frear, mas o automóvel vira, capotando várias vezes. O mundo gira rapidamente dentro do carro. Ligia vê de relance, os cabelos desgrenhados de Camila subir e descer com o movimento circular. O segurança é sacolejado como um boneco de pano.

Por um momento tudo parece tranquilo. Uma fumaça branca sobe do motor. Os pneus parecem estar no chão. Parecem.

Ligia desperta assustada e, uma gota de sangue cai sobre os seus olhos dourados. Ela põe a mão na testa e sente um rasgão acima da sobrancelha esquerda.

O segurança ainda inconsciente, está preso no banco do motorista. Camila parece estar bem, a não ser pelo seu olhar de completo terror.

— Você tá bem? - pergunta Ligia.

— Tudo bem!

O segurança acorda fazendo careta de dor. - Merda! Olha que merda você fez, sua maldita! - Ele grita transtornado. Ele se meche no banco tentando abrir a porta.  

— Para, agora! - Ligia adverte. O segurança ignora e continua mexendo o carro, tentando abrir a porta, sem sucesso.

— Para se não todos nós vamos morrer! - Ela continua.

O segurança para e olha para Ligia. Ele a vê com o indicador apontado para o para-brisa. Ele segue o dedo dela e, vê um abismo diante deles.

O carro está inclinado na ponta do penhasco na beira de um abismo. As rodas traseiras estão presas por algumas cordas de cipó velho. Qualquer movimento causa mais uma inclinação em direção à morte.

— Eu vou sair daqui custe o que custar. - diz o segurança levantando-se indo em direção as portas traseiras, pois as dianteiras abrem-se para uma queda mortal.

O automóvel pende para o lado direito escorregando ainda mais.

— Para! - Ligia grita desesperada.

Ele fica imóvel entre os bancos dianteiros.

— Por favor! Se você fizer mais um movimento, nós vamos cair e ninguém sai vivo dessa história. - Ligia fala pausadamente.

Ele retorna ao banco do motorista sem movimentos bruscos.

Camila se contorce de dor. Ligia rasga um pedaço de sua camisa e pressiona o ferimento.

— Mas que merda heim! Olha onde você me meteu! - diz o segurança inconformado.

O segurança se endireita no banco e abre o porta-luvas retirando o rádio transmissor. Ele liga o rádio e chama pelo homem sardento. Ninguém responde. Tenta mais uma vez, em vão.

— Alfa 02 aqui é o Jordan! Vamos lá merda! - Ele grita com raiva.

Na escuridão da noite chuvosa. É possível ver os faróis do jipe inclinado, iluminando o profundo abismo.

— Olha eu detesto isso! Que merda vocês vieram fazer aqui? - pergunta Jordan irritado.

— Eu procuro por meu filho sumido, e, ela está me acompanhando. - diz Ligia.

Camila revira os olhos e sorri sarcasticamente. - Huumhum. Acompanhando!

— Que garota louca! - diz Jordan.

— Ela perdeu a mãe muito jovem. Ela só precisa de alguém pra cuidar dela. - diz Ligia.

Camila se endireita no banco e tenta olhar para Jordan.

— Eu vim aqui pra matar seu chefe ENVENENADO! Aquele maldito gordo nojento! - Camila fala rangendo os dentes.

Jordan sorri com o canto dos lábios. - É, eu também já quis fazer isso, pirralha! Eu já quis matar o Arnoudo.

— Posso saber por que? - pergunta Ligia.

Jordan retira a carteira do bolso e puxa um foto 3x4 de um homem bigodudo.

— Tá vendo esse aqui? - ele pergunta mostrando a foto para as duas. - Esse é meu pai. Sumiu também! E eu vim atrás dele aqui, no topo do monte. Disseram que ele agenciava prostitutas para Arnoudo. E, quando meu pai sumiu, o maior suspeito era ele.

— Você disse que ele agenciava prostitutas para o Arnoudo? - pergunta Camila.

— Era! Mas eu descobri que era tudo mentira. O Arnoudo tem seus desvios, mas prostitutas, não é a praia dele. - confessa Jordan com um sorriso discreto.

— E aquela cabana no meio do mato? O que é tudo aquilo? - pergunta Ligia curiosa.

Jordan olha pra ela e sorri - Você quer saber de mais!

— Tá, só me diz o que aconteceu com o seu pai? - pergunta Ligia.

Jordan coça a cabeça e mexe no rádio. Um estalo alto atrás do carro. Um cipó se rompe. Todos olham para o vidro traseiro. Jordan acende uma lanterna e vê uma coluna d’água descendo ribanceira abaixo em direção ao jipe.

— Merda! O rio Papuá deve estar transbordando desde a nascente, no topo da montanha. Se não cairmos no abismo antes, as águas do rio vão nos empurrar penhasco abaixo. - alerta Jordan.

Os pés de Ligia e Camila estão submersos na água. A corrente que começa fraca, aos poucos vai ganhando força. Mais um estalar e, um  novo cipó se rompe.

— Bem, meu pai morreu de cirrose. O Arnoudo ajudou ele, mas ninguém conseguiu salvá-lo. Eu vim atrás de justiça, mas percebi que o Arnoudo poderia ser um grande pai pra mim. Acabei ficando no monte e trabalhando pra ele.

Camila sorri e diz: - Esse foi o fim que te contaram? Alguém me disse que nem tudo o que as pessoas dizem é verdade - Ela fala olhando cinicamente para Ligia.

— Você entende tudo errado! - Ligia adverte Camila.

PRAAAA. Mais um cipó se rompe fazendo com que o carro deslize um pouco mais pra frente.

Jordan entra em desespero. Ligia segura no banco da frente. Camila parece assustada, mas, uma sombra percorre sua face.

O rádio começa a chiar. Jordan fala eufórico: - Alfa 2 na escuta? Aqui é o Jordan, eu preciso de ajuda!

— Alfa 2 na escuta! O que aconteceu? Onde você tá? - pergunta o homem sardento pelo rádio.

— Estou na curva da morte, no quilômetro 05 na beira do penhasco. Vem agora! - grita Jordan.

— Chego em 10 minutos - responde o sardento.

Ligia olha aliviada para Jordan. - Você não pode nos deixar no pé do monte. Diz que vai nos levar pra mansão.

Jordan olha indiferente para elas. Em seguida, guarda a foto do seu pai na carteira.

— Você acredita que Arnoudo tem algo com o sumiço do seu filho? - pergunta Jordan.

— Eu vou procurar em todos os lugares se possível for! - Ligia diz determinada - Inclusive, na mansão do Arnoudo.

Camila olha para Jordan com frieza: - Eu acho que o Arnoudo matou o seu pai, sequestrou o David e, abusou e estrangulou a minha mãe. - Ela diz com uma frieza psicótica.

— Como foi que você perdeu seu filho? - pergunta Jordan.

— Eu discuti com ele. Achei que ele tinha furtado dinheiro da minha bolsa. Descobri que o dinheiro estava no cesto de roupa suja. Eu me recusei a pedir desculpas. Ele estava revoltado e fugiu de casa. - confessa Ligia.

— Você disse que ele nao tinha voltado da escola! Você mentiu! - Camila grita com raiva.

— Eu menti por que não queria assumir que ele havia fugido de casa por minha causa. Ele já tinha sumido outras vezes, mas por duas semanas? Ele nunca ficou tanto tempo. O máximo foram dois dias na casa de um amigo. - Ligia confessa culpada.

— Isso é bem ruim. As vezes perdemos as pessoas por não reconhecer que erramos. - provoca Jordan.

Um jipe se aproxima na estrada e estaciona no acostamento. O homem sardento desce, carregando um cabo de aço. Ele amarra o cabo em uma árvore e prende um gancho na outra ponta.

Os ocupantes do carro parecem aliviados. O sardento prende o gancho na traseira do jipe e quebra o vidro traseiro do carro. Ele retira primeiro Camila. Depois ele puxa Ligia. E, por último, ele estende a mão para Jordan.

Um estalo alto, como um quebrar de madeira seca, ecoa no penhasco. O cabo de aço treme e a lataria do jipe amassa.

— Vamos, o cabo vai ceder! - grita o sardento segurando a mão de Jordan.

O sardento aperta a mão de Jordan e o puxa pra fora do carro. O jipe escorrega junto com o cabo. Jordan derrapa e se agarra na beira do penhasco. O sardento pula, segurando a mão dele novamente. O carro cai no abismo abaixo.

— Calminha, cara! Não agora! - diz o sardento com um sorriso de medo.

— Foi por pouco! - Jordan fala com a voz tremula.

O sardento se ajoelha tentando erguer Jordan que está suspenso na beirada. Ligia se aproxima para ajudar.

O sardento continua de joelhos na beira do abismo. Duas mãos firmes encontram suas costas e lhe empurram no abismo. Ele solta a mão de Jordan e despenca no desfiladeiro. O seu corpo cai como uma fruta podre.

Ligia rapidamente se joga no chão e, agarra a mão de Jordam. Ela tem o braço totalmente esticado ao segurar ele.

Camila está de pé ao lado de Ligia.

— O que você fez Camila? Por que você empurrou ele? Você tá louca? - pergunta Ligia eufórica.

— Éramos nós ou ele. Solta ele tia. Ele vai nos matar se sair dai vivo! - Camila diz resoluta.

— Eu não posso! Vem aqui e me ajuda! - pede Ligia, agarrada à mão de Jordan.

As pernas de Jordan mexem com o vento e a chuva. - Eu levo você pra mansão. Só nos ajuda, por favor! - Ele grita.

— Estou escorregando Camila! Você precisa me ajudar. Se não nós dois caímos - Ligia fala implorando.

— Solta ele então! - diz Camila.

— Eu não posso! - Ligia diz.

Camila se afasta.

— Eu preciso matar o Arnoudo. Me perdoe por isso tia Ligia. - Camila diz dando as costas e indo em direção ao carro estacionado.

— Volta aqui Camila! - Ligia grita. - Volta aqui!

Camila entra no jipe. Dá partida, e, conduz o carro ao topo do monte. O jipe some virando uma curva sinuosa. A chuva não cessa.

CONTINUA


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Notas finais do capítulo

Próximo capítulo será publicado em 27/12.



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