O medalhão de Salazar escrita por Sirukyps


Capítulo 12
Mentiras e mingau




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Mantendo o livro levitando na altura dos olhos, James havia perdido o mingau duas vezes pela concentração em monstros noturnos e feitiços de proteção. Desta vez, a mistura (novamente) borbulhava e ele mexia com a colher de pau, fechando os olhos para memorizar a pronúncia de encantamentos antigos.

sacerwt in me ex carit...” Preocupado, seria mais fácil se soubesse o que invadia a sua casa. Revirando os olhos, a próxima página mencionava algo sobre Julho, o mês do nascimento do Harry. Intrigado, quase derrubou a panela quando uma gota saltou e lhe machucou o antebraço. Equilibrando-a por um milagre, deixava o talher enfeitiçado no automático, enquanto capturava o livro. “Marcada por igual...”.

— James...

Assustando-se ao ter o nome chamado, fechou o material apressado, quase derrubando dentro da panela. Arremessando-o na parte superior do armário, segurava o cabo de madeira, forçando o riso para aparentar o quanto estava tranquilo e que não utilizava magia. Pensando bem, aquele combinado perdia o sentido já que, agora, algo os atacavam.

Todavia, não iria brigar.

Reparando o amante sentar à mesa cabisbaixo, pensando bem, uma discussão fosse o que eles precisassem para retornar a rotina.

— Ele só conseguiu me falar que o monstro é gelado e sempre tá escuro... – Suspirando fundo, Severus afundava o rosto entre ambas as mãos ainda molhadas. “Se era só o medalhão, por que permitiam que ele se aproximasse daquela família? A profecia quase o tinha matado e...” Juntando as peças, o sonserino revisitava as gavetas da mente, buscando finalizar o complexo quebra-cabeça. A velha profecia: "Aquele com o poder de vencer o Lorde das Trevas se aproxima... nascido dos que o desafiaram três vezes, nascido ao terminar o sétimo mês... e o Lorde das Trevas o marcará como seu igual". Suspirando entristecido, confessava. – Estamos deixando algo escapar.

— Você envelhecerá rápido se continuar se preocupando assim. – James brincou, logo rindo ao notar o quanto aquele resmungão estava molhado. Tocando-lhe os ombros numa massagem, sugeria. – Por que não toma um banho para relaxar? Vai terminar pegando um resfriado.

— Eu não entendo. Como você não está preocupado? Ele... – Severus continuava indignado, mas não por muito tempo, pois o pequeno Harry entrou na cozinha com a blusa estranhamente invertida.

Unindo as sobrancelhas, a mão ao queixo impedia que este caísse questionando como aquela criança tivera a habilidade de enfiar a cabeça no espaço para o braço. Escutando o idiota gargalhar abafado, segurava o próprio riso, levantando compadecido. E, esquecendo-se de tudo por aquela noite, as ameaças pareciam algo distante enquanto ele pegava o pequeno no colo e levava pra cima do balcão.

— Vai tomar banho, amor. – James insistia. – Eu troco o Harry.

— Você está fazendo o jantar. – Severus interpôs, retirando a camisa infantil, explicava pela milésima vez a forma correta de vestir.

Aproveitando o devaneio do companheiro, James sussurrava um feitiço para acelerar o jantar. Espionando por cima dos ombros, um novo encantamento e todos os vegetais eram cortados. Rapidamente, ele guardava a varinha, puxando a mistura para o ensopado. Reparando a porta do armário descerrar pelo peso do livro, abriu, empurrando-o mais para o fundo.

Um minuto.

O melhor não seria trazer o material para a mesa e conversar? A grifinória não era conhecida pela excessiva coragem? Então, por que a possibilidade em perder o rabugento professor o fazia hesitar daquela forma?

— Estive pensando... – Severus ponderava incerto. – Será melhor se vocês forem pra um lugar seguro. Hogwarts, talvez.

 - Você virá conosco?

— James...

— Eu não vou deixar a minha vida por conta de tolos pesadelos.

— Eu tenho certeza que a Ordem vai entender. – Severus prosseguia. Retirando a toalha do ombro, secava os acastanhados cabelos do pestinha. As esmeraldas o fitava com curiosidade, achando engraçado ser amassado pela branca toalha. Retribuindo o olhar sem emoção, jamais se perdoaria se algo acontecesse aquela criança. O coração apertava ao saber que algo suspeito o visitava, furtando-lhe o sono. Pensativo, relembrava. – Eles já te deram proteção uma vez e...

— Com a minha vida, eu quis dizer: Você, Severus. – James pontuou, envolvendo-o num meio abraço pela cintura, entregando-lhe a pronta mamadeira com a outra mão.

Pego desprevenido, a mente do sonserino embranquecia. Mordendo ambos os lábios, permitia que a escuridão de seus cabelos fossem cortinas ocultando o quanto seu rosto estava vermelho.

Maldição!

Por que, mesmo depois de tantos anos, aquela irritante voz ainda o desestabilizava? Meneando a cabeça em negativo, por que aquele infeliz não poderia levar as coisas a sério uma única vez? Prendendo a respiração para sufocar os sentimentos, por Merlin, será que o insuportável não percebia o quanto tudo aquilo se tornava arriscado?  

Encontrando os vívidos olhos redondos do jovenzinho sentado frente a eles, a angústia se convertia em lágrimas e o sonserino as engolia com dificuldade para não transparecer o gradativo receio. Recebendo a mamadeira, deu um leve empurrão com o cotovelo no sorridente idiota, protestando sem nenhum humor:

— Isto é loucura, Potter. Você deveria se preocupar com a segurança do seu filho.

— Até ontem, ele era nosso.

— Não faça piada!

— Calma, Severus... – James pedia. Dissimulando a aflição, forçava a casualidade. – Você. Nós. Todos estaríamos seguros em Hogwarts ou a Ordem pensaria em algum lugar.

— E sob qual desculpa você espera que EU apareça na Ordem com vocês? Só faria sentido se fosse a Lily e...

— A gente fala que casou. – Encostando-se no balcão, temia fitá-lo. Limitando-se a observar o pequeno segurar a mamadeira com ambas as mãos, cruzou os braços, propondo despreocupado. – Ou casamos. De verdade.

O silêncio.

Será que aquilo seria um... “Sim”? Ele poderia comentar sobre a igreja e que havia comprado as alianças na mesma noite que se reencontraram ou... Estreitando os olhos, James prosseguia com extrema cautela:

— Uma pequena cerimônia. – Percebendo o cenho alheio franzir em decepção num rápido espionar, apesar de estar ansioso por uma grande festa comemorando o dia mais feliz de toda a sua vida, o bruxo retrocedia, optando pela lógica. – Aliás, só assinamos os papéis no Ministério e...  

— Eu sou um comensal.

— É... – Mordendo a bochecha, James se sentia defronte um campo mimado. Os neurônios haviam o abandonado e a impulsividade não sabia como proceder, assim, dando de ombros. – É um pouco tarde para que isto importe.

— Você enlouqueceu. – Severus assegurou entredentes.

Piscando devagar, aguardava a risada explicando que a proposta impensada era brincadeira. Uma piada para afastar o clima pesado.

Todavia, esta não veio.

E não viria.

Considerando as últimas semanas, meses, anos... A quem queria enganar? James Potter não iria retroagir.

E, para piorar, o coração lhe pulsando agitado protestava contra o claro “não” que ele deveria dizer. Só que... Sentindo-se ainda mais angustiado, Severus sabia que não deveria continuar ali. Se na escola não faria sentido, agora... Ratificando o óbvio, recordava:

— Todo mundo sabe o quanto eu te odeio.

— A gente não convida ninguém. É simples.

— James.

— Como sempre, desculpas.

— Não é isto.

— Não merecemos uma chance de ser feliz, Severus?

— Caso não recorde, eu te odeio muito, Potter.

— Eu sei.

— Você é cínico.

— E, você, detestável. – James rebateu por um sorriso, logo desistindo. Reparando o amante revirar os olhos e se afastar para o fogão, este conferia as panelas, evitando que queimasse. Por que aquela cobra tinha que ser tão cabeça dura? Desesperando-se, vomitava. – É sério, Severus. Não está funcionando com a gente separado. Temos que fazer uma aliança. – Reparando a criança bebendo o mingau e atento a dinâmica dos dois, aproveitava. – Pelo Harry. – Apontando para o filho, embravecia. – Como você disse, ele está correndo perigo. E Ordem tem a obrigação de proteger a minha família. Se eu sumo com ele, você é quem estará em perigo. E eu...

— Não temos nada, Potter.

— Não seja estúpido.

Severus não respondeu. Nervoso, os olhos corriam de James para o Harry e do garoto para o pai. Levantando as sobrancelhas, entortava a boca, fingindo não se importar. Contendo o ódio, aquilo estava fora do seu alcance. Ressentido, pegou um copo de água, buscando engolir a montanha de sensações lhe sufocando o pescoço, a corda de uma forca a apertar. Queria muito abraçá-los e aceitar fugir, contudo, o plausível... Respirando fundo, deveria permanecer sustentando a máscara da indiferença.  

Desanimado, o auror também perdeu a paciência. Soltando um muxoxo, nem tinha mais argumentos para sustentar aquela porcaria de situação. Pegando o filho ao colo, avisava:

— Vou levar o Harry pra cama.

— Ele vai dormir conosco, James.

— Eu sei. Vou levá-lo para a nossa cama, querido.

— Eu te odeio, papai. – Harry falou animado, logo bocejando.

Perplexo, James parou.

O sonserino até engasgou com a água que bebia, logo se recuperando e permanecendo boquiaberto. Espantando, o homem questionou num preocupado temor:

— Filho...? O que aconteceu?

O garoto piscou confuso.

Olhando para o sonserino, segurava a mamadeira entre as duas mãos, suspeitando ter feito algo ruim. No entanto, voltando a fitar o desconforto na cara do pai, não fazia sentido. Aconchegando-se no carinho dos braços que o carregava, baixou o rosto, explicando tímido:

— Não entendo. Quando o papai Severus fala isto, você parece tão feliz. Não é bom?

O comensal respirou fundo, prendendo a gargalhada pela inesperada observação. Por mais que não devesse estar ali, não conseguia se imaginar distante daqueles dois, ainda mais, quando não era somente a aparência que o pequeno havia herdado do idiota. Aproximando-se, bastante culpado pelos olhos do amante o julgando, justificava-se:

— Harry, eu não... – Confuso, como colocaria? Recomeçando, - Eu... Seu pai. – Escutando um anasalado riso, o ódio lhe dominava. – Eu... – Reparando os acastanhados olhos, bastante interessado nas palavras a serem ditas, o professor optava pela defensiva. – Eu posso odiar o idiota do seu pai e esperar que ele morra lentamente, pois ele é um infeliz.

Harry ficou pensativo por dois segundos, logo interpondo:

— Mas, se o papai morrer, ele não estará mais com a gente.– Deixando a mamadeira perto do peito, juntava as mãozinhas numa atrapalhada prece. – Por favor, papai Severus, não queira que ele morra.

Maldição!

Maldição!

Maldição!

Atacado, Severus cerrou os olhos, extremamente perdido.

Por Salazar, ele não odiava. Harry não reparava que eles estavam juntos e... Por mais que jamais admitisse, nenhum outro beijo se comparava ao do idiota. Sem dúvida, o dia ganhava um maravilhoso colorido quando podia xingá-lo. Fitar aqueles olhos sempre determinados. Usufruir daqueles abraços... E.... Outras barbaridades que ele jamais deveria verbalizar.

Por Merlin!

Por que o pequeno não entendia como o mundo adulto era complicado? Como explicaria que os dois nunca deveriam ter trocado uma palavra e, muito menos, estar naquela cozinha?

Quando aquela criança poderia estimar o erro colossal que era aquele professor continuar ali?

Percebendo o amante a ponto de explodir, James rodopiou com o garoto, logo seguindo para o quarto enquanto comentava sobre vassouras, dragões e vassouras que voavam com dragões. Prometia que, um dia, o jovenzinho alcançaria as estrelas, pois teria uma vassoura dragão tão rápida que superaria os cometas.

Coçando a nuca, o jovem comensal permanecia em conflito. Embora aquele lar fosse caloroso, conforme os ponteiros do relógio repetiam uma nova volta, o frio crescia e o acolhia. Reparando as panelas do jantar começar a borbulhar, por mais que houvesse prometido ao anjinho que ficaria, só desligou o celular, recolheu os livros e saiu.

Libertando as lágrimas ao cruzar a porta, enxugava-as rapidamente com o dorso da mão.

QUE PORCARIA DE MISSÃO!

Estava claro que já havia falhado e não poderia continuar ali. Por mais que amasse muito aqueles dois, era impossível. Afinal, comensais da morte... Recordando os ensinamentos sobre proporcionar o desespero, estava claro que a felicidade jamais marcaria presença em vidas amaldiçoadas. Por isto, recompondo-se, reconhecia que o melhor seria permanecer, como sempre esteve, sozinho.

Seis passos.

Fechando os punhos.

Mais lágrimas.

Meneando a cabeça, desnorteado, Severus não entendia: Se estava conformado, por que doía tanto? Talvez, o misterioso “monstro” tivesse razão quanto contava ao Harry que o estimado professor mentia.

Todavia, ele não voltaria. 


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