Luisa Parkinson: A Companheira Fantástica escrita por Gizelle PG


Capítulo 88
O jeans da TARDIS


Notas iniciais do capítulo

Hello!

"a perseguição não acabou, porém, enquanto o Doutor tirava um cochilo, as meninas resolveram descontrair um pouquinho"



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—Arrr! Tenho certeza que o cara que armou tudo isso pra cima de nós, deve estar agora, adorando nos ver assim, aturdidos!—Melissa disse, irritada. –Odeio gente que se diverte as custas dos outros... Aposto que o fanfarrão ainda está comendo pipoca, enquanto assiste à nossa ruína!

—Ah, por favor... Não seja tão dramática! –censurou a TARDIS. –Como se já não bastasse todas as coisas pelo que passamos hoje... Será que você sempre tem que ver o lado negativo de tudo?

—Meninas, não briguem –pediu Luisa. –Só vai piorar as coisas...

—Tem razão –a TARDIS reconheceu. –Me perdoe. Eu não tive a intenção de tirar sua liberdade de expressão, Melissa. Sei que você está se sentindo mal com tudo isso, e reconheço que não há nada de errado em querer se manifestar. –admitiu. –Sabe, a verdade é que desconfio que eu mesma esteja virando uma pilha de nervos...

 Melissa passou o braço ao redor do pescoço da moça.

—Sabe? Você devia experimentar mandar todo mundo pro inferno de vez em quando... Dá uma sensação tão revigorante.

Luisa observava o novo Doutor, enquanto ele dormia.

 -Por que ele tem tanta obsessão por doces? –perguntou.

—Porque, quando se é um deus solitário com a mentalidade de uma criança, você precisa descarregar as energias acumuladas, praticando alguma coisa. –explicou a TARDIS. -O Doutor é bem organizado: ou ele corre. Ou ele fala pra burro. Ou ele... Come doce.

Luisa assentiu, dando a entender que aquela explicação já tinha bastado. Melissa respirou fundo.

—Coitado. Ainda vai morrer do coração, tireóide, ou diabetes...

E que tal morrer de tanto se desregenerar?—Luisa contrapôs, séria. –Só faltam três rostos agora! O que vai acontecer com ele quando não sobrar nenhum? 

Melissa e a TARDIS se entreolharam, pensativas. Luisa não gostou do silêncio alongado após sua pergunta.

—Vamos Doutor... Agüente firme –disse ao amigo, dormindo com a cabeça apoiada em seu colo. Mesmo com ele fora de si, ela passava a mão por entre seus cachos, fazendo-lhe cafuné. –Por favor... Por favor não morra.

O rapaz permaneceu em silencio por mais um tempo, então fungou abruptamente e começou a se mexer, o que foi um alivio para Luisa e as demais. Apesar de estar bem vivo, parecia não querer acordar.

—Por que ele não se levanta? –insistiu Melissa. –Já faz quase meia hora que ele está assim...

—Ele está muito fraco –disse a TARDIS. –Eu posso sentir. Está tentando repousar para reunir um pouco mais de força. Em geral, esse é seu plano. Apesar de ser uma tentativa variavelmente inútil, eu não posso deixar de reconhecer que foi executada com boa intenção.

—É. Boa intenção de dormir, só se for –alfinetou Melissa. –Que tal todos tirarmos uma soneca? Eu também sinto que estou precisando... Toda essa correria e exaustão está acabando com os meus pés!

—Seus pés? –a TARDIS observou os sapatos de Melissa. -Não é jovem demais para reclamar de dor nas juntas e coisa e tal?

—Nunca se é jovem demais para ter dor em algum lugar, ou mesmo reclamar. –Melissa interveio.

—Que tal nos distrairmos com alguma coisa para passar o tempo? –propôs Luisa. –Nós trouxemos tantas roupas lá do achados e perdidos, que poderíamos nos disfarçar só por diversão.

—É! Assim deixaríamos o Doutor em paz, repousando, e poderíamos nos ocupar com algo de útil! –aprovou a TARDIS. –Legal, eu topo!  

—Você topa? –Melissa achou graça na animação da ex-máquina do tempo. –Puxa. Nunca poderia imaginar que você era ligada em moda, e acessórios, e todas essas coisas altamente femininas.

—Ué? E não sou! –a TARDIS atou as mãos. –Só achei a idéia divertida. A verdade é que quando se é uma caixa azul, nunca se pode experimentar todos os tipos de experiências que a vida proporciona. Especialmente, porque a maioria é inalcançável para sua verdadeira forma –explicou, tamborilando os dedos ligeiramente de ansiedade. -E, devo confessar: Desde que virei humanóide, que eu estava louca para fazer alguma coisa que jamais seria capaz de praticar, sendo uma nave espacial.

—Bom... –Luisa colocou seus óculos escuros, depois deu um jeito de observá-la por cima da armação. –Então hoje é seu dia de sorte.

—“Bora se trocar no toalete”?—Melissa propôs, entusiasmada.  

A TARDIS sorriu amplamente.

—“Bora!”

 

*      *      *

Enquanto isso, em algum lugar nas entranhas do Shopping, o chefe dos Ratongos, também mentor da pequena Sofia, observava as câmeras de vigilância com um sistema trapaceiro, que desviava as imagens da sala de segurança, diretamente para seu covil obscuro. Indiferente, ele olhava todas as imagens das noventa e duas câmeras, ao vivo de um telão gigantesco, roubado diretamente do Cinecosmos; o cinema mais famoso do universo. Depois de todas as coisas mirabolantes que fizera até então, ele podia muito bem se dar o direito de ficar orgulhoso, afinal, todas as suas práticas foram verdadeiros golpes de mestre. Sim, todos os trinta e cinco. É... Realmente andara ocupado. Manipular pessoas não é tão simples quanto parece, e roubar seus artefatos, tão pouco era menos desafiador. Por isso, agora, estando tão pertinho da vitória, ele poderia se permitir sorrir de deleite, e se contentar com tudo o que fizera... Porém, não o fez. Tudo porque a obsessão em ser o centro do universo, e em derrotar seu maior rival, o Doutor, ainda falavam mais alto. Não... Espere. Elas não falavam. Elas... Tamborilavam. Sim, isso mesmo! Dentro de sua cabeça... A marcha não parava jamais. Por nenhum obséquio ou súplica. Ela apenas se agitava, e aumentava de intensidade, conforme a hora do juízo final ia se aproximando... Sim. Porque aquele era o som de um tambor, e os tambores chamam pela guerra.

Contudo, naquele momento, ele ergueu a cabeça e semi-cerrou os olhos. Tinhas as mãos unidas atrás do corpo, mas não precisava delas para ativar o controle de zoom.

—Computador. Sobressaia a câmera 25. Preciso de zoom total.

A máquina respondeu ao seu comando de voz, e o projetor transferiu imediatamente a imagem selecionada para a tela de cinema.

—Ah. Ali estão elas –disse, sorrindo malicioso ao observar as três garotas se trocando no toalete. –As amiguinhas humanas. As duas chaves essenciais para a ruína total do Senhor do Tempo... E a TARDIS dele. Caminhando, e respirando, feliz da vida. Ah! Isso é tão bonito... —disse com sarcasmo. –Mas durará menos tempo do que imaginam. Quando menos esperarem, não restará nada do seu precioso Doutor... E, falando no diabo –ele fez um sinal com a mão, e a máquina aplicou mais uma camada extra de zoom. –Onde você está? Cadê o Senhor do Tempo... Estará embaixo da pilha de roupas?—cantarolou, mas acabou perdendo as estribeiras ao perceber que o Doutor não estava em lugar nenhum da imagem. –Nãããão! Como pode ser possível!? ELE ESTAVA COM ELAS! EU SEI QUE ESTAVA! –gritou, chutando uma cadeira longe. Então, foi levantando a cabeça aos poucos, como se retomasse o controle interno de seu psicológico. –Ao menos que tenham suspeitado de alguma coisa. Eles... Podem ter se separado, no final das contas? Ou o Doutor pode estar se escondendo. Mas isso não faz muito o tipo dele... Se ele soubesse exatamente o que lhe espera, viria me enfrentar agora mesmo. Apesar de que, aquelas garotas não parecem nada preocupadas... E isso só pode significar que o Doutor ainda está sob sua supervisão. Mas... Onde aquele idiota pode estar? Se não veio acertar as contas, então...? –foi aí que seu rosto se retorceu em uma cara de bravo e ele gritou o nome de Sofia.

—Chamou, mentor? –disse a menininha, tímida, aparecendo do nada.

Por tudo que é mais sagrado, não me assuste assim!—bronqueou-a. –Sabia que o motivo da sua existência é seguir minhas instruções, e não me matar de susto cada vez que eu a convoco?

—Desculpe. –ela fungou. –O senhor queria me ver?

—Sim. Na verdade eu queria. –ele disse, tentando manter o controle. –Você quer, por favor, me explicar onde está o maldito Senhor do Tempo?

A menininha observou as imagens e engoliu em seco.

—E-eu fiz o que o senhor mandou, mentor... –ela gaguejou, insegura. -Eu entreguei a ele o cachecol.

—Tá. Tá. Tá. Eu sei! Você fez o que mandei, e ele regenerou. Ótimo! Mas agora ele desapareceu! E eu não tenho idéia de onde o abestalhado possa ter se enfiado... –ele segurou-a forte pelos pulsos fininhos, e falou bem perto de seu rosto, ameaçadoramente. -Por acaso, você sabe de alguma coisa?

Eu não sei de nada!—ela gemeu, aturdida, tentando recuar. –Me deixe ir, por favor! Eu não fiz nada de errado...

Não fez? Você tem mesmo certeza disso?—disse, desconfiado. –Tem certeza absoluta que seguiu todas as minhas instruções à risca?

A menina parou para pensar por um momento. Houve um clima de dúvida no ar, então Sofia voltou-se para ele e insistiu:

—Eu tenho certeza.

O homem endireitou as costas e empinou a cabeça, imponente.

—Então tudo bem. Está dispensada.

Sofia suspirou.

Por enquanto. –acrescentou, antes que ela pudesse se tranqüilizar o bastante. –CAPICIOSO! –chamou, já uma pilha de nervos.

—Sim, chefe! –o rato se prontificou, batendo continência.

—Convoque as tropas! Encontrem aquele Senhor do Tempo ou essa será a última ordem que receberá ainda em vida! –ordenou, ranzinza.

—Considere feito, meu amo e senhor. -preocupado com o próprio pescoço, o rato escapuliu bem depressa e tratou de reunir outros Ratongos para fazer uma vistoria nos corredores do Estrela Guia.

O homem impaciente fechou a cara, e jogou-se em uma poltrona confortável, tornando a observar fixamente todas as 92 câmeras, demonstrando insatisfação e tamborilando os dedos energicamente na lateral do estofado. Queria encontrar o Doutor de qualquer jeito... E, quando ele queria muito uma coisa, costumava passar por cima de planetas inteiros para consegui-la.

 

*     *      *

Já fazia bastante tempo que o Doutor apagara, mas agora, depois de uma boa soneca, finalmente estava disposto a se levantar.

Abriu os olhos rapidamente e estranhou a claridade excessiva que o banhava.

—O... O que está havendo? –indagou, confuso. Não houve resposta. – Onde estou? Que lugar é esse aqui? –ainda sem resposta. Ele virou os olhos de um lado para o outro, intrigado. –Eu morri? –perguntou por fim. Também não obteve resposta. Ficou meio decepcionado com a recepção. –Então é isso? A gente morre, de uma hora para a outra, e é aqui que a gente vem parar? Num tipo de lugar claro... Uma espécie de sala de confinamento. Talvez uma cela. Um lugar para se ficar à eternidade toda pagando pelos pecados? Olha... Se o objetivo é me punir, já vou avisando que eu juro que não foi idéia minha colar uma anã-branca-explosiva na cadeira da professora! –redimiu-se. Não houve resposta. –Pra variar, ainda se é obrigado a viver sem companhia para conversar. O que vou fazer? Vou enlouquecer aqui...!—reclamou.

Então ouviu-se um barulho próximo e ele estreitou os olhos, para enxergar melhor. Logo, percebeu-se rodeado por três formas escuras, que o observavam de cima. Mesmo quando a sensibilidade visual começou a voltar, ele ainda teve dificuldade em reconhecê-las. Uma usava chapéu de palha, e vestia um tipo de sobretudo por cima de um vestido colorido. A outra vestia uma roupa rústica, feita de pele de animal, e a terceira usava roupas comuns: jaqueta apertada e jeans colado ao corpo, mostrando bem a silhueta.

O Doutor arregalou seus olhos espantados o máximo que conseguiu, e quase desmaiou de novo.

Romana? Leela? Sarah Jane?—indagou, perplexo.

—Resposta errada! –anunciou uma voz, antes dele sentir um tapa na cara.

—MELISSA! –Luisa repreendeu, tirando seu chapéu de palha.

Que é? Ele fica bancando o sonso e eu que ganho bronca!? –resmungou a loira, esfregando a mão com vontade, dentro do macacão de pele de animal. –Puxa, não sabia que pele podia pinicar tanto...

—Não sei do que você tanto reclama... Isso aqui é incrível! -perto dali, a TARDIS empolgava-se com as peculiares vestimentas humanas. –Eu estou me sentindo tão diferente! Nunca tinha usado uma... Hã? Como vocês chamam mesmo? Ah, sim! Calça. –sorriu, encantada. -Na verdade, desde que assumi essa forma humanóide, só aprendi a sentir frio nas pernas... Mas agora é diferente! Agora elas estão quentinhas e protegidas por uma redoma mágica de pano! Não é como sentir a leveza de um vestido, devo admitir, mas ainda assim é uma experiência bastante interessante!—comentou. Porém, a palavra “interessante” soou meio esganiçada, já que ela estava dando pulinhos e fazendo força para fechar a calça, da maneira errada.

Calma—Luisa prontificou-se a ajudá-la. –Não adianta repuxar o tecido... Use o zíper. Olha, você tem que fechá-lo assim... –e demonstrou a forma certa de se fazer. -Entendeu? É ridiculamente simples.

—Ah! –a TARDIS pareceu maravilhada. –Gostei do Zíper! Ele é bastante útil... E intimo também.

—Sim! –Luisa riu com a referência dela. –Ele fica bem agarradinho ao seu corpo, mas se não fosse por ele, você não conseguiria fechar a calça –parou para refletir por um instante. –Bom, ao menos que você usasse botões.

—Botões! Eu gosto de botões! –ela afirmou. –É um tanto retrô, assim como eu!—concluiu. –Mas mesmo assim, aderi bem ao zíper. Ele tem alguma coisa que me faz gostar muito dele...

—É a facilidade. Bem vinda ao mundo moderno! –Luisa anunciou, fazendo a TARDIS rir.

—Obrigada! –ela disse, alegremente. Foi dar alguns pulinhos, mas parou de chofre depois do segundo, fazendo uma careta incômoda. –Ai! O zíper me mordeu!

—Não seja boba –interveio Melissa. –Zípers não mordem...

—Esse me mordeu! Eu senti! –ela alegou. –Querem ver? Olha só... –e tornou a saltar, e a resmungar logo depois. –Ai! Viu? Olha, gostei muito da “calça jeans”, mas por outro lado, me sinto meio desconfortável com ela... Especialmente entre as pernas.—e tentou esticar o tecido, sem sucesso. –Sinceramente, por quê ela tem que ser tão justa?

—É uma clássica calça jeans. –Luisa explicou. –Lá na Terra existem vários tipos de modelos e tamanhos... Mas devo admitir que o estilista responsável por esse, realmente extrapolou um bocado –Luisa vez um bico reprovador, analisando a peça. –Poxa... Parece quase fundido ao corpo. Um verdadeiro exagero.

—E aí está a brilhante explicação para que esse modelito, em especial, tenha sido “esquecido” bem aqui, no fim do mundo!—resumiu Melissa, tirando barato.

A TARDIS fez uma careta.

—Não estou querendo me desfazer, mas agora que vocês tocaram nesse assuntou, não estou me sentindo exatamente confortável com ela...

—É falta de costume –Luisa assegurou. –Vai por mim, se conseguir usá-la até o fim do dia, o seu corpo se acostuma.

A TARDIS suspirou, impaciente.

—Não sei se vai ser muito fácil. Ela fica se esfregando em mim... -reclamou, forçando o tecido para baixo, novamente. –É irritante! Por que tem que ficar raspando? Não gosto disso!

Luisa e Melissa se entreolharam.

—TARDIS, você está usando calcinha, não está?—Luisa sondou, já prevendo a resposta. Durante todo o tempo, o Doutor só as observava, sem ousar se meter nos assuntos delas.

—Calcinha? –a TARDIS franziu o cenho. –É aquela coisa que a gente usa para proteger os pés, certo?

—Não. Aquilo se chama sapato.

A TARDIS parou de chofre.

Ora... Assim vocês me confundem! Será que dá pra parar de me desconcentrar? Já está sendo bastante difícil ajustar esse troço...—reclamou, tentando afrouxar o tecido colado em seu corpo. Porém, a divisão da costura fundiu-se ainda mais no meio de suas pernas e a TARDIS se assustou abruptamente com o resultado: -AH! Mayday! Mayday! Minha trava de segurança falhou! As defesas foram corrompidas! Fui invadida! Socorro! Minha área reprodutiva foi violada!guinchou em desespero.

—Calma... –Luisa riu. –É só a costura da calça lhe pregando uma peça. –explicou, ajudando-a a baixar um pouco a cintura. –É como eu disse: Tudo questão de costume. Agora tente não se desesperar quando isso acontecer daqui pra frente, tá?

Está bem—a TARDIS disse, ainda paralisada pelo pânico. –Eu v-vou tentar. Juro que vou tentar...

Enquanto Luisa a consolava, Melissa dava uma checada em como ficou o designe geral.

—Ih! Você viu que a calça dela tem outro zíper na área traseira? –Melissa chamou a atenção de Luisa.

—Outro zíper? –Luisa correu para checar. E havia mesmo um zíper em forma circular, abrangendo suas duas nádegas, juntas. –Ah... Deve ser porque é uma versão futurista da calça. Pense bem: porque eles acrescentariam um zíper justamente aí?

—Tem razão. Na verdade, até que é meio obvio –continuou Melissa. -Esse segundo zíper deve servir de auxilio para quando “a natureza chamar”.

—É. –Luisa assentiu. -Realmente, é bem mais prático: Se você precisar ir ao banheiro em qualquer lugar, mas não quiser abaixar as calças, então é só remover o tecido traseiro com a ajuda do zíper e, bem... Mandar ver.

A TARDIS voltou-se para as garotas humanas, olhando feio para cada uma. Seu rosto estava meramente corado e ela parecia deveras aborrecida por ter sido exposta a uma hipótese de completo constrangimento.

Ótimo! Mas saibam que eu não estou pretendendo “mandar ver”. E se for para ficarem tirando um barato da minha cara, toda vez que virem esse zíper aí, então acho melhor voltar a usar meu vestido de sempre... –ela bateu o pé, inflamada.

Naquele instante, houve um baque estrondoso, que pegou todos de surpresa. Algo tão forte que chegou a fazer as paredes tremerem; O prédio todo sentiu o chacoalham.  

—Mas o que foi isso? –indagou o Doutor, pondo-se de pé em um salto.

—Não olhem pra mim –a TARDIS prontificou-se. –Eu não fiz nada.

—O prédio todo tremeu –Melissa observou.

Luisa olhou para o Doutor, aturdida.

—O que poderia ser tão forte a ponto de causar isso?

—Alguma coisa proibida, eu aposto. –o Doutor emendou. –Meninas, a hora do recreio acabou... Vamos voltar à ativa agora mesmo!

—Espere! Não posso correr com essa roupa... Calma que eu volto já! –Melissa mancou até o boxe onde havia se trocado. –NÃÃÃÃO!—gritou por fim.

—O que foi? –Luisa indagou, preocupada.

—MINHAS ROUPAS SUMIRAM! –ela arfou, exasperada, voltando para junto deles. –NÃOOO!!! Minha regata! Meu tênis! Meu shorts preferido... TUDO DESAPARECEU!

—Como? Inclusive as roupas do “achados e perdidos”? –sondou Luisa, incrédula.

—Sim. A grande maioria, infelizmente. Só sobrou a sacola com as roupas que escolhemos para o Doutor. Ela estava em cima da tampa do vaso sanitário... De alguma forma, parece que isso impediu que elas fossem levadas, eu sei lá como ou por quem! Só sei que quando eu o encontrar, quem quer que seja vai pagar muito caro pelo susto que me deu!—rugiu. –Ninguém assusta Melissa Rivera!

Os outros três entreolharam-se, aturdidos. Então Luisa arregalou seus olhos, inesperadamente, e correu também para seu boxe.

Ai não!—ela sumiu por um instante. Para depois reaparecer aliviada, abraçando a Bolsa Que Tudo Tem, contra seu peito. –Ufa... Pelo menos ela não foi levada. Tudo porque eu tive a maravilhosa intuição de pendurá-la atrás da porta...

—Mas e as suas roupas? –perguntou a TARDIS, preocupada.  

—Todas sumiram também. Estavam jogadas, mas não há mais nada aqui. Só minha bolsa. –e franziu a testa. –É estranho... Quase como se alguma coisa tivesse recolhido tudo.

—Como se pensasse que era lixo, você quer dizer? –o Doutor comentou. –Ah, sim... Se me permitirem expor minha opinião... Acho que já sei o que aconteceu.

O que aconteceu?—Melissa segurou-o pela gola da camisa, ainda em êxtase. –Desembucha, homem espacial!

—Tudo bem. Pra começo de conversa, não foi alguém especificamente. Não poderia ter sido, pois mesmo estando em um shopping totalmente alienígena, ainda assim, é extremamente complicado fazer objetos desaparecerem da frente dos nossos olhos, sem deixar pistas. Então, diminuindo nossa lista, eu só tenho duas possibilidades: ou foi o Alma sem Alma. O fantasma babão da 5ª Transilvânia espacial; Ou foi a incrivelmente sofisticada máquina de sucção automática. Fabricada pelas industrias Limpólita; é altamente responsável pela faxina de locais públicos, costumando aspirar, de meia hora em meia hora, tudo que estiver despejado no toalete. –ele fez uma pausa para respirar. -Tipo um controle de limpeza automático. Top de linha.

Espantadas, as meninas se entreolharam.

—Como você sabe de tudo isso?

Ele arqueou as sobrancelhas.

—Eu li o aviso. –ele indicou uma placa na parede, fixada ao lado de uma máquina branca e, quase imperceptível entre a decoração do banheiro.

—Puxa! Isso é sério mesmo? Uma máquina que faz toda a faxina sozinha? —Melissa sorriu pretensiosa, contemplando-a. –Eu tenho que levar uma dessas pra casa...

—O que estamos esperando? Vamos ver se conseguimos recuperar alguma coisa! –disse a TARDIS, correndo junto de Luisa e Melissa para cutucar a máquina. O Doutor balançou a cabeça e caminhou até elas, devagar.

—Ah, não!

—O que foi?

—A máquina é lacrada. E, além do mais, aposto como ela conta com a extensão de um cano grandalhão, passando por dentro da parede, que já deve ter sugado todas as nossas roupas para outro departamento. –analisou a TARDIS. –Se for isso mesmo, vai ser muito difícil recuperá-las agora.

Luisa cruzou os braços.

—Bom, ainda bem que não estávamos de toalha... –suspirou. –Poderia ser pior... Pelo menos estamos vestidas! De qualquer forma, isso é um alívio. 

Ao testemunhar a tremenda calma da amiga, Melissa quase deu o chilique.

—Cara! Vocês não estão entendendo a gravidade da situação: Eu não posso ficar nem mais meio minuto com esse macacão coça-coça!—e tornou a se coçar. –O pessoal vai achar que eu estou infestada de pulgas!

—E não está? –cutucou o Doutor. Melissa fez cara de brava para ele.

—AH! Isso é um DESASTRE! –gemeu a TARDIS, levando as mãos à cabeça. –O que vamos fazer agora? O que eu vou fazer sem o meu vestido?

Você vai seguir em frente—o Doutor disse severamente, sentindo-se saturado daquele assuntinho banal. –Como Luisa mesma disse, vocês deviam agradecer por ainda terem alguma coisa cobrindo seu corpo. Muita gente pode não ter tido a mesma sorte... Por isso agora, nesse exato momento, todos temos que nos concentrar em evitar os Ratongos, fugir de seu chefe obcecado por mim, e principalmente, em permanecermos vivos, entenderam? Nenhuma banalidade barata deve ficar no caminho da coisa mais importante de todas: cultivarmos nossa existência.

—Eu concordo –Luisa apoiou. –E vocês, meninas? Estão com a gente?

A TARDIS não hesitou.

—Podem contar comigo!

Então todos olharam feio para Melissa, que até então não tinha dado um parecer.

Ah! Tá bom! Tá bom!—resmungou, juntando-se a eles. –Mas se o resto das minhas roupas sumirem, vocês vão ter que se acostumar a conviver com uma garota andando nua, no grupo!

—Sem problemas! Já convivi uma vez com um cara chamado Adão e sua esposa, uma tal de Eva. E se querem mesmo saber, eles não eram exatamente o que podia se chamar de “civilizados”. –contou o Doutor.

—Certo. Então estamos combinados –Luisa pontuou. –Vamos sair logo daqui, antes que as paredes tremam de novo...

E assim, saíram com a garra e motivação precisas para enfrentar um touro, ou neste caso, um lunático obcecado por Senhores do Tempo, mas infelizmente, nada ocorreu exatamente da forma que pensaram.

Inicialmente, caminharam durante uma hora, só observando o movimento, e procurando ficar, grande parte do tempo, encobertos pelas sombras.

Mas aquele esquema de observação (completamente isento de ação) aos poucos começou a desmotivar as meninas, na segunda hora consecutiva. E até mesmo Luisa, começou a ficar cansada.

—Está certo... Diz de novo o que estamos procurando –pediu Luisa, bocejando ao lado do amigo.

—Eu te digo o que não estamos procurando: confusão. –ele ponderou, semi-cerrando os olhos por um momento. –Binóculo, por favor –estendeu a mão aberta na direção de Luisa e a garota entregou-lhe um binóculo que tirara da inigualável Bolsa Que Tudo Tem. –Obrigado.

Ela aconchegou-se perto dele.

—Viu alguma coisa?

—Talvez. Nunca sei direito. –disse, deixando-a na mesma.

A menina, persistente, tentou mais uma vez puxar conversa.

—Então... Você já tem uma idéia de quem possa estar por trás disso tudo?

—Superficialmente, sim. –ele assentiu. –Mas não posso afirmar nada. Não seria justo.

—A vida não é justa. –Luisa emendou, causando um tom mórbido e emblemático que o fez parar suas observações, para unicamente fitá-la.

—Você está bem?

—Não. Não estou. –ela admitiu. –Estou muito cansada.

—Então vá em frente. Tire uma soneca. Eu fico montando guarda.

Não é desse jeito!—Luisa protestou, irritada, fazendo a TARDIS e Melissa (que já estavam embaladas em um cochilo já fazia algum tempo) sobressaltarem-se atrás deles. Apesar do susto, elas estavam tão casadas que logo voltaram a fechar os olhos, de modo que o único que prosseguiu encarando-a foi o próprio Doutor; e Luisa, constrangida por sua ação impulsiva, cobriu o rosto com as mãos. –Me desculpa... Eu não quis gritar.

—Você está exausta. –ele percebeu. –Venha dormir um pouco.

—Não. Eu prometi que ficaria de guarda com você...

O Doutor exalou forte. Depois sorriu amplamente.

—Promessas... Promessas... Nem mesmo eu cumpro sempre as minhas –ele brincou, passando o braço ao redor dela. –Sério. Vá dormir. Eu fico de olho no movimento.

—Eu já disse que não quero. –ela teimou. Depois fitou-o com incredulidade. –Por que fica me olhando com esses olhos arregalados? Eu pareço algum tipo de alienígena exótico, por acaso? –replicou. O Doutor ergueu as sobrancelhas.

Bom, agora que tocou no assunto—começou. Luisa fez uma careta e deu-lhe um tapinha descontraído no braço. Os dois sustentaram um ar de riso, até que o momento divertido acabou e Luisa voltou a encará-lo, intrigada.

—Por que sinto como se já tivesse visto esse rosto antes? –ela indagou, pensativa.

—O meu rosto? –ele franziu o cenho. –Bobagem... Você não conheceu essa versão de mim. Deve estar me confundindo com outra pessoa.

—Mas eu não estou –ela insistiu. –Não sei direito como explicar, mas tenho certeza que já vi essa expressão no rosto de alguém, uma vez na vida... Só não consigo me lembrar onde foi.

—Hum... Interessante—ele ponderou, coçando o queixo. –Não quer mesmo dormir um pouco? –e sorriu de orelha a orelha, brincalhão.

Luisa acabou por sorrir também.

—Ah, Doutor... Não consigo dormir. Estou preocupada. Todas às vezes que o contemplo, vejo você aí parado, só observando a multidão passar, matando o tempo e fingindo estar fazendo alguma coisa de útil, quando eu tenho certeza de que não está –murmurou ela, acariciando o braço dele. –Pergunto o que você está procurando e você me responde bobagens do tipo: “sabe que nem eu mesmo sei?” ou “não faço idéia”. Diga-me: Como uma pessoa tão determinada em vistoriar um corredor, poderia não estar procurando por nada?

O Doutor não respondeu de primeiro momento; baixou o binóculo algumas vezes e desviou os olhos em outras.

—Sinto muito pela minha irrelevância. Eu não tenho sido completamente sincero com você... Com nenhuma de vocês, pra variar. E isso já tem muito tempo...

O brilho no olhar dela novamente se acendeu.

—Então vai me contar tudo? Porque você sabe quem está querendo acertar as contas com você. Eu sei que sabe. Só não quer me contar...

—Na verdade, acho que é um pouco mais complicado que isso.

—Como assim? –ela franziu a testa.

—Acho... Que não estou querendo admitir isso nem mesmo pra mim. –ele revelou, deixando-a chocada.

—Espere aí... –ela fez as conexões. -Está com medo de enfrentar o chefe dos Ratongos? É esse o problema?

O Doutor esfregou o rosto com as duas mãos. Parecia extremamente cansado.

—Não estou com medo. Só queria postergar nosso encontro o máximo possível... –ponderou. –Eu tenho esse direito, não tenho?

Luisa fitou-o pensativa, afastando-lhe um cacho de cabelo de perto dos olhos.

—Não pode fugir disso pra sempre... –Luisa insistiu. –Você terá que encará-lo uma hora ou outra.

O Doutor respirou fundo, tentado controlar o sentimento incômodo que queria dar um nó em sua garganta.  

—Não posso? Fugi das responsabilidades minha vida inteira... –disse, revoltado. –O que a faz pensar que será diferente agora?

Naquele momento, seus olhos fizeram contato e a garota automaticamente começou a ler seus pensamentos.

—Acho, que tem algo aí dentro de você que quer muito poder resolver tudo... E enfrentar esse idiota de uma vez por todas. Mas também, por outro lado, você não quer isso. Grande parte de você quer evitar esse confronto porque sabe que essa pessoa é perigosa, e tem medo que ele tire algo de você. Algo muito, mais muito importante. Sua essência. Ele brinca com ela de um jeito que você não gosta... -Luisa sorriu, surpreendendo-o. –É por isso que você o teme tanto. Tem medo que ele possa dizer alguma coisa que o faça perder a cabeça. Que o faça agir de uma forma que você próprio jamais perdoaria... Ago que o faça não se reconhecer. Alguma coisa a ver com sua raiva acumulada e escondida, ganhar voz e sobressair seu lado bondoso e sensato. Tudo isso me faz crer que você já o viu antes. E o seu medo, é apenas um efeito colateral desse encontro passado.

Hã!—o Doutor afastou-se dela, soltando uma exclamação. –Como você...? O que você...?—gaguejou, assustado. –Como você pode saber de tudo isso? O que está fazendo?

Está tudo na sua cabeça.—ela murmurou, com o olhar vago. –Cada palavra... E tem um nome em destaque. Um nome por trás de tudo isso...

O Doutor arregalou os olhos.

Luisa... Pare! Seja lá o que estiver fazendo... Pare!—ordenou.

—Ele está tão visível na sua cabeça... –ela prosseguiu. –Ele é tão carregado de inconseqüência e insanidade...

Pare! Eu já disse pra parar!—ele chacoalhou-a pelos braços, olhando-a intensamente. –Você não quer continuar... Vamos, pare com isso! Seja uma boa garota e pare com isso já!

—EU VEJO UM NOME! –ela gritou, esquivando-se dele. –O MESTRE ESTÁ DE VOLTA!

Brandiu, deixando o Doutor perplexo. Depois sentiu a vista embaralhar (nunca tinha chegado tão longe com o poder de Visualizadora), sentiu uma fraqueza intensa tomar seu corpo e apagou, desmoronando nos braços dele.

Durante algum tempo, o Senhor do Tempo permaneceu de joelhos, sem reação, com a garota em seu colo. Quando finalmente conseguiu retomar a fala, sua voz soou mais controlada do que esperava.

—Você me assustou. Por um momento, pensei que tivesse visto meu nome.—ele fechou os olhos, metade ainda consternado, metade já aliviado. –Ao invés disso, você me fez encarar à força o nome de quem estou mais tentando evitar. –e contemplou-a, pensativo. –Agora que já foi dito, não há mais como esconder. Vou ter que abrir meus olhos, mesmo não querendo, porque você me obrigou a isso. Está satisfeita agora? -ele disse para o corpo inconsciente da amiga. Ela continuou imóvel. Ele suspirou, rindo de si mesmo: Estava tentando discutir com Luisa fora de si. Que grande bobagem... É. Muitas vezes ele fazia papel de bobo. O velho e bobo Doutor.

Esperou um pouco, tentando recuperar o fôlego. Depois, ainda bastante abalado, ele arrastou-se até a parede contrária à que Melissa e a TARDIS estavam encostadas, dormindo pesado, e ajeitou-se, para depois posicionar a menina desacordada, deitada contra seu peito, e envolvê-la em seus braços. Deu-lhe um beijo na testa e sussurrou:

—Eu não sei quem você é. Pensava que a conhecia bem, mas na verdade, não faço a menor idéia de quem você realmente seja, Luisa Parkinson. –ponderou. Depois sorriu, improvavelmente. –Fomos feitos um pro outro, não acha? Você e eu... Os dois cheios de segredos. Sabe? Isso é até engraçado de se dizer... Mas acho que estou conseguindo ter uma vaga idéia de como é lidar comigo mesmo.

Na parede oposta, Melissa se mexeu, e ameaçou, ainda dormindo:

—Se vocês não calarem a boca, eu juro que irei amarrá-los e amordaçá-los um por um.

O Doutor ignorou o aviso dela. Continuaria falando se tivesse vontade, mas a verdade é que o sono foi chegando rápido, e antes mesmo que pudesse se dar conta, já estava quase apagando.

Um pouco antes de fechar os olhos de vez, deu uma última olhada em Luisa, protegida por ele, e sussurrou:

—Boa noite, querida.

*      *       *

Naquela noite, Luisa teve um sonho estranho. Estava amarrada e não conseguia se mover. Seus amigos estavam imobilizados, assim como ela. Ninguém conseguia desvencilhar-se das amarras que uma estranha mulher lhes fizera, enquanto dormiam. Lembrava-se vagamente do rosto dela: tinha um quê imponente; olhar ardiloso e sorriso pretensioso. Seus cabelos eram negros e armados. E ela parecia muito, mais muito satisfeita com o que fizera.

Ai!—Luisa gemeu, despertando ao sentir alguma coisa beliscar seu braço.

Abriu os olhos. E a cena que viu a sua frente, quase fez seu queixo cair. Lá estava a tal mulher malvada, reforçando as amarras que envolviam o corpo de Melissa e o da TARDIS, presas uma de costas para a outra, ainda adormecidas. Sentindo a respiração acelerar, Luisa tentou levantar-se para defender as amigas, mas descobriu rapidamente, para sua decepção, que também estava amarrada.

—Psiu! –ouviu uma voz falar-lhe próximo do ouvido. Virou a cabeça e deparou-se com o Doutor, amarrado junto dela. –Desculpe pelo beliscão... E aí? Dormiu bem?

—O quê? Doutor? –Luisa estava meio confusa com tudo aquilo.

—Sshhhh! Fale baixo. –pediu ele, ás suas costas. –Não queremos chamar atenção dela, queremos?

Luisa negou com a cabeça.

—O que está havendo? Eu estava sonhando, e aí de repente...

—Você acordou amarrada. É, pode crer. Foi um choque pra mim também. Ainda mais porque ontem à noite, Melissa me ameaçou dormindo, dizendo que se eu não ficasse quieto, ela iria se levantar e me amarrar. Então, na manhã seguinte, eu acordo e me deparo com a cena irônica de ter minhas pernas e braços imobilizados. Claro que automaticamente pensei que fosse coisa dela, mas aí vi que você estava amarrada junto a mim, e que a TARDIS e a própria Melissa também estavam amarradas. Então pensei que seria muita estupidez da parte dela se amarrar junto a nós... Foi aí que comecei a ficar realmente desconfiado—contou, sussurrando. –Então, não passado muito, me deparei com uma das encarnações da “maníaca dos experimentos, bem na minha frente. E pra variar, me deu uma câimbra no pescoço que eu vou te contar...

—É. Nem me fale. –Luisa bufou, fazendo uma careta para a corda que os comprimia.

O Doutor se esticou do outro lado da amarra.

—Você está bem? Está muito apertado aí do seu lado? Ela não te machucou, machucou?

—Não. Acho que está tudo bem. Obrigada por se preocupar –assentiu. Depois, ficou novamente séria. –Quem é ela, Doutor?

—Não sei se quero admitir. Estou em estado de negação até agora. –comentou.

—O quê? Mais por quê?

O Doutor demorou um pouco para responder. Talvez estivesse reunindo forças para encarar o fardo que suas palavras trariam de brinde consigo.

Porque ela não deveria estar viva.—anunciou. -Nenhum dos Senhores do Tempo sobreviveram à última grande Guerra do Tempo, além de mim mesmo, e de um antigo amigo meu. Ver essa “cara” por aqui, é completamente impossível. Quase uma quebra nas leis do espaço e tempo...

Luisa ficou perplexa, do outro lado da amarra.

Quer dizer que ela é uma Senhora do Tempo?—indagou, dando um pequeno tranco para frente com o corpo. Seqüencialmente, as costas do Doutor chocaram-se com as dela.

Não, não faça isso... Espere!—gemeu ele, tentando manter a voz baixa. –Fique absolutamente parada.

—Não posso acreditar... Acabamos de ser feitos de prisioneiros por uma maluca especialista em dar nó, que além do mais, “não deveria estar viva”... E, só pra variar, nós dois estamos amarrados juntos, sem poder nos defender.  

—É. Estamos. Você é realmente muito observadora—ele arfou do outro lado, com a cabeça inclinada para trás. –Mas, se não for se importar... Eu gostaria de voltar a ficar ereto.

—Ah! Desculpe –ela retomou a posição inicial. O Doutor suspirou. –Sinto muito por isso. Você está bem?

—Estou ótimo. Quero dizer, para um cara amarrado—ele articulou. –A única dificuldade é se eu sentir alguma coceira. Sinceramente, seria bastante decepcionante...

Luisa sorriu em silêncio do outro lado. O bom humor dele alcançava as alturas em situações como esta. 

—Como você ainda consegue fazer isso...? –ela disse, em tom bem-humorado.

—Na verdade é bem fácil. É só evitar pensar muito na coceira, que ela não aparece... É tiro e queda. Bom, ao menos que seja imprescindível mesmo. Aí a coisa pode ficar feia...

Não... —ela conteve uma gargalhada. –Eu estava me referindo ao seu bom humor. Como é que ainda consegue continuar fazendo piadinhas?

Anos de prática— revelou.  –E uma pitada de ignorância.

Luisa riu pelo nariz.

—Estou feliz por ter sido amarrada a você.

O Doutor sorriu torto do outro lado, mas tentou não demonstrar sua empolgação.

—Espere. Não é hora para flertar...

—Não existe hora certa para se flertar –contrapôs ela. –E se existisse, com certeza seria agora, quando ainda estamos vivos e temos possibilidade de fazer isso. 

Ele mordeu o lábio, refletindo com o comentário dela.

—Sabe que você tem razão?

—Eu sempre tenho razão.

O Doutor retorceu o pescoço para tentar encará-la.

—Cuidado... Você está ficando convencida!

Luisa riu do outro lado.

—Olha só quem fala... –alfinetou. –Fazer o quê? Aprendi com o mestre. –brincou com ele. Mas a brincadeira cruzou o limite e chegou a um veredicto nada agradável.

O Doutor arregalou os olhos ao ouvir aquela palavra. A mulher pretensiosa, ainda de costas para eles, endireito o corpo e voltou-se para o casal amarrado.

—Acertou em cheio, querida. O Mestre está de volta. E eu, a magnífica Rani, também.


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Notas finais do capítulo

É isso aí galera: vilões revelados!!

Expectativas alcançadas? As teorias se concretizaram? Quero saber tudinho!!

Beijos e até domingo!



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