Luisa Parkinson: A Companheira Fantástica escrita por Gizelle PG


Capítulo 4
A Caixa Azul


Notas iniciais do capítulo

Oieeee! Feliz Natal gente!
Hoje o capítulo está cheio de humor e experiencias novas. Luisa e Melissa vão conhecer a TARDIS. Como será que elas vão reagir?



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  Ao acabarem de entrar na casa, ambas deram de cara com a mãe de Melissa que estava tão distraída assistindo tv na sala de estar, que nem percebeu a presença das meninas no aposento.

  -Oi Mãããããããããããããe! -gritou Melissa, escandalosa.

  -Melissa! Que susto!!!—resmungou a mulher.

   -Desculpe...

  -Ah, tudo bem. Não faz mal, pelo menos você trouxe os pã... -a mãe de Melissa parou de chofre e observou Luisa ao lado da filha, aparentemente reparando apenas agora na presença da garota. -Filha, eu não sabia que ia trazer alguém com você, estou tão desarrumada... Você poderia ter avisado! Eu não estava esperando visitas há esta hora.  

 -Nem eu sabia que ia trazer alguém comigo...-explicou Melissa com sinceridade. -Mãe, essa é Luisa Parkinson. Ela e os pais se mudaram ontem pra cá, ela estava na rua: disse que queria conhecer os vizinhos. 

 -Ah, é por isso que não a reconheci. Muito prazer em conhecê-la Luisa! Sabe, é que conheço a maioria dos amigos de minha filha, e achei estranho não saber com quem ela estava. Eu sou Naya Rivera, a mãe de Melissa.

 -Muito prazer -disse Luisa sorridente.

 “Au! Au!”  -naquele exato instante, um cachorro manchado entrou correndo na sala, feito um foguete. O animal saltou sob o sofá e a mulher sentada nele (fazendo-a exclamar um: “Santo Deus!”), e se dirigiu imediatamente para Melissa. Ficou de pé, com as patinhas apoiadas nas pernas dela; A língua pra fora... Parecia muito contente com seu retorno. Então notou uma figura diferente no ambiente (que era Luisa) e foi logo querendo fazer amizade.

 -Opa! –disse a garota, meio atrapalhada, quando o cão começou a farejá-la, movido pela curiosidade. Mas Luisa gostava de animais, então, após se recompor, abriu um imenso sorriso para ele. –Ei... Calma rapaz!

 “Au! Au!” –o cão sentou-se aos seu pés, abanando o rabo freneticamente. Ela se abaixou para ficar da altura dele.

  -Ah, olá –sorriu Luisa, acariciando suas orelhas. –E quem é você, hein?

  -Esse é o Nik. –informou Melissa, com orgulho. –É meu cachorro. Cem por cento escovado e limpo!

  Nik era um Dálmata de tamanho médio. Tinha na cara duas manchas pretas enormes, uma em volta de um dos olhos, outra próxima ao focinho molhado e mais uma porção por todo o corpo.

  -Então, muito prazer Nik! –disse-lhe Luisa. O cão latiu feliz, em resposta.

 -Mãe, convidei a Lu para ver um filme comigo hoje...-falou Melissa, esperando ver qual seria a reação da mulher.

 -Certo, podem assistir o que quiserem. Vou voltar para a cozinha, só parei mesmo para esticar um pouco as pernas... –e apanhou o saco de pães. –Ainda não tomamos café... Á propósito, Luisa, está servida?

  -Não, obrigada. Já tomei café lá em casa.

  “Au!” –latiu Nik.

  -Não seu bobo, você já tomou café hoje! Desta vez o “rango” é só para os humanos—disse a mãe de Melissa, com bom humor. O cão fixou o olhar nela e na sacola de pães em seus braços. –Oh, está bem! Veremos o que posso arranjar para você...

  Nik passou em disparada para o lado de dona Naya e a seguiu rumo á cozinha, cheio de fome.

  -Beleza! Vamos ver o que podemos encontrar... -disse Melissa, jogando-se no sofá... Os pés sob a mesa; Revirando, com o controle remoto, canal por canal, à procura do que assistir. –Vamos, não fique aí parada! Sente aqui e me ajude a escolher um filme! -disse a garota à uma Luisa meio sem jeito. Ela não era o tipo de moça que chegava na casa dos outros e ia se fazendo de dona das coisas... Contudo, depois que Melissa chamou-a, a timidez começou a dar lugar a um sentimento de empolgação e Luisa não demorou a juntar a ela.

 -Legal -sorriu ansiosa, sentando comportada ao lado da amiga.

 Aquele dia prometia mesmo ser inesquecível...

*     *     *

  Mais rápido do que gostariam, a noite foi chegando. O filme que escolheram tinha acabado já havia horas, e as duas procuravam o que fazer. Sem muitas idéias, passaram boa parte do tempo conversando. De repente o telefone tocou... Era a mãe de Luisa querendo saber se a garota voltaria para casa agora, às seis e vinte da tarde, ou ficaria mais um pouco na casa da amiga.

  -Alô, oi mãe!  Sim, ainda estou na casa da Melissa. O filme já acabou... Você quer que eu volte pra casa...?  

  Enquanto Luisa falava no telefone com sua mãe, Melissa levantou-se subitamente e correu para fora do cômodo, deixando a amiga sozinha na sala. Em questão de segundos ela reapareceu, trazendo consigo um bloquinho de folhas de sulfite e uma caneta preta de ponta grossa. Em seguida começou a escrever uma espécie de recado em letras arredondadas e bem caprichadas:

   Fala, ou melhor, pergunta pra sua mãe,

   Se você pode dormir na minha casa hoje!

   Luisa assentiu e fez sinal de que ia perguntar.

  -Mãe, posso dormir na casa da Melissa hoje? Sim, ela acabou de me convidar. Tudo bem então... O.k! Tchau.

  Após desligar o celular, Luisa olhou para a amiga... Seu rosto estava inexpressível.

  -E então? O que ela disse? –perguntou Melissa, ansiosa.

  Luisa fez uma cara de “quem não gostou nada do que ouviu”, por fim disse:

  -Olha, não sei como dizer isso... Eu tentei de tudo, mas... SIM!!! –gritou inesperadamente, feliz por sua encenação ter dado o resultado esperado.

  -Sério? Ela deixou mesmo? –festejou Melissa. –Legal, então vamos acampar!

  -O quê???

  -Acampar! Eu tenho uma barraca, e você uma permissão... Afinal, o que nos impede?

  -Nada. Mas aonde você pretende...?

  -Armar uma barraca? –completou, ligeira. -No quintal de trás, é claro! Aonde mais poderia ser?

  -Sei lá. A idéia foi sua...

  -E então, vamos?

  Luisa raciocinou por um instante: Quer dizer que logo no seu segundo dia de mudança ela já estaria dormindo fora de casa? Aquilo era informação demais para se assimilar... Era uma coisa bastante improvável, mas também incrivelmente excitante! Sabia que jamais viveria uma situação igual em outro lugar, que não fosse a rua Bannerman... Obvio que ela toparia!

  -Mais o que estamos esperando? Vamos logo! –Luisa, disse, empolgada. -Você pega a barraca e eu pego os travesseiros e cobertores! -ela fez uma pausa enquanto falava. -Bem, isso se você me mostrar onde estão guardados os travesseiros e cobertores... -terminou ela, lembrando-se do pequeno detalhe.

  Melissa riu da reflexão da amiga.

 -Está tudo no meu quarto: a segunda porta à direita. Dentro do armário, na prateleira mais alta.

  -O.K, LET’S GO MY FRIEND!!! -disse Luisa, para a amiga.

  E as duas saíram na correria em direções opostas para pegar tudo que precisassem para passar a noite em uma barraca. E em menos de vinte minutos as duas já estavam com a barraca armada, nos fundos da casa de Melissa, com livros e revistas espalhados por seu interior (para as garotas passarem as ultimas horas se distraindo) travesseiros amontoados, mantas, cobertores, lanternas, pijamas, bolsas, rádio, celulares e etc. (Ufa! Ainda bem que tinha bastante espaço, pois só faltava as duas levarem a TV de 40 polegadas para que a barraca acabasse virando um hotel ou algo parecido).

  No meio da noite, quando todos já estavam dormindo, Luisa acordou. De inicio ela não reconheceu o interior da barraca, mas com o passar do tempo, acabou se lembrando de tudo que fizera naquele dia...

  Ela se levantou, com cuidado para não acordar a amiga, e se dirigiu para o zíper da barraca, que equivalia como uma porta. Abriu-o e contemplou a lua pálida, que refletia seus raios sobre o lugar onde elas estavam acampando.

  Afinal de contas lá estava ela: Em uma barraca com Melissa. Uma garota que ela mal acabara de conhecer, mas que era tão familiar para ela, que até parecia um déjà vu. A amiga adormecera enquanto lia um de seus livros de temas variados, que por acaso estava aberto na pagina 134, onde um grande letreiro no inicio da folha informava que se iniciava o capitulo 12, com o seguinte enunciado: 

“A ESPERA  DE  UMA  OPORTUNIDADE”

  Luisa tinha confessado nunca ter visto alguém com tanto gosto para leitura quanto Melissa. Ela devorava livros como ninguém, mas o mais inacreditável era a rapidez com que os terminava. Também tinha o fato dela adorar ler livros de diferentes estilos: Em um dia qualquer ela poderia estar lendo um romance, e no outro se interessar por uma comédia, ficção, ou até mesmo suspense. Melissa era assim: apreciava todos os gêneros, mas quando você perguntava para ela qual seria o seu preferido, ela simplesmente não sabia dizer. 

  A situação estava ficando crítica. Luisa passara os últimos minutos contemplando a amiga e se lembrando de tudo que fizeram juntas naquele dia, mais isso não mudava o fato de que ela perdera o sono e que, por mais que quisesse, não conseguiria voltar a dormir... Pelo menos não tão cedo. A garota fechou os olhos e desejou que algo acontecesse, senão provavelmente essa seria a noite mais longa de sua vida.

  Ela tornou a abrir os olhos e continuou a contemplar as estrelas, imaginando como seria estar tão longe da Terra. Esse é com certeza um pensamento muito comum entre pessoas sonhadoras, quer dizer: Como deve ser estar tão longe de casa? Estar no meio do nada, fora de qualquer alcance… Estar simplesmente lá, sem saber como nem porquê… Como será essa sensação? Viajar, flutuar sem a gravidade…? Haverá algo lá em cima?

  Estaríamos mesmo sozinhos nesse vasto universo?

  Nesse momento Luisa teve uma idéia maluca: ela se imaginou andando sobre os Anéis de Saturno. Vislumbrou-se contemplando a Terra lá do alto e acenando sorridente para o planeta.  

  Enquanto Luisa pensava essas coisas, uma estrela cadente atravessou o céu. Por um momento, imaginou que seus pensamentos poderiam estar interligados com o universo, de alguma forma.

  -Isso é loucura –pensou com seus botões. Mas a sensação era tão boa que ela se deixou levar por aquela vibração e continuou imaginando-se caminhando em Saturno. Lá em cima, no espaço, estava tudo calmo e silencioso, mas ao mesmo tempo, não estava. Era como se o silêncio compusesse uma melodia própria. A melodia da “inovação”, pois nada no universo era estável. Nada era eterno. Tudo estava sempre em constante mudança. Uma estrela que você estivesse contemplando agora mesmo, poderia se apagar a qualquer momento, e deixar de existir. Um asteróide poderia mudar de rumo e alterar o curso da existência. Uma fagulha mal calculada dos raios solares seria capaz de queimar parte do sistema solar, inclusive a Terra. Era tudo tão delicado. Tão majestoso. Tão... Imprevisívelmente excitante!

   Em meio a tudo aquilo, Luisa olhou para o lado... E viu uma sombra. A sombra tinha um contorno humano. Apesar de não conseguir ver seu rosto, ela deduziu tratar-se de um homem. Ele a estava contemplando, em silêncio. Um formigamento estranho percorreu todo seu corpo e a garota hesitou. Nenhum dos dois disse nada um para o outro.

  Luisa tornou a abrir os olhos. Ainda estava dentro da barraca... Ou acabara de voltar de Saturno? Será que realmente sonhara aquilo tudo?

   -Puxa vida... –espreguiçou-se, exausta. De fato não estava conseguindo dormir. Precisaria de um milagre para salvar sua noite.

  De repente, como se seus desejos mais profundos tivessem sido ouvidos a bilhões de anos luz, eis que algo aconteceu. Algo que conseguiu fazer Luisa esquecer metade dos seus pensamentos e a fez apurar os sentidos para um ruído esquisito que aumentava a cada instante, parecendo se aproximar. 

  “Vuuuuuuuuul... Vuuuuuuuuuul... Vuuuuuuuul... BAM!”

  E um estalo muito grande ocorreu, seguido de um silêncio ameaçador e sombrio que conseguiu deixá-la intrigada.

   Com muito cuidado para não acordar a amiga, ela apanhou uma lanterna e saiu da barraca.

   Movida, em grande parte, pela curiosidade (que era uma grande motivadora sua), a garota disparou em direção ao jardim da frente da casa de Melissa, onde subiu, sem pensar duas vezes, em cima do muro divisor. Semi-cerrando os olhos, ela ligou a lanterna na direção dos fundos de sua própria casa. Percebeu uma iluminação anormal no quintal de trás e resolveu ir até lá para ver o que estava acontecendo.

   Luisa pulou para dentro do próprio jardim; Um misto de ansiedade e receio passaram a tomar conta dela.

  Enquanto atravessava o corredor lateral do sobrado onde morava, pensou consigo mesma, que aquilo não poderia ser obra de um ladrão, pois alem de ter feito muito barulho, seria muito azar eles serem assaltados logo no segundo dia de mudança e, com toda a proteção ao redor da casa, ela achou essa opção francamente inválida.

     Mas afinal, se não era ladrão, então o que poderia ser?

   Caminhando nas pontas dos pés, com o corpo colado na parede da casa, no maior estilo “MISSÃO  IMPOSSíVEL” ela finalmente chegou ao quintal de trás.

   Quando percebeu que a parede chegara ao fim, parou e respirou fundo. Dentro de instantes ela ficaria frente a frente com o desconhecido.

   -Muito bem... É agora ou nunca –murmurou para si mesma. E saltou, aparecendo no quintal de trás.

   Silêncio absoluto. Aparentemente, estava tudo no seu devido lugar: O balanço, a rede, as árvores, o barracão, a piscina inflável... Calma aí! O que era aquela coisa enorme refletida na água da piscina Inflável?

   A garota ergueu o olhar, e então... Ela viu.

  Lá estava uma grande caixa azul, com uma lâmpada no topo. Meu Deus, o que aquilo fazia lá?

  Curiosa, a menina arriscou uns dois paços na direção do estranho objeto. Ele não se moveu.

 -Estranho... –ela pôs as mãos na cintura. -Não me lembro de termos comprado algo tão grande, tão duvidoso, tão curioso e tão... Azul—disse Luisa, ainda meio sem crer nos próprios olhos. –Azul.—repetiu ela, admirando-se com o que via. Sem perceber, acabou dando mais alguns passos em direção à caixa. Já quase podia tocá-la... Mas não o fez. Não pretendia abusar da sorte.

 Contentando-se momentaneamente em apenas observá-la, a garota olhou para uma placa que localizava-se no alto da caixa, com letras que brilhavam no escuro, cujo estava escrito:   Police  Public  Call  Box (Cabine Telefônica Pública da Polícia).

 Mais o que uma “cabine telefônica de polícia, e ainda por cima publica,” fazia parada na casa de Luisa?

  A garota não se deu por satisfeita: a cada segundo tudo aquilo parecia fazer menos sentido. Luisa resolveu estender a mão e tocar a cabine. Segurou em uma maçaneta fina e curva com um buraco de fechadura dourado e redondo logo embaixo. Depois deslizou os dedos pelo material liso e azul.

 -É de madeira –disse admirada. –Essa caixa tem um formato engraçado... Parece tão antiga! –Luisa se pegou sorrindo. –Uma distração e tanto... E veio justo quando eu precisava. –então parou de chofre. -Espera aí, será que no meu subconsciente desejei uma cabine telefônica, por engano? -pensou ela, preocupada. –Meus pais me matarão quando souberem que eu trouxe isso pra cá só com o poder da minha mente!

*   *   *

  Enquanto isso, na casa ao lado, Melissa acordara e começava a procurar pela amiga, que havia desaparecido.

  -Luisa? Cadê você? Acredite ou não, sua mãe vai me matar se souber que você sumiu! –sussurrou, andando em círculos. -E agora Lu? Aonde você pode estar? –perguntou para as paredes. Obviamente, não obteve resposta. -Bom, acho que não adianta nada ficar parada aqui falando sozinha... Tenho que procurar e encontrar você de qualquer jeito!

Foi aí que Melissa olhou para seus pés, e seu rosto se iluminou ao detectar varias marcas de sapatos, que pareciam recentes.

—O que é isso? São pegadas? Devem ser da Luisa!—comemorou Melissa, aos murmúrios. -Tudo bem, vamos começar pelo começo... –disse, tentando tomar as rédeas da situação: começando pelo ato de se acalmar e seguir a trilha de pegadas que estavam espalhadas, aparentemente, por todos os lados. A princípio, Melissa deu voltas e mais votas por todas as extremidades do quintal; percorreu também a fachada da casa, onde encontrou Nik em sua casinha de cachorro, que imediatamente se pôs de pé e ofereceu-se para ajudar sua dona a procurar a garota desaparecida.

  No fim de uma busca noturna e cansativa, Melissa e Nik sentaram-se nos degraus da porta de entrada da casa.

  -Absurdo... Ela não pode ter simplesmente desaparecido! –gemeu Melissa, chateada. –Ela está por aqui, sei que está, mas onde? –perguntou, olhando para o cão ofegante. -Se nem você Nik, com o faro bom que tem, foi capaz de encontrá-la, duvido que mais alguém conseguiria.

  “Au! Au!” –concordou Nik.

Atentamente, Melissa varreu os olhos por toda a garagem, fazendo uma última checagem a distancia. Foi aí que percebeu uma coisa.

  -Espere! Espere só um minuto! –disse ela, entusiasmada, levantando-se de supetão. –Eu esqueci um detalhe: Hoje de manhã eu vim aqui fora, minha mãe e meu pai também vieram e até você Nik! Você também veio... E a Luisa. Sabe o que isso significa? –o cão olhou esperançoso para ela. –Quer dizer que andamos em círculos! As pegadas de Luisa estão espalhadas por aí, sim estão, mas estão misturadas com as nossas...  Ah, Maldito piso que mancha!—praguejou.

Desestimulada com a própria descoberta, olhou sem compromisso na direção do muro divisor, e deparou-se com uma cena inusitada: Marcas verticais de sola de sapato, na parede

  -Espere aí Nik, não desista ainda... –disse uma Melissa renovada, caminhando com a lanterna na mão, na direção do muro. –Ah, agora sim! Isso é uma pista digna... –então, seu sorriso foi sumindo aos poucos, conforme a verdade se instalava. –O que será que houve? –perguntou à Nik.

    Nik inclinou a cabeça, fitando-a significativamente.

   -Bem, não vejo muitos motivos para ela ter voltado para casa no meio da noite –comentou Melissa. –Vejamos: Ou ela enjoou de acampar, ou ela se cansou da minha companhia... O que é definitivamente impossível, porque eu sou uma garota super legal e divertida—disse, num tom convencido, mas também auto-astral. –Ou então, talvez ela seja sonâmbula! —constatou, com ar de espanto. Nik levantou uma orelha. –O que você acha, amigão?

“Au! Au! Auuuu!”

  -Tem razão... Não posso deixar isso terminar assim. Preciso descobrir o que aconteceu com ela! –falou decidida. –Fique aqui guardando nosso forte, ou melhor, a barraca!—então ela escalou o murinho. Parou bem em cima dele, porém, antes de pular para o outro lado, voltou-se uma ultima vez para o cachorro. - Seja um bom menino Nik... E lembre-se: Se eu não voltar em meia hora, diga à mamãe que eu a amo.

 E, com essa despedida incrivelmente exagerada, Melissa pulou para dentro do quintal de Luisa, esperando descobrir o que acontecera com a amiga.

Ela com certeza deve ter tido um ótimo motivo para ter ido embora...” –disse uma voz na cabeça de Melissa.

“Talvez seja mesmo sonambulismo. A gente nunca sabe quando vai ter uma crise disso! Essa seria uma boa explicação... Os sonâmbulos não sabem aonde vão, afinal:“Eles estão dormindo!” Ai, ai, só eu mesma para pensar em algo assim...”

Mas e se ela tiver se chateado com alguma coisa? Ela pode ter ido embora por pura e espontânea vontade... Não. Luisa não faria isso. Eu sei que não faria...”

Essas hipóteses assombraram o imaginário de Melissa por alguns instantes, mas mesmo assim, não foram capazes de desviar sua atenção do foco principal: Ela tinha de achar Luisa! Independente de qual o motivo de seu sumiço, ela teria de encontrá-la, pelo menos para que pudesse voltar a dormir sem se sentir culpada ou preocupada com a segurança dela.

*     *     *

Enquanto isso, Luisa ainda estava a investigar aquela estranha aparição azul. Segurou novamente na maçaneta da cabine... Era estranho. Ela sentia uma espécie de formigamento quando fazia isso. O que será que significava? Estava tão absorta em pensamentos que nem viu Melissa se aproximar.

   -E aí sonambulinha!?—saldou Melissa, assuntando-a.

   -Méli! Pelo amor de Deus... Eu quase enfartei!

   -Você é nova demais para enfartar –interveio Melissa, também tendo o olhar atraído pela estranha caixa. –Ih... Qual é a da cabine telefônica londrina?

   -Não faço idéia. Ela não é minha –disse Luisa. –Bom, está no meu quintal, mas garanto que não me pertence.

   -Como assim não é sua? -perguntou Melissa, intrigada. -Ela não estava aqui de manhã cedo?

  -Não que eu me lembre. –afirmou Luisa, pensativa. Então dirigiu-se novamente para a cabine azul. -O que você faz aqui...? De onde você veio afinal...? –falou ela para a caixa, como se o objeto fosse fornecer-lhe as devidas explicações. -Não tem jeito de você ter aparecido assim, de repente ou tem? -sugeriu Luisa.

  -EI, acorda! Isso aí uma caixa azul gigante, ela não vai responder! Vamos pensar: Se isso não estava aqui de manhã e nem veio com as suas coisas na mudança... O que esse troço faz aqui agora?

  -Eu não sei. Não me lembro de termos comprado algo tão distinto, tão espantosamente britânico e...

  -Azul?—completou Melissa, com uma sobrancelha arqueada.  

  -Exatamente! –disse Luisa, espantada. –Eu também fico dizendo isso... É como se a palavra “azul” fosse uma chave secreta para alguma coisa oculta.

  -Bem, acho que já entendi o motivo de você ter abandonado o nosso acampamento –anunciou Melissa. –Sinceramente, você me pegou: Encontrar “uma caixa azul” não estava na minha lista de motivos para o seu desaparecimento. Sendo assim, acho que está perdoada. –disse, em tom brincalhão. Então ambas voltaram a contemplar o intrigante objeto. -Isso é extremamente curioso...

  -É, extremamente estranho, isso sim! –completou Luisa, dando ênfase à frase.

  As duas se entreolharam: os rostos pálidos e as mãos trêmulas por causa de uma fumaça branca – possivelmente tóxica—expelida pela cabine e alguns misteriosos estalos, vindos da mesma, que as surpreendiam, ocorrendo sem mais nem menos, e fazendo-as se sobressaltarem. Esse clima de suspense ficou reinando por lá, até que:

  -Vamos entrar nela? -sugeriu Melissa, inesperadamente.

  -Claro! Porque não disse antes?—aprovou Luisa, empolgada.

  Poderia ser assustador, mais não o bastante para impedi-las de darem o próximo passo. Luisa já tinha a mão novamente estendida para tocar a maçaneta, quando Melissa falou de um jeito preocupante:

  -Espera! E se... E se tiver alguém aí dentro? -contrapôs ela, engolindo em seco.

  -Ah, Melissa, não seja boba! Por que você acha que haveria alguém aí dentro?

  -Sei lá! Me ocorreu à idéia de que, por ser uma cabine... Talvez tivesse alguém telefonando no seu interior, ou algo assim... -insinuou Melissa.

  -Ah, tá bom! Agora minha casa é um local publico onde as pessoas entram a hora que quiserem e fazem suas ligações?

 -Se você for levar tudo para esse lado... –resmungou Melissa.

 -Tá legal. Vamos dizer que “hipoteticamente” tivesse alguém lá: Quem você acha que poderia ser?

  Melissa pensou um pouco no assunto.

  -Sei lá... Brad Pitt?

  -Hein?—Luisa não conseguiu segurar o riso. -Por que você acha que o Brad Pitt estaria no meu jardim fazendo uma ligação numa cabine como essa? -perguntou, incrédula.

  -Tem razão, foi mal... Deve ser coisa do meu remédio. Ando ficando muito ansiosa ultimamente, sabe? Então meu médico me receitou um remédio. Ainda estão acertando a dose... A verdade é que ando tendo umas idéias meio sem pé nem cabeça desde que venho tomando aquele troço. É mesmo uma droga... Então, não ligue pra mim se por acaso eu disser que vi a Rainha da Inglaterra atravessando a rua, ou se afirmar ter visto o Presidente dando um passeio em um disco voador, ou algo do tipo. Sinceramente, aí vem uma dica diretamente de mim: Nesses casos, Me ignore.

  -O.K, vou me lembrar disso. –disse Luisa com ar de riso, voltando-se novamente para a cabine. -Então, o que vamos fazer?

  -Tudo bem. Dessa vez vamos tentar ser rápidas: você abre as portas e eu dou um golpe de caratê no infeliz que estiver aí dentro –Melissa piscou. Luisa deu as costas à cabine e fez cara de pouco caso para a amiga. –Quero dizer, SE tiver alguém aí dentro. –Melissa acrescentou. –Eu já disse para você não me dar ouvidos...

—Estou tentando, mas você não está facilitando muito as coisas.

—Tá legal: Então a gente só abre a cabine mesmo.

Luisa ergueu as sobrancelhas.

—Esse é o seu plano?

—É o nosso plano. –Melissa garantiu, como se fosse grande coisa.

—Tudo bem, está certo. Vamos logo com isso –concordou Luisa, inquieta. -Eu preciso dar um xá de sumiço nessa coisa até o amanhecer ou meus pais vão “dobrar o cabo da boa esperança”. Chamariam a polícia e tudo mais, e a ultima coisa que eu gostaria de ver no meu terceiro dia de mudança é a polícia visitando minha casa! Isso seria um absurdo! Seria totalmente prejudicial para nossa reputação, já que somos novos no bairro... Como se já não bastasse eu quase ter acordado todo mundo hoje cedo, agora isso... Daqui a pouco ficaremos conhecidos como os problemáticos do bairro. E eu não acho...

Naquele instante, todas as luzes da cabine se extinguiram. Melissa foi à única que notou, já que estava olhando diretamente naquela direção.

—Luisa, olha aquilo! –Melissa fez a amiga se virar e contemplar a caixa azul, ás suas costas.

  -O que foi agora? –Luisa olhou da amiga para a cabine, erguendo as sobrancelhas.

  -As luzes... Elas se apagaram. –Melissa disse, num tom de voz nervoso. Tudo que restara fora uma caixa em breu total, abandonada.

   -E qual o problema nisso?

  -Nenhum, é que tinha uma... –começou Melissa. –Não, esqueça. Não deve ter sido nada.

  -Uma o quê? Tinha uma o quê? Fala Méli! –insistiu Luisa.

 -Não foi nada... É que eu pensei ter visto uma sombra se mover bem rápido na direção das janelas foscas. –admitiu Melissa. –Mas não dê muito ouvido a isso... Você sabe que às vezes eu vejo coisas.

 Luisa olhou bem para as janelas apagadas da cabine, inerte.

 -Não tem nada lá... Não há o que temer.

  Nesta hora um último baque cortou o silencio. As portas azuis da cabine abriram-se de uma só vez, como se de repente uma rajada de vento muito forte as tivesse impulsionado. E um vulto auto e magro saltou para fora, dizendo com entusiasmo:

   -Hey, Pond! Traga seus peixes com creme, pois o maltrapilho aqui está de volt... —a voz dele foi sumindo aos poucos... A confusão refletida em seu rosto.

   Luisa e Melissa assustaram-se. A primeira atitude que tomaram ao recuperarem a fala foi gritar, descontroladamente. O vulto cambaleou para trás. Ele também gritou, pego de surpresa. Pelo jeito não esperava uma sinfonia de berros no calar da madrugada. Ambos se afastaram com rapidez uns dos outros, como se tivessem acabado de ver uma assombração. Elas recuaram para perto da casa, recuperando o fôlego; O estranho voltou de súbito para a escuridão suprema da cabine, onde permaneceu por mais alguns instantes, em silêncio.


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Notas finais do capítulo

"Santa Maluquice..." kkkk
Ai, ai... Essas duas são uma comédia, né? O que acharam do primeiro encontro das meninas com o Doutor?
Comentem!