Luisa Parkinson: A Companheira Fantástica escrita por Gizelle PG


Capítulo 133
Cérebro, coração, coragem


Notas iniciais do capítulo

Hello! :)



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Estava tudo bem escuro na sala do comandante da espaçonave. Havia uma cadeira bem grande ali, uma espécie de trono, onde alguém de preto estava sentado. Não se ouvia quase nada, a não ser um ruído de respiração mecânica, exageradamente forte, que se repetia em intervalos curtos de tempo.

—Com licença, senhor –disse um de seus soldados, entrando na sala. –Mas o pessoal da monitoração disse que o senhor gostaria de ver isso... A garota vai escolher um dos dois para sobreviver!

O homem na cadeira estendeu a mão sem pressa até um painel de controles próximo e ativou um botão, que resultou numa projeção holográfica ativada. Nela, era possível ver Jack Harkness e Mickey Smith auxiliando Luisa para libertar seus amigos presos.

O Comandante se ergueu, dando as costas à projeção. Caminhou até uma janela gigante, que exibia o esplendor do espaço aberto –tudo escuro, mas salpicado de pontinhos luminosos. Sua armadura rangeu bastante no percurso, sua capa negra e comprida esvoaçava. Então ele parou, contemplando a escuridão, contando apenas com o som das vozes da projeção, para entender o que se passava no planeta logo abaixo da Estrela da Morte. Curiosamente, estendeu-se um longo silêncio depois disso.

—Então é isso? –questionou o senhor supremo. -Queriam que eu soubesse do progresso da garota, mas não conseguem nem manter o canal de áudio estabilizado.

—Senhor? –instigou seu soldado. –Acho que devia mesmo ver isso.

O homem na armadura se virou... E pode conferir que realmente não havia som na projeção, pois os amaldiçoados do planeta Oz estavam se empenhando para fazer um esquema de libertação mútua, para os dois amigos de Luisa.

O soldado apertou uma prancheta contra o peito, receoso.

—Senhor, lamentamos muito... Sabemos que ela devia escolher um só, mas a garota é teimosa... Não está sendo fácil dificultar as coisas para ela, pois essa Luisa sempre parece saber o que fazer, e acaba por anular nossas investidas.

O comandante ergueu uma mão, como que dispensando o discurso do servo.

Deixe-a.—proclamou. –Eu quero ver do que ela é capaz.

 

*    *    *

Com a ajuda de Jack, Luisa escalou o altar entre a Esticadeira e a Jaula, para conseguir subir na segunda, e enfiar um pedaço de aço –que arranjou na bolsinha rosa –entre a lâmina da guilhotina e o espaço por onde ela passaria para entrar na jaula. Depois pediu para K-9 sondá-lo ali, para garantir que não se soltaria do lugar. Enquanto isso, Mickey se posicionou atrás da esticadeira com seu machado na mão, pronto para cortar a corda principal que mantinha o Espantalho preso à mesa, e sujeito a ser esticado pelas demais cordas.

—Depressa! Depressa! Me liberte! Por favor, corte essa corda maldita! –gemeu o Doutor.

—Agüenta aí só mais um pouco. A Luisa já está terminando. –disse Mickey.

Luisa saltou de cima da jaula de Melissa, aterrissando nos braços de Jack.

—Certo Mickey, corte a corda do Doutor!

—Pode deixar –e com um só golpe de seu machado afiadíssimo, ele libertou o Espantalho, que escorregou pela mesa ao ter o restante das cordas afrouxadas. A reação do rompimento da corda principal –que era a mesma ligada à guilhotina –fez com que a lâmina despencasse de uma só vez, em direção ao interior da jaula onde Melissa continuava desacordada. Contudo, o pedaço de aço que eles soldaram na abertura por onde a lâmina passaria, impediu-a de prosseguir, fazendo com que esta se desequilibrasse e caísse no solo, mantendo assim, Melissa à salvo.

Luisa comemorou, abraçando Jack, Mickey e K-9. Todos pareceram orgulhosos com seu trabalho em equipe, até mesmo Mickey, que não era de demonstrar suas emoções –ao menos na forma de Homem de Lata.

—Doutor! –Luisa o abraçou por último, enquanto Jack e Mickey foram tentar forçar as barras da jaula de Melissa. –Eu senti tanto a sua falta...

—Eu também senti –disse, com uma expressão confusa no rosto. Mas Luisa estava tão animada por revê-lo que nem suspeitou.

—Doutor! O seu cabelo! –foi quando se separaram que a garota levou as mãos aos lábios, surpresa. Os cabelos do Senhor do Tempo estavam agora muito mais claros, e também finos, como palha. Estava se tornando parte do conto infantil, igual a todos eles. –Você está virando um espantalho...

—Eu já virei. Acredite. –ele deu de ombros. –Não vai fazer muita diferença quando se tornar definitivo.

—O que quer dizer?

—Que eu não sou mais o mesmo; Estou tão atrapalhado... Tudo parece muito mais confuso do que jamais esteve... Há horas não me lembro do porquê me chamam de Doutor, meu raciocínio se torna mais lento a cada instante... Me sinto quase completamente fora de área.

—Ainda bem que é só “quase” –Luisa sorriu amigavelmente. Segurou sua mão. –As pessoas te chamam de Doutor porque você as ajuda. O seu nome é uma promessa. Uma marca registrada. Um segredo.

—Que... tipo de segredo?

Luisa sorriu, inclinando a cabeça.

—O maior de todos os segredos. A sua essência mais pura e antiga.

—Hein?

—Nada. Esqueça. –ela se levantou, puxando ele consigo. –Continue tentando se lembrar. É importante que você se lembre. Ajuda a atrasar o processo de conversão para personagem de “O Mágico de Oz”.

—Tudo bem, eu vou tentar. –esfregou a cabeça.

—É assim que se fala! –ela lhe lançou um sinal de positivo, mas logo seu rosto feliz se desfez assumindo uma expressão preocupada: Jack havia corrido desesperado em sua direção. –Jack? O que foi?

—A sua amiga. A Méli-qualquer-coisa. Ela SUMIU!

—OI? QUE? –Luisa abriu caminho até chegar à jaula, para encontrá-la vazia. –Tá. Isso não é hora para brincadeiras... Cadê a Melissa?

—O Jack está falando sério. A garota desapareceu bem na frente dos nossos olhos –reforçou Mickey. –O Leão arrebentou algumas barras da jaula com sua força e eu ajudei com meu machado. Então entramos para tirá-la dali, só que na hora que Jack tentou pegá-la no colo, ela simplesmente oscilou e desapareceu.

—Mas... Como assim ela desapareceu? Tem que haver uma lógica nisso! –insistiu Luisa.

—Ela tremeluziu e desapareceu. Como num holograma; uma projeção –disse Mickey. –Pela análise, é possível constatar que ela nunca esteve aqui de verdade...

Era mesmo uma armadilha, ama Luisa. –concluiu K-9. –Consegui scanneá-los, e o resultado acabou de sair. Neste ínterim, só havia uma pessoa em real perigo para salvar: O mestre Doutor.  

Luisa lançou um olhar assombrado à figura pacifica do Doutor.

—Puxa vida... Ainda bem que eu não optei por escolher só um dos dois para salvar... Não tinha como saber quem era real ou não, quem estava fingindo ou não.

—Ei! Eu não estava fingindo! –respondeu o Doutor, ofendido.

—Eu não disse que você estava. Na verdade, ninguém estava. Aquela não era nem mesmo a Melissa de verdade. Era só uma projeção.

Jack suspirou.

—A vida anda muito confusa ultimamente... Temo que em breve não consigamos saber a diferença.

Luisa ergueu o olhar para o horizonte. Estava com a nítida impressão de que alguma coisa ruim estava vindo. Ou que, no mínimo, outros desafios os aguardavam.

 

***

Escureceu bastante rápido depois dos últimos acontecimentos. A terra de Oz era fria de noite, por isso o Leão, ou melhor, Jack Harkness teve a idéia de acenderem uma fogueira para se aquecerem –porém, ele não ajudou-os na tarefa. Afirmou ter medo de se queimar.

Algum tempo passou, em que todos ficaram sentados ao redor da fogueira, encolhidos e em total silêncio.

Luisa estava num exercício contínuo de tentar resistir à olhar para o Doutor. Fazia tanto tempo que eles não se viam... Ela estava morrendo de saudades. Nem acreditava que realmente o encontrara, contudo, as coisas pareciam estar diferentes agora. Contraditoriamente, o incrível alívio que sentiu no momento em que o reconheceu como Espantalho naquele lugar, agora parecia não ter mais significado. Eles estavam novamente juntos, mas por algum estranho motivo, o amigo parecia distante. Estava encolhido perto do fogo, com o olhar perdido nas chamas que crepitavam. Era quase como... se alguma coisa estivesse errada. De tempos em tempos, Luisa estudava-o com insistência. Não conseguia entender direito porque, mas sentia que havia algo nele agora, alguma coisa nova, que a estava intrigando muito. Todavia, descobrir de que se tratava era um desafio e tanto... Sobretudo tratando-se do Senhor do Tempo –o homem mais misterioso que a criação já conheceu. Tudo bem que ela conhecia certos segredos que o pertenciam, mas eram claramente poucas revelações perto de tudo que havia de verdade. Luisa já estava com ele há tempo o bastante para saber que esse buraco era bem mais fundo, e, muitas vezes, sem possibilidade de retorno.

—Mais alguém está com fome? –perguntou Jack.

—Eu não –disse Mickey.

—Estou mais cansada do que com fome –disse Luisa.

—Idem –respondeu o Doutor, trocando um olhar rápido com Luisa. O primeiro em muito tempo. A garota até sentiu o rosto esquentar. Parecia que nem se conheciam direito.

—Nossa... Estou morrendo de fome –reclamou Jack, pondo as mãos sob a barriga enxuta.

—Então porque não vai caçar? Você é um Leão, ora! –resmungou Mickey.

Luisa e o Doutor os observaram discutir, em silêncio. Jack fez uma cara indignada, como se não esperasse por uma resposta dessas.

—Ei! Eu não sou um leão de verdade, se é que não percebeu ainda!—retrucou. –Conta pra mim: tem alguma coisa que preste nessa sua cabeça oca de lata velha, ou será que os neurônios enferrujaram todos com o passar do tempo, hein?

Mickey umedeceu os lábios, então lançou um olhar fuzilante à Jack.

—Você é um hipócrita mesmo... Todos vocês são na verdade. Sobretudo ele! –e apontou inesperadamente para o Doutor. –Eu me lembro dele. Passei muito tempo aqui pensando que o achava familiar demais para não ter tido nenhum envolvimento meramente significante em minha vida... E então, depois de muito bater nessa tecla, eu finalmente me lembrei de onde o conheço. –se levantou, com as mãos no bolso, e caminhou até ele.

—Verdade? –o Doutor o fitou, do chão. –Engraçado... Eu não consigo me lembrar de você.

—Ah, mas eu me lembro bem de você –sorriu, então, num movimento brusco e definitivamente violento, Mickey o levantou pela gola da camisa, só para lhe dar um soco depois, que levou o Senhor do Tempo ao chão de novo.  –DESGRAÇADO!

—NÃO! –gritou Luisa, correndo para acudir o amigo que apanhara. –O que você fez? Se afaste dele!!

—Isso não foi nada perto das coisas que Ele fez —retrucou Mickey, fora de si. 

—Tá bem! JÁ CHEGA LATÃO! –Jack correu para segurá-lo. –Violência não vai consertar as coisas, independente do que seja.

—São poucos fleches de memória, mas eu me lembro do que ele fez com as pessoas!! –brandiu Mickey, detido por Jack. -Como ele ferrou com a vida de Rose Tyler! Como ele ferrou com a minha vida!

Rose Tyler...—Luisa repetiu baixinho. Aquele nome lhe soava familiar. Onde foi que já ouvira falar nisso...?

—Mickey, do que diabos está falando??? –perguntou Jack.

—Esse Doutor é um destruidor de vidas! Eu tinha um futuro antes de conhecê-lo! A pobre da Rose também, mas então ele cruzou nossos caminhos e pôs tudo a perder! E então, Senhor do Tempo, acha que esse soco doeu? Você merecia coisa muito pior!

—Eu não entendo! -disse o Doutor, massageando o queixo; o lábio sangrando. –O que eu posso ter feito para você me odiar tanto?

—Você acabou com a minha vida. Com a de todos nós! Só deixa destruição por onde passa... Você é um perigo para o universo!

—Não! Está enganado! Ele salvou todos nós diversas vezes! O universo nem estaria aqui se o Doutor não tivesse intervindo! Você sabe que isso é verdade!—rebateu Luisa.

—Eu só sei que ele ferrou com a vida de muuuuuita gente, nessa toada de tentar “salvar” alguns mundos. Você já leu os arquivos confidenciais da UNIT? Eu li uma vez. Na verdade, diversas vezes... E em todos eles, só havia uma coisa que se repetia na pasta gigantesca sobre o Doutor: o rastro de morte que ele deixou ao cruzar as vidas das pessoas. Já conferiu os números? Será que você ao menos faz idéia de quantos companheiros ele teve? Quantos morreram? Quantos ficaram para trás, completamente ferrados, e ele não fez absolutamente NADA para mudar isso. Apenas “seguiu em frente”.

—Eu... não entendo... Do que ele está falando? –o Doutor perguntou, verdadeiramente confuso. Mickey fez uma careta.

—Santa mãe... Ou você pirou de vez para se esquecer das coisas que fez, ou você não é o verdadeiro Doutor!

—Pare de atacá-lo! Ele está confuso, assim como todos nós! Esse lugar nos deixa alienados, esqueceu? –gritou Luisa, pondo-se na frente do amigo. –É por isso que você vem falando essas coisas absurdas... A atmosfera venenosa desse planeta conseguiu te contagiar! Está mexendo com a sua cabeça, Mickey! Por favor, resista!

Ele fez um movimento de ombros, soltando-se de Jack. Então olhou feio para Luisa.

—Eu já venho resistindo há bastante tempo... Mais do que você pensa! Por isso minha mente chegou a esse ponto, conseguindo me fazer enxergar novamente toda a sujeira por detrás do tapete. Toda a verdade oculta, por detrás desse magrelo ordinário e insensível!

Luisa franziu a testa o máximo que pode. Aproximou-se dele.

—Como? Mickey, você está se ouvindo? Nem se lembrava direito de quem era ainda a pouco, quando nos conhecemos... Como pode ter certeza de que essas idéias não foram distorcidas e implantadas agora mesmo na sua mente, para que parecessem reais?

Mickey cruzou os braços e semi-cerrou os olhos, ficando cara a cara com ela.

—E como você sabe que o seu conceito sobre o caso não foi distorcido?

Luisa abriu a boca para dizer algo em sua defesa, mas a resposta simplesmente não lhe ocorreu.

—Bem... É isso aí. Como eu imaginava –disse o Homem de Lata, se afastando. Luisa baixou a cabeça, indignada com sua própria reação. Não podia acreditar que hesitara... Que dera esse gostinho à Mickey. Ela conhecia o Doutor. O verdadeiro Doutor. Do jeito que ele era por dentro. Ela tinha poderes de Visualizadora... Era uma das bruxas mais poderosas que havia! E tinha noção do que isso significava: se sua percepção sobre os outros não estivesse correta, então a de ninguém mais estaria. As coisas eram assim. Mas, talvez pela pressão exercida naquela conversa, ou mesmo por influencia das estranhas vibrações daquele lugar chamado por todos de “Oz”, ela não conseguisse estabelecer uma leitura completa do interior das pessoas. Quase como se sofresse interferência. Uma coisa que barrava suas análises e impedia sua mente de chegar a um veredicto mais aproximado da coisa real. Mas ela sabia quem era o Doutor! Ela o conhecia bem... Não conhecia?

Tornou a fitar os companheiros. K-9 estava desligado para poupar baterias; Jack estava encolhido no chão, próximo à uma pedra, Mickey estava de costas para a fogueira, fitando o firmamento escuro e o Doutor... Bem, parecia incrivelmente desanimado.

Bem... Talvez... Só talvez Mickey tivesse algum pingo de razão nisso tudo. Isso é, não nas acusações que fizera, mas sim em desconfiar do Doutor. Porque, querendo ou não, Luisa precisava concordar com Mickey num aspecto: o Doutor estava estranho. Alguma coisa não fazia sentido ali e ela podia sentir o cheiro de “problemas” à longa distância...

Porém, não adiantava pensar muito nisso agora. Tinham que tentar sobreviver a aquela noite fria e escura, e como fariam isso se continuavam brigando sem parar uns com os outros?  

—A culpa é minha –disse Luisa.

—O que? –perguntou Jack. Só então ela mesma percebeu que dissera aquilo alto o bastante para os companheiros escutarem. Contudo, não se importou nem um pouco com a idéia de poder dividir seus pensamentos com eles.

—Eu disse que a culpa é minha.

—A gente escutou. A pergunta é: por que você diz isso? –instigou o Doutor, não com a animação de sempre, mas já era uma evolução. Luisa suspirou, finalmente voltando a se sentar junto à fogueira.

—Fui eu que incentivei todo mundo a tentar resistir à lavagem cerebral que o planeta vem fazendo em nós. Isso deve gerar efeitos colaterais... –disse, olhando para Mickey, lembrando-se das coisas que ele disse.

—Então, você acha que era melhor a gente não resistir? Mas eu sei que essa não é minha verdadeira forma! Eu meio que já sabia antes, mas a idéia só se reforçou quando nos encontramos aqui e você disse para eu resistir e tentar me lembrar de quem eu era antes de vir parar em Oz –disse Jack, dando de ombros. –Bem... Eu ainda não me lembro direito, mas você disse que eu não era um covarde, e desde então estou tentando muito mesmo me agarrar a essa idéia, para quem sabe torná-la realidade. –revelou. –O fato é que eu cheguei a essa compreensão toda graças à você, senhorita Parkinson. Então... Não sei, dando resultado ou não no final, está valendo a pena tentar.

Luisa abriu um sorrisinho. Ficou realmente feliz por perceber que estava ajudando-o de alguma forma. Mas então seu olhar se perdeu ao encontrar a figura de Mickey Smith, que continuava insistentemente a dar as costas para a fogueira e, conseqüentemente, para seus companheiros também. Com isso, ela murchou um pouquinho de novo. Desta vez, porém, o Doutor percebeu... e foi mais rápido ao reagir.

—Ei... Não fique assim –passou a mão nas costas dela, como que num consolo. –As coisas vão melhorar. Acredite.

Seu sorriso voltou, ao encontrar o rosto do amigo. Ele estava ali. Estava ali com ela, bem ao seu lado. Pouco importava o que diziam seus sentidos agora... Aquele era o Doutor. O seu Doutor bondoso e gentil. Era no que ela queria acreditar, e assim seria.

—Obrigada –disse, agradecendo o carinho. –Você é um ótimo amigo. É muito importante pra mim saber que você está aqui do meu lado, para o que der e vier.

Ele sorriu. Não respondeu nada, mas aquele sorriso valeu de resposta. Mickey Smith finalmente se juntou a eles ao redor da fogueira.

—Olha... Desculpem pelo surto –disse, surpreendendo todo mundo. –Eu estou procurando me conter, mas é difícil aqui!

—Pois é, cara. Eu te entendo –disse Jack. –Eu estou tentando não ser covarde, mas isso sempre parece ser mais forte do que eu –admitiu, olhando para Luisa, envergonhado. –Sinto muito. –encolheu os ombros.

Luisa tocou seu braço.

—Tudo bem Jack, você não tem culpa. –deu uma olhada ao redor. -Tudo está bagunçado por causa desse planeta. Ele que coordena a realidade que nos ronda. Pelo que entendi, tudo aqui é ao contrário do que realmente é. Desta forma, é compreensível que um cara tão corajoso quanto você, Jack, esteja com medo agora -voltou-se para Mickey. -Eu não te conheço muito bem, Mickey Smith, mas imagino que você deva ter um grande coração, senão não estaria aqui na posição de "Homem de Lata" -e olhou para o Doutor maltrapilho. -E você... Oh... Você, meu Doutor, é muito inteligente. Por isso que aqui está incorporado no "papel" de Espantalho -o amigo sorriu de leve para ela. Luisa retribuiu, então baixou os ombros, suspirando. 

—O que houve Luisa? -perguntou Jack.

—Nada... É só que... Eu não entendo a minha posição nisso tudo. Todos sempre dizem que eu sou tão amável... Por que então eu estou sendo brava nesta realidade? Dorothy não era brava.

—Sim. Tem razão. -concordou o Doutor. -E acho que é exatamente por isso que você está agindo assim.

—Como assim?

—Bem, você disse que é muito parecida com a Dorothy, e, em teoria, tudo nesse lugar funciona ao contrário... -ele relembrou. -Então, é muito simples o que aconteceu: Vocês duas eram compatíveis ao personagem, mas o planeta estava "programado" para inverter personalidades, então neste caso especial, imagino que sua personalidade tenha sido invertida automaticamente.

—É... Faz sentido.

—Sim. Faz mesmo.

—Puxa vida, até que pra um "sem cérebro", ele pensa bastante. -cutucou Mickey. Luisa olhou para ele. -Ah, foi mal. Eu tô tentando me controlar...

—Tudo bem. Acho que todos nós devemos lutar contra essa personalidade implantada que quer nos dominar... -Luisa concordou, então envolveu o Doutor num abraço. -Você tá indo muito bem nisso... Não se esqueça de sua verdadeira personalidade! É a única forma de poder restaurá-la.

Foi nesse instante que uma luzinha vermelha começou a apitar em K-9.

—O que é isso agora? –perguntou Mickey.

—Oh não... Me diga que não é uma BOMBA! –gemeu Jack, se encolhendo todo.

—Não, não gente... Não parece algo ruim. –Luisa se aproxinou do cachorro de lata. –K-9? O que foi?

Ama Luisa, esta unidade acabou de receber uma mensagem. Ela vem de seus superiores: os controladores de Oz.

Luisa boquiabriu-se.

—Santo Deus, então eu estava certa! Existe MESMO um controle acima de nós... –arfou. Então se recompôs. –Okay K-9... Nos transmita a mensagem!

Afirmativo. –então K-9 divulgou a mensagem, que foi interpretada por uma voz feminina, um tanto zombeteira:

Saudações, terráqueos bobões! Bem vindos ao Inferno!—risada histérica. –Bem, enfim, agora que já estão acostumados com as acomodações, devem se preparar para a grande missão de suas vidas! Tádãã!! Vejamos o que lhes espera: Hum... Que interessante! Parece que vocês devem nos trazer a Chave do Universo até amanhã, antes do por do sol, ou então sofrerão consequências. Nhó! Que lindo. Achei tão meigo... –disse, debochada. –Não se preocupem, vocês a reconhecerão quando a virem. Como diz o conto, cuidadosamente adaptado: “Sigam em frente pela escada de ladrilhos amarelos, até chegarem ao cofre Esmeralda”. Isso é tudo. –concluiu. -A propósito, querida, seu sapato é uma bomba relógio programada para detonar até o prazo final da entrega da chave. Se vocês não se apressarem... CABUM! –riu, malignamente. -Bom, desejo-lhes sorte. E sejam breves! O Imperador não gosta de esperas longas...

Beijo, beijo. Até loguinhooo!”

Fim da Mensagem

Todos ficaram paralisados. Luisa ficou levemente intrigada. Não só pela mensagem em si, mas porque, por algum estranho motivo, aquela voz lhe soava familiar.

—Alguém... Entendeu alguma coisa? –o Doutor franziu a testa.

—Não. –admitiu Mickey. –Eu não entendi bulufas.

—Acho melhor ouvir de novo –sugeriu Luisa.

—Não! Essa voz me assusta... Vou ter pesadelos se ouvir de novo –disse Jack, engolindo em seco.

—Tá bem então. O que sabemos? –recapitulou o Doutor.

—De um modo geral: que estamos lascados com L maiúsculo –argumentou Mickey. Luisa desligou K-9 de novo, para polpar energia e baterias, então sentou-se sob as duas pernas.

—De acordo com a mensagem que K-9 recebeu, nós só sairemos daqui quando conseguirmos pegar essa tal “Chave do Universo”. Numa interpretação mais fiel: Os sapatos de rubi só sairão dos meus pés quando terminarmos nossa missão. E isso significará que estaremos livres desse lugar, de uma vez por todas!

—E o que acontece se falharmos?

—Bom... A mulher disse o que aconteceria –fez uma pequena pausa. –“Cabum”. Mas eu não acredito realmente que haja uma bomba, sabe? Está parecendo só pressão psicológica...

—Mas, espera... Ela disse “cabum” se a gente recusasse a missão... Mas e se a gente aceitar de bom grado e simplesmente se ferrar no final?

Luisa deu de ombros.

—Acho que ficamos presos aqui para sempre. Sei lá. Algo assim.

Uns se inquietaram, outros arregalaram os olhos.

—Caramba. –Jack roeu uma unha.  

É. Muito motivador. Profundo mesmo... –disse Mickey, irônico, passando a mão na cabeça.

—Bom... independente do que aconteça amanhã, uma coisa ficou bastante clara: precisamos trabalhar juntos para enfrentar os desafios que vem por aí –declarou Luisa.

—Ainda não consigo entender o propósito por trás de tudo isso... Será que não temos mesmo uma segunda opção? –propôs o Doutor. –Tipo alugar um balão e cair fora daqui?

—Bom, essa hipótese só funcionaria se houvesse um Mágico de Oz de verdade aqui, e ao menos que o encontremos durante a trajetória de amanhã, em busca da tal chave, então estaremos definitivamente sozinhos nessa. –concluiu Luisa, para o descontentamento da equipe.

—Ora essa, então é isso? Já perdemos?

—Não foi o que eu quis dizer... Só acho que a gente precisa bolar um plano eficaz, caso as coisas não funcionem como planejado amanhã e a gente acabe presos aqui –esclareceu ela. –Não estou sendo pessimista. Só... Alguém sabe o que é uma Chave do Universo?

—A mulher disse que “nós saberemos quando a virmos” –lembrou o Doutor.

—Bom, não sei quanto a vocês, mas isso não tá me cheirando nada bem –disse Jack, tremendo de medo.

—Não diga!? Que novidade—resmungou Mickey.

 

*    *    *

Custaram para dormir aquela noite, preocupados com o dia seguinte. Antes mesmo de amanhecer, Luisa se sentou para observar a paisagem à sua volta. O vento estava morno, a fogueira havia apagado, e o silêncio, apenas interrompido pelo som de uma cigarra aqui e ali, parecia agradável. Era a primeira sensação de paz que ela sentia naquele planeta, desde que chegara lá. Oz era cheio de mistérios, mas certamente, sua madrugada era um conforto. Talvez porque a estranha presença, que parecia sempre estar em seu encalço, também tivesse ido dormir. Ou talvez porque esse era o “poder mágico” das madrugadas mesmo, entrando em ação. Isso Luisa não soube responder. Todavia, era um conforto de qualquer maneira, e eles não iriam rejeitá-lo.

Luisa abraçou as próprias pernas, o olhar fixo no horizonte. Então percebeu uma movimentação ao seu lado. Alguém se sentara perto dela.

—Hey Doutor -falou baixinho para não acordar os outros. Um sorrisinho se abrindo na face. –Está tudo bem?

—Eu não sei. -O Senhor do Tempo admitiu; as mãos abraçando o próprio corpo. –Eu... Não estou muito legal.

Luisa inclinou a cabeça, observando-o.

—Você acha que está doente?

—Não. Falo sério, eu não sei o que tenho. Palavra!

Luisa pôs a mão na testa dele.

—O que você sente?

—Saudades de casa –falou, deixando-a surpresa.

—Oh. Entendo... –mas ela realmente não entendia. Será que ele falava da antiga Gallifrey, ou... ?

—Minha cabeça está meio fora de área. Pesada. Com... milhões de informações, e ao mesmo, nada que faça sentido.

Luisa tocou seu rosto.

—Você está confuso. É normal. Todo mundo aqui está.

—Não –ele olhou para os próprios pés. A voz carregada, dolorida. –Eu... Sinto como se tivesse deixado alguém para trás. Eu... precisava salvá-la, mas... está fora de alcance. –ele parecia incrivelmente frustrado.

Luisa suspirou.

—Não se preocupe. Cedo ou tarde isso vai fazer algum sentido e você irá se lembrar de tudo –o encorajou, passando a mão nas costas dele. O mesmo conselho também valia para ela, que estava encafifada com a voz da mulher da mensagem de mais cedo. Não fazia idéia de onde a conhecia, mas a voz era familiar.

O Doutor encostou a cabeça no ombro dela. Os olhos fechados.

—Ainda bem que eu tenho você. –ele sussurrou. O rapaz não tinha completa certeza de que a conhecia de verdade; sua mente estava bem embaralhada, mas o rosto daquela menina era incrivelmente amigável e ela se mostrara muito confortante desde que seus caminhos se cruzaram em Oz. Então... Luisa parecia uma boa opção para se procurar amparo.

A garota sorriu de levezinho, pelos cantos dos lábios. Com tudo o que vinham passando ultimamente, estava difícil conseguir sorrir realmente de corpo e alma, mas ela estava se esforçando.

—Eu estarei sempre aqui pra você, meu Doutor. –segurou sua mão. -Sempre que precisar.

E com isso, ele adormeceu. Ela beijou sua testa e tentou dormir mais um pouco também. As horas iam passando, e logo eles teriam que levantar e começar sua busca pela tal “Chave do Universo”.

 

*    *    *

Quando abriram os olhos de novo, o Sol já havia nascido agora. Jack-Leão fizera o favor de acordá-los –porque Mickey-Homem-de-Lata não levava lá muito jeito pra coisa.

Rapidamente, se aprontaram e desmontaram “acampamento”. Subiram até a beira do morro onde estavam, e observaram as terras de Oz, abaixo de si.

—Puxa... Parece que está aprontando um temporal pra hoje –comentou o Doutor-Espantalho.

De fato, estava ventando bastante, e o mato sob seus pés chacoalhava muito. Seus cabelos e roupas também esvoaçavam. Em meio à essa ventania toda, Luisa religou K-9.

Bom dia ama Luisa!

—Bom dia pra você também K-9 –saudou. –Será que poderia repetir para nós, somente um pedaço da mensagem que recebeu ontem?

Afirmativo. Eu a tenho gravada em meus arquivos. Qual parte desejam?

—Aquela onde a voz da mulher dizia por onde devíamos ir.

K-9 rebobinou a gravação da mensagem e a voz da mulher novamente soou:

Sigam em frente pela escada de ladrilhos amarelos, até chegarem ao cofre Esmeralda

—Essa voz me dá arrepios –repetiu Jack, encolhendo os ombros. Luisa não podia culpá-lo... Ela também sentia uma sensação esquisita ao ouvir a voz. Porém, tentou focar no que realmente importava:

—Onde ficam as tais escadas de ladrilhos amarelos, alguém aqui sabe? –perguntou Luisa, finalmente.

K-9 recomeçou a falar:

Meus registros indicam que as escadas ficam localizadas logo após o labirinto.

—Qual labirinto?

—Aquele ali, ao que parece –Mickey indicou um, à direita do morro onde se encontravam, e estendendo-se até não se poder ver mais.

Luisa fez uma careta.

—Droga. Estava fácil demais... –franziu a testa. –Mas... Cadê as escadas? Não consigo vê-las...

—Isso é porque labirintos costumam ser imensos. Não dá mesmo pra ver o outro lado –disse Mickey. –E mesmo que desse, não poderíamos enxergar daqui. Está vendo aquela neblina logo acima do labirinto? Está obstruindo nossa visão. Não dá pra saber qual o tamanho, ou a extensão real da coisa toda.

Luisa suspirou.

—Isso não parece muito animador.

—Animador? Se quiser animação vá para um circo! Aqui em Oz não existe essa palavra... Tal qual como “diversão” e “paz”.

—Tá legal. São informações demais para essa hora da manhã. Vamos com calma, okay? –pediu Luisa, dando a volta e começando a descer o morro, seguida de perto por K-9 que não desgrudava dela. –É melhor começarmos a caminhar ou então não chegaremos nem na porta do labirinto hoje! E como a mulher da gravação mesmo disse: “nós não temos tempo para desperdiçar...”

—Eu não lembro dela ter dito essas palavras –Jack comentou.

—Verdade. Ela ameaçou que se não trouxéssemos a Chave do Universo até o por do sol, sofreríamos conseqüências, mas sinceramente, não disse nada disso. –analisou o Doutor.

—Ai, vocês tem sempre que levar tudo no literal? –resmungou a menina. –Vamos. Não há tempo à perder.

Andaram, ao som de *Down Under –Men At Work, até sentirem as pernas começarem a doer –porque tiveram que descer o morro primeiro, e dar a volta, para só depois chegar na entrada do labirinto. Luisa sentou-se na grama, recuperando o fôlego. Os amigos fizeram o mesmo, só que com menos classe: Foram se jogando no chão e lá ficavam na posição que haviam caído, dramatizando muito mais a chegada ao labirinto. Jack chegou a beijar o chão.

Homens—revirando os olhos e balançando a cabeça, a menina se levantou. Imediatamente, K-9 tornou a acompanhá-la. Eles pararam à entrada do labirinto e ali ficaram, observando.

—K-9, você consegue scannear esse negócio? Sabe... Pra definir se tem alguma criatura perigosa ou... sei lá mais o que possa estar dentro de um labirinto.

K-9 ergueu sua pequena haste com um scanner na ponta, na direção das paredes alaranjadas do labirinto.

Sinto muito ama Luisa, mas meus scanners estão inoperantes, ou o labirinto que é dotado de um filtro de percepção muito reforçado para meus padrões.

Luisa suspirou, impaciente.

—Tá me parecendo obra daquela bruxa da voz debochada –acusou, franzindo a testa. –E eu tenho certeza que já ouvi essa voz antes... –se voltou para os amigos, agora mais recompostos, parados logo atrás dela. –Todos prontos? Nós vamos entrar no labirinto.

Mickey assentiu. O Doutor assentiu. K-9 assentiu. Jack começou a abater os dentes. Luisa fingiu não ver.

—Vamos gente, só temos até o por do sol –relembrou e começou a liderar a equipe. Os outros a seguiram. K-9 sempre ao seu lado, como seu fiel escudeiro. Jack tremendo, segurando a própria calda e choramingando.

Foram reto, levemente confiantes, seguindo pelo único caminho inicial que o labirinto fornecia. Se continuassem nesse ritmo, logo chegariam ao centro. Mas seus sorrisos vacilaram ao se deparar com o primeiro obstáculo: agora haviam três caminhos para escolher. A equipe se entreolhou.

—E agora? –choramingou o Leão.

—Que tal a gente se separar? –sugeriu o Espantalho. –Talvez um de nós tenha sorte de chegar ao centro primeiro, e depois voltar para avisar os outros.

Luisa não acreditava que o Doutor dissera aquilo.

Ficou maluco? Digo, mais do que o normal? Isso é suicídio! –ela balançou as mãos histericamente. –Não. Definitivamente não podemos cair no erro de nos separarmos. É a cilada mais antiga tratando-se de labirintos: separou, deu ruim! É tiro e queda!—apontou para um dos caminhos. –É sempre a mesma coisa: a gente se separa, aí fica todo mundo confiante num primeiro momento, achando que vai ser o sortudo a encontrar a saída primeiro. Então daqui a pouco a gente ouve um de nós gritar e um silêncio mortal logo em seguida. –os rapazes se entreolharam, preocupados. –Eu to dizendo, É CILADA!!!

—Okay. Okay. Já foi o bastante pra me convencer. –Jack concordou, se escondendo atrás de Luisa. –Então... pela sua experiência em labirintos... Se a gente não vai se separar, o que vamos fazer hein?

Luisa levou a mão ao queixo.

—A gente tem que escolher um caminho e irmos todos juntos por ele. Tipo arriscar na sorte. Sei lá.

—Ah, ótimo! Vamos arriscar na sorte! –reclamou Mickey. –“Vamos arriscar”, ela diz. Isso é mesmo uma maravilha: Não vamos correr o risco de morrermos separados, porque vamos estar juntos, mas ainda podemos acabar morrendo juntos, porque NÃO SABEMOS PARA ONDE ESTAMOS INDO!

—DÁ PRA PARAR DE DAR CHILIQUE, TODOS VOCÊS!? –gritou Luisa. O silêncio se fez no recinto. –Vai lá K-9. Você escolhe o caminho.

—K-9? Porque o cachorro vai escolher?

—Porque foi o único que FICOU DE BOCA FECHADA!

Era a pura verdade. Não houve como debater aquilo.

Rapidinho, K-9 começou a guiá-los pelo caminho do centro e eles o seguiram. A lógica do robô não era das melhores, mas pelo menos tinha fundamentos: eles chegaram até aquele ponto por um caminho central, então continuariam seguindo pela extensão central, ao invés de escolherem algum caminho das pontas. Era simples, mas parecia fazer sentido. Para Luisa estava de bom tamanho, então todos aderiram.

Caminharam por um longo percurso, ao som de *Hurricane –Bridgit Mendler, sempre seguindo K-9.

Por favor não diga que estamos indo na direção das nuvens escuras de tempestade. Por favor não diga que estamos indo na direção das nuvens escuras de tempestade. Por favor não diga que estamos indo na direção das nuvens escuras de tempestade...—gemia Jack, horrorizado com a aproximação deles perante à neblina, que agora podiam ver... era muito mais do que realmente neblina. Eram nuvens de tempestade concentradas sob o labirinto. Nuvens que giravam num redemoinho assustador... que tinha potencial para formar um futuro... Furacão. -Por favor não diga que estamos indo na direção das nuvens escuras de tempestade...

—Alguém faz ele calar a boca? –resmungou Mickey; as mãos nos ouvidos. –E façam também o favor de tirar o cachorrinho da liderança... Ele está nos guiando para a morte certa!

—Não seja tão rude! K-9 está dando o melhor de si – repreendeu Luisa.

—“E essas foram as últimas palavras de Dorothy”. –zombou Mickey. –Sabem porque? Porque depois disso todos nós morremos!

Na mesma hora que Mickey disse isso –como se já não bastasse estarem andando sem saber para onde, escolhendo aleatoriamente os caminhos a serem seguidos no labirinto –de repente um relâmpago os fez tremer na base.

Em resposta, Luisa deu um tapão no braço de Mickey.

—Ai!

—PARE DE ATRAIR MAU AGOURO!

Ama—chamou K-9. –Precisamos seguir adiante. Meus scanners detectaram um abrigo para a tempestade.

—Certo, k-9! Bom garoto. Nos leve até lá –consentiu ela. K-9 prosseguiu, na direção da tempestade. Luisa ia dar um passo, quando foi puxada para trás.

—ESTÁ MALUCA? –Jack a chacoalhou pelos ombros. –O cachorrinho está nos levando para o OLHO DO FURACÃO! VAMOS MORRER SE CONTINUARMOS!

—O K-9 acabou de dizer que achou um abrigo pra nós, Jack –ela se desvencilhou dos braços dele. -Nós vamos nos esconder da tempestade...

—Ah é, é? NO OLHO DO FURACÃO!? –gritou ele, um tique pulsando abaixo do olho esquerdo. Luisa cruzou os braços e continuou andando. 

—Tá bem. Fiquem aí se quiserem. EU vou com o K-9. Tchau. Tchau. –acenou e sumiu de vista. Os outros se entreolharam.

—Ela não pode ir sozinha, vocês sabem disso –disse o Doutor. –A gente não pode se separar.

—Hã! Que se dane. Deixa ela ir... Não quer dizer que porque ela quer morrer, todos nós devamos ir junto. –esse foi Mickey falando.

Um novo clarão de relâmpago os assustou. Jack se encolheu, então olhou para o caminho por onde Luisa passara. Ela não estava retornando, nem pretendia retornar. Foi aí que ele respirou fundo e tentou por em prática o que a garota vinha dizendo desde o começo para eles. De repente, a voz de Luisa soou na mente de Jack: “Resista à essa personalidade falsa! Ela não é sua de verdade. É esse lugar que está manipulando vocês... Seus pensamentos estão confusos e vocês não sabem mais quem são. Mas não se enganem rapazes: Vocês são inteligentes, amorosos e corajosos. Nunca se esqueçam disso”.

—Eu queria muito saber que horas são –o Doutor disse, trazendo Jack de volta à realidade. -Fica difícil controlar a aproximação do por do sol, com uma tempestade dessas. Eu sei que o dia acabou de clarear, mas... Nunca se sabe. Oz gosta de pregar peças...

O Leão sentiu uma força estranha crescer em si. Inesperadamente, se prontificou, segurando o Doutor pela gola da camisa esfarrapada.

—Epa! Calma aí amigo... –o Espantalho sorriu amarelo. –Não vamos partir para a violência... Eu sou feito de palha lembra? O meu soco não é lá essas coisas...

Jack o soltou, mas não completamente. Agarrou seu braço e o arrastou pela passagem do labirinto, cruzada ainda a pouco por Luisa.

—ESPERA AÍ! O QUE ESTÁ FAZENDO? LEÃO!

—O Meu Nome É Jack Harkness e eu sou corajoso! –parou então, soltando o Doutor, que esfregou o braço. –E você? É um Espantalho fracote, ou é o Doutor? O Homem que, de acordo com Luisa, salvou dezenas de pessoas?

O Doutor mudou o olhar. Ao erguer a cabeça, pareceu muito mais destemido do que antes.

Jack o encarou, esperando uma resposta ou então uma reação à altura, que provasse que ele havia entendido a deixa. O Doutor não decepcionou... Olhou para o furacão que se formava, com um leve ar curioso, ousado, cheio de expectativas;

—Você tem razão. Chega de ser impotente... Eu sou MUITO MAIS! –e deu um passo na direção do desconhecido, saboreando a sensação de conseguir restabelecer um controle sobre si.

Então ambos voltaram-se para Mickey.

—E você? Vem com a gente? –perguntou Jack. Mickey cruzou os braços, a cara amarrada.

—Não precisa ser insensível até o final. Todo mundo tem um limite. –acrescentou o Doutor. Mickey olhou para os dois, então suspirou.

—Tá legal. Eu não sou cem por cento insensível. Quero dizer... Eu fiquei com medo do relâmpago, e não gostei nem um pouco da garota ter avançado sozinha, só com aquele cachorrinho metido a besta. –admitiu, meio sem jeito. Jack e o Doutor se juntaram a ele, estendendo os braços para que segurasse.

Para o olho do furacão?

—Para o olho do furacão!

Mickey revirou os olhos.

—Sério que vocês vão querer cantar agora é? –os outros entrelaçaram os braços dele nos seus e sorriram.

Nóooos vamos para o olho! O olho do furacão! Ele é terrível, é muito pior que um arrastão! Ninguém jamais voltou de lá, nem tem histórias pra contar! Porque, porque, porque, porque, porqueeeeee! O cão de lata vai nos dizer!

—AI, MINHAS POBRES ENGRENAGENS –Mickey estapeou a própria testa.

Nós vamos juntos para o olho, O OLHO DO FURACÃÃÃÃÃÃO!

—Epa! –os meninos trombaram com Luisa, que abriu um imenso sorriso. –AH! Vocês vieram!!! Estou tão feliz!

Ela fala como se tivéssemos sido convidados para um chá—disse Mickey, levando uma cotoveladinha de Jack.

—Oi Luisa. Desculpe os nossos modos mais cedo. A gente pensou bem no caso, e chegamos à conclusão de que você estava certa: não podemos mesmo nos separar, nem nos render à esses sentimentos que nos tomam conta. –disse o Doutor, para a felicidade dela. –Nós vamos com você até o fim disso, independente de onde isso nos leve!

—É! –os outros apoiaram.

—Mesmo que a gente tenha que cruzar o furacão!

—É!

—Mesmo que a gente tenha que rastejar na lama para sobreviver!

—É!

—Mesmo que a gente tenha que voar por cima das nuvens pra encontrar a saída do labirinto!

Jack olhou para ele.

—Acho que está acreditando demais nas suas capacidades agora. Vá com calma.

—Tá legal. –aderiu o Doutor.

—Moderação é sempre bom. –concordou Mickey.

Luisa deu risada e os abraçou.

—É muito bom ver todo mundo reagindo melhor! Estou muito feliz –falou, realmente orgulhosa. Eles coraram um pouquinho, mas retribuíram o abraço.

Durante o abraço, Jack olhou mais adiante e viu uma coisa estranha: A chuva parecia começar a cair do céu, mas vinha caindo em diagonal, com toda a fúria na direção deles.

—GALERA! OLHA A CHUVAAAA!!! –Jack apontou, desesperado. O abraço se desfez, mas antes que pudessem fazer qualquer coisa, a chuva os pegou em cheio.

Em segundos, ficaram encharcados e começaram a tentar escapar daquela aguaceira que os deixava desorientados e atrapalhava sua visão; Tropeçaram, se perderam uns dos outros, não sabiam mais para onde ir nem o que fazer.

Ama! Ama!—disse K-9 com urgência, no meio daquela confusão.

—K-9? Onde você está?

No abrigo, ama! Meus scanners conseguiram rastrear a entrada!

—Ótimo K-9!

Vou lançar um sinal para vocês todos seguirem e chegarem até esta unidade.

—Boa idéia!

E foi o que aconteceu. K-9 lançou uma luz vermelha, que atravessou a chuva, localizou todos e também serviu-lhes de “farol”, para encontrarem a direção do abrigo.

Imediatamente, Luisa correu na direção da luz. Os outros fizeram o mesmo, instruídos por K-9. Então Jack passou por uma figura de estatura média, petrificada no lugar, e parou.

—Mickey?

—É. Sou eu.

—O que está esperando? K-9 nos deu as instruções por telepatia! Temos que correr na direção da luz! É a única forma de escaparmos...

—Eu vou ficar.

Jack arregalou os olhos

—O QUE? POR QUE?

Eu gostei da vista—ironizou Mickey. –POR QUE VOCÊ ACHA? Eu sou de lata! Estou enferrujado aqui!

—M-mas você não é! Não é Mickey! Lembra? Isso é só coisa da sua cabeça...

—Não. É das minhas pernas mesmo. Elas não se movem!

—Isso é psicológico. Acredite em mim... Você não está se esforçando para crer que não é um Homem de Lata.

—Eu estou! Estou sim! Mas parece que não é o bastante!

—JAAAAACK! MICKEEEEY! VENHAAAAAM! –gritou Luisa, já a salvo com K-9 e o Doutor, embaixo da cobertura do abrigo.

—Está ouvindo? A Luisa acredita em nós! Ela sabe que somos capazes...

Mickey fechou os olhos, tentando se concentrar na idéia de ser um homem normal de carne e osso, e de suas pernas não poderem enferrujar com água; mas talvez fosse a pressão do momento ou mesmo o barulho da chuva, que estava atrapalhando seus pensamentos e o fez hesitar...

—Não consigo! Minhas pernas não se movem... –concluiu, para a inquietação do amigo.

—Ah, tudo bem. Deixa pra lá. Dá licença aí—Jack o carregou nas costas e levou-o para o abrigo. 


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Notas finais do capítulo

E aí? Estão gostando da minha versão de O Mágico de Oz? Ela tem um tom mais dark que a história original, mas admito que gostei bastante de explorar esse outro lado.

;)



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