Stranger Things 3: Rising Darkness escrita por Liv


Capítulo 1
Prólogo: As Vozes


Notas iniciais do capítulo

♥ Capítulo dedicado ao Samuel por ter me ajudado com as ideias ♥
Boa leitura!!!



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DALLAS, TEXAS

1984, cerca das 23h

.

Um. Dois. Três. Quatro. Cinco. Respira.

Um. Dois. Três. Quatro. Cinco. Respira.

A sequência era repetida de novo e de novo, sem jamais parar. Cinco segundos submersa, virando a cabeça para o lado no sexto, enchendo os pulmões de ar e novamente tombando o rosto para dentro da água fria. Já estava há mais de três horas naquele mesmo percurso por toda a extensão da piscina. Seu corpo nunca ficava tão cansado, todavia, sua mente jamais ficava tão serena quanto quando imersa. Os braços esticados faziam movimentos circulares. Meio circulo dentro d’água e meio circulo fora, à medida que os pés sacudiam para baixo e para cima no intuito de adquirir maior velocidade. Os olhos permaneciam fechados, não havia qualquer necessidade de ver onde estava a parede, pois foram tantas as vezes que nadara ali que o corpo e mente já pareciam ter gravado no inconsciente cada centímetro do local.

Os músculos reclamavam, distribuindo dor a cada movimento, todavia, dor era algo familiar. Muito familiar. A dor física nada era em comparação ao terrível incomodo cerebral que tinha em si. Desse modo, trocava facilmente uma pela outra. Não era um caso isolado esse seu, pelo contrário. Qualquer ser humano é capaz de trocar a dor emocional pela física. Os casos de depressão crônica são o exemplo disso, levando geralmente à auto mutilação, que existe na tentativa de, ao menos por um segundo, diminuir a dor crescente na alma ao machucar a própria pele. Poucos são os que entendem e menos ainda são os que admitem                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                            entender. Humanos são tolos, por vezes tolos até demais.

Eram raras as vezes que não havia nada em sua mente senão os próprios pensamentos. Como se houvesse crescido num local onde o barulho era infindo e então se mudasse para um novo lugar completamente silencioso, onde até a própria respiração já é como um grito para quebrar o silencio. Haviam tantas vozes ao redor que vez ou outra temia acabar esquecendo a sua própria.

Após o longo período nadando, enfim parou os movimentos, aguardando alguns segundos até mergulhar profundamente na piscina, alcançando o chão. Os olhos permaneceram fechados e o ar lentamente deixava seu corpo, permanecendo naquele ambiente sem qualquer som. Sem ninguém. Já conseguia ficar mais de cinco minutos embaixo d’água, tendo aprendido a como respirar propriamente para o ar não faltar muito rápido. O método exigia completa calma e concentração. Completa paz e silencio. Seu ambiente pacífico foi quebrado quando sentiu uma terrível pontada na cabeça. Encolheu-se, se assustando com a sensação que surgira de repente, principalmente estando na água. Os olhos foram abertos devido ao susto, lhe dando primeiro uma visão turva e embaçada, aos poucos ganhando nitidez e formato. Soltou o restante de ar que restava nos pulmões ao ver fiapos vermelho-escuros flutuando lentamente em sua frente. Levou uma das mãos para o próprio nariz, erguendo os dedos para o campo de visão e encarando a mancha de sangue. Usou o chão como impulso para jogar o próprio corpo para cima, não tardando a atingir a superfície.

As vozes voltaram com absurda e dolorosa rapidez, causando uma careta em sua face. Com completa inutilidade, tapou os ouvidos, coisa que sempre fazia ainda que soubesse muito bem que jamais funcionaria. Não vinham do ambiente onde estava, mas sim de muito além. Jogou o corpo para fora da piscina, se apoiando nos próprios braços para sair da água e logo se erguer, bambeando um pouco. Esse era o problema. Sempre que ficava muito tempo sem as vozes, era sempre doído quando retornavam para si. Caminhou o mais rápido possível para onde suas coisas estavam, se enrolando numa toalha e sentando-se. Os olhos novamente foram fechados e a cabeça imediatamente caiu para frente, como se houvesse perdido a consciência.

O barulho desapareceu e o som do silencio tornou a tomar conta, mas não por muito tempo. Começou com um sussurro, aumentando o volume devagar até ser capaz de ouvir claramente.

Fechar.

Fechar.

Fechar.

Não sabia bem o que significava, contudo, seu interesse não era bem entender a situação e sim ouvir.

Portal.

Um portal?

Fechar o portal.

Mais uma vez, seus olhos se abriram abruptamente, ignorando a enxaqueca e revirando a bolsa que levara consigo, vestindo a calça larga e a camiseta de moletom antes de colocar os pés nos tênis de qualquer jeito, sem sequer amarrá-los ou calçá-los propriamente. Apenas correu. O máximo e o mais rápido que pôde, passando pelos longos corredores do prédio até alcançar a escadaria. Quase pulou os degraus, querendo chegar mais rápido em seu destino. Logo chegou à entrada de uma nova ala, onde dois homens estavam parados na porta dupla, usando uniforme e segurando uma espécie de arma que ainda não conhecia. Provavelmente eram tipos novos. A dupla a encarou, colocando-se em seu caminho.

—–— Preciso falar com ele. Foi tudo o que disse, com a voz calma e neutra. Apenas encarava a porta em sua frente, tentando focalizar em seu destino e não no que acontecia em sua volta. —–— Agora.

Criaturinha imunda! Até parece que é chefe para mandar em mim. Eu bem poderia explodir os miolos dela agora mesmo. A boca do guarda da direita estava fechada, mas pôde ouvir com precisão sua voz.

A cada novo dia esses cães pensam controlar esse lugar. Onde já se viu. Foi a vez do da esquerda.

—–— Você não pode entrar agora. O da esquerda respondeu.

—–— Mas eu que preciso fal...

—–— Tem problema de audição por acaso? Eu disse que. Você. Não. Pode. Entrar. Entendeu? Olhou para o da direita, que dissera tudo de forma grosseira e mau humorada, não que fosse um humor raro ali dentro.

Com um suspiro frustrado, deu um sutil passo à frente, erguendo a mão direita para tocar o homem na direção oposta. Alcançou sua mão enluvada, que segurava a arma. No momento seguinte, ele apontava o objeto para o lado, mirando no companheiro de posto. O outro ficou tão perplexo com a atitude alheia que sequer notou que a outra mão da criatura que chamara de inútil fora em contato com a sua. Dando três passos para trás, observou a agonia nos olhos dos dois homens que apontavam suas armas um na direção do outro. No segundo seguinte, um barulho alto cortou o ambiente, deixando dois corpos caídos no chão, tendo suas cabeças explodidas. Observou-os sem qualquer incomodo, puxando a arma de um deles e empurrando as portas duplas.

Adentrou então num outro corredor, mas agora cheio de salas com paredes de vidro, ao menos a maioria, revelando o que os trabalhadores do prédio realizavam ali dentro. Certamente não houve um que não virou os olhos para a pessoa de pé ali, com sangue escorrendo do nariz, sangue alheio respingado no rosto e nas vestes e, é claro, uma arma nas mãos. Nenhum olhar era de surpresa, mas sim frustração ou impaciência. Sabia o que passava na mente deles, mas não ligava o suficiente para ouvir o que as vozes diziam em sua cabeça. Andou com pesados e ligeiros passos até uma das últimas salas do corredor, a única com todas as paredes cobertas, empurrando a porta usando a ponta da arma. Lá dentro havia uma enorme mesa de madeira, rodeada por um grupo de cadeiras, sendo preenchidas por homens e algumas mulheres. Seu olhar caiu para a ponta da mesa, num homem alto, esguio e de cabelos brancos. No semblante dele não havia decepção, ira ou algo do gênero. Não havia nada em especial, ele apenas parecia esperar para saber o que queria ali.

—–— Não treinei com essa arma ainda. Disse, erguendo o objeto para os cientistas.

—–— Chegaram esta manhã. O homem de cabelos claros respondeu, com um sorriso gélido e quase imperceptível.

—–— Sobre o que estão falando?

—–— Você pergunta como se não fosse meramente capaz de saber. E ele estava certo. Ela sabia. Era sobre o garoto, que não era uma experiência, que não fora treinado e criado num laboratório, mas que tivera de ser arrastado para aquele mundo horrendo. Estavam estudando a situação dele.

—–— Will Byers. Respondeu, assentindo e recebendo o mesmo gesto do homem que encarava.

—–— Quantos foram dessa vez?

—–— Dois. Murmurou, um pouco desconfortável. —–— Não me deixaram entrar.

—–— Entendo. Ele não entendia, na verdade. Mas ignorava, eram danos colaterais. Isso que dizia todas as vezes que alguém reclamava a respeito. —–— Não poderia ter esperado? Balançou a cabeça novamente, agora em negativa ao que ele questionara.

—–— Não, você precisava saber.

—–— Saber do que?

—–— Que ela voltou para Hawkins. Foi tudo o que disse, agora tendo expressões de espanto no semblante alheio. Todavia, não parou para encarar a cena por muito mais tempo, virando-se e tomando o caminho de volta para onde estivera durante a maior parte do dia: A água.


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