San Peter: A Escola dos Mimimis Amorosos (Vol.2) escrita por Biax


Capítulo 82
158. Sobrecarregada




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Quando chegamos no refeitório, de longe vi Lili, James, Júlio e Bebê na mesa que sempre ficávamos. Yan e eu pegamos nossos lanches e fomos para lá.

— Você que é teimosa — retrucou Júlio. Eu tentei entender o que estava acontecendo.

— Eu já falei que depois vou parar. — Lili segurava um livro, apoiado na mesa, perto de uma xícara de chá.

— Lili, eu não disse que era pra descansar? — falei, sentando em sua frente.

— Depois do café, sim.

— Não era nem pra você ter trazido esse livro.

— É, mas eu esqueci que amanhã tem atividade oral de francês. Mon français n'est pas bon.

— Ninguém entendeu nada — disse Bernardo. — Só eu.

— Vocês não vão ter essa atividade?

— Vamos.

— E você não tá nervoso?

Ne pas.

— Me dá um pouco da sua confiança, então.

— Se desse, até daria. Quer treinar um pouco depois?

— Não, a Lili vai descansar — intervi.

— Ela pode descansar enquanto fala.

Encarei Bebê seriamente e ele desistiu, dando uma mordida em seu sanduiche. Lili fechou o livro e tomou mais um gole de chá, ignorando os olhares sobre ela.

Um assunto surgiu e esquecemos de encher o saco da Lili. Ficamos lá, conversando e comendo. As cinco, James, Yan, Bebê e eu fomos para o teatro. Estávamos retomando a história toda, acrescentando detalhes, provando as roupas nas cenas e os cenários. Nem parecia que daqui uns meses iriamos apresentar a peça para a escola toda.

Pelo menos na janta, a Lili não desceu com um livro e comeu razoavelmente bem. Não precisei ameaçá-la. Fiquei com ela o resto da noite e fomos dormir.

Acordei de manhã e me troquei. Peguei minha mochila e fui até o quarto da Lili, para ver se estava tudo bem. Dei uma batidinha e abri a porta, vendo que ela inda estava dormindo. Larguei a bolsa na mesa e me aproximei, tocando seu ombro.

— Lili? — Ela abriu os olhos, resmungando. — Você tá bem?

— Eu... — E pigarreou. — Acho que não.

— O que foi? Tá sentindo o quê?

— Minha cabeça tá latejando... — Se arrastou, sentando com uma carinha de doente. — Minha garganta arranha e... acho que estou com febre. Tô tremendo de frio.

Coloquei a mão em sua testa, vendo que ela estava muito quente, assim como sua bochecha e pescoço.

— Melhor ir pra enfermaria. Se troca e vamos lá.

Parecendo fazer esforço, Lili levantou e trocou de roupa, vestindo uma calça grossa e um moletom com touca. Vestiu os tênis, eu peguei minha mochila e fomos para o corredor. Andamos devagar pelas escadas e ela se encolheu quando saímos para o frio congelante do jardim. Caminhamos no passo dela até a enfermaria, e quando chegamos, explicamos para a senhora, que fez Lili sentar na maca enquanto pegava um termômetro.

— Vai tomar café, Bru — disse ela, enquanto a enfermeira colocava o termômetro debaixo do seu braço. — Eu não vou fugir, prometo.

— Tudo bem, antes de ir pra sala eu volto aqui. — Ela concordou, e eu fui para o refeitório.

Peguei meu café e fui para a mesa dos meninos, que já estranharam por eu estar sozinha, e expliquei assim que me sentei.

— Eu sabia que alguma hora ela ia ficar doente — comentou James. — Ela não para de estudar um minuto. Tá muito sobrecarregada.

— Eu acho que tem mais a ver com o Viktor — disse Bernardo.

— Como assim? Eles brigaram? — perguntou Júlio. Ele era o único que estava de fora das “novidades”.

— Ele vai embora. — James respondeu, mexendo sua salada de fruta com o garfo. — No ano que vem.

— De novo? — Júlio ficou surpreso, e aparentemente um pouco bravo.

— Ele vai fazer faculdade em Minas. A Lili sabe que é importante pra ele, e entende, mas... eu sei que ela tá chateada.

— E agora ela tá evitando ele, provavelmente porque não quer dizer o que realmente tá sentindo — falei.

Júlio negou com a cabeça. — Vocês não sabem que a Lili precisa ser pressionada pra falar o que pensa? É sempre assim.

— Vocês acham que eu devo... avisar o Viktor? — perguntei para todos.

— Pelo menos na enfermaria, a Lili não tem como fugir.

— A gente não deveria forçar ela desse jeito — ponderou James. — Uma hora ou outra ela vai ter que conversar com ele, mas aí ela que vai decidir a hora.

Algumas cabeças viraram ao mesmo tempo e eu senti uma movimentação atrás de mim, e assim que me virei, vi Viktor se agachando ao meu lado.

— Oi, Bru. Cadê a Lili? — indagou, baixinho.

Hesitei em dizer. Se a Lili não queria falar, e James achava que não era boa ideia forçar um diálogo, agora ela não teria saída.

— Ela estava com febre por causa da gripe...

Seu cenho franziu. — Ela tá na enfermaria?

— Sim.

Rapidamente, Viktor levantou e seguiu para fora. Virei de volta para a mesa com cara de quem estava arrependida, mesmo sabendo que eu não tinha muita escolha.

— Você não pode proteger ela o tempo todo — apontou Bebê. — Eles precisam conversar de uma vez, e se dependesse da Lili, ela ia arrastar isso até quando pudesse.

— Eu sei...

— Se ela não ir para a aula, vamos lá ver como ela está, antes do almoço. — James me olhou, me dando um pouco de conforto. Eu concordei.

Terminei de comer um pouco antes dos meninos e fui ficar um pouco na mesa do Yan e do Gabriel. Contei sobre o caso da Lili e eles concordaram que ela teria que conversar com o Viktor cedo ou tarde, e mesmo que eu não tivesse ido atrás dele, ele teria ido atrás dela. Faz sentido.

A Lili não foi pra aula, então quando o último sinal tocou, deixamos nossas mochilas na mesa e eu e James fomos para a enfermaria. Não adiantaria ir todo mundo, já que não poderíamos entrar todos juntos. A enfermeira nos deixou entrar na salinha e encontramos Lili deitada na primeira maca, coberta até o queixo, virada para o outro lado.

Me aproximei, sentando na ponta da maca ao mesmo tempo que segurava seu ombro.

— Lili?

Ela abriu os olhos e se virou, nos vendo ali. Seus olhos estavam inchados, e eu tinha quase certeza que não era por estar dormindo.

— Oi... — Deu um sorrisinho desanimado.

— Como você se sente? — James questionou, também chegando perto.

— Um pouco melhor. Eu tomei um remédio pra febre. Eu estava com trinta e oito e alguma coisa... Tô começando a suar.

— Isso é bom.

— É, se eu piorasse, meus pais teriam que vir aqui e me levar pro hospital. — Ficamos em silêncio uns segundos, sem saber como começar o assunto. Ela suspirou e se sentou. — Eu terminei com o Viktor.

James e eu nos olhamos, surpresos.

— Vocês não conversaram...?

— Sim, conversamos. Um pouco alto, no começo, mas depois foi... tranquilo. A enfermeira deve ter ouvido tudo, coitada.

— E como foi?

— Bom, ele veio perguntar como eu estava, reclamou que eu fico evitando ele o tempo todo, que sentia falta de ficar comigo, e eu perguntei se ele ia sentir minha falta quando estivesse em Minas, e ele ficou quieto. Daí eu comecei a despejar o que eu estava pensando sem nem perceber, só fui falando e começando a chorar e... Foi difícil. Me senti um pouco culpada, porque afinal ele não tem culpa, ele tá indo atrás dos sonhos dele, eu que tô aqui parada igual uma estátua... Enfim, eu falei que era melhor terminarmos antes dele ir de vez, porque senão seria complicado e eu não queria passar por aquilo de novo.

— E ele? — James indagou.

— Ele não queria, porque queria aproveitar os últimos meses comigo antes de ir, mas... ele me entendeu. Não vamos... ficar sem conversar. Ainda vamos conversar de vez em quando, lá em casa, aqui ou sei lá onde. Só não estamos mais juntos. É isso.

James colocou o braço no ombro dela, e Lili acabou por abraçá-lo. Me juntei a eles, esperando que Lili sentisse que estávamos ali para ela. Ficamos ali mais um tempinho, falando sobre as coisas que tiveram nas aulas e depois fomos almoçar. Explicamos a situação pro pessoal e pelo menos ficamos mais aliviados de que ela estava melhor da febre.

Lili não foi para as aulas extras e, quando eu fui para o quarto, depois da aula de ilustração, vi uma mulher saindo do quarto dela. Uma moça que eu nunca tinha visto. Guardei a mochila e fui para o quarto da Lili.

— Tá melhor? — perguntei quando entrei, a vendo deitada na cama.

— Sim, bem melhor. — Sorriu.

— Quem era aquela moça que saiu? — Me sentei no colchão, de frente pra ela.

— Marina. Ela é uma das psicólogas que trabalham na diretoria.

— Psicóloga? — Fiquei confusa.

— É... A enfermeira me disse que acha que essa gripe é mais emocional do que outra coisa... Perguntou se eu queria conversar com alguém sobre... as minhas dúvidas. Daí eu aceitei e ela veio aqui depois que eu subi.

— E como foi?

— Estranho. Bem estranho. Falar dos seus problemas e medos pra alguém desconhecido é esquisito. Mas, bom, eu falei. Ela foi muito atenciosa, me ouviu o tempo todo e depois começou a falar coisas que eu nunca tinha percebido, mesmo que fosse óbvio.

— Tipo o quê?

— Tipo... que eu estou estudando igual uma condenada, fazendo todas as aulas possíveis porque tenho medo de não ter uma... profissão decente, digamos assim. Eu tenho medo de não ser ninguém, de não fazer diferença no mundo... Então eu estou sempre tentando encontrar algo que eu realmente goste de fazer pra trabalhar futuramente, só que até agora eu não encontrei nada.

— Nada, nada?

— Não... Eu não sei o que vou fazer de faculdade, não sei com o que quero trabalhar.

— Não podemos ser adolescentes pra sempre? Seria tão mais fácil.

Ela riu. — Sim, seria. Eu ainda não sei o que quero fazer, mas pelo menos consigo enxergar isso, sabe? Tenho essa noção. Acho que essa decisão do Viktor em estudar longe acabou me fazendo me sentir ainda mais pressionada pra escolher logo um caminho.

— Ainda temos tempo, Lili. E mesmo assim, você não precisa fazer faculdade logo que terminar a escola.

— Eu sei, mas parte de mim não quer ficar parada... Eu entendi essas coisas e acho que consigo lidar melhor com isso agora. A Marina me ajudou bastante.

Sorri. — Que bom, fico feliz por você estar melhor.

Lili abriu os braços e eu me aproximei, a abraçando apertado.


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Notas finais do capítulo

Poxa, Lili :/ Estamos aqui para dar uma força, assim como todo mundo.

Até mais o/



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