Vinte e um dias haviam passado desde a última conversa, três semanas, que para o jovem de cabelos pretos haviam sido como três segundos. Seu desejo era que o tempo não passasse e parasse por bons anos, para que pudesse aproveitar os amigos e todo o turbilhão que lhes acompanhavam, no entanto os ponteiros do relógio se apressaram.

Dentro do cômodo, bem iluminado pelos raios do sol que se infiltravam pela fina cortina marfim que decorava a grande janela em uma das grossas paredes, Jeon Jungkook se forçava a arrumar suas malas. Utilizaria apenas uma, simples, grande e marrom, mesmo assim demorava para aprontá-la pensando em como combinar as peças e quantas opções diferentes elas lhe dariam, assim talvez pudesse manter todos os outros pensamentos conturbados distantes de si.

Seu quarto, não seria mais seu quarto, seria apenas um espaço em branco para aqueles que conheciam, para ele...Bem, ele não se lembraria, certo?

Denso. O clima no ambiente estava assim, reflexo dos pensamentos que pairavam no ar, parecia que uma  nuvem negra repleta de medo, receio, angústia e saudade, inundava o quarto do mais jovem.

— Tenho mesmo que ir? — Perguntou, quebrando o silêncio entre ele e a sereia que se mantinha sentada no ponto oposto da cama de casal que o moreno usava para dormir.

A vida do garoto sempre foi baseada em fragmentos, respostas ocultas e códigos que ninguém entendia, nem ele mesmo. Suas peças lhe faltavam e por isso sempre funcionou pela metade. Entretanto, muitas coisas faziam sentido agora, finalmente tinha cor, mas ele teria que ir e deixar tudo para trás, a idéia lhe tirava o ar, mesmo assim ele se mantinha firme, não queria atrapalhar a noona, se para ela esta era a melhor opção, então certamente era, raramente duvidava de sua "irmã mais velha".

— Sim, Kookie.  — Mesmo que tentasse acobertar com um sorriso torto, o pesar em sua voz era nítido. Tentou encorajá-lo de diversos jeitos nas últimas semanas, havia falado tanto da "maravilha" que seria a nova vida em Busan que o assunto se tornou clichê. As tentativas de animá-lo não haviam funcionado nenhuma mísera vez, todavia Yumii sempre teria um encantador sorriso torto para mostrar. Era inegável para ela que havia uma enorme necessidade em tê-lo perto, mas não podia ser egoísta, a vida do rapaz seria melhor longe das confusões sobrenaturais e dos seres que as acarretavam, poderia dar a ele algo que nunca teve, sossego e paz.

— Vou sentir sua falta. — Murmurou, quase inaudível, com a voz mais rouca devido ao baixo tom. A sereia não se conteve e se levantou para dar um abraço caloroso no mais novo, um abraço cheio de amor e saudade, mesmo que ninguém houvesse partido, ainda.

— Eu também — Respondeu no mesmo tom. Seus olhos estavam marejados e os dois se seguravam para não chorar. Ambos tentavam eternizar cada segundo em suas memórias, não queriam deixar nada passar, por mais pequeno que fosse o detalhe, como por exemplo o cheiro do shampoo de Mii que lembrava amêndoas e o doce perfume de seu protegido que contagiava o apartamento inteiro. "Não há como não saber por onde ele passou, os lobos devem odiar esse perfume", pensou ela e riu baixinho. "Sereias tem um pouco de cheiro de peixe", foi a vez de Kookie pensar e retribuir a risada.

Ele tinha um pequeno plano em mente, algo para lhe devolver um pouco da paz interior e tinha que colocar isso em prática. Saiu do calor dos braços da que o acompanhava para lhe fazer um simples pedido.

— Noona, você pode pegar meus moletons no varal? Eu esqueci de pegar e ainda tenho que colocar muitas coisas na mala, estou com medo de me atrasar. — Justificou-se com uma voz e expressão tão fofa que tornou impossível o fato do seu pedido ser negado.

A ruiva assentiu e saiu para findar os assuntos pendentes do jantar e realizar o pedido inegável do amigo. Não desconfiou de nada.

Jungkook esperou que ela saísse, olhando de soslaio, como um gato a espreita, até que em um movimento rápido tirou uma foto de uma das molduras douradas que ficavam no criado mudo ao lado de sua cama. A imagem havia sido retirada no parque e se tornou sua favorita, com dor ele a dobrou e guardou-a dentro de um medalhão. Era um colar antigo e também muito importante, com detalhes em relevos e na cor ouro velho, não sabia o motivo da importância que ele tinha para ele, porém ele tinha, então apenas o guardava. Colocou o objeto em um bolso secreto da mala e deixou ali, satisfeito. Talvez o objeto e a fotografia pudessem no futuro lhe guiar de volta para casa.

A porta do quarto não estava fechada, não demorou para sentir a presença de alguém, o ser havia se escorado na batente.

— Está com cara de quem aprontou. — Taehyung mencionou brincalhão, o outro rio nervoso, confirmando as suspeitas do shadowhunter. — Fique tranquilo, eu não vi o que você estava fazendo. Mas é bom estar certo.

Tae já se sentia em casa, era como se o quarto do maknae fosse o seu também. A euforia de saber que naquele cômodo haviam dois shadowhunters ainda não havia o abandonado e ele acreditava que Jeon seria seu parabatai um dia. Sentou-se na cama e o dono do futuro título se sentou ao seu lado, deixando as malas para depois.

— Não quero ir. — Lhe confidenciou, enquanto brincava com as mãos, gesto que ressaltava sua inquietação. — Mas não posso atrapalhar a Noona.

— Aish, Jungkookie — Pronunciou arrastado, com a língua entre os dentes, de um jeito que só ele sabia fazer.

— Eu sei, eu sei! É o melhor para mim. — Repetiu para si e não conteve uma longa revirada de olhos. Não queria e não podia cultivar raiva de Miinie, então apenas se calou. Tae respondeu com um abraço de urso, aproveitando para afagar os fios negros de Kookie.

— Eu sinto que você pertence a este lugar, e quando se pertence a um lugar, sempre se voltar para ele. — Suas palavras, repletas de convicção, eram ditas mais para ele mesmo do que para qualquer outra pessoa. Seu dever era crer que ele voltaria.

Jungkookie sorriu pela tentativa de conforto, apoiou sua cabeça no ombro do Hyung e se permitiu chorar, sem fazer barulho algum, apenas deixando as lágrimas rolarem por suas bochechas. A frustração lhe escapava pelos olhos. O mais velho o aconchegava o máximo que podia em seus braços, deixava-o desabafar, não falou nada, mas ainda conseguiu lhe dizer que ele sempre estaria ali. Ficaram assim até que Yumii lhes avisasse que todos os aguardavam para o jantar.

Jeon correu para lavar o rosto, não queria permanecer vulnerável. Enquanto fazia isso, Taetae terminou de arrumar sua mala com as peças que Yu havia trago e depositou ali um presente para o companheiro, um colar banhado em ouro, o pingente era um vira tempo e em sua base havia uma pequena runa parabatai.

Os três foram juntos até a sala de jantar e o mais novo sorriu largamente ao ver Jimin, Namjoon, Somin e Baek ao redor da mesa farta.

— Pelo visto vocês querem que eu saia daqui uma bolinha. — Comentou divertido. Nunca havia visto tanta comida na vida, um mimo de sua protetora.

— É que rolando você vai chegar no seu destino mais rápido, Hamster. — Jimin, suas piadinhas e apelidos incomuns não poderiam faltar em uma despedida.

— Vou exigir vingança e acabar com essa sua forma. — Forçou uma careta para tornar mais séria sua ameaça, no entanto logo voltou a falar com Taehyung. — Existe uma runa para isso?

Todos na mesa acabaram rindo devido ao tom e a inocência usada. Os três se aconchegaram nas cadeiras e começaram a aproveitar do tempo restante juntos.

A noite não poderia ter sido melhor, comeram, riram e se divertiram bastante. Somin pode vislumbrar mais do irmão mais novo e passou a admirá-lo mais. Jimin estava adorando o fazer rir. Os outros se afeiçoaram ainda mais ao garoto.

Infelizmente, a noite passou rápido, acompanhando todas as outras coisas, a hora de partir havia chegado. Iriam partir de noite, escolha de Yumii, não me questionem sou apenas um narrador. Voltando: Namjoon colocou as malas no carro, Tae, Kook, Jimin e Yumii entraram nele também, foram o mais rápido possível para a estação e por sorte as ruas não estavam cheias. Ao chegar lá, todos mantinham um sorriso de gratidão no rosto, gratidão a existência do mais novo, a aprendizagem que ele havia proporcionado, as situações que os tornaram amigos e muitas outras singularidades. Não foi preciso de palavras, cada gesto, cada olhar e cada segundo mostravam isso e o jovem prestes a partir compreendia tudo, mesmo sem os pais agora ele compreendia o que era uma família.

O trem chegou na plataforma, ele entrou e sentou-se no lugar devido, perto da janela. Algumas lágrimas ameaçavam sair, assim como em Yumii, Taehyung se mantinha cabisbaixo e Jimin acenava de um modo engraçado que o fez rir. O warlock preparava o feitiço. Ouviu-se a voz de uma mulher anunciando a próxima parada e o trem partiu. O potente feitiço foi lançado e Jungkook adormeceu.

Algumas horas depois ele chegou ao seu destino, acordou e o que estava fazendo ali? Algumas lágrimas escorreram por seus olhos, estava atônito, devia ter ficado acordado até e por isso os olhos arderam e lhe causaram às lágrimas. Pegou sua mala e saiu em direção a sua casa, estava esquecendo de algo, algo muito importante... Talvez fosse um compromisso.