Come Together escrita por lamericana


Capítulo 5
Capítulo 5




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/744639/chapter/5

Eu já esperava por isso, mas não que durasse por tanto tempo. Todo mundo estava falando da festa, mesmo quase dois meses depois. Só faltava sair uma manchete no jornal da cidade, na coluna social. Já imagino a manchete: “Forasteira namora com filho de respeitado membro da comunidade”.

Como se tornou rotina, Matthew tava me esperando no meu armário. Dessa vez, ele segurava uma única flor e fez uma cara exagerada de arrependimento.

— Me desculpa por não ter aparecido ontem pra sair com você? – ele se desculpou

— Tudo bem. Não vou morrer por causa disso. – tirei por menos – E pra quem não gosta de ser o centro das atenções, você está se dando muito bem.

— Acho que já me acostumei. Queria te fazer uma pergunta. – ele pareceu nervoso de repente – Podemos mudar um pouco os planos de hoje?

— O que você tem em mente? Pensava que você amava ir no Alfredo’s.

— Não me leve a mal, adoro o Alfredo’s. Mas eu queria fazer alguma coisa diferente hoje.

— Tudo bem. Pode me surpreender.

Ele beijou minha testa.

— Passo na sua casa na hora de sempre. Agora tenho que ir. Tenho que entregar um trabalho agora na aula de inglês. Te vejo no almoço?

Concordei com a cabeça e peguei meu livro de biologia. Assim que me virei, vi que Matthew já não tava mais ali e quase dei de cara em James.

— Hm, oi. – eu disse, tentando desviar dele e andar para a sala

— Oi. Sei que você e o Matthew estão juntos pra valer e tudo mais... – ele começou

— Você quer me chamar pra sair, é isso? – interrompi – Se for, desculpa, mas não vai rolar. Tenho planos com meu namorado. E você deveria ter planos com a Becca, não?

— Não, não é nada disso. Eu tenho planos com a Becca. Mas esse é o meu problema. Eu queria um conselho de alguma menina para o que eu dou de presente pra ela.

— Ah. Não sei. Do que Becca gosta, além do anuário e de festas?

— O normal, acho. Música, dançar, maquiagem...

— Alguma coisa te chama a atenção nela? Porque isso é muito vago, James.

Ele pareceu pensar um pouco.

— Talvez o cabelo dela. Acho que acabei de ter uma ideia. Obrigado.

Ele me abraçou antes de sentar. A professora começou a mandar os outros alunos se sentarem. Ela parecia abatida.

— Como alguns de vocês já devem saber, ano passado, o professor de espanhol conseguiu ser “curado” – ela desenhou aspas no ar – de um câncer. Essa semana, ele, infelizmente, encontrou outro tumor, uma metástase do original.

O que ela dizia parecia um gatilho pras memórias que eu tinha represado sobre a minha mãe. Tentei segurar as lágrimas que vinham, mas foi mais forte que eu. Peguei minha mochila no chão, levantei e saí. Murmurei um pedido de desculpas e fui me abrigar no banheiro.

— Não podemos contar a ela desse jeito, Edmund! – minha avó por parte de mãe reclamava – Ela ainda é muito nova. Não vai entender.

— Mas é a mãe dela. Ela vai sentir falta e não quero ter que mentir pra minha própria filha.

Me aproximei do meu pai.

— Papai, cadê a mamãe?

Ele me pegou no colo antes de responder.

— Querida, mamãe não vai poder voltar pra casa.

— Porque, papai? Ela não quer saber mais da gente?

— Não é isso, meu anjo. – ele deu uma pausa – Lembra que a gente achava que mamãe tava esperando um bebê? – concordei com a cabeça – Não era um bebê, querida. Mamãe tava com uma doença chamada câncer.

Alguém bateu na porta do reservado.

— Pru? Sou eu, Stella. – ela chamou do outro lado. Enxuguei as lágrimas – Tá tudo bem aí?

Abri a porta e ela pareceu se espantar um pouco com meu estado.

— Eu só não aguentei. – dei de ombros

— O que foi que houve? – ela me pressionou

— Minha mãe. Ela morreu de câncer há alguns anos. Pelo que meu pai acabou me contando depois, era de um tipo totalmente tratável, mas foi descoberto tarde demais.

Stella me abraçou. Quando se afastou, sugeriu que eu lavasse o rosto e me prometeu que falaria com a professora de biologia que eu não estava bem, no tanto que eu fosse pra enfermaria. Concordei e ela voltou pra sala.

No caminho da enfermaria, vi Matthew do lado de fora da sala de inglês. Diferente de Stella, a primeira reação dele foi de preocupação.

— O que houve, anjo? Você tá bem? – ele me abraçou e as lágrimas voltaram pros meus olhos

— Sabia que o professor de espanhol tá com metástase de um câncer? – foi o que consegui responder

Ele me embalou, indo comigo até a enfermaria.

— Onde quer que a sua mãe esteja, ela deve estar orgulhosa de você.

Entramos na enfermaria, que estava vazia. A enfermeira estranhou a nossa entrada e veio logo me acudir, achando que eu estava passando muito mal.

— Não é nada. – Matthew respondeu antes que ela perguntasse

— Se não é nada, acho que posso cuidar dela, senhor Stuart.

— É Cooper.

— Acho melhor o senhor ir para aula. Posso cuidar da sua namorada direitinho.

O ar começou a ficar difícil. Apertei a mão de Matthew. Por conta da falta de ar, não consegui distinguir a movimentação. Apenas senti o frio do metal da bombinha e dos dedos de Matthew, empurrando a minha mão na direção da minha boca. Quando consegui respirar de novo, vi que a enfermeira tinha mudado a expressão em relação a Matthew. Ela pareceu anotar alguma coisa numa ficha. Provavelmente o meu ataque.

— Quer que eu fique aqui com você? – ele perguntou

Concordei com a cabeça.

A enfermeira voltou pra minha frente. Ela parecia um pouco preocupada.

— Querida, qual seu nome? Tenho que anotar na ficha e vou ter que ligar pros seus pais.

— Prudence Aoife Shine. – ela anotou no topo da ficha

— Você fica de olho nela enquanto vou na secretaria?

Matthew disse que sim e se sentou na cadeira de plástico do meu lado. Ele fazia um carinho na minha mão. Ficamos em silêncio. A enfermeira voltou e avisou que meu pai já estava a caminho pra me buscar. Ela começou a escrever num papel na escrivaninha e o entregou a Matthew.

— Ficha pra entregar pro professor de inglês. Você vai ficar em casa sozinha o dia todo?

— Meu pai vai ficar comigo. Provavelmente pra entender o que aconteceu. Ele faz isso quando eu tenho um ataque na escola. Mas ele normalmente volta pro trabalho de tarde. Eu ainda vou sair com você hoje. Fique tranquilo.

— Qualquer coisa, pode me ligar. Posso ficar com você.

— Eu aviso. Vai pra aula. Não quero que fique em detenção por minha causa.

Ele saiu relutante. Não demorou muito para que meu pai chegasse. Ele demonstrava menos preocupação do que eu sabia que sentia.

— Eu to bem. – falei assim que ele me viu. Levantei os braços em sinal de rendição.

— Tudo bem mesmo? Trouxe a bombinha, né? – ele me bombardeou com as mesmas perguntas de sempre.

Balancei a bombinha na frente dele. Caminhei com ele até o estacionamento e parei na frente do fusca.

— Tenho como ir dirigindo. Você me segue do seu carro? – sugeri

— Tudo bem. Só não acelere muito.

Entrei no fusca e joguei a mochila no banco do passageiro. Fui dirigindo com um cuidado maior. Meu pai sempre ficava com medo de que eu pisasse um pouco mais fundo no acelerador depois de uma crise de asma.

Assim que pus os pés em casa, meu pai começou a velha reação pós crise: falou sem parar de como sou importante na vida dele, enquanto começava a fazer um chá na cozinha e checava o nível do remédio na bombinha. Quando foi checar o remédio, ele balançou a cabeça.

— Temos que marcar médico pra você. Tá com pouco remédio e você vai precisar.

— Tá certo. Posso marcar essa semana.

— Nada disso, mocinha. Da última vez que deixei você marcando sua consulta, você ficou sem remédio e teve que ser atendida às pressas na emergência. Sou eu que vou marcar. Ou melhor, nós vamos agora. Você nunca teve uma crise tão cedo.

— Pai, não precisa. É só que.... O professor de espanhol tá com metástase de um câncer que devia estar em remissão. Lembrei da mamãe. Tive uma crise de choro. Só isso.

— Tem certeza?

— Tenho.

— Mas você iria no médico pra deixar seu velho com a consciência tranquila?

Tive que rir. Nunca tinha chamado meu pai de “velho” na vida, mas toda vez que ele queria me convencer a fazer alguma coisa que eu não queria, ele usava esse truque. Aceitei ir no hospital.

Quando chegamos na emergência, a recepcionista pediu o de praxe: documentos, especialidade, qual a queixa. Assim que falei que o meu problema era uma crise de asma, ela pegou uma pulseira amarela e botou no meu braço. Um enfermeiro veio praticamente correndo pra me atender.

Ele me botou numa cadeira de rodas e me empurrou direto para um consultório. Um pai teve que acelerar o passo para poder acompanhar. No consultório, estava um médico que parecia recém-saído da residência.

— Bom dia... – ele checou na tela do computador – Prudence. Sou dr. Moore. O que houve?

Expliquei exatamente o que tinha acontecido na escola e que meu remédio estava acabando, mas que eu tinha o suficiente para, no máximo, mais uma semana.

— Qual o remédio que você usa? – entreguei a bombinha pra ele – Hm, interessante escolha de remédio. Tem algum efeito colateral por conta dele?

— Nunca senti nada de diferente. Tomo ele há anos, já.

— Certo. Já que você já está acostumada a esse remédio, vou continuar com ele. Mas queria pedir que você fizesse algum tipo de consulta psicológica, por conta desse gatilho emocional.

— Desculpa. Sem querer ofender, mas já fiz um milhão de terapias diferentes, acredite. E essa foi a única vez que tive uma crise de asma depois de uma crise de choro relacionada à morte da minha mãe. Acho que tem mais a ver com a crise de choro do que com a morte da minha mãe em si.

— Tudo bem. Mas antes de lhe liberar pra ir pra casa, vou pedir uma nebulização, tá certo?

Fui levada pelo mesmo enfermeiro pra sala de nebulização. A sensação era até reconfortante, com o ar espesso por conta do remédio. Meu pai fiou sentado do meu lado falando sobre as coisas que tinham acontecido há anos. Como quando tentamos ficar com o cachorro da minha avó, mas minha mãe acabou devolvendo o cachorro porque não queria ter que levar pra passear. E quando quebrei minha perna porque subi numa árvore logo antes de nos mudarmos pra Riverside.

— Onde você vai querer almoçar hoje? – ele perguntou e eu abri um sorriso de criança pequena

— Posso escolher mesmo o lugar ou vai ter filtro?

— Você realmente vai escolher.

— Tem o Alfredo’s. A comida não é nenhum tipo de refeição de verdade, mas é gostosa.

— Ok, vamos nesse Alfredo’s.

Quando o remédio terminou e fui liberada, mandei uma mensagem para Matthew, dizendo que tinha sido liberada do hospital. Não deu cinco minutos no caminho de volta pra casa, que recebi a ligação dele.

— A crise foi ruim a ponto de ir parar no hospital? – ele perguntou, claramente preocupado

— Não, mas tinha que tranquilizar meu pai. Mas você não devia estar na aula de álgebra?

— Acabou, já. Vai almoçar em casa?

— No Alfredo’s com meu pai.

— Então diz pra Emelie que eu mando um oi. Mais tarde ainda passo na sua casa.

— Até mais tarde.

Desliguei o celular e indiquei o caminho pro Alfredo’s pro meu pai.

— Quem era no telefone? – meu pai questionou – Seu namorado?

— Acho que a gente já passou dessa fase de ter ciúmes, né? E você trabalha pros pais do garoto. Não é como se eu tivesse namorando um total desconhecido.

— Sei que você não quer ter essa conversa, assim como eu, mas vocês se protegem?

— Acalma a sua mente de pai se eu disser que não rolou nada além de beijos?

— Mais ou menos. Mas entenda meu lado. Você é filha única. E eu sou viúvo.

— Porque você não aproveita que eu tenho idade e juízo suficiente pra ficar em casa sozinha e não sai? Por mais que eu te ame, às vezes é chato ser a única presença feminina na sua vida, pai.

— Vou ter isso em mente. Mas não vou fazer isso hoje. Talvez sexta. Hoje vou ficar de olho em você.

— Os Stuart estão ok com isso? De você passar o dia comigo?

— Eles sabem que é importante que eu fique com você quando você fica doente, já que não tem mais ninguém pra ficar com você.

Entramos no Alfredo’s e Emelie abriu um sorriso quando me viu. Ela pegou um par de cardápios e nos levou até uma mesa.

— Bem-vindos ao Alfredo’s. Meu nome é Emelie e vou atender vocês esta tarde. – ela disse, parecendo animada – Vou dar um tempo para vocês decidirem o pedido de vocês.

Quando ela se afastou, voltei minha atenção pro meu pai.

— A vovó não pode vir? Entendo que vovó Oona não venha, por estar do outro lado do oceano mas tem vovó Olívia, que literalmente mora no mesmo lugar há décadas.

— Posso falar com sua vó Olívia. E acho que seria interessante, em algum momento, eu mandar você pra passar as férias com sua vó Oona na Irlanda.

— Não, pera. Passar as férias com vovó Oona? Você acha que vovô Angus ficaria feliz com uma adolescente na casa dele de novo?

— Você não é qualquer adolescente. Você é a neta dele. A única neta, por sinal.

— Se você conseguir fazer vovô Angus concordar com a minha visita, eu to dentro.

Emelie veio pegar nossos pedidos. Meu pai começou a dizer o quanto seria simples convencer meu avô materno de que seria uma boa ideia me ter por um mês na Irlanda. Mas ele impôs a condição de que eu passasse por ano por média e não arrumasse confusão.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Come Together" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.