Conluio escrita por Lina Limao


Capítulo 4
Capítulo 4




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Seu quarto fora o ambiente mais convidativo em todo o castelo aquela manhã.

As paredes do quarto que tinha formato de pentágono eram pintadas com grossas fileiras verticais de tiras brancas e verde-chá que contrastavam com o chão de madeira esmaltada. No local onde as paredes se encontravam e formavam uma ponta era que a janela se localizava, ficando dividida pela quina em duas folhas de vidro quase transparentes, protegida por uma grade de ferro cor de cobre que formava desenhos de trevo, entrelaçando os caules das plantinhas de maneira delicada e charmosa.

Havia uma grande cortina de seda de quatro camadas que variava entre o cinza chumbo e o verde-broto, lembrando bem o uniforme da sonserina, que balançava com a brisa que entrava no quarto. A cabeceira da cama de casal era de mogno talhado, como uma réplica do brasão da casa que trazia uma ameaçadora serpente perfeitamente detalhada e pronta para dar o bote. Ficava escorada na parede lateral, com o lado esquerdo virado para a janela.

Na mesma parede em que a cama ficava escorada haviam duas bandeirinhas triangulares de cetim, uma branca e uma verde, presas a hastes de madeira extremamente finas que se cruzavam formando um “x” em referência ao time de quadribol da sonserina. Por vezes Draco se pegava olhando para as bandeirinhas e perguntando-se por que diabos alguém havia achado aquilo um bom item de decoração.

A colcha que vestia o colchão e se estendia até o chão e as fronhas que encapavam os travesseiros eram prateadas, com fios delicados que formavam o desenho de vários pêndulos. O cobertor verde-broto estava embolado como se houvesse até sido torcido, caindo para fora da cama e tocando o tapete trabalhado que ilustrava a figura de Salazar Slytherin. Às vezes Draco gostava de pisar ali com força, por que não ia muito com a cara daquele velho.  

Aos pés da cama havia um baú de madeira da mesma cor de mogno que a cama possuía. Era retangular e liso, sem qualquer detalhe específico além do puxador da tampa, que era prateado e também tinha o formato de um pêndulo. Sobre ele havia uma porção de coisas, como algumas folhas de pergaminho, uma pena, o brasão de monitor de Draco, sua varinha e a gravata do uniforme. No teto um belíssimo lustre de prata com quatro velas e alguns pingentes e contas de cristal com detalhes trabalhados em vidro. A base de metal cintilava quando a luz do dia batia, deixando tudo ainda mais iluminado.

O armário ficava de frente para a cama. Também de mogno, mas apenas trabalhado na parte superior, tinha quatro portas largas e compridas capazes de acomodar os pertences de quase toda a grifinória. Os puxadores eram prateados, idênticos aos do baú, mas Draco havia conseguido a proeza de quebrar aquele que ficava mais próximo da janela e quase cortava a mão quando precisava de alguma coisa que estivesse ali.

A porta de entrada ficava perfeitamente de frente para a janela, bem no meio da parede. Era com as bordas arredondadas e de uma madeira quase tabaco, toda trabalhada com vários desenhos que representavam grandes feitos de outros famosos bruxos da sonserina. Contornando e dividindo todas essas imagens havia o longo e fino corpo de uma serpente e sorria com a língua para fora. A maçaneta redonda e prateada brilhava de tão limpa quando a luz do sol batia. 

Ao lado da porta havia um espelho veneziano cujo formato remetia a uma ampulheta mais arredondada, envolto por uma moldura prateada que lembrava vários ramos de planta e uma coroa no topo, em destaque. O vidro era meio fosco nas pontas mais próximas da moldura e perfeitamente límpido no meio. Ficava posicionado estrategicamente sobre um criado-mudo de quatro gavetas, extremamente semelhante ao baú de mogno, especificamente nos puxadores cintilantes.

Havia um jogo de três velas brancas sobre o pequeno criado-mudo. Estavam posicionadas sobre uma bandeja de prata e possuíam um fogo baixo, enfeitiçado para que fosse verde e servisse mesmo apenas para iluminar. Outro detalhe é que, embora Draco as deixasse sempre acesas, elas nunca derretiam por causa de uma magia maluca que Dumbledore gostava de fazer.

O melhor de ser monitor, entretanto, era o pequeno banheiro que ficava conectado ao quarto. Havia uma porta de vidro ao lado do armário que conectava ao estreito cômodo retangular. “Mesmo que seja pequeno”, Draco pensava, “é melhor que dividir com os outros”. Todo preenchido por azulejos acobreados, contava com uma janela retangular extremamente pequena e que mal abria.

Tinha também um espelho oval com bordas douradas (não tão bonito quanto o veneziano) pendurado sobre o lavatório de mármore estreito e arredondado que tinha uma belíssima torneira que lembrava um ramo de árvore. O vaso sanitário de louça brilhava de tão limpo, mas a toalha molhada verde-oliva que Draco usara a pouco estava jogada sobre ele, pois o garoto ignorava o porta-toalhas prateado que ficava logo ao lado do box de vidro pouco espaçoso.

O murinho que ficava debaixo da pequena janela, dentro do box, estava com os produtos de higiene como shampoo e sabonete, igualmente molhados pelo uso recente. Draco tinha optado por deixar todas as janelas abertas para que não precisasse secar ele mesmo o banheiro.  

Ficou jogando o balaço para cima e para baixo diversas vezes enquanto encarava o teto branco e suspirava, sem muito ânimo para sair aquele dia. Usava o uniforme da escola, porém, sem os sapatos e estava pronto para passar o dia todo enfurnado ali.

Não que o dia estivesse horrível, pelo contrário. Dava para ver da janela várias pessoas se divertindo no jardim e à beira do lago Negro, que quase cintilava pelos raios de sol que refletiam em suas aguas escuras e geladas de forma quase mágica. A grama verde bem cortada parecia meio amarelada devido ao excesso de luz que recebia e os alunos riam alto, falavam com suas vozes irritantes e lhe faziam sentir que era muito distinto de todo aquele povo para simplesmente descer e se misturar com eles.

Pois, no final, era sempre assim que se sentia. Diferente. Apenas um observador que fica em sua janela olhando os caminhos da vida dos outros sem interferir. Talvez fosse por ter sido sempre assim, um espectador, que fosse difícil ver sua vida como a de alguém que realiza grandes coisas.

Sempre soube, desde criança, que tudo que o mantinha era o dinheiro de sua família. Merlin que o livre ser pobre como a Weasley, por que se dependesse de sua boa vontade em aparecer no colégio com roupas e livros de segunda mão, morreria de desgosto e se trancaria no armário de vassouras.

Ser um Malfoy, em sua visão, era como ter um status. Seu sobrenome lhe proporcionara as coisas mais incríveis de sua vida: o quadribol, viagens e tudo mais que o dinheiro pudesse comprar. Tinha roupas excelentes, uma varinha excelente, uma vassoura excelente, um quarto excelente e notas excelentes.

Só o que não era excelente nessa história toda é que no fundo, bem no fundo, tinha certeza que não jogaria quadribol se seu pai não houvesse pago novos uniformes e vassouras para o time da sonserina. Também sabia que, se não fosse pela influência que Snape possuía na escola, jamais seria monitor e poderia desfrutar de um quarto só dele, sem ter que ficar aturando os outros alunos.

Era mimado, não burro.

Também sabia que só tinha a amizade de Crabbe, Goyle e Zabini por toda a influência que possuía na sonserina. Afinal de contas era bem mais fácil seguir sua vida sem penitências quando um de seus amigos era o monitor, certo? Potter que o diga.

Se bem que Malfoy não tinha lá muita certeza desta última afirmação. Sendo tão certinha e irritantemente justa, era bem capaz que a sangue-ruim aplicasse uma penitência no Potter se o visse perambulando pelo castelo a noite só para aliviar o peso de sua consciência. Blérgh, grifinórios eram tão chatos.

Continuou jogando o balaço para cima e para baixo enquanto seguia com seus devaneios, realmente desconexo, pensando em várias coisas que ele mesmo considerava sem sentido, quando ouviu o barulho de asas batendo e, em seguida, um barulho alto, parecendo um assovio. Aproximou-se de sua janela, afastou as cortinas e viu uma coruja grande e marrom cheia de penas grandes, que deixavam-na aparentando ser mais rechonchuda do que era, enroscando os pés de unhas compridas nos trevos de ferro, tentando ficar de pé.

Ela carregava no bico comprido e laranja um envelope vermelho, olhando com seus olhos amarelos arregalados e Draco sabia que não havia como ter boas notícias ali. Apenas pegou o papel com pouca delicadeza e começou a abrir, querendo se livrar logo daquilo enquanto a coruja se empoleirava na grade.

Quando abriu, o pequeno pedaço de papel começou a se desdobrar sozinho e virou algo parecido a uma boca com a língua para fora, que flutuou bem em frente a seu rosto. “Ah, que ótimo”, pensou, “um berrador. Maldita invenção dos infernos”.

— Draco Malfoy! Em que diabos está pensando?!

Era a voz de Lúcio que soava como um trovão, extremamente irritado. Draco sentou-se na cama, já esperando pelo que viria em seguida.

— Por que não está se apressando para resolver logo esses malditos armários?! Sabia que agora sua mãe fez uma porcaria de pacto com Snape por puro medo de você fracassar?! Ouviu o que eu disse? Um Malfoy! Fracassar!

Então Draco arregalou seus olhos cinzentos e começou a prestar atenção de verdade nas palavras gritadas que aquele papel proferia. Um pacto com Snape era tudo que sua mãe não devia feito.

— Não sei quem você puxou para ser tão estupido e lerdo como está sendo! O que você quer? Nos ver mortos? Ser morto? Acha que lorde das trevas vai pegar leve com você por toda essa maldita demora? O que diabos você tem para fazer que é tão importante a ponto de atrasar deste jeito os planos dele?!

Draco suspirou, coçando a cabeça e ficando de pé. Era tão chato apenas ter que ficar ouvindo os berros idiotas de seu pai sem poder responder ou se defender. Na verdade, Lúcio nunca se interessou por qualquer coisa que ele tivesse a dizer.

— É o quadribol que anda ocupando sua cabeça? Por que se for, posso dar um jeito nisso rapidinho! Agora levante esse traseiro preguiçoso e concerte aquelas porcarias de armários antes que eu mesmo mate você, maldição!

Então, assim que terminou de falar, o pergaminho começou a se rasgar sozinho em mil pedacinhos e Draco apertou os lábios, olhando a cena enquanto cada parte do berrador caía lentamente à sua frente, formando um pequeno montinho no chão.

Deitou-se novamente na cama e começou a massagear as têmporas. Por mais que seu pai houvesse gritado, nada havia sido tão irritante quando a parte do pacto. Por que diabos Narcisa tinha que ser tão estupida?

E, além disso, que tipo de pacto será que havia feito? E o que aconteceria se Draco falhasse e não cumprisse com o prometido? Quer dizer que agora ainda ia ficar devendo satisfações a Snape? Será que a vida do professor também estava em perigo agora? Oh, Merlin, quem tinha uma mãe dessas não precisava de inimigos...

Agora as coisas ficavam um pouco mais problemáticas, pois quais chances teria ele?

Draco resolveu pensar racionalmente em duas alternativas. O que aconteceria se conseguisse cumprir a maldita tarefa, matar Dumbledore e sair de Hogwarts como vitorioso para Voldemort ou o que iria rolar se ele meio que desistisse...

Assim, só para saber mesmo.

Ok, SE Draco colocasse todos os amiguinhos de Voldemort dentro do castelo e matasse a porcaria do Dumbledore a sangue frio. Talvez aquele bicho estranho saísse de sua casa, né? Será? Talvez ele ficasse feliz e premiasse seus pais, que por sua vez ficariam vivos e não lhe infernizariam a vida. Além disso, não teria mais dívidas com Snape e podia ser um bom negócio, pois não havia nada pior que ficar devendo favores a alguém.

Agora levando em consideração que a probabilidade mais alta era a de que não conseguisse matar Dumbledore por que não era um assassino, bem... com certeza Voldemort ia ficar muito irritado e talvez descontasse em seus pais. Ou, quem sabe, no Rabicho ou em qualquer um que aparecesse em sua frente na hora errada...

Seu pai não ia gostar nem um pouco e talvez fizesse com que fosse expulso de Hogwarts para poder vivenciar melhor os “dias dourados de guerra”, como Lúcio gostava de chamar... Sua mãe ia ficar extremamente preocupada e decepcionada, querendo impedir aquela situação toda, mas sem ter voz ativa para isso, o que causaria diversos conflitos desnecessários.

Talvez sua tia, Bellatrix, aquela pessoa magnífica e controlada, se oferecesse para Voldemort para lhe escalpelar e matar lenta e dolorosamente. Não duvidava nada que qualquer coisa pudesse vir daquela família maravilhosa, digna de um comercial de margarina, que Merlin lhe dera.

Draco suspirou e se remexeu na cama. Era a segunda vez que chegava a mesma conclusão: estava em um beco sem saída.

Não interessava muito qual dos dois caminhos fosse tomar, estava perdido. Maldita hora em que o Potter se enroscara no ministério, ano passado! Se não fosse aquele impertinente ficar brincando de pega-pega com os comensais no setor de profecias, com certeza seu pai não teria sido exposto ao ridículo e Voldemort não se mudaria com todas as tralhas para a mansão Malfoy.

Ah, que inferno”, Draco pensou enquanto voltava meio sem querer sua atenção para a coruja, ainda parada em sua janela. Por Merlin, quase se esquecera dela! O que será que aquele bicho estava esperando, uma resposta?

Emburrado, apanhou em cima do baú um dos pedaços de pergaminho e a pena, quase sem tinta, com a qual escreveu um bilhete curto com a letra falha e caprichada.

 “O.K., serei mais rápido.

Enrolou o pequeno pergaminho sem muita precisão e amarrou no pezinho da coruja, que saiu voando imediatamente. Ficou absorto em seus pensamentos observando a ave voar para longe quando deixou sua vista cair sobre as pessoas caminhando pelo jardim. E, parada, com as mãos na cintura estava ela. A Weasley inconveniente que andara lhe perturbando nos últimos dias.

Estava discutindo com aquele outro cabeça-vermelha. O mais insuportável de todos, que apontava acusadoramente para ela. Porém, a Weasley não parecia se intimidar e, em determinado momento, deu um puxão nas orelhas do irmão antes de sair andando pesadamente pelo jardim.

Então começou a pensar no que ela havia dito.

O que você quer fazer, Malfoy?

Os olhos cinzentos de Draco recaíram sobre a pequena pilha de papel rasgado que havia no chão que se movia lentamente, se desfazendo conforme o vento da janela batia.

O que eu quero fazer?

Se perguntou, como se fosse a primeira vez.

Por mais mimado que fosse, Draco não estava acostumado a se colocar como prioridade quando o assunto era Voldemort. Na verdade, em sua cabeça, o objetivo era conseguir sair vivo do envolvimento que seus pais idiotamente criaram com aquele bicho. Por que ele se recusava a ver o lorde das trevas como um ser humano.

O que você quer fazer, Malfoy?

Não sabia se queria de verdade deixar os comensais destruírem Hogwarts e, possivelmente, matarem alguém. Mesmo que algum feitiço acidentalmente pudesse arrancar um olho de Potter, o que seria esplêndido, não tinha certeza de que realmente desejava aquilo.

O que você quer fazer, Malfoy?

A voz dela soava cada vez mais alto em sua cabeça. Com certeza não queria ter de largar os estudos e o quadribol. Também gostava da sensação de medo e respeito que as pessoas tinham por ele e não gostaria de perder esse status. Apreciava muito as regalias que seu nome lhe trazia.

O que você quer fazer, Malfoy?!

Também não queria matar Dumbledore. Por mais que o velho fosse chato e organizasse muito mal os eventos escolares, fazendo com que os outros colégios (como beauxbatons ou durmstrang) deixassem Hogwarts no chinelo, não achava que ele merecia morrer. Na verdade, ele era o alvo de várias piadinhas que não seriam mais tão engraçadas assim...

O que você quer fazer, Malfoy!

A voz da Weasley pareceu um grito fino e ensurdecedor, que o fez apontar a varinha para o papel largado no chão e atear fogo naquela porcaria.

— Mas que inferno!

Exclamou antes de colocar as mãos na cabeça e cair de costas na cama que rangeu ao sentir o impacto de seu corpo.

Por um momento pensou que, se não houvesse sido estupido o suficiente para brigar por causa daquela galinha gigante que Hagrid tinha, poderia agora fugir nela para sabe-se lá Merlin onde, mas que não tivesse mais de se preocupar com porcaria nenhuma.

Nem com sua família, nem com Snape, nem com seu status e nem com aquela maldita frase que a Weasley mais inconveniente havia plantado em sua cabeça.


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