Meetings At Midnight escrita por Yokichan


Capítulo 4
IV - Nossos Vultos


Notas iniciais do capítulo

Ele não conseguiu desenhar nem um coração no msn pra mim no dia do meu aniversário, mas simplesmente ter aparecido, foi o melhor presente que eu poderia ganhar. ♥



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“Você me machuca, eu te machuco. Nós sofremos por isso.”

 

 

 

         Por que você precisava me fazer chorar no dia do meu aniversário? Você havia dito que me amar era motivo suficiente para que sua vida não tivesse lados felizes, como uma pessoa normal teria. Oh, amor... Você tinha o dom de me ferir, sempre soube como fazê-lo – mesmo que involuntariamente – por meios de seu amor docemente agressivo. Seu amor intenso, por isso muitas vezes violento, e mesmo assim, eu sentia que não saberia viver sem ele.

 

 

Todos os argumentos eram irrelevantes, eu simplesmente não saberia.

 

 

O chá fumegava junto ao meu rosto frio, enquanto minhas mãos eram aquecidas pelo contato com a xícara. Eu fechei meus olhos e apenas desejei que naquele dia nostálgico você estivesse comigo, e então, toda a solidão acabaria. Por que um desejo tão simples era difícil de ser compreendido? Daquele modo, apenas continuaríamos a nos desgastar na medida em que o tempo passasse, sem sermos capazes de dizer “não”, e aquilo me perturbava. Precisávamos, urgentemente, destruir aquela distância. Sim, precisávamos, mas tudo se tornava ainda pior quando eu lembrava que eu era a parte fraca de nosso elo.

 

 

Eu era a que tinha dois corações.

 

 

Quase meia noite, quase o momento de nosso fantasioso encontro. Você teria acreditado em meu bilhete, em minha promessa? Tremi, não por medo, mas por amor. Depositei calmamente a xícara vazia sobre a mesa, encolhendo-me na cadeira giratória e abraçando nervosamente os joelhos. Meu aniversário acabaria no exato momento em que eu me aproximasse de você, mas eu tinha certeza de que encontraria meu maior presente em alguns instantes. Engoli meu suspiro ansioso e fechei os olhos, pois quando eu os abrisse, você estaria ali.

 

 

Porque você era o sonho no qual eu podia acreditar.

 

 

         O hálito frio da noite tocou meu rosto com ternura, eu havia chegado. Aquela não era a sua sala, muito menos seu quarto escuro, mas por que aquilo importaria, se você estava ali? Sim, tão perto de minhas mãos, tão real. A varanda aberta era embalada pela brisa noturna e coberta pelo escuro céu estrelado que mostrava-se além da aba do telhado. A única luz presente era a do interior da casa, que passava pela porta aberta e mergulhava no breu. O resto era silêncio, era penumbra. Era seu vulto diante dos meus olhos. Sentado e curvado em uma cadeira ao lado da porta, respirando o ar frio da meia noite, você era apenas um vulto sobressaindo-se no escuro. Seu rosto baixo era quase que totalmente oculto pelas sombras e pelos cabelos que lhe caíam sobre os olhos, enquanto seus cotovelos permaneciam apoiados nos joelhos afastados. Eu podia arriscar o palpite de que sua alma havia deixado aquele corpo, se seu rosto não tivesse se movido lentamente na minha direção naquele momento. E enfim, seus olhos negros reluziram na penumbra ao encontrar os meus.

 

 

Pela primeira vez, seus olhos profundos caíam sobre mim.

 

 

         Meu coração apertou-se num misto de dor e emoção. Eu poderia ficar parada ali para sempre, sem me importar com a passagem do tempo. Seus olhos conversavam com os meus, e aquilo simplesmente ia além do que eu havia sonhado por tanto tempo. Não precisávamos de palavras, de movimentos, de gestos, aquele momento dizia tudo: nosso amor era a origem de nossa loucura.

         Eu sabia o que fazer, e ainda assim, meu corpo insistia em não obedecer aos comandos internos. Vagarosamente, eu fiz com que meus pés se arrastassem pelo assoalho de madeira da varanda, dizimando nossa distância à uma vaga lembrança. Seus olhos rígidos me acompanhavam, a cada passo. O soluço desceu a arranhar minha garganta quando eu o engoli à seco, egoísta o suficiente para não permitir que nada atrapalhasse nosso doce encontro.

 

 

Eu sempre fora uma garota egoísta, desejando você só pra mim.

 

 

         Enfim, eu estava parada diante de você, à centímetros de seus joelhos. Eu poderia então dizer “eu te amo” com todo o meu coração? Você estava pronto para receber minhas confissões? Meus joelhos se deixaram desabar ali, encontrando o chão com um ruído surdo entre seus pés. Minhas mãos apoiaram-se em seus joelhos, e tudo o que eu pude fazer foi entreabrir os lábios e suspirar um murmúrio inaudível. Aquele coração dentro de meu peito, aquele que era só seu, suplicava para que o tempo parasse naquele momento. Eu havia lhe alcançado, e aquilo era irrevogável.

 

- Eu... – murmurei, forçando-me para conter os soluços do pranto.

 

         Mas você não permitiu que eu quebrasse nosso delicado silêncio, pousando um dos dedos sobre meus lábios trêmulos. Seus olhos invadiam meu rosto com minúcia, percorriam meu semblante com intensidade, analisavam cada traço meu, avidamente. Eu apenas deixei que você me fitasse daquele seu modo sério e absorto. Seus dedos abandonaram meus lábios, deslizando pela lateral de meu rosto vagarosamente, para então penetrarem nas camadas negras de meus cabelos. Você não deixou que eu falasse, porque nada precisava ser dito.

 

 

Porque tudo estava ali, ao alcance de nossas mãos.

 

 

         Enquanto seus dedos tocavam minha nuca, eu deixei que meus olhos se fechassem, involuntariamente. Eu estava entregue, exclusivamente à você. E sem avisos, eu senti o toque macio e quente de seus lábios sobre os meus, provando-me com exímia delicadeza. Não, não era apenas delicadeza, era cuidado, era fascínio, era amor. Tocou-me, afastou minimamente a boca da minha, ofegou discretamente, para só então voltar a me beijar. Seus dedos ergueram sutilmente meu queixo, e desta vez, o beijo cresceu calorosamente. Nossos lábios encaixavam-se, deslizavam uns sobre os outros, abraçavam-se, tocavam-se com o ardor que ambos já não eram capaz de suportar. Minhas mãos apertaram-se em desespero em seu casaco negro, puxando-o para mim.

 

 

E nada mais estava sob meu controle.

 

 

         Nosso beijo se perdeu, em busca de ar. Nós dois ofegávamos, tão próximos. Seus braços apertavam-se em torno de meu corpo, percebendo o quão vacilante e trêmula eu me encontrava. Eu poderia desmoronar ali.

 

- Há tantas coisas que eu quero te dizer... – comecei, eufórica.

 

         Nossas testas se tocavam, assim como as pontas de nossos narizes frios.

 

- Não diga nada. – sua voz macia fez surtir tremores internos em meu corpo.

 

- Mas não há muito tempo, e eu... – insisti, agarrando-me à você.

 

- Não importa, você está aqui. – você constatou, abraçando-me com força.

 

- Eu preciso ouvir que voc... – supliquei, forçando meu olhar contra o seu.

 

- Eu te amo. – e então, você adivinhou do que eu precisava, e o fez.

 

         Meu coração reagiu à palpitações violentas, e eu não mais pude segurar o que agitava-se em ondas gigantes dentro de meu peito. Meus olhos transbordaram, e acolhida no calor de seus braços, eu chorei por nosso amor. Eu pediria para aquele Deus que há algumas noites me concedia o milagre de te ver, que me deixasse ficar ali para sempre, mas meu tempo se foi e eu acabei me perdendo no escuro. Antes de desaparecer, eu ainda pude sentir o toque apertado de seus lábios no alto de minha testa.

 

 

Eu pude sentir seu amor fluindo em meu coração.

 

 

         E novamente, eu me vi abraçada pela frieza e pelo silêncio de meu quarto branco, enquanto todo o meu corpo encolhido consumia-se em convulsões de dor e lágrimas de uma comovente saudade. Nada estava perdido, eu só precisava esperar pela próxima noite, e então correr na sua direção outra vez.

 

 

 

“Nós sofremos, e amamos por isso.”


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