Aconteceu devagarinho e de maneira silenciosa: quando Malfoy se deu conta, lá estava ela em cada brecha de pensamento. Nos quatro pontos do seu coração. Ele conseguia evocar o som de sua risada sem sequer se esforçar e a lembrança tinha um efeito permanente e incorrigível: iluminava todos os recônditos escuros de sua mente atormentada.
Para muitas pessoas, constatar o fato de que se está apaixonado é visto como positivo, ainda que possa ser recebido com doses homeopáticas de receio. Para alguém como Draco, no entanto, o evento se assemelhava bastante à experiência de assistir um filme de terror – gratuitamente violento, sem sentido e reator para desconforto, embora ele não pudesse atestar com certeza, já que nunca havia visto um filme dessa natureza, ou, para fazer justiça, qualquer tipo de filme.
As sensações, no entanto, estavam lá, enfileiradas uma por uma, esperando educadamente a sua vez para saltar diante dele em forma de pensamento autodepreciativo. Por essa razão, ele estava se defendendo do único modo que conseguia conceber aos vinte e poucos anos de idade: se embebedando de uísque de fogo como se não tivesse um fígado para lidar num futuro próximo. Mais do que isso: ele estava se embebedando de uísque de fogo no lugar onde isso poderia lhe gerar grandes chances de levar – e dar, se tivesse alguma sorte – uns socos em algum outro bruxo também bêbado e inconveniente.
Astoria nem precisava ser tão esperta quanto de fato era para imaginar que o encontraria na travessa do tranco. Ela o amaldiçoou três vezes (antes de também se amaldiçoar três vezes pelo gosto extremamente questionável que tinha para homens) e teve tempo de ver Draco sendo jogado para fora de um pub pequeno, malcheiroso e suspeito. À distância ele parecia um boneco quebrado na neve, mas a risada grogue e a fileira de palavrões que saíram de sua boca em tempo recorde foram o suficiente para que ela não andasse nem um passo mais rápido do que o habitual.
- Ei. – Astoria cumprimentou, cutucando a perna direita de Draco com a ponta da bota gasta.
— Ei. – ele respondeu, sorrindo. Seu cabelo estava todo desalinhado e um pouco de sangue seco havia grudado no canto interior da boca. Para Astoria era estranho como de algum modo aquilo parecia terrivelmente sexy.
— Você parece bem. – ela ironizou.
— Você precisava ver o outro cara. – e tentou piscar, sem sucesso.
Astoria olhou por cima do ombro para ver se achava indícios de algum outro bruxo estúpido através da vidraça imunda. Tudo o que pôde conferir foi o dono praguejando enquanto passava um pano cinza questionável no balcão engordurado.