Hopeless escrita por vivian darkbloom


Capítulo 12
Capítulo XI - A Singularidade De Um Natal Em Família.


Notas iniciais do capítulo

Oi pessoal, tudo bem? O capítulo anterior tinha sido o maior de Hopeless, mas esse superou e confesso, é meu favorito!
Aqui alguns segredos foram revelados, outros foram lançados maiores pistas e eu digo, cada parágrafo é importante, mesmo que não pareça.
Eu coloquei alguns significados no começo dos capítulos porque iremos tratar de duas doenças em duas personagens diferentes (depressão e bipolaridade) e eu acho importante deixar isso o mais claro possível. Se você sofre com uma delas e sentir algum gatilho em algum momento, por favor, não continue a ler e me avise, que eu posso alterar. No mais, se sentir vontade de conversar ou algo do gênero, estou sempre disponível. Você não está sozinho (a)!

Boa leitura.



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Lyanna Black.

Melancolia

psiq - tristeza profunda e permanente, nascida de causas físicas ou emocionais, que torna difícil para a pessoa sentir felicidade. 

A decepção, para muitos, é um dos piores sentimentos existentes. Ela corroí todas as suas boas lembranças, transforma relações maravilhosas em uma sombra do que um dia foram, soterra todos os seus mais puros sentimentos. A decepção é uma inércia, não se modifica, porque arranja um lugar pequeno dentro de si para se fazer morada.

Há uma semana, Lyanna Black tentava arrancar esse sentimento horrível do seu coração, mas tudo que havia conseguido era alguns feitiços lançados a esmo, vasos quebrados e uma mão machucada de tanto socar a parede, para não socar Sirius. Ela gritou e chorou mais do que achava ser possível e, ainda sim, nada aliviava toda aquela confusão que havia se instalado.

Nos primeiros dias, seu pai havia tentado ultrapassar a barreira de ódio e incompreensão que a mesma criou ao redor de seu quarto, mas tudo que ganhou foi alguns palavrões e uma porta fechada com violência na cara. Seguindo o conselho da amiga da garota, Natalie, ele viu que o melhor era deixa-la remoer todos os últimos acontecimentos sozinha. Ela precisava de espaço para respirar e sua presença apenas trazia à tona todas as mentiras tão bem contadas.

Lyanna queria se afogar, todas as noites. Porque de todas as coisas que ambos tinham em comum, ela nunca pensou que a habilidade para esconder fatos das pessoas que amavam, era algo que partilhavam. Infelizmente, havia sido de Sirius que herdou aquela catástrofe que parecia, inevitavelmente, atingir todos os ao seu redor.

Com o passar de tempo, entretanto, ela deixou sua guarda abaixar um pouco, pelo menos o suficiente para finalmente descer as escadas e cumprimentar todos os amigos que estavam lá. Não havia visto June desde o dia que Sirius conversou com as duas e suspeitava que a garota também havia se trancado no quarto. Pelos gritos da mesma, batendo a porta na cara de alguém, há duas noites atrás, ela tinha certeza que sim.

De qualquer maneira, Lyanna havia ido em passos lentos e receosos até a sala, onde o pai conversava desanimado com Molly, que parecia lhe aconselhar em algo. A surpresa dele ao vê-la e a hesitação em se aproximar, balançou com todos os sentidos de Lya. Ela queria correr até ele como uma garota assustada e ferida e implorar que fizesse toda essa dor passar. Mas, infelizmente, seus pés não se moveram um centímetro sequer.

Mas Sirius sabia. Ele sabia melhor do que qualquer outra pessoa no mundo como lidar com a inconstância de sua filha. Em passos ágeis e rápidos, chegou até ela, a puxando para si. Lyanna pensou em bater nele, empurrar, gritar. Contudo, por Merlin, ela não tinha forças para isso. Tudo que restava em si eram as lágrimas, que pareciam queimar em seu rosto. Por quanto tempo não havia lutado para não derrama-las por nenhum motivo sequer? E ali estava ela, como uma criança, agarrada a pequena e desajustada família que ainda lhe restava.

— Eu sinto muito, de verdade. — Ele sussurrou, apertando-a ainda mais.

— Eu também.... — Respondeu, sem saber ao certo por qual das inúmeras coisas mais sentia.

Nos dias seguintes, pelo menos, havia ficado mais fácil deixar seu quarto para trás. E, vez ou outra, ela olhava ansiosa para a escada, esperando ver June descendo-a. Mas ela nunca vinha. A única prova que tinha que a menina ainda estava na casa, era Monstro resmungando vez ou outra sobre ter que levar comida para ela e o rosto desanimado de Fred, com as tentativas frustradas de tentar falar com a mesma.

— Aparentemente, alguém aqui consegue ser mais rancorosa que você. — Natalie havia brincado, ao ver o garoto descer desanimado, após minutos batendo na porta e implorando para entrar.

— E você pode culpa-la? — Lyanna resmungou, olhando feio para Fred. Ele era seu amigo, também. E deveria ter dito a verdade.

Como se não bastasse toda essa confusão, seus pesadelos haviam ficado piores. Quase toda vez que dormia, ela sonhava com Rosamée, mas não somente com as luzes verdes que tiravam o brilho de sua vida, mas agora tinham os gritos. A mulher, de longos cabelos ruivos e um espirito tão tempestuoso quanto o seu, parecia entregue a uma dor muito maior do que Lyanna poderia entender. E não importava o quanto ela tentasse correr em sua direção ou toca-la, Rosa simplesmente não parava de gritar. Essa, de todas as torturas imagináveis, era a pior.

E não havia sido uma ou duas vezes que a mesma acordou assustada, o pijama colado em sua pele que suava, mesmo na noite fria.

Aquele, em especial, havia sido o pior de todos os sonhos. Rosa implorava por sua ajuda e não havia nada que a mesma pudesse fazer, até que um vulto encapuzado lançou um feitiço contra ela. Geralmente, era assim que o sonho acabava: com o rosto falecido de sua mãe a encarando.  

 Acordou com a risada de Bellatrix Lestrange ecoando em seus ouvidos. Ela sabia quem era, mesmo que não pudesse ver. A mulher que havia assassinado Rosamée anos atrás, a privando ver a filha crescer ou reencontrar o marido. Lyanna sabia que se havia justiça nesse mundo, ela encontraria aquela desgraçada e terminaria o trabalho que sua mãe começou.

Chutando as cobertas para longe, ela se levantou, ainda respirando com certa dificuldade, e foi em direção a janela, puxando as cortinas para o lado e deixando a brisa fria que vinha de fora diminuir a temperatura de seu corpo, deixando-a mais calma. O brilho do sol matinal de Londres era fraco, porém era claramente de manhã já. Algo em seu coração se aqueceu um pouco. Era dia 24, véspera de natal... não havia nenhuma outra data que ela amasse mais do que aquela.

E, naquele dia, ela amava ainda mais porque suas amigas iriam passar a manhã consigo. Áquila passava todas as noites conversando com ela, pelo espelho, e Selina lhe soterrava de cartas todos os dias. Contudo, a presença delas era mais valiosa que todo o resto.

Lyanna nem imaginava qual era a ótima desculpa que a Malfoy havia arranjado para conseguir escapar de casa justamente naquele dia, mas, independentemente de qual fosse, ela era grata. Assim, depois de se arrumar, desceu animadamente as escadas da mansão Black, olhando ansiosa para a lareira. As duas não podiam aparatar ainda, mas por sorte a rede de pó de flu andava sendo vigiada pela Ordem, então não seria difícil para elas conseguirem chegar.

Ela batia a ponta dos dedos no braço da poltrona que estava sentada, desejando que os segundos pudessem passar mais rápidos. Suas mãos ficaram ainda mais agitadas quando Sirius entrou na sala, com o olhar sobre si.

— Suas amigas vêm hoje? — Ele perguntou, sentando-se no sofá próximo.

— Sim, a qualquer momento, na verdade. — Explicou, visivelmente animada, fazendo-o sorrir.

— Isso é bom, elas parecem te fazer bem. — Disse, com um tom nostálgico. Lyanna sentiu seu coração apertar um pouco quando se lembrou que de todos os amigos mais íntimos de seu pai, apenas Lupin ainda estava com ele. Ela não imaginava como seria ter que viver sem Áquila e Selina.

Quase como se lessem sua mente, a lareira deu um forte estalo, revelando as duas figuras. Selina saiu animada, praticamente se jogando em Lyanna assim que a viu, enquanto Áquila ficou um pouco mais para trás, retirando as cinzas da roupa e olhando desconfiada ao redor. Seus olhos cinzas cravaram em Sirius, que também a encarava, surpreso pela semelhança da mesma com Narcissa, a quem ele não via desde que tinha fugido da mansão, e desconfortável por ter uma filha de um comensal em sua casa.

A loira, entretanto, parecia ter chamas no lugar da habitual tempestade cinzenta. Assim que viu o Black, ela deu alguns passos em sua direção, tomada de raiva por todas as noites que ouviu Lyanna chorar por sua culpa.

— Você — ela apontou o dedo para ele, ainda mais espantado pela atitude dela e pelo fato da mesma ficar ainda mais parecia com sua prima quando agia daquela forma — é um babaca! Como você pode fazer isso com ela?

— Como é? — Perguntou, atônito.

— Áquila, se acalma... — Lyanna tentou intervir, se colocando entre ambos. A mesma, contudo, apenas se ergueu em seus saltos altos, gritando com ele por cima de seu ombro.

— Você ao menos tem ideia de como fez ela se sentir? Você parece uma criança! — A Malfoy sabia que não era seu direito tomar a frente e defender a amiga. Mas se não fosse ela fazer, então quem seria? Além disso, sabia que Lyanna faria a mesma coisa em seu lugar. — Uma criança egoísta!

— Malfoy, vem aqui. — Selina ajudou a Black, aproveitando-se do fato de ser um pouco maior que a amiga e passou os braços ao redor dela, praticamente arrastando-a para fora da sala. Áquila poderia ser mais ágil e, por ter sido criada em meio a Draco e Charles, ter se acostumado a escapar de pessoas mais fortes, mas naquele momento ela estava cansada e doente demais para se livrar delas, se limitando a protestar enquanto ambas lhe afastavam de Sirius.

— Vocês deveriam ter me deixado terminar, eu ia era ensinar uma lição para ele! — Brigou, enquanto lhe faziam subir as escadas. Lyanna, para sua surpresa, soltou uma risada diante da fúria da loira, sendo acompanhada por Selina.

— Você fica parecendo um cachorrinho querendo brigar, quando está assim. — A lufana disse, fazendo Áquila lhe olhar indignada, franzindo a sobrancelha. — O que foi? É ódio demais para alguém do seu tamanho.

Ainda rindo, Lyanna jogou um braço ao redor dela, puxando-a um pouco para perto.

— Obrigado, de qualquer forma. — Sussurrou, fazendo a garota sorrir um pouco. Precisa lembrar que haviam pessoas ao seu redor, lutando para deixa-la bem. Precisava saber que ainda tinha uma família, apesar da confusão.

Quando finalmente chegaram no quarto da Black, Áquila estava mais calma, devido as diversas graças que Selina fazia no caminho, para faze-la rir. Se não fosse pelo espírito divertido da mesma, provavelmente a amizade delas seria bem mais conturbada.

— Afinal, como vocês duas chegaram aqui juntas? — Lyanna perguntou, deixando a porta encostada após elas passarem. Ambas se jogaram no sofá confortável, perto da janela, enquanto mesma sentou ao lado da loira.

— Eu fui até a casa dos Fimmel, por pó de flu e de lá nós viemos. — Selina explicou, pegando um bolinho que estava perto delas. Antes de chegarem, a Black havia pedido para Monstro levar algumas coisas para o quarto.

— Meus padrinhos não estavam em casa. — Áquila completou, com um sorriso malicioso que Lyanna já conhecia bem demais. — E meu pai acredita que eu estou segura e plena na companhia de Daphne, que na verdade está em Roma com a família.

— Genial. — Riu, nada surpresa. Aparentemente, a mentira era um dom que ambas dividiam.

— Então... você tem uma irmã. — A Campanella começou, meio sem jeito. Lyanna assentiu com a cabeça, soltando um suspiro.

— É, eu tenho uma irmã. — Deu de ombros, como se não fosse nada demais e ela soubesse disso desde que nasceu. Porém, ambas lhe conheciam muito bem para cair nisso. — Uma irmã que eu não vejo a dias porque ela decidiu que a decoração do quarto é linda demais para sair de lá.

A amargura em sua voz era clara. Queria ir lá e arrastar June para fora, mostrar que ela não era a única sofrendo com aquilo, que ambas foram traídas e enganadas. Mas, ao mesmo tempo, entendia a dor dela. Sentiria o mesmo se sua mãe estivesse viva e mentindo para si.

— Bem, pelo menos June é legal, acho que vocês vão se dar bem. — A garota sorriu, tentando lhe confortar, mas Lyanna conseguiu retribuir somente de maneira fraca. — Eu sempre achei que vocês eram primas ou algo assim...

— Não tem mais ninguém da família Black para ter filhos, Sel, apenas Sirius. — Áquila explicou, enquanto a mesma se ajeitava no sofá, deitando a cabeça em seu ombro.

— Eu não acredito que você fez isso comigo. — Uma voz abafada veio pelo corredor, interrompendo elas. As três se entreolharam, ficando quietas. — Você mentiu para mim, me enganou, escondeu as coisas, isso não tem perdão!

— Não podia contar para você um segredo que não era meu, June... — Lyanna reconheceu a voz de Fred, o que a fez se levantar rapidamente e ir em direção a porta, encostando o rosto contra a mesma, para ouvir melhor. Atrás de si, as meninas imitaram seu gesto.

— Não importa! Eu confiei em você! — Pela sua voz, June parecia chorar. De maneira instintiva, a garota colocou a mão na maceta, pronta para sair lá e tentar ajudar de alguma forma, mas Selina a conteve.

— Me desculpa....

— Não, eu não desculpo. — Uma batida forte na porta fez as três darem um pulo e voltarem correndo para o sofá, com medo de serem pegas espiando.

— Coitada... — Selina comentou, quando se ajeitaram, os rostos corados pelo susto. — Deve ser horrível ser enganada desse jeito pela pessoa que você gosta.

— Todo mundo mentiu para ela, não é? A mãe, o Weasley, Sirius — Áquila completou, balançando a cabeça de leve. — Ela deve ser muito forte para lidar com tudo isso.

            — Falando em Sirius... você já se acertou com ele? — Selina perguntou, seus dedos brincando de maneira displicente com a pulseira que usava.

— Pode se dizer que sim.... — Lyanna se encolheu um pouco, para fugir do olhar inquisidor dela.

— Lya, você não pode fizer castigando ele para sempre por isso. — Respondeu, gesticulando um pouco. — Não é, Áq?  

— Na verdade, ela pode sim. — A Malfoy soltou, tinha uma fruta em seu colo, mas parecia mais entretida em gira-la na mão, do que comer.

— Áquila!

— O que foi? — Ela suspirou, dando de ombros. — Se meu pai aparecesse falando que eu tinha uma irmã, eu nunca mais olharia na cara dele. Já me basta o Draco, pelo amor de Merlin.

— Você não está ajudando. — Selina tornou a repreende-la.

— Você que me perguntou. — Lyanna não pode evitar rir da cara que uma fazia para outra, divididas entre uma expressão exasperada e a outra com um rosto impassível. — E olha, todo mundo sabe o quanto amo Lucius, mas se fosse comigo, eu colocaria em prática todas as maldições que ele já ensinou.... Não que minha mãe fosse deixar ele vivo por muito tempo, de qualquer maneira.

— Ainda bem que não é com você, então. — A Campanella balançou a cabeça, incrédula, embora sorrisse.

— Realmente....

— Nós podemos deixar meu pai para lá? — Lyanna perguntou, embora sentisse que o assunto era muito mais fácil de ser entendido com a ajuda delas. — Eu comprei presentes para vocês.

— Nós também! — Elas responderam juntas, visivelmente animadas.

A Black sorriu, indo até o baú perto da cama e puxando de dentro dele duas pequenas caixas, enquanto elas pegavam embrulhos em suas bolsas.

— Aqui, esse é seu — ela estendeu o pacote verde em direção a Áquila, que o agarrou rapidamente, antes de se virar para Selina, dando-lhe a caixa amarela — e esse é seu.

— Que lindo! — A loira exclamou, olhando com admiração para a gargantilha. Uma muito parecia estava nas mãos de Selina, também.

— São relíquias de família, meu pai queria jogar fora, mas eu consegui salvar — disse, orgulhosa de si mesma e abaixando um pouco a blusa, para que elas pudessem ver que uma terceira estava consigo. — Eu não sei de quem eram essas duas, mas a sua já foi da Narcissa, antes dela casar.

— Sério? — Áquila perguntou, surpresa.

— Sim, Sirius disse que era uma das joias da família Black, então ela não pode levar quando se tornou uma Malfoy..., mas, teoricamente, você é uma Black também, sempre vai ser.

— Eu não sei se deveria aceitar isso, Lya — Selina comentou, um tanto envergonhada. — É da família de vocês.

— Lembra quando você comentou comigo que sua avó era de uma família muito tradicional bruxa? Então, eu pesquisei bastante e descobri que ela tem um parentesco distante com os Black.... — Respondeu, satisfeita com seu próprio empenho. — Além disso, agora elas são encantadas. Enquanto nossa amizade continuar, elas se mantem intactas.

— E se não continuar? — Selina perguntou, ainda admirada com a descoberta da amiga e olhando curiosa para o objeto.

— Bem.... eu não sei. O feitiço não dizia claramente, acho que elas se quebram ou algo assim.

— Meu presente é bem parecido — Áquila falou, rindo de leve e entregando a elas os embrulhos. Lyanna viu que eram tornozeleiras de ouro branco, as suas tinham pequenos rubis, as de Selina safiras amarelas e a dela, esmeraldas. — Mas são encantadas para, caso alguma de nós precise urgentemente da outra, elas esfriam até chegar a um ponto incomodo e só voltam ao normal quando nos aproximamos.

— Brilhante. — Ambas elogiaram, já colocando a delicada joia.

— Minha mãe e Elia tem duas desse jeito, achei que vocês iriam gostar. — Comentou, feliz ao vê-las sorrirem, aprovando.

— Eu amei, de verdade. — Selina disse, animada. — Bem, eu comprei coisas diferentes para vocês duas.

Ela estendeu os dois pacotes para as meninas, que se se entreolharam curiosas.

Áquila pegou o dela primeiro, vendo um pequeno porta-retratos, com uma foto dela e de Charles. Havia sido Selina que tirou a foto, animada com a câmera que tinha ganhado no aniversário, pegando-os desprevenidos no jardim de Hogwarts. Eles estavam abraçados, sorrindo para ela e o garoto lhe dava um beijo delicado na bochecha, antes de voltar a sorrir.

— Se você sussurrar “revelion” ele troca de foto — mostrou, fazendo a imagem se alterar para uma que estava as três meninas, abraçadas na casa dos Fimmel. Selina e Lyanna tinham os braços ao redor da amiga, que ria com elas. A Black imediatamente se lembrou de quando a foto foi tirada, no ano anterior, elas comemoravam o aniversário de Áquila. — Eu sei que seus pais não podem saber que nós somos amigas, então é uma forma de você lembrar de mim quando quiser.

— Sel, é lindo! — Ela se jogou na amiga, abraçando-a com força e dando vários beijos em seu rosto, animada. — Eu com certeza vou deixar na nossa foto todas as noites.

— É, nós somos consideravelmente mais bonitas que o Fimmel mesmo — brincou, fazendo-as meninas rirem. — Lya, esse é seu.

Ela rapidamente agarrou o presente, desfazendo o laço que o segurava. Dentro, havia um pequeno caderno, modesto, ela o folheou, curiosa.

— É um diário, mas só você pode ver o que escreve — explicou, mostrando a pena encantada que vinha junto. — É uma forma de você desabafar e, ainda sim, ninguém vai ser seus segredos.

— Caramba, Sel, isso é.... incrível. — Ela estava sem palavras, olhando boba para o objeto, era simplesmente maravilhoso.

As três ficaram admirando seus presentes, ainda sem voltar a se sentar, cada uma delas sentindo-se emocionadas pelo tanto que se conheciam. Os objetos eram maravilhosos e eram exatamente o que as agradariam.

— Eu amo vocês — Selina disse, subitamente, abraçando as meninas com tanta força que ambas acabaram caindo na cama, atrás delas.

— Selina! — Áquila exclamou, rindo, enquanto a amiga ia para seu lado.

— Obrigada por terem vindo hoje... — Lyanna agradeceu, aproveitando o momento de carinho entre elas. De forma cálida, ela deixou-se ir mais para o lado da Malfoy e a mesma apoiou sua cabeça nela, pensativa.

— Não tem que agradecer, você faria a mesma coisa por nós.

— Você sabe que a gente iria até o inferno para te ver bem — A Campanella emendou, também se aproximando delas.

— Eu sei... e por isso eu tenho tanto medo de perder vocês. — Confessou, sentindo suas bochechas corarem.

— Você não vai, independente do que aconteça. — Áquila segurou sua mão para lhe passar mais confiança, mas a Black podia senti-la tremer de leve e sabia que ela tinha medo. Medo de estarem em lados tão opostos de uma guerra que se perderiam. Mas os temores de Lyanna iam além: se agarrava aos seus segredos para que eles não as destruíssem e se agarrava a ela, apenas para ter a certeza que continuaria ali, embora inúmeros fatores pudesse leva-la.

— Meninas, o almoço está quase pronto. — A voz grave de Sirius as interrompeu, batendo de leve antes de abrir a porta e as três sufocaram uma risada, achando cômico a ideia do mesmo estar preparando alguma comida. Ele definitivamente não fazia o tipo “dono de casa”.

— Eu preciso ir... Já está tarde. — A Malfoy disse, com pesar na voz.

— Também preciso, prometi a minha mãe que estaria lá quando minha avó chegasse de viagem. — Selina explicou, acompanhando a amiga que ia arrumar as suas coisas. — Te escrevo assim que possível.

— A gente se fala a noite, okay? — Áquila disse se aproximando, dando um cálido beijo em sua testa, aproveitando-se da Black ainda estar sentada. — E olha... esquece o que eu falei mais cedo.

— Sobre o que?

— Sobre Sirius... Eu não sei como é ficar longe do meu pai por anos e é imaginável para mim pensar nele em Azkaban, como o seu ficou. — Ela balançou a cabeça, afastando a ideia absurda. — O que eu quero dizer é que você já ficou anos longe dele, não o perca novamente por uma mágoa passageira. Além disso, você sempre quis ter uma família, acho que se aproximar de June é um grande passo para isso.

— Desde quando você se tornou tão sábia? — Lyanna perguntou, abismada.

— É de família, querida — ela brincou, balançando a cabeça de leve —, e eu claramente estou falando dos Malfoy.

— Claro... — A garota riu, acompanhando-as até a porta. — Nos vemos logo.

— Assim que possível. — Elas concordaram, abraçando a mesma e saindo para o corredor, não sem antes Áquila dar uma encarada bem séria em Sirius.

 — Essa garota dos Malfoy.... Herdou o temperamento do pai, isso sim — ele resmungou, fazendo-a rir. Contudo, Lyanna mal prestou atenção em suas palavras, ainda muito marcada pelo que Áquila disse, lançando os braços ao redor dele.

— Não minta para mim de novo, por favor. — Pediu, sem solta-lo.

— Jamais, Lya, eu prometo. — Sirius concordou, acariciando seu cabelo de leve. No fundo, ela sabia que tudo iria ficar bem.

Sophie Lewis.

Angustia

psiq - uma ansiedade física e dolorosa; inquietude profunda que oprime o coração.

Há pessoas no mundo que conseguem fazer você se sentir confortável em qualquer situação, te acolhendo como se fossem parte de sua família e te estendendo um carinho tão grande, que é difícil compreender que coisas tão boas ainda existem em um mundo tão repleto de perversidade e maldade.

Os Weasley eram uma família com esse dom. Desde que Arthur havia saído do hospital, não eram poucas as visitas que vinham conferir se estava tudo bem com o tão conhecido homem que era tão querido por todos. Os Lewis eram um deles, uma família repleta de membros da Ordem que sempre havia sido muito próxima dos ruivos. Tão próxima que, naquele natal, foram convidados a se juntarem a mansão Black durante o almoço do dia 24.

Benjamin e Merina Lewis possuíam quatro filhos: Mathew, Colin, Arthur e a única menina, Sophie. Ela, diferente dos irmãos, havia fugido do centro da mesa, das discussões acaloradas dos adultos sobre os novos rumos da magia. Não que deixasse de se importar com isso, pelo contrário. Apenas prezava uma tranquilidade que era oposta aqueles espíritos extrovertidos.

Assim, estava sentada com Hermione, Natalie e Lyanna. As quatro jovens conversavam de maneira mais contida, porém ainda sim animada sobre os presentes que haviam ganhado de natal e todos os últimos acontecimentos da escola. Todo mundo parecia temeroso, já que os ocorridos continuavam sem respostas e só geravam ainda mais perguntas.

Mas nada disso, no momento, perturbava Sophie mais do que a visão que havia tido no dia anterior, quando andava pelo Beco Diagonal, procurando algo para Resael, seu amigo sereiano. Seu ex-namorado, Jason, andava furtivamente pelas ruas do local, claramente tentando esconder algo.

— Encontrei seu irmão ontem... — Comentou, olhando para Lyanna, que franziu a testa.

— Jason? Eu mal falei com ele desde que entramos de férias, já que prefere ficar com a nossa família adotiva.  — Ela deu de ombros, embora um brilho de tristeza transparecesse pelo seu olhar. Eles eram bem apegados, todo mundo sabia, mas a inconstância do garoto sempre dificultou o relacionamento.

— Ele estava indo para a Travessa do Tranco, acho que escondia algo. — Sussurrou, tomando cuidado para que as outras garotas, concentradas em uma conversa paralela, não a ouvissem. Poucas pessoas sabiam que Sophie já havia tido um relacionamento com o Black, a própria Lya só tinha esse conhecimento por ser inevitável.

— Meu irmão sempre está escondendo algo — suspirou, balançando a cabeça de leve —, e nem sempre é bom. Vou falar com ele quando chegarmos em Hogwarts.

A Lewis assentiu, concordando. Embora o namoro já tivesse acabado há meses, ainda se preocupava com Jason. Havia uma pequena parte de si, quase que soterrada, que sempre zelaria por ele, apesar de todas as desavenças e desentendimentos. Ela gostava de pensar que o mesmo não era uma pessoa ruim, apenas um garoto confuso e imaturo demais, cujo qual o mundo por si só trataria de fazer crescer.

— Ah, aí estão vocês! — Uma voz animada veio do outro lado da mesa, quase derrubando o pobre Harry ao tentar passar entre as inúmeras pessoas que se amontoavam na sala de jantar.

— Tonks! — Lyanna chamou, igualmente feliz, acenando para ela. A moça, agora de cabelos absurdamente claros, sentou-se ao seu lado ruidosamente, sorrindo para as meninas. — Achei que você não viria.

— E perder esse natal? Jamais. — Brincou, balançando a cabeça de leve e fazendo os fios bagunçarem um pouco. — Então, o que vocês acharam do meu novo visual?

— Loira demais — Natalie disse, rindo, embora fizesse gestos de aprovação. — Está parecendo a mãe dos Malfoy, um pouco.

— Vou tentar levar como um elogio. — Piscou, embora Sophie notasse que os fios acabaram escurecendo um pouco para um tom mais dourado. Provavelmente a Granger não sabia do grau de parentesco entre ambas e da indelicadeza da comparação.

— Andrômeda não vêm? — Lyanna perguntou, olhando um pouco ansiosa para a porta. Até onde sabia, ela era muito próxima da prima, que sempre havia ficado do lado de Sirius e todos aqueles que ousaram virar as costas para os antigos costumes dos Black.

— Infelizmente, não. — Respondeu, um tanto desanimada agora. — Ela queria ficar com meu pai, fazer uma comemoração só deles, mas acho que é desculpa. Minha mãe não gosta muito do natal.

— Que pena... — Lya disse, decepcionada, mas logo seu sorriso voltou ao rosto ao lembrar de uma coisa. — Ei, pode mostrar a Sophie aquilo que você faz com o nariz?

— Claro! — Natalie e Hermione sorriram também, com a confirmação, olhando com entusiasmo para o rosto da jovem.

Sophie não pode evitar rir quando o nariz dela foi lentamente se modificando, até que, junto com a boca, formaram um enorme bico de pato, que sonoramente soltava alguns barulhos iguais aos do animal. Ela manteve a transformação por algum tempo, fazendo as meninas rirem com as suas diversas expressões.

— Eu aprendi algo novo — disse, voltando a forma original. — Olhem.

Seu rosto se alongou, e pelos cresceram, fazendo com que no lugar da bela expressão que a moça tinha, surgisse um focinho enorme, porém igualmente belo. Surpresa, ela reconheceu a forma de um lobo no rosto da mesma, que se virou para cima, uivando para o teto e assustando o resto das pessoas, que não prestavam atenção nelas.

— Tonks! — Molly ralhou, fazendo a voltar ao seu rosto.

— Desculpa — disse, rindo, enquanto as meninas batiam palmas, maravilhadas.

— Isso foi genial! — Natalie elogiou, bastante admirada.

— É, eu amei! — Lyanna concordou, tocando a ponta do seu nariz apenas para garantir que estava tudo normal após a transformação.

— Genial — Sophie também disse, sempre se surpreendia com as diversas modificações que a metamorfa conseguia fazer. Era um dom realmente lindo.

Como se atraída pelos sons e brincadeiras, uma figura conhecida surgiu a porta, atraindo os olhares de todos e fazendo a sala rapidamente se afundar em um silêncio surpreso.

— Boa noite — June cumprimentou, corada por toda a atenção direcionada a si. Ela olhou meio confusa para eles, sem saber ao certo para onde ir. Seus olhos focaram um tempo em Sirius, que rapidamente gesticulou para sentasse ao seu lado, mas a jovem negou com um pequeno aceno de cabeça. Era visível que ainda sentia magoa dele.

Todos ali já tinham plena noção da confusão que o Black havia feito na vida das meninas e Sophie realmente sentia pena delas. Aproveitou o momento para olhar em direção aos seus irmãos. Como seria crescer sem qualquer um deles? Descobrir a existência dos mesmos quase aos 16 anos? Era algo inimaginável para ela. Amava-os com todas suas forças, mesmo com as brigas e sendo todos tão diferentes. Não conseguia conceber a ideia de uma vida sem a presença de sequer um dos três.

— Você pode sentar aqui, se quiser — Lyanna ofereceu tão baixo que, somente pelo local estão em um silêncio tão profundo, pode ser escutada.

June abaixou a cabeça, indo em direção a ela, o rosto escondido pelos longos cabelos escuros. Sophie lhe encarou um tanto curiosa. Já havia visto a menina várias vezes pelos corredores de Hogwarts, mas nunca desconfiou do parentesco de ambas. Porém, quando a garota sentou ao lado de da irmã, ficou claro que havia uma forte semelhança entre elas.

— Obrigada — Sussurrou, agradecendo a jovem e finalmente erguendo o olhar para as outras meninas.

— Não precisa agradecer. — Tanto Lyanna, quanto as outras lhe sorriram simpáticas, fazendo com que ela ficasse um pouco mais confortável.

— Mione, quem é aquele garoto? — Perguntou, enquanto as Black ainda se olhavam, meio incertas do que dizer uma para a outra. Havia um menino que Sophie nunca tinha visto antes, sentada ao lado de uma mulher igualmente desconhecida, próxima de Arthur. As outras garotas acompanharam seu olhar.

— Acho que é Alecxander Fraser, algo assim — explicou, gesticulando um pouco. — Sobrinho do sr.Weasley, pelo o que eu entendi.

— Não sabia que Arthur tinha uma irmã — Tonks comentou, olhando um pouco desconfiada para a ruiva que conversava em voz baixa com Molly e Sirius.

— Ninguém sabia, pelo o que entendemos — Natalie continuou a explicação. — Ela nem sequer morava na Inglaterra. Acho que ia para aquela escola americana que eu esqueci o nome...

— Ilvermorny — Hermione e Sophie disseram ao mesmo tempo e acabaram sorrindo uma para outra.

— Pelo menos ele é bonito... — Lyanna brincou, fazendo as garotas rirem. Para a surpresa delas, Alecxander olhou em sua direção, curioso. Elas acenaram educadamente, o que ele rapidamente retribuiu.

— Você não estava saindo com a Blunch, da Corvinal? — Natalie perguntou, achando graça da falta de vergonha na cara da amiga, que nem sequer corou quando todas olharam em sua direção.

— Dito bem, estava. — Frisou, dando de ombros.

— Você não presta... — Sophie disse, balançando a cabeça e sorrindo para a jovem.

Porém, antes que a mesma pudesse lhe responder com alguma de suas tão marcantes frases irônicas, a porta foi aberta com um estrondo e Lupin cambaleou um pouco para dentro, visivelmente abatido.

— Remo? O que aconteceu? — Sirius foi o primeiro a se levantar e ir em sua direção, amparando o amigo.

— O garoto, aquele da escola, acabei de chegar do St.Mungos...

— O Søren? — Hermione perguntou, também correndo para se aproximar do antigo professor.

— Sim, esse mesmo. — Ele tomou fôlego, sentando-se na cadeira que Harry puxou para si. — Ele morreu.

Naquele momento, Sophie desejou não ter levantado, porque suas pernas imediatamente fraquejaram e foi necessário que seu irmão, Mathew segurasse seu braço, lhe mantendo de pé.

Seus olhos se fecharam e ela lembrou-se instantaneamente do garoto que vivia andando silenciosamente pelos corredores, sempre gentil e com palavras sábias para despejar em todos os seus amigos. Quando namorava Jason, ele era um dos poucos que entendia o temperamento confuso e intenso do Black.

Se recordou de sua risada que não vinha fácil, de como sempre estava lá para seus amigos e de quando ela e Áquila o puxaram para uma sala vazia, abismadas por ele ter revelado que não sabia dançar. Passaram a noite iluminados pela luz fraca que entrava pela janela, banhados com uma música suave emitida através de um feitiço, ambas se revezando para ensina-lo. Ele parecia encantado pela loira e Sophie sempre soube que qualquer menina que pudesse conquistar esse olhar único que o mesmo possuía, seria sortuda.

Søren era um bom amigo. Até onde sabia, era até mesmo um bom filho e estudante. Ela não o conheceu tão bem quanto os da casa Sonserina, mas sentia sua perda.

Quando abriu os olhos novamente quase todos se debruçavam sobre a mesa, para ouvir melhor as palavras de Lupin.

— Foi alguém que conhecia a escola, estão apostando até mesmo em alunos, por isso a morte dele não foi divulgada. — Ele gesticulava, como se explicasse um acontecimento em aula. — Mas o feitiço que usaram... era magia negra, da mais profunda e horrível. Chamaram os melhores curandeiros do país, fiquei sabendo que até a Fimmel passou por lá, mas ninguém conseguiu fazer nada.

— Isso é horrível... — Merina, sua mãe, disse, abaixando a cabeça. — Deveríamos fazer um minuto de silêncio por ele.

— Concordo — Molly acenou com a varinha, fazendo algumas velas flutuarem até o centro da mesa, iluminando a todos com um brilho fantasmagórico, que trouxe arrepios na pele de Sophie.

Ela abaixou a cabeça, respirando fundo. Ao seu redor, todos faziam a mesma coisa. A jovem quase sorriu, vendo aquela família que não conhecia Søren nem um pouco, nem sequer tinham motivos para lamentar sua morte, mas ainda sim, possuíam empatia o suficiente.

Instintivamente, sua mão agarrou a de Mathew, ao seu lado. Era seu irmão mais próximo, mais querido. Ambos tinham a idade mais semelhante e eram grudados desde que Sophie nasceu. Ele retribuiu seu aperto, com carinho.

Eu estou aqui por você, era isso que queria dizer silenciosamente.

Mas o coração dela parecia tomado por uma névoa densa e escura. Aquela perda tinha sido o mais próximo de uma morte significativa em sua vida, mas quantas mais não a seguiriam? Quais outros colegas ou amigos ainda choraria a falta?

Eles estavam caminhando para uma guerra, sabia disso. Por um instante, desejou grava cada rosto de cada pessoa na sala, para que jamais se esquecesse deles. Um dia, e seu coração lhe preparava avisando que não demoraria chegar, tudo que conhecem terá se transformado em pó, por uma disputa movida pelo ódio.

Ela só esperava ser capaz de aguentar o preço disso tudo.

— Acho que já o bastante — Benjamin disse, fazendo as velas se apagarem e flutuarem até o lugar certo. Pouco a pouco, as pessoas foram se separando em grupos novamente, embora agora as conversas fossem mais baixas e assustadas.

— Não acho que tenha sido um aluno — Hermione disse, quando as meninas voltaram a se sentar, embora Tonks tenha ficado para trás, querendo recolher mais informações.

— Eu não duvido de absolutamente nada — Lyanna exclamou, tanto June quanto Natalie concordaram consigo.

— Seja quem for, uma hora Dumbledore vai descobrir — a outra Black disse, apoiando a irmã. — E a pessoa vai pagar.

Sophie se limitou a acenar com a cabeça, concordando, mas ela sabia: quantas pessoas já tinham matado e saído impune disso? Mesmo que pegassem o assassino de Søren, não podiam ainda acabar com todas as mortes que o seguiriam.

Suspirou, tentando afastar os pensamentos. O fim chegaria um dia, mas todos ali lutariam ao máximo para adia-lo.

Áquila Malfoy.

Bipolaridade.

psiq - doença que faz a pessoa flutuar entre estados de profunda depressão, episódios maníacos e euforia extrema. 

Antigamente, os bruxos e bruxas tinham como sua única religião a wicca: permeada por rituais tão velhos quanto o tempo e extremamente poderosos, eles podiam manipular e utilizar a energia da natureza para diversos fins. Contudo, com o tempo e principalmente com a caçada instituída por outras religiões, esses ensinamentos foram se perdendo.

Apenas as famílias mais tradicionais mantiveram os hábitos, ainda que nem sempre da maneira correta e rígida de seus antepassados. Entre os diversos rituais praticados durante o ano, estava o Yule. Este, comemorado em dezembro, tem a Deusa em sua fase anciã e triste, sofrendo com a perda do Deus sol, porém também simboliza o recomeço, já que a mesma dará à luz ao novo Deus sol que, posteriormente, irá fertiliza-la novamente e trará brilho a sua vida.

Esse Sabbat – comemorações realizadas para marcar a mudança das estações, é considerado o retorno da vida, já que tudo ficou escuro com a morte do Deus nos meses anteriores.

Assim, é de se esperar que a família Malfoy, considerada a mais antiga e aristocrata de todas, comemore o Yule no lugar do tradicional natal. Portanto, seus jardins estavam repletos com as cores dos deuses nessa época: enfeites vermelhos, dourados e verdes pendiam dos galhos de árvores e diversas bolas brilhantes flutuavam, iluminando ao redor da mansão.

Tudo isso havia sido preparado com muito cuidado e os encantamentos que cercavam a propriedade pareciam ainda mais fortes.

Em uma das inúmeras salas da casa, Áquila se dedicava intensamente ao seu ritual. Ela estava sentada no chão, com um longo vestido branco; velas vermelhas e incensos estavam espalhadas por todo o ambiente, sendo a única iluminação para a garota e um conhecido perfume de mirra preenchia o local. Um livro antigo, que havia pertencido aos seus avós e aos avós deles antes, repousava em seu colo.

Havia, ainda, um cadeirão em sua frente, dentro de um triangulo formado por velas pretas, repleto de folhas de louro e uma vela vermelha em seu interior.

A garota suspirou, tentando ignorar a dor de cabeça que sentia desde manhã, erguendo um pouco o livro, seus olhos se adaptando com a baixa claridade. Ao seu lado, pequenos pedaços de pergaminho estavam perfeitamente organizados: eram desejos escritos por sua família, que seriam pedidos durante o ritual.

Ela já havia traçado o círculo mágico ao seu redor, demarcando-o com diversos cristais que brilhavam diante das chamas. Ao longe, podia ouvir o som do relógio indicando que os minutos passavam. Fechou os olhos. Era hora de começar.

— Que o poder do Sol e do Espírito da Luz sejam despertados! Que o poder do Sol e do Espírito da Luz voltem. Que eles voltem do País de Verão. Que a luz extinguida renasça agora. — Entonou, sentindo a magia fluir pelas suas veias, até a palma das suas mãos.

Não precisava abrir os olhos para saber que as velas ao redor do caldeirão haviam se acendido sozinhas. Isso sempre acontecia em seus rituais.

— Que a partir de hoje a luz aumente e que a força do Inverno enfraqueça aos poucos. Oh, Grande Deusa e Antigos Deuses, que o Sol renasça através de vossa ajuda e poder! — Abriu os olhos, encarando as chamas ao seu redor.

Sentiu sua gargantilha apertar um pouco em seu pescoço e o pingente de pentagrama, cujo qual jamais tirava, se esquentar contra sua pele. Não era ruim, pelo contrário, era até mesmo confortável.

Levantando-se e tomando cuidado para não esbarrar o vestido no fogo, ela começou a andar, em volta do círculo traçado. Sua dor piorou um pouco quando se ergueu, a fazendo levar os dedos até as têmporas, tentando dissipa-la.

Quando se sentiu um pouco melhor, continuou.

— O Deus renascerá e a luz voltará! — As palavras fluíam naturalmente agora e já não mais precisava dos livros para lê-las. Era como se estivesse decorado, embora jamais tenha realizado tal comemoração antes. Pelo menos, não sozinha.

Narcissa costumava lhe acompanhar, mas havia decidido que já tinha idade o suficiente para poder continuar por conta própria.

— O Deus renascerá e a luz voltará! — Ela repetiu e de maneira instintiva levou a mão a barriga.

No Yule, a Deusa estava grávida, esse era seu único consolo em meio ao luto. Áquila quase riu da ironia, mas continuou respeitosamente. Sentia a tristeza como se fosse sua e sabia que grande parte era mesmo. Deveria ter vestido preto para a ocasião, porque a perda também lhe impregnava. Ela e sua divindade tinham mais em comum do que gostaria de admitir. E mais dores do que poderia contar.

 — O Deus renascerá e a luz voltará! — Disse, pela terceira e última vez. O processo era exaustivo, porque exigia muita concentração e energia pessoal. Assim, Áquila foi grata por finalmente voltar a se sentar.

Sua mão, entretanto, continuava em seu ventre e sua respiração um tanto acelerada ameaçava se verter em lágrimas. Porém, ela mordeu o lábio inferior, se segurando. Não era o momento de pensar em suas próprias perdas, mas sim de celebrar o nascimento do Deus.

Ela ergueu o braço, por fim, pegando os papeis com os desejos e jogando-os os no cadeirão, cujo qual o fogo da vela os consumia lentamente.

— Sol dos vales, rios e cachoeiras. Sol das fontes, mares e montanhas a Roda do Ano continua a girar. Que no decorrer deste mesmo ano, os meus pedidos possam frutificar. Que assim seja, e que assim se faça! — Pediu, vendo a chama ficar mais forte e finalmente queimar os pergaminhos por completo.

Sentia um alivio, como uma brisa fresca em seu rosto, muito semelhante ao toque de uma mãe e uma lágrima escorreu. Não estava sozinha.

— Por Ti e para Ti, Deus da Luz, Luminosidade, Senhor da Aurora!

E para aquele que jamais nascerá, completou em pensamento, de certa maneira orando um pouco pelos seus próprios erros.

— O círculo está desfeito, mas jamais será quebrado. — Era o fim do ritual.

Lentamente, se levantou, puxando a varinha que estava guardada em suas vestes e com um aceno apagando as velas e acendendo o enorme lustre que pendia do teto. A sala quase vazia, exceto pelos objetos do ritual, estantes cheias de livros antigos e alguns baús próximos a parede, tomou vida.

— Whynou! — Chamou e, em um estalo, a pequena criaturazinha surgiu em sua frente, olhando-a curioso. — Você pode guardar tudo isso para mim, por favor?

Diferente de quase todos em sua família, Áquila realmente tinha um apreço pelo elfo. Ele, junto com Dobby, praticamente ajudaram sua mãe a criar ela, Draco e Lyra. Seu pai detestava o fato dela trata-lo com tanta educação e se negar a castiga-lo, mas era inevitável.

— Claro, senhorita, Whynou tem todo prazer em servi-la. — Ele fez uma longa reverência, começando a juntar as velas.

— Obrigada... — Áquila se virou, deixando-o com seus afazeres e indo em direção a porta. Na sala de estar, seus pais deveriam estar lhe esperando.

O caminho até lá era curto, mas ela fez questão de se demorar alguns minutos há mais, andando em passos lentos, os dedos brincando com as diversas flores que encontrava pelos corredores. Uma coisa era inegável: sua mãe realmente amava rosas e narcisos.

Sorriu, quando uma pétala caiu em sua palma. Tão frágil e tão bela. Seu reflexo na mesinha bem polida em que o vaso estava apoiado, dizia a mesma coisa. Mas balançou a cabeça, tentando se livrar de tais pensamentos.

O Yule – ou o natal, como atualmente a maioria chamava – era seu feriado favorito. Não pelos presentes caros ou fartos banquetes, mas sim porque era um dos poucos momentos que poderia voltar de Hogwarts e ficar com sua família, principalmente com seus pais. Ela tinha certeza que nunca se acostumaria a ficar longe deles.

O único que não havia ido para a mansão, tinha sido durante o segundo ano, quando Lucius e Narcissa foram viajar para os Estados Unidos a negócios e ela ficou no castelo, com Draco, Charles e Lyra. Mas tinha lembranças boas daquela data, também.

Ela se lembrava de sorrateiramente ter saído com eles e Jason do salão comunal e encontrar suas outras amigas: Lyanna e Selina. Na época, Lya e Charles eram melhores amigos e até hoje a Malfoy não entendia como isso havia se perdido com o tempo.

De qualquer maneira, Áquila tinha uma vaga memória de ter saído da sala em que todos estavam juntos, rindo e jogando alguns jogos, junto com Selina. As duas tinham subido alguns lances de escadas e ambas pararam em frente a uma enorme janela que Filtch havia esquecido aberta. A vista lhes tirou o fôlego. Era tudo lindo lá fora, com a neve cobrindo todos os locais que seus olhos podiam ver. As garotas ficaram admiradas.

Mas acima de tudo, a única coisa que sua mente não perdia com o tempo, impedindo a lembrança de ficar sequer desbotada, é que diante da imensidão de Hogwarts, Áquila havia tido seu primeiro beijo.

Como ela e Selina chegaram a isso era algo que nenhuma das duas saberiam dizer hoje em dia. Em um segundo elas estavam bobas olhando a noite e no outro, suas bocas se encontravam de maneira tímida, sem jeito até. Eram crianças, não tinham experiência nenhuma. Tudo que sabia sobre beijos era o que Lyanna e Charles lhe diziam, quando saiam com alguém. Eles sim eram precoces para a idade, ela sempre foi tímida demais para ter essa impetuosidade.

O beijo durou alguns minutos. Áquila sentia a mão de Selina sobre seu rosto e, atualmente, sempre sorria com a memória. O ato se repetiu algumas vezes depois, tanto naquela noite pelas escadas, a caminho da sala novamente, quanto em outras, com as duas escondidas. Mas nenhum foi tão doce quanto o primeiro, nem tão especial.

Ninguém nunca soube e elas conservavam a lembrança assim: intacta da imaginação alheia, sendo comentado somente quando estavam sozinhas. Era o pequeno segredo delas, que poderia ser inocente, mas foi a base para a confiança da amizade inquebrável que possuíam.

Áquila sorriu, já sentindo falta da amiga. Ela era como um dia de sol e a amava por isso.

Seus pensamentos foram interrompidos pela risada de sua mãe, um pouco antes de entrar na sala que todos estavam. Draco dizia alguma coisa, que fazia tanto Narcissa quanto Lyra rirem, enquanto Lucius sorria. Ela gostava da duplicidade que sua família tinha: eram a mais profunda muralha de gelo para qualquer um que olhassem de fora, mas por dentro eram totalmente diferentes.

— Até que enfim, que demora. — Draco reclamou, quando lhe viu entrar, fazendo-a revirar os olhos. — Hécate está destruindo a sala sem você aqui.

Ela virou para onde ele apontava e notou que Narcissa acenava com a varinha, fazendo alguns enfeites voltarem a enorme árvore no canto da sala, pelo visto a felina tinha ficado bastante empenhada em escala-la, enquanto a dona não estava.

— Desculpa mãe — pediu, abaixando para pegar a gatinha que se escondia atrás do sofá, com medo de levar algum xingo. Esperta, pensou, segurando o riso.

— Ela só está seguindo seu exemplo, quando eram pequenas — ela apontou para Áquila e Lyra — quase derrubaram a árvore em cima de vocês um ano, tentando colocar o pentagrama no topo dela.

Não pode evitar rir, ao lembrar, embora fazer isso fizesse a dor em sua cabeça aumentar um pouco. Na sua casa, era costume colocar um pentagrama no lugar da característica estrela de natal e as duas sempre amavam essa parte. Normalmente, esperavam até a mesma estar totalmente decorada, então Lucius e Anthony as erguiam para colocarem juntas. É uma pena que ambas sempre foram apressadas demais.

— Tal dona, tal gata — respondeu, dando uma piscada divertida para a mãe, que apenas balançou a cabeça sorrindo, antes de ir se sentar ao lado de Lucius, cujo qual rapidamente colocou um dos braços ao redor dela, a abraçando e depositando um beijo em sua testa.

Áquila não pode evitar sorrir.

— Quando eu me casar, quero que seja assim — comentou baixinho, para que apenas Lyra a ouvisse.

— Eu não tenho dúvidas que vai ser — a prima disse carinhosamente, segurando sua mão, feliz ao constatar que a mesma usava o anel que havia lhe dado.

Porém, uma agitação na porta interrompeu as conversas e Áquila sorriu mais abertamente ainda, quando os Fimmel entraram. As duas famílias sempre passavam os natais juntos.

— Boa noite! — Elia cumprimentou, animada, com seu costumeiro sorriso. Normalmente, era a pessoa mais animada que Áquila conhecia. Ela usava um longo vestido dourado, que combinava com seus cabelos claros.

— Crianças — Anthony deu uma piscada em direção aos três, com um sorriso de canto mais contido que a esposa. Assim que se sentou, acenou com a varinha, fazendo um copo de whiskey sair da mesa de bebidas ao canto e vir em sua direção.

Embora sorrisse animada para eles, seu foco estava em um Fimmel diferente. Charles tinha entrado um pouco mais atrás, sempre evitando um contato direto com o pai e, assim que chegou, cumprimentou os padrinhos, mas era visível que sua atenção era quase que total para a namorada.

— Feliz natal, meu amor — disse, dando-lhe um beijo, que rendeu um olhar feio de Lucius em sua direção e uma risada de Anthony para a cara do amigo. Ela segurou à vontade manter seus lábios aos dele, se agarrando a sua máscara de inocência e cortesia.

— Uma hora, você vai ter que se acostumar — Áquila o ouviu dizer, recebendo um resmungo de seu pai como resposta.

— Eu comprei um presente para você — ela exclamou, segurando a mão do garoto e o puxando para um canto da sala, em direção a pilha de caixas enfeitadas que cercava a árvore. A que procurava estava no topo, próxima a parede, com um embrulho azul escuro.

A pegou delicadamente, sentindo o olhar de Charles em suas costas. Queria puxa-lo para a sala ao lado, para o quarto, infelizmente tinham aparências para manter.

— Aqui — ofereceu, com uma expectativa crescente.

— Obrigada, Áq — ele sorriu, rapidamente desfazendo o pequeno laço e tirando de dentro um relógio. Era claramente muito caro, com uma pulseira de couro e ponteiros pontilhados de ônix que brilhavam conforme os minutos passavam. Era lindo e combinava exatamente com o garoto. — Uau, eu amei!

— É encantado, na verdade — explicou, com um sorriso, sabendo que ele não esperava por isso. Seus olhos piscaram demoradamente, a dor que sentia desde cedo aumentava agora, mas ela estava decidida a não reclamar dela. — Está vendo os números dele? Então, você vai notar que eles mudam de cor. Uma vez você me disse que nunca entendia direito as coisas que eu sentia e bem... cada vez que elas se alterarem, significa uma emoção diferente.

Charles olhou surpreso para o pequeno objeto, segurando-o mais firmemente. Lhe parecia uma chave para decifrar a Malfoy, sempre tão difícil de ser entendida.

Ele não a culpava por isso, sabia que seria pior se a mesma não tomasse medicamentos justamente para tais oscilações: desde pequena, Áquila parecia andar em uma eterna corda bamba e vez ou outra ela caia. Isso era uma doença, que atacava seu emocional e fazia seu humor flutuar entre uma doçura a mais terrível tempestade em questão de segundos. 

 — E o que significa a cor azul? — Perguntou, notando que os números estavam claros, quase como um céu em um dia de intenso sol.

— Felicidade — respondeu, dando de ombros e sorrindo.

— Você é genial — elogiou, realmente orgulhoso do empenho da namorada em encontrar um presente como aquele. — Espero que goste do meu.

Ele puxou de dentro do bolso do suéter que usava uma pequena caixa preta aveludada, abrindo-a para ela e mostrando uma pequena pulseira, que tinha um pingente de cobra, com duas esmeraldas nos olhos. Era simples, se comparado as outras joias da garota, mas justamente por isso fez seus olhos brilharem intensamente.

— Cada vez que eu pensar em você, o pingente esquenta — explicou, colocando-a no pulso da garota. — Não muito, mas o suficiente para você saber.

— Percebi — ela brincou, já sentindo, de maneira confortável, quando a cobra tocou sua pele. — Eu amei, Charles.

Em sua empolgação, Áquila esqueceu que sua família estava ao redor, e acabou se jogando nos braços de Charles, beijando-o com intensidade. Suas bocas se tocaram de maneira firme, quando ele entrelaçou os braços ao redor de sua cintura, e ela deixou-se levar pela sensação já conhecida que apenas seu beijo conseguia proporcionar.

— Merlin, Fimmel, é minha irmã — Draco reclamou, embora baixo para não atrair a atenção de Lucius, jogando uma almofada nos dois.

— Vocês dois querem um quarto? — Anthony brincou, já novamente próximo à mesa de bebidas, fazendo-a rir.

— Eu te amo — ela sussurrou, quando se separaram.

— Eu também te amo, Áq.

— É melhor a gente voltar para o sofá, ou eu vou acabar concordando com seu pai e te arrastando lá para cima — disse, fazendo com que ele lhe sorrisse maliciosamente.

— Eu não iria reclamar... — brincou, embora a acompanhasse até o centro da sala novamente, ambos sentaram-se juntos perto de Lyra e Draco.

Não foi difícil para eles logo se integrarem a conversa da família e, vez ou outra, Narcissa levantava para ver se estava tudo certo para o jantar, que aconteceria daqui a pouco. Infelizmente, a luz da sala parecia mais forte a cada segundo, piorando sua dor e fazendo-a piscar demoradamente algumas vezes.

— Está tudo bem? — Lyra perguntou, notando o desconforto da prima e seu silêncio cada vez mais longo.

— Sim, claro — Áquila sorriu fracamente, sabendo que não a enganava.

— Já é meia-noite — Elia disse, erguendo uma pequena taça de champanhe, várias tinham sido distribuídas para todos da sala. Era a única data no ano que Lucius permitia os filhos beberem livremente. — Feliz natal, gente.

Todo mundo levantou, para fazer um brinde. Áquila sentiu uma leve tontura, mas fez o possível para disfarçar, focando nos inúmeros sorrisos que a cercavam. Sua cabeça girava um pouco e ela precisou apertar a taça com mais força, para que não escorregasse por sua mão.

Fechou os olhos por uns segundos, enquanto erguia o braço.

— Áquila? — Podia ouvir Charles lhe chamando, mas soava longe demais. Sua cabeça parecia prestes a explodir.

Abriu os olhos quando as taças se tocavam, o barulho do brinde parecia mil vezes mais alto em seus ouvidos. Quando finalmente conseguiu focar em algo, foi nos olhos igualmente cinzas de seu pai, o sorriso dele desaparecendo em uma expressão preocupada. Queria pedir ajuda, queria repousar a cabeça em seu ombro e deixar que ele a protegesse e fizesse essa dor passar.

Porém, antes que pudesse dar qualquer passo em direção a ele, suas pernas fraquejaram, a taça finalmente caiu de sua mão se espatifando no chão de madeira e o liquido sendo espalhado por todo local. Ela esperou pela queda, mas os braços firmes de Charles ao seu redor garantiram que a mesma nunca chegasse.

Sentia-se flutuando, quando ele a ergueu. Seus olhos pesavam demais para serem abertos, queria gritar para que alguém fizesse aquela dor horrível, mas não tinha forças nem sequer para mover os lábios. Ao seu redor, alguém chamava seu nome, uma mão tocava seu pulso e outra afastava seu cabelo do rosto.

— Leve ela para o quarto — Narcissa disse, próxima.

Mãe, tentou chamar, por favor, faz isso parar.

Sabia que alguém, provavelmente Charles ou Lucius, subia consigo pela escada, de maneira rápida. A próxima coisa que teve noção foi de seu corpo sendo deitado em confortáveis lençóis de seda, talvez em seu quarto.

— Aqui, faça-a tomar isso — a voz de Elia ordenava, para alguém próximo, que rapidamente colocou um pequeno frasco em seus lábios. Os abriu fracamente, recebendo um líquido denso, quente, difícil de engolir.

Quis colocar para fora assim que terminou de beber, mas a escuridão finalmente tomou todos os seus sentidos e ela se perguntou, com medo, se voltaria a acordar.

.

Quando seus olhos se abriram novamente, a primeira coisa que viu foi o teto branco, imaculado. Respirou aliviada, sem sentir mais dor, apenas um cansaço extremo. Instintivamente, suas mãos se fecharam ao redor do cobertor que haviam colocado sobre si. Não usava mais o vestido cheio de pedrarias brancas, mas sim uma camisola escura e fina, que lhe caia perfeitamente.

— Áquila? — Ela se virou para ver Charles em seu sofá, os olhos cansados. Quando tempo ela ficou desmaiada?

— Oi — respondeu, fracamente.

— Graças a Merlin — ele praticamente correu até a cama, sentando-se ao seu lado e tomando suas mãos nas dele. — O que você está sentindo? Está com dor?

— Não, calma...

— Eu vou chamar minha mãe, para cuidar de você.

— Charles, não precisa...

— Ela preparou algumas poções e...

— Charles, eu estou bem! — Disse, um pouco mais alto, cortando seu desespero. Ele respirou fundo, ainda encarando-a. — Não quero que chame sua mãe, por favor, só fica aqui comigo.

— Tudo bem — rapidamente o garoto concordou, deitando-se ao seu lado. Ela se aproximou, colocando a cabeça em seu peito e deixando que ele fizesse um carinho em seus cabelos.

— Quanto tempo eu fiquei assim?

— Algumas horas, sua mãe estava aqui também até alguns minutos atrás, ela disse que já voltava.

Áquila fechou os olhos, lutando contra a vontade de chorar. Horas, desmaiada, horas de sua vida perdidas.

— Eu estou cansada de estar tão doente — reclamou, fechando as mãos em punho. Queria bater em alguém, mas nem tinha forças para isso. E mesmo que tivesse, em quem bateria? — Isso é minha culpa, eu sei, mas não aguento mais.

— Não é sua culpa, Áquila. — Ele protestou, a voz séria, como uma reprimenda.

— É sim, se eu não tivesse.... feito aquilo, nada disso estaria acontecendo — rebateu, negando-se até mesmo falar em voz alta o maior de seus erros. Alguns segredos são melhores quando nem sequer ditos.

— Você não pode dizer isso — sentiu que ele balançava a cabeça, em descrença. — Já ouviu o que minha mãe disse, é algo de família, não é  controlável.

Áquila se limitou a ficar quieta, lutando contra as lágrimas. No fundo, ela sabia, sabia bem demais que estava a cada dia mais próxima da borda de um precipício. Cada poção, cada desmaio, era um passo a mais em direção a queda. E ela não sabia se sobreviveria quando atingisse o chão. 


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