Destinada escrita por Benihime


Capítulo 5
Capítulo III




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Decidi ir à cidade para procurar um livro na biblioteca, mas não consegui encontrá-lo. Depois de procurar por quase uma hora, eu estava quase indo perguntar à bibliotecária quando uma mão masculina estendeu-se por trás de mim, colocando o dito livro na estante. 

— Procurando por isto?

A voz era profunda, e seria mentira dizer que não me causou um arrepio. Eu também podia sentir o calor em minhas costas, indicando que o homem que falara estava bem atrás de mim, perto o bastante para que nossos corpos quase se tocassem. Ignorei isso e me virei, apenas para me deparar com o par de olhos mais inquietantes que já havia visto na vida, verdes como esmeraldas brilhando sob o sol.

Só de olhar naqueles olhos perdi completamente a capacidade de raciocínio. O homem, um grandalhão musculoso, ergueu uma sobrancelha para mim, sorrindo com malícia.

— Ah, que ótimo! — Forcei um sorriso — Sim, eu estava. Obrigada.

— É um livro bem estranho para uma mulher bonita como você.

Dei de ombros, não gostando nem um pouco do tom machista daquele comentário.

— Já ouvi isso antes — Rebati acidamente — Ainda bem que não ligo para o que os outros pensam.

— Calma, morena. — O homem ergueu as mãos no ar em sinal de paz, embora ainda ostentasse aquele sorriso debochado. — Eu só quis dizer que nem todas as mulheres gostam de contos de terror. Foi um elogio.

— Nesse caso, tudo bem. — Estendi a mão direita em um cumprimento. — Sou Lydia.

— Eu sei — Ele respondeu, seu sorriso se alargando. Ele era bonito, eu tinha que admitir. Ao olhá-lo, meu coração falhou uma batida. — Sou Ares.

— Como o deus da guerra?

Exatamente como ele.

Pelo tom de sua voz, percebi que havia mais naquela resposta do que ele realmente disse.

— Bem, foi um prazer. — Usei meu tom mais frio. — Mas agora realmente preciso ir.

Ele não respondeu, apenas continuou me encarando. Algo naqueles olhos verdes ... Era como se já nos conhecêssemos, e a sensação estava me deixando com os nervos à flor da pele.

— Dá pra parar com isso? — Sibilei

Ares apenas me olhou, fingindo uma expressão inocente.

— Isso o que, exatamente?

— Ficar me encarando. Sinceramente, isso é coisa de psicopata. Estou começando a achar que você é o assassino da machadinha.

Ele riu ironicamente de minha pequena explosão, mas eu continuava com raiva. Instintivamente cerrei minhas mãos em punhos.

— Por que eu pararia? — Desafiou. — É sempre bom admirar uma bela mulher.

Com outra pessoa esse final seria um elogio, talvez um flerte. Com ele, foi apenas uma provocação. E o que mais me irritou foi que uma parte de mim gostou daquilo.

Sem pensar, virei a mão em seu rosto, num tabefe bem dado. Pude ver a marca de minha mão depois. Ele tocou o local onde o acertei e deu um meio sorriso, como se, de algum modo, minha explosão o agradasse.

— Você é intensa, Lydia. — Disse — Ainda brilhante como o fogo.

— Vá se danar.

Afastei-me sem dizer mais nada. Aquele homem conseguira me deixar fora de mim, com vontade ao mesmo tempo de matá-lo e agarrá-lo em um beijo apaixonado, lascivo ...

Ares

Observei o cabelo dela, preso em uma trança, balançando ao ritmo de seus passos apressados. Ela estava ainda mais bonita do que antes.

Ri, tocando o local onde ela me acertara. Não era surpresa que Lidya tivesse a mão pesada. Eu mesmo lhe ensinara a lutar.

Olhei mais uma vez para a morena que se afastava, meu riso baixo se transformando em uma gargalhada.

— Ah, Lydia. — Eu disse para mim mesmo. — Você não mudou nada, garota.

Lydia

Querido diário,

Sete anos se passaram. Mal consigo escrever essas simples quatro palavras. Como o tempo passou tão rápido sem que eu percebesse? Pensar nisso me deixa atônita.

Muita coisa mudou nesse tempo. Eu mudei. Gradualmente, ao longo dos anos, aceitei a ideia de que as coisas não eram como sempre pensei. Aceitei quem realmente sou e retomei contato com minha família. Foi uma das melhores decisões que tomei.

Ou seria uma das melhores se não fosse pelo meu irmão Ares. Ele é irritante, adora me provocar e, quanto mais zangada fico, mais ele se diverte. Isso quando sua diversão não consiste em me roubar um beijo. Não que eu permita, é claro, mas ele sempre consegue encontrar uma oportunidade.

 Sobre o resto da minha família, consigo me dar bem com quase todos, embora seja meio complicado. Quando se é imortal, rixas antigas não são esquecidas e rivalidades nunca acabam. Pegue meu pai e tio Poseidon como exemplo. Um é o melhor amigo do outro (embora os dois provavelmente prefiram passar a eternidade no Tártaro a admitir isso) porém brigam tanto que ninguém aguenta ficar por perto. Isso é inevitável.

Mudei de posição no sofá, aproveitando a brisa que corria pela janela da sala de estar, pensando em como continuar o texto. Me perdi em pensamentos até ser sobressaltada por uma sensação estranha: um arrepio gelado, uma sobra em minha visão periférica, sumindo assim que tentei olhar para ela.

Lydia. Hera chamou mentalmente, me fazendo pular de susto. Cronos voltou. E ele quer vingança.

Algo em que eu possa ser útil?

Receio que não, minha filha. Apenas tenha cuidado. E use isto. Ele a protegerá.

Algo brilhou na palma de minha mão, uma névoa dourada que lentamente se dispersou, tomando uma forma sólida.

Olhei para o presente de minha mãe. Era um medalhão prateado em forma de coração, primorosamente trabalhado. Eu coloquei e voltei a escrever do ponto em que havia parado:

 Tive aquela sensação novamente. Algo ruim está para acontecer, posso sentir. Hera, ou melhor, minha mãe, disse que Cronos está retornando, mas acho que há algo muito maior em movimento. Mais perigoso.

Eu gostaria de poder prever o futuro, saber o que vai acontecer. Odeio ter que lidar com um perigo do qual não tenho conhecimento. A verdade é ... Que estou com medo. Simples assim.

Dias depois

— Você é um babaca!

Tentei acertar Ares com um soco. Ele, como já conhecia meus movimentos quase tão bem quanto eu mesma, conseguiu me bloquear. Segurando meu punho, ele se aproximou até estarmos bem próximos, nossos lábios a centímetros de distância. Curvei-me para trás, impondo algum espaço entre nós.

— Não. — Adverti num rosnado. — Não ouse, Ares. Nem sequer pense nisso.

— Agindo assim você só torna tudo mais divertido, sabia?

— Estou falando sério. Se ousar me beijar, juro que atiro você no Tártaro.

Ele riu ironicamente e enfim me soltou.

— Um dia, morena, você é quem vai querer me beijar. Pode apostar nisso.

Afastei-me fervendo de raiva. Aquele homem era tão irritante! Ri comigo mesma assim que pensei isso. Ares me irritava desde o momento em que o vi pela primeira vez, mas eu não podia negar que nossas brigas eram divertidas. Ele tinha o dom de trazer à tona a pior parte de mim, aquela parte selvagem que ansiava por uma boa briga como uma fera enfurecida. 

Nós dois, como sempre, ficamos envolvidos demais em nossa discussão sussurrada durante a reunião do Conselho para sequer perceber que todos já haviam saído. Quando nos demos conta, estávamos sozinhos na sala. Tentei abrir a porta, mas estava trancada. Rosnei de raiva.

— Trancada — Informei — Perfeito!

— Calma — Ares disse — Aposto que isso é coisa do Hefesto. Deixe eu tentar …

Senti sua presença atrás de mim, bem perto, o que deixou todos os meus sentidos em alerta. Ele estendeu uma das mãos, seu braço roçando levemente no meu com o movimento. O calor de sua pele parecia ultrapassar minha blusa e queimar a pele, mas sem a dor.

Ele não teve mais sucesso do que eu na tentativa de abrir a porta. Estava mesmo trancada, provavelmente selada com magia.

— Que ótimo. — Resmunguei, cruzando os braços. — De todas as pessoas do mundo, fico presa justo com você.

— Ora, vamos. Pode não ser tão ruim se você baixar um pouco a guarda.

Eu fico na defensiva? — Não dava para acreditar na petulância daquele homem — Você me provoca tentando comprar briga, e sou eu quem fica na defensiva?

— Tá, tudo bem. — Havia um brilho de divertimento em seus olhos. — Talvez nós dois estejamos errados. Que tal ... Recomeçarmos? Fingir que todas as brigas não existiram?

— Não iria adiantar. — Falei, meio brincando. — Eu te odiaria no segundo seguinte, e já estaríamos brigando.

— Vamos, princesa, dê uma chance. Não sou tão ruim quanto pareço. E eu realmente sinto muito por ... Por tudo.

Sentei-me ali mesmo no chão de mármore, minhas costas apoiadas na parede. Ares se acomodou ao seu lado, mantendo uma pequena distância entre nós.

— Está mesmo se desculpando, Ares? — Provoquei. Só precisei de uma olhada para saber o que ele queria — Não, não está. Seu mentiroso.

Ele pareceu um pouco sem jeito. Se eu não o conhecesse, poderia jurar que minha brincadeira o constrangera. Seus olhos, porém, tinham uma leve expressão de prazer. Parecia que ele gostara do fato de eu o pegar mentindo.

— Tem razão. Sinto muito por ter sido um idiota. — Ele me lançou um meio sorriso travesso. — Mas, em minha defesa, você realmente fica bonita quando está irritada. Não pode me culpar por querer admirar.

Eu ri e aquilo me fez lembrar de outros momentos, quando éramos mais jovens. Ares costumava ser o único capaz de ultrapassar todas as minhas defesas e me fazer sorrir, mesmo nos meus piores dias. Olhando para ele naquele momento, vi o rapaz que costumava ser meu melhor amigo.

— Você ... Também se lembra ... De nós dois?

— É claro — Ele respondeu tranquilamente — Você foi a melhor amiga que já tive, Lydia.

— Fala como se fosse impossível isso acontecer novamente. Nós dois, quero dizer.

— Você não se lembra, não é? Esqueceu por que nos distanciamos.

— Não, eu não lembro. — Admiti — O que aconteceu?

— Nós crescemos. — Ele respondeu. — Nos tornamos diferentes demais, e começamos a brigar o tempo todo. Pouco depois houve o ataque e depois disso nunca mais a vi. Até agora.

Não pude evitar uma onda de remorso. Se Ares estivesse mesmo dizendo a verdade, eu agira como uma megera e, se minhas recordações estavam certas, fora também completamente injusta.

— Sinto muito. — Falei sinceramente.

— Tudo bem — Ele deu de ombros — Isso já é passado.

Naquele exato momento a porta se abriu e pulamos de pé, assustados. Era Afrodite, que tinha um enorme e satisfeito sorriso no rosto.

— Nossa, ainda estão vivos! — Exclamou. — Pensei que já teriam se digladiado a essa altura.

— Há quanto tempo estamos aqui? — Ares quis saber.

— Não sei. Uma hora, talvez.

Nós nos entreolhamos, e percebi que estávamos pensando a mesma coisa.

— Você armou isso, não foi, Dite? — Inquiri acusadoramente.

Ela fez uma carinha inocente, rejeitando minha acusação.

— Eu? Claro que não, Li.

A Deusa do Amor desapareceu em uma nuvem rosada. Ares virou-se para mim, seus olhos verdes dançando cheios de humor. Era óbvio que ele continha uma gargalhada.

— Então ... Isso é uma trégua?

— Não. — Eu sorri — Digamos apenas ... Que eu não te odeio tanto assim.

Ares passou os dedos por entre os cabelos, gesto que sempre o fazia parecer um moleque. Isso e aquele sorriso torto, que significava problemas.

— Ok. Mas eu ainda te odeio tanto quanto antes.

— Aham. Me engana que eu gosto, Cabeção.

— Cabeção? Que tipo de apelido é esse?

— O seu apelido. — Eu ri — E não está muito aquém da verdade, se quer saber.

Ele riu, pela primeira vez, uma risada verdadeira, sem ironia. O efeito foi fazer meu coração disparar e meus joelhos amolecerem.

— Só pra constar, também não te odeio tanto assim, tubaroa.

— Tubaroa? — Repeti, erguendo uma sobrancelha.

— Nada sutil, violenta, ataca para matar e feia de doer ... Com certeza é você.

Eu ri e lhe dei um soco no ombro. Com força. Ele revidou, o que fez com que eu o empurrasse. Mas mesmo assim não consegui deixar de sorrir.

— Vá se ferrar, Cabeção.

— O mesmo para você, tubaroa.


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