Destinada escrita por Benihime


Capítulo 29
Capítulo XXVII




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Fui despertada por alguém me chamando. Abri os olhos para me deparar com os flamejantes cabelos ruivos de Héstia.

— Desculpe, Héstia. — Falei. — Eu nem percebi que estava tão cansada.

— Vá dormir um pouco, querida. — Minha tia disse gentilmente. — Eu termino aqui.

— Não, eu estou bem. Quero acabar logo com isso.

Nesse momento, Ares entrou na biblioteca e veio direto até nós, parecendo exasperado.

— Ela está mentindo, Héstia. — Ele anunciou.

— O que você veio fazer aqui, seu insuportável?

— Te arrastar pra fora. — Foi a resposta. — Lydia, você está aqui a quase dois dias diretos. O que está tentando provar?

— Nada. — Respondi. — Eu só quero achar logo uma forma de vencermos.

— Pensei que as relíquias fossem a forma.

— Não sozinhas. — Declarei. — Precisamos de mais, muito mais, se quisermos vencer Nyx.

— Isso pode muito bem esperar algumas horas.

— Argh, está bem! — Cedi, de má vontade. — Eu vou, mas só descansarei por uma hora.

Tentei levantar, mas estava tão cansada que cambaleei, e só não caí porque Ares me amparou.

— Deixe de ser idiota. — Ele ordenou. — Eu vou te prender no quarto até ter certeza de que dormiu o suficiente.

— Seu bobo. — Retruquei. — Eu sei me cuidar. Não sou mais criança.

— Não é o que parece.

— Ares, eu não preciso …

Ele me calou com um dedo em meus lábios.

— Pelo menos uma vez, sua teimosa, relaxe e deixe alguém cuidar de você.

Suas palavras e a semelhança com o que Damaso dissera me desarmaram. Eu não pude dizer nada em resposta.

Ares

Minutos depois

Lydia se deitou e puxou as cobertas até o queixo. Eu conhecia aquele gesto. Pude ver o medo em sua expressão, por mais que ela tentasse esconder.

— O pesadelo de novo?

— Tenho medo de dormir. — Ela confessou baixinho. — Não quero fechar os olhos. Não quero ter aquele pesadelo de novo.

Eu me deitei ao seu lado e ela escondeu o rosto em meu ombro. Passei um braço por sua cintura, trazendo-a para bem perto de mim, abraçando-a o mais forte que podia.

Lydia

Nos braços de Ares eu relaxei um pouco. Comecei a me perguntar se conseguiria dormir. Acabei pegando no sono bem mais rápido do que imaginara.

O labirinto de pedra é frio, e estremeço. De repente ouço passos ecoando pelas paredes mal iluminadas. A risada os acompanha. Há séculos que não ouço aquela risada. É contagiante, cheia de vida.

Um momento depois, a garota de cabelos escuros está à minha frente. Nossos olhos, exatamente iguais, não se desviam. Seu vestido branco, na débil luz da tocha que empunho, é quase fantasmagórico. Fazendo sinal para que eu a siga, ela começa a correr.

— Aonde vamos? — Pergunto.

Ela olha para trás, por sobre o ombro, ainda sorrindo.

— Espere e verá.

Logo chegamos a uma enorme porta negra, que ela abre. Ao cruzar o umbral, estou em um campo de batalha. E minha família está sendo massacrada. Tento ajudar, mas não posso me mover.

— Sua lealdade é louvável. — Uma voz familiar diz. — Mas isso é o que a espera caso insista na guerra.

Viro-me para olhar nos olhos de Nyx. Há algo diferente em seu olhar, uma centelha de calor aquecendo o gelo.

— O que espera que eu faça? — Não escondo a hostilidade. — Não depende de mim. Mesmo que eu me renda, minha família não o fará.

— Desista. Esqueça a busca pelas relíquias, convença-os a se render e lhe dou minha palavra de que isto ... — ela indica a cena à nossa frente com um gesto lânguido e elegante. — Jamais acontecerá.

— Por que está me oferecendo essa chance?

— Porque admiro sua coragem. — Nyx responde, e parece absolutamente sincera. — E então, temos um acordo?

— Jamais. — Respondi. Não com você.

— Eu lhe darei algum tempo para pensar. — Ela declara, colocando em minhas mãos uma pulseira de ônix — O acordo vale até a véspera da batalha. Se mudar de ideia, saberá onde me encontrar. Não deixe seu orgulho falar mais alto, Lydia.

— Covarde! — Explodo, furiosa com sua atitude. — Se você tivesse coragem, me enfrentaria pessoalmente. Você teme fazer isso porque sabe que eu vencerei.

— Talvez a mim, mas não vencerá meu pai.

— Seu pai?! — Não pude conter a surpresa. — Caos?

— Sim. — A Deusa da Noite assentiu. Fazer um acordo comigo é sua única chance de evitar enfrentá-lo.

— Que seja. — Praticamente rosnei em resposta. Prefiro enfrentá-lo e perder do que me aliar a você.

Nyx se aproxima, perto o bastante para que eu possa sentir seu perfume denso e misterioso. Ela estende uma das mãos e pega um cacho de meu cabelo, deslizando-o indicador e o polegar num gesto quase afetuoso.

— Tanta coragem. — A Deusa da Noite diz, quase para si mesma. — Realmente espero que mude de ideia, Lydia. Eu preferiria não ter que matar você.

Acordei com um sobressalto, sentando-me na cama. Imediatamente senti Ares tocar a base de minhas costas, num gesto de conforto.

— Tudo bem, Lids?

— Tudo bem. — Voltei a deitar ao seu lado. — Só mais um pesadelo.

Ele me puxou para si novamente, seus braços formando um casulo ao meu redor. Eu desejei que pudesse ficar ali para sempre.

Na manhã seguinte

Assim que terminei de falar, senti que cometera um erro ao contar o sonho a Gaia. Ela estava absoluta e obviamente furiosa.

— Aquela ... Aquela ... — Ela respirou fundo para controlar-se. — Eu poderia matá-la.

— Nem pensar! — Protestei. — Nyx é minha.

— Pelo menos você não cedeu. — Minha companheira comentou. — Isso é bom.

— Eu não cederia. Não a ela. Além do mais, desconfio que Nyx nem estava realmente tentando me convencer.

— Por que acha isso?

— Quando eu me neguei ... Ela não fez nada. — Revelei. — Nyx sabia que, se me dissesse para desistir e ameaçasse minha família, eu ficaria ainda mais decidida a lutar. Ela quer me enfrentar na batalha, e está armando uma forma de isso acontecer.

— É, Nyx sem dúvida faria algo assim.

— Como sabe disso?

— Já fomos aliadas. — A Mãe-Terra revelou. — No começo nosso plano era apenas ganhar sua confiança. Com você fora do jogo, enfraqueceríamos os olimpianos facilmente. Claro que não deu certo. Lembra-se dos Transfiguradores no Ártico? — eu assenti em resposta. — Foi ideia de Nyx. Eu devia apenas vigiar, ter certeza de que o plano daria certo, mas acabei me envolvendo. Por algum tempo fingi ainda estar do lado dela apenas para acabar com seus planos.

— O que deu errado? — Eu quis saber. Apesar de tudo o que acabara de ouvir, eu acreditava que Gaia era minha aliada. Não havia dúvida alguma quanto a isso. — Nyx descobriu?

— Não. — Ela esboçou um sorriso — Ela confiava demais em mim, consegui manter tudo no mais perfeito sigilo. O problema foi que não aguentei mais manter a farsa. Quando a defendi, na Estíria, Nyx soube exatamente de que lado eu estava. Por isso me chamou de covarde. Ela acha que quebrei nosso juramento por medo da retaliação.

— E você não tem medo?

— Por algumas coisas, Lydia, vale a pena qualquer punição.

Horas depois

Origem da vida

Um segredo guardado

Na escuridão

O brilho de uma chama é aprisionado  

— E o mapa aponta esta floresta.

— Então vamos logo.

Na floresta

— Droga! — Héstia praguejou, depois de mais uma vez ter tropeçado em uma raiz saliente.

Eu quase ri. Ao invés disso, tentei pensar em como ajudá-la. Lembrei de um truque que Gaia me ensinara e fiz com que as raízes ficassem cobertas de terra.

— Pronto. — Anunciei. — Chega de raízes.

Antes que Héstia pudesse responder ouvimos passos de algo enorme vindo em nossa direção. Minha tia agarrou minha mão e disparou pela floresta. Algum tempo depois, paramos perto de uma caverna.

Olhei em volta, tentando ver alguma coisa, mas estava muito escuro. De repente, a mão de Héstia iluminou-se com chamas. Pude ver a caverna atrás de nós, mais profunda do que imaginei. Uma atmosfera fria e pesada a cercava.

— A Gruta das Almas. — Minha tia anunciou. — Sente isso? A relíquia está lá dentro.

Trocamos um rápido olhar antes de entrarmos lado a lado na gruta. Lá dentro, tive uma surpresa: estávamos em um labirinto.

— Este é ... ?

— O Labirinto. É sim.

— E você sabe o caminho?

Ela assentiu. Fiz uma linha prateada surgir, conectada à entrada do labirinto. A outra extremidade estava enrolada ao redor de meu pulso. Juntas, Héstia e eu nos embrenhamos no Labirinto.

Uma hora depois

— Fique longe das paredes. — Héstia avisou. — Elas têm espinhos.

— Espinhos?

A Deusa do Fogo aproximou uma das mãos de uma parede, de modo que eu visse claramente os pequenos, porém afiados, espinhos que a recobriam.

Continuamos a caminhada através da passagem cada vez mais estreita. De repente, Héstia cambaleou. Eu a segurei. Ela arfou ligeiramente, numa breve exclamação de dor. Notei que seu ombro fora arranhado profundamente por um espinho afiado.

— Tudo bem?

— Acho que sim.

Continuamos a caminhar até eu notar que os passos de minha tia vacilavam. Eu a segurei e, ao fazer isso, notei que seu ombro ainda sangrava. Já devia ter cicatrizado, pensei, alarmada.

— Veneno.

Levei um segundo para entender seu aviso. Os espinhos continham veneno. Sem pensar duas vezes, eu a peguei no colo. Minha vontade era voltar imediatamente ao Olimpo, mas eu sabia que precisava encontrar a relíquia. Assim, concentrei-me em passar a Héstia um pouco de minha força, curando o corte em seu ombro. Isso a sustentaria até Apolo poder assumir a situação.

— Melhor?

Ela assentiu. Notei que estava pálida, um contraste marcante com o ruivo flamejante de seu cabelo.

Seguimos pelo labirinto, saindo em uma passagem mais larga. Era uma bifurcação. Parei, indecisa, tentando sentir o que nos esperava ao final de cada caminho. 

De repente notei um lírio no começo do caminho para a esquerda. O perfume da flor era tão forte que preenchia o ar ao nosso redor. Quase sorri. Tinha certeza de que a flor não estava lá antes, o que significava que havia alguém tentando nos ajudar. Ou poderia ser uma armadilha. Olhei para Héstia.

— Acho que podemos arriscar. — Ela declarou.

Mal cruzamos a passagem, senti-me em queda livre, que logo foi interrompida pelo que parecia ser uma rede. Estava escuro demais para enxergar e ter certeza.

— Héstia? — Sem resposta — Héstia? Héstia!

Tateei na escuridão, tentando encontrá-la. Sua mão fechou-se sobre a minha. Ela estava gelada. Gelada demais.

— Você está bem? — Perguntou.

— Não importa. Você se machucou?

— Estou bem, Lydia. Não se preocupe.

Tentei chegar mais perto dela, mas estava firmemente presa. Só então percebi que não estava presa em uma rede. Era uma teia de aranha. Bem no momento em que percebi isso, olhos vermelhos e brilhantes apareceram na escuridão. Eu conhecia a lenda, sabia exatamente o que esperava nas sombras.

— Aracne. — Fiquei orgulhosa porque minha voz soou alta e firme. — Deixe Héstia ir. Ela foi ferida, precisa voltar ao Olimpo.

— Lydia, não.

— Quieta. Você sabe que precisa de Apolo. — Ergui a voz novamente, dirigindo-me a Aracne. — Aracne, por favor. Fique comigo, mas deixe Héstia ir.

— Uma olimpiana altruísta? — Aracne foi irônica, sua voz pingando veneno. — Ora, isso não se vê todo dia. Está bem, vou lhe dar uma chance. Se completar meu desafio, eu as libertarei.

— Que assim seja. Eu aceito.

Aracne então se aproximou e, com incrível velocidade, teceu algo em volta de mim, prendendo-me inexpugnavelmente. A única parte de meu corpo que estava livre eram minhas mãos.

— Desfaça toda a tapeçaria sem romper nenhum fio.

Assenti e tentei desfazer a tapeçaria, mas os fios estavam tão firmemente trançados que seria impossível desfazê-la sem rebentar alguns. Lembrei-me de Atena, que me ensinou a tecer, e tive uma ideia. Foi preciso muita flexibilidade para ficar na posição certa, mas consegui desfazer a tapeçaria com alguns puxões nos lugares certos.

— Como fez isso? — Aracne soou extremamente surpresa.

— A tapeçaria é mais frágil por baixo. Só precisei encontrar o ponto onde você começou a tecer.

— Vocês não estão longe do fim. — Ela informou. — Assim que voltarem à bifurcação, sigam pela direita. Haverá uma escadaria, mas não desçam. Dez passos para a esquerda e depois você saberá exatamente o que fazer. Essa é toda a ajuda que posso lhe dar.

— Obrigada. — Virei-me para minha tia, que conseguira se levantar. — Acha que aguenta uma escalada?

Héstia assentiu. Escalamos a parede, usando a teia de Aracne como apoio. Rapidamente voltamos ao corredor e seguimos as instruções da mulher aracnídea, que levavam a uma passagem secreta.

— Acha que podemos confiar nela? — Inquiri.

— Não temos muita escolha, não é?

Avançamos lentamente pela passagem estreita. Depois do que pareceram horas, mas com certeza foram apenas minutos, chegamos a uma pequena caverna.

O local estava iluminado pelo que parecia milhares de pequenos vagalumes azulados. No centro da caverna, aninhado em uma cavidade da rocha, um cristal brilhava como se estivesse em chamas.

— A Chama do Olimpo.

Héstia assentiu, já se aproximando para pegar o cristal. Assim que seus dedos o tocaram, uma luz intensa brilhou. Héstia foi envolvida pelas chamas, que dançaram em espiral ao seu redor até sumirem. Foi aí que realmente pude realmente olhar para minha tia.

Ela não estava mais pálida por causa do veneno. Sua pele tinha um profundo tom bronzeado, seus olhos brilhavam e, no movimento das mechas de seu cabelo, havia o brilho das chamas. Ela era a própria chama.


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