O abismo em todos nós. escrita por Ninguém


Capítulo 5
Capítulo 5




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“Exija muito de si e espere pouco dos outros, assim evitará muitos aborrecimentos.” – Confúcio.

Quantas vezes já se pegou olhando para o teto de seu quarto ou encarando o nada apenas pensando na vida? Quantas vezes se pegou sentindo uma conhecida, porém indecifrável, tristeza? Cada ser humano na face deste mundo é único à sua maneira mesmo que muitos não acreditem nisso.

Por quê?

Por causa de pensamentos como “minha vida tem sentido?” “ Onde está o significado da minha existência?Por que não sou feliz como tantas pessoas que vejo no face ou no instagram que parecem estar de verdade usufruindo de uma felicidade genuína em eventos incríveis junto de seus amigos sorridentes?”  Mais e mais nos focamos em terceiros tentando comparar nossas vidas, tentando desesperadamente trilhar o caminho deles, desejando, ambicionando terem o que essas pessoas irritantemente satisfeitas possuem.

Dinheiro? Viagens? Amigos? Um grande e dedicado amor? Uma família unida e carinhosa?

É fácil se perder em tais pensamentos, nos fazendo esquecer quem somos ou pior, nos fazendo perder o desejo por descobrir quem realmente somos. Ou quem queremos ser. Então uma fenda em nossa alma se abre e vai ficando funda conforme o tempo passa e assistimos a vidas dos outros esquecendo nossa própria. Ao atingirmos o fundo, o terror de não estar vivendo finalmente toma forma e, desesperados por entender que um dia morreremos, tentamos fazer esta existência ter um significado do jeito mais errado que há: pelos olhos dos outros.

A aceitação ou os “likes” se tornaram o real significado do que estamos fazendo. Quanto mais elogios, atenção ou “likes” mais sentimos que estamos saindo da fenda de nossa alma subindo para a superfície... quando na verdade é meramente uma ilusão. Por quê? Por que confundimos reconhecimento com aceitação.

Ser reconhecido é quando você se expressa por pura vontade própria, faz o que faz por que gosta ( trabalhar, escrever, cozinhar, desenhar, pintar, atuar) e então, os outros gostam e aí entra o reconhecimento.

A aceitação é algo pessoal, deve vir de dentro de cada um. Aceite a si mesmo.

Tais pensamentos afloravam na mente de Alexandre sem parar, desde que voltara para casa sua cabeça estava sendo tomada por contradições e verdades tão claras que chegavam a ser obvias. E quanto mais ponderava sobre suas implicações, mais reconhecia que tinha mudado, que tinha perdido alguma coisa... só não conseguia entender o quê.

Na escola, Alexandre não se importava com os olhares em sua direção seja por causa dos braços enfaixados, pelos boatos da briga com Aegon ou mesmo das tantas outras fofocas que surgiram após isso, eles ainda faziam chacota do garoto só que desta vez Alexandre os ignorava; não por despeito ou orgulho, simplesmente porque sua cabeça funcionava a mil e o mundo externo ganhava uma atenção secundária.

Ao chegar a classe viu que sua mesa estava rabiscada e pintada com insultos do tipo “medroso” “covarde” “verme”, mas não ligou a tal ponto que era como se não houvesse nada lá. Quando o professor Roberto, de história, pediu os relatórios sobre a segunda guerra mundial Alexandre ergueu o braço.

— Desculpe professor, devo ter faltado a aula... eu não fiz.  

O mestre baixinho de óculos olhou para o garoto.

— Eu deixei o aviso no grupo da turma, já tem uma semana Alexandre.

O neto de Gertrudes se lembra de não ter visto nada, afinal sempre checava os grupos para não perder a nota dos trabalhos já que suas notas nas provas eram horríveis e um pontinho extra de algum relatório era salvador.  

Alguns alunos riram, outros cochicharam.

— Posso entregar amanhã?

— Não, não pode. Agora todos, abram a apostila na página 42.

Ao término do dia letivo, enquanto arrumava suas coisas na mochila uma figura esbelta parou rente a sua mesa, o adolescente ergueu os olhos para ver Catarina Gomez: simplesmente uma das meninas mais bonitas da sala ou do colégio. Sua pele morena e longos cabelos negros lisos que desciam quase na cintura fina combinavam com os olhos cor de mel formando uma imagem feminina adorada por boa parte do grupo estudantil e até por alguns professores – de acordo com boatos.

Alexandre “chegou” nela uma vez, motivado por seu ego inflado ele achou que como Catarina era bonita e teoricamente importante – pois é filha de um senador – eles formavam um bom par já que o rapaz é neto de uma importante e juíza e bem... talvez não tivesse um corpo musculoso, os braços eram um pouco finos, havia umas gordurinhas nas ancas, e umas espinhas pequenas no rosto... ainda sim ele não era de se jogar fora. – era assim que Alexandre pensava.

Ela o rejeitou num severo e seco “não”. Quando o garoto perguntou o motivo, eis a resposta:

— Você não me conhece, eu não te conheço não quero conhecer e com uma atitude dessas só sua presença já me é ofensiva. Não chegue perto de mim.

Agora ela tinha se aproximado, o fitando com aqueles olhos marrons claros.

— A turma criou um novo grupo e te deixaram de fora.

— Imaginei algo assim. – respondeu ele sem qualquer emoção na voz pondo os cadernos na mochila.

— Peça aos professores para te darem a matéria separado.

Alexandre ergue o olhar fitando o dela. De repente não eram tão intimidadores como da vez em que levou um fora.

— Por que essa gentileza repentina?

— Por que não gosto de ficar devendo nada a ninguém – respondeu ela.

— Você não me deve nada.

Catarina estreita o olhar, uma leve confusão passa por sua face.

— Não dou a mínima para seu senso de humildade – disse a garota em tom sério – eu vou devolver o que fez por mim, então ficamos quites.

Ela aponta para os braços enfaixados de Alexandre.

— Os idiotas desse colégio estão dizendo um monte de asneiras sobre seus ferimentos. Provavelmente sou a única que sabe realmente o que aconteceu com você naquele incêndio.

Alexandre arregala os olhos.

— O que disse?

— Não se preocupe – respondeu Catarina – não vou contar a ninguém.

E do mesmo modo sério e ríspido que veio ela se foi deixando o rapaz completamente absorto com o que tinha escutado.


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