Allons-y, Winchester! escrita por Hunter Pri Rosen


Capítulo 10
Ciranda macabra


Notas iniciais do capítulo

Hi, peoples!

Segue aí mais um capítulo dessa história super fofa e nada agoniante kkkkkk

Teoricamente, esse é o penúltimo capítulo, mas ainda teremos outras três atualizações. Oi? (É que o final ficou enorme, dividi em duas partes, e depois terá um epílogo para fechar o paranauê todo.)

Bem, esse aqui é pov Sam.

Boa leitura!



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No quarto que pertenceu a mim durante os meus seis primeiros meses de vida, outro tipo de criatura maligna tenta arruinar a minha história nesse mundo. Mas tenho que dizer: perto dos Anjos Lamentadores que me encaram com expressões animalescas agora, prestes a me atacarem se eu piscar de novo, Azazel era fichinha.  

Com demônios eu sei lidar, sei como funcionam, apesar de algumas rasteiras que levei ao longo da estrada até aqui. Mas alienígenas sanguessugas que se disfarçam de estátuas angelicais? Parece que isso eu terei que aprender na marra se quiser sobreviver a essa noite. 

Por sorte e para meu alívio, Dean está aqui. Como sempre, ele está por perto quando mais preciso. Ou mesmo quando acho que não preciso. Como sempre, ele deu um jeito de vir ao meu auxílio, como o irmão mais velho protetor e homem nobre que é. 

Desta vez, ele trouxe um reforço, é claro. Temos um aliado importante na caçada incomum onde eu virei a própria caça. O Doutor está do nosso lado e isso me deixa mais confiante. 

Admito que sem a ajuda do último Senhor do Tempo, eu não teria como enfrentar essa situação sozinho e, provavelmente, nem Dean. Eu me perderia para sempre em poucos segundos, quando piscasse eventualmente, e algum dos Anjos conseguisse me tocar. Aposto que Dean tentaria impedir, mas não sei se seria capaz de me salvar, apesar de toda a coragem e determinação que correm em suas veias. 

Se eu fosse lançado em algum ponto do passado, tentaria reverter a situação por minha conta, óbvio. Até o fim da linha se fosse preciso. Porém reconheço que seria uma luta bem difícil de vencer, pois estaria num território desconhecido e sozinho, à mercê de detalhes e complicações que desconheço agora. Talvez, no fim, fosse simplesmente impossível voltar para o presente. 

Ao imaginar esse cenário, sinto o suor brotar em minhas mãos e a garganta fica seca. Mais uma vez, agradeço em pensamento por Dean ter aparecido bem a tempo e pelo Doutor também estar aqui. 

Minha vida está muito longe de ser perfeita, mas eu não a trocaria por nada nesse mundo. Sei que cometi os meus erros no passado, ao perseguir, por tantos anos, o sonho de ter uma vida normal. Entretanto, hoje sei que esse desejo não faz mais parte de quem eu sou, de quem me tornei. Depois de dar tantos murros em ponta de faca, aprendi alguma coisa. Hoje sei o meu lugar no mundo e qual é o meu trabalho aqui. Sou um caçador e sou o legado dos Homens das Letras. 

Certamente, ninguém em sã consciência gostaria de ocupar tal lugar. Com certeza, esse é um péssimo trabalho. Sem falar, que nem remunerado é. Mas alguém precisa fazê-lo, certo? E estou cada vez mais convencido de que caçar é a única coisa que eu realmente faço direito. Modéstia à parte, sou um bom caçador. Pudera... aprendi com os melhores: Dean Winchester, nosso pai, Bobby Singer.  

Estou pensando em tudo isso em parte porque, em virtude da situação arriscada em que estou metido, deve ser natural que minha vida passe como um filme diante dos meus olhos. Por outro lado, também estou concentrado nesses fatos pois tenho que me agarrar a alguma coisa, à realidade, a quem sou e a quem não quero deixar de ser. Apesar de imperfeita, prezo muito pela minha vida e não quero que ela mude. Preciso manter o foco nisso e usar essa determinação para manter os olhos bem abertos. Não posso piscar. 

Fazê-lo iria arruinar tudo. Destruir tudo. Seria o meu fim. E se Dean não conseguisse me salvar, estou certo que a culpa que passaria a sentir o destruiria também. 

Com esse espírito, faço um esforço e ignoro a ardência quase insuportável em meus olhos. Continuo encarando os oponentes de outro mundo diante de mim e me recuso a deixar que eles vençam essa batalha.  

Sim, é muito difícil encarar os dois ao mesmo tempo. Por sorte, estão relativamente próximos um do outro. Acho que pretendiam me cercar antes que eu alcançasse a saída. Como agora há mais olhos concentrados nos dois, parece que o plano maligno foi comprometido. 

Tomando muito cuidado para não tropeçar de novo e, com isso, perder o foco num momento fatal — o que poderia desconcentrar Dean e o Doutor também —, dou curtos e lentos passos para trás. 

— Muito bem, Sammy. Continue a nadar — Dean fala, em algum lugar entre mim e a saída do antigo recinto. Apesar do senso de humor, a apreensão em sua voz é nítida. 

— Você está indo muito bem mesmo — o viajante do tempo emenda, enquanto recuo mais alguns centímetros. — Nós três estamos olhando — refere-se aos Anjos Lamentadores —, então eles não vão a lugar algum. Enquanto estivermos encarando as criaturas, elas não podem se mover.  

Deixo o discurso do Doutor influenciar o meu foco positivamente. Concentro-me ainda mais no que estou fazendo. Dou mais passos para trás, fazendo um progresso maior. Ouço os passos leves dele e de Dean, também em movimento, contudo mais devagar. Acho que querem que eu os alcance primeiro.  

Em dado momento, é exatamente o que acontece. Não posso olhar, mas sinto os dois ao meu lado. Ouço o ritmo tenso das respirações. É bem nesse momento também que algo muito estranho e, sem dúvida, inesperado, acontece. 

Como se fôssemos parte de um filme, ou quem sabe de um seriado televisivo qualquer, o cenário a nossa volta treme de forma esquisita em virtude de uma interferência inexplicável. Sem desviar o olhar das estátuas, noto feixes de luz atrás delas, pelas paredes do quarto e no teto. É como se algo estivesse atravessando ou se misturando ao ambiente, rompendo uma película invisível que está lá de alguma forma e mantém as coisas como são, fixas no tempo e espaço. Ou como deveriam ficar pelo menos. É essa a impressão que tenho. O mundo parece estar rachando nesse quarto. 

Quando o fenômeno termina, temos um grande problema pela frente. Não há apenas dois malditos Anjos conosco no quarto, agora quatro deles nos encaram. Os dois novatos estão mais atrás, com as mãos ocultando as faces de pedra. Deduzo que só estão imóveis porque eu olhei para eles. 

Ao me lembrar das criaturas mais adiantadas, procuro por elas de novo. Levo um tremendo susto e oscilo para trás ao perceber que as estátuas em questão avançaram de forma perigosa até mim. Seus dentes pontiagudos e seus dedos compridos são mais visíveis do que nunca. 

— Mantenha o olhar nos segundos Anjos, Dean! — grito, desesperado. 

Acho que ele faz exatamente isso, já que o controle da situação agoniante fica ao nosso favor mais uma vez. O ar fica estático, levando-me a concluir que, se as estátuas que surgiram por último, se moveram alguns centímetros, logo ficaram travadas de novo sob o olhar do meu irmão. 

— O que é isso, Doutor? — ele questiona, no exato instante em que uma nova oscilação acontece no quarto.  

Mais dois Anjos Lamentadores aparecem atrás dos espécimes que surgiram anteriormente. 

Enquanto a tensão do ambiente cresce de forma sufocante e indica um desfecho incerto pela frente, o Senhor do Tempo responde, emblemático: 

— Isso, meus amigos, é o que eu chamo de causa e consequência. 

— Como assim? — De repente, tenho a nítida impressão que ele e Dean sabem de alguma coisa que eu não sei. 

— Awesome... — meu irmão resmunga, com ironia, numa clara manobra para dissipar a tensão e também me fazer esquecer o que acabei de ouvir. 

Mesmo diante dessa situação complicada, uma vez que é bem difícil manter todos os seis Anjos bloqueados quanticamente sob nossos olhares, não deixo minha suspeita ser ignorada e questiono: 

— O que vocês fizeram? — Não obtenho resposta. Insisto, direcionando a pergunta: — Dean, o que você fez? 

Talvez ciente de que é inútil negar e notando que estamos sem tempo hábil para meias palavras no momento, meu irmão revela falando rápido e meio irritado: 

— Eu voltei no tempo para te salvar! Odiei a primeira versão da história e não podia deixar barato. O Doutor não aprovou de cara, mas eu consegui convencê-lo e aqui estamos nós. Fim da história. 

— Você o quê?! — Mesmo agradecido pelo sacrifício, fico indignado pois, claramente, estamos diante de uma tremenda consequência agora. Consequência que poderia ser evitada se Dean tivesse deixado as coisas como estavam.  

Sem querer, acabo esquecendo da sinuca de bico a nossa volta e procuro por Dean. Ao me lembrar dos Anjos, arregalo os olhos e torno a encará-los. Alguns se moveram rapidamente em nossa direção, formando um cerco. 

— Droga, Sammy! — ele esbraveja, preocupado e possesso. — Mantenha os olhos nessas coisas!  

— Em qual delas exatamente? 

Pergunto isso porque há seis Anjos ao nosso redor. De repente, são oito. Não sei para qual olhar e acredito que meu irmão e o Senhor do Tempo enfrentam o mesmo impasse. Os seres perigosos avançam de forma ameaçadora e bizarra toda vez que nos atrapalhamos assim.  

Para ajudar, as luzes das lanternas e do meu celular oscilam, nos deixando na penumbra por incertos e valiosos segundos. 

— Eles estão querendo nos deixar sem luz! — o Doutor deduz com obviedade. 

— Jura? Eu não tinha percebido — Dean resmunga com sarcasmo. Sei que, no fundo, está com medo do que pode acontecer se ficarmos no escuro absoluto de novo. 

— Eu nem sabia que podiam fazer isso — admito, concentrando o olhar em três deles. — São como demônios ou espíritos vingativos no fim... 

— Confie em mim, são mais perigosos e traiçoeiros do que isso — o Doutor argumenta, estranhamente calmo, como se estivesse pensando em algo. — Sammy está olhando para aqueles três, Dean para aqueles ali e eu fico com esses de cá — murmura, soando ainda mais racional e tranquilo. 

Estou prestes a perguntar, mas Dean, tenso ao meu lado, se antecipa: 

— O que você está tramando, Doc Brown? É aquele bendito plano? Quer saber? Agora seria uma ótima hora de definir os detalhes e colocá-lo em prática de uma vez. O cerco está se fechando. 

Um longo e irritante momento de silêncio se arrasta. Fico receoso ao pensar que talvez o Doutor não seja capaz de fazer isso ou simplesmente não saiba o que fazer.  

Os Anjos Lamentadores avançam nos rápidos segundos em que simplesmente não conseguimos mais ficar sem piscar. Principalmente com as luzes tremendo constantemente. 

Aos poucos, ficamos acuados, somos postos um contra o outro no centro do quarto. Ao que parece, mais dois Anjos surgiram. Desta vez, na frente da porta, nos impedindo de correr para fora, mesmo que quiséssemos ou tivéssemos tempo.  

Por puro instinto, giramos e revezamos de forma constante os olhares em cada ser de pedra a nossa volta, impedindo-os de avançarem rápido demais até nós, embora cada centímetro que conseguem transpor já seja uma derrota e um risco iminente. 

— Vocês não vão gostar do que eu tenho em mente, mas pode funcionar — o Doutor finalmente diz, com as costas apoiadas nas minhas. 

— Desembucha! — Dean grita, apesar de estar bem ao lado dele e esbarrando no meu ombro. 

— Lembra o que eu disse no começo de tudo? Sobre a única fraqueza e forma de derrotá-los? 

De imediato, recordo a conversa por telefone, quando o Doutor nos revelou que os Anjos Lamentadores não podem olhar uns para os outros. Se acontece, ficam presos para sempre na forma de estátua. 

— Lembro. 

— Sim — Dean emenda. Espero que esteja falando sério e que tenha mesmo prestado atenção às explicações do Senhor do Tempo. 

— Molto bene! — De repente muito animado, como alguém que acabou de juntar a última peça de um quebra-cabeças, o Doutor insinua: — E o que os Anjos estão fazendo agora? 

Formando um cerco. Respondo em silêncio. É isso! Entendo o que ele quis dizer e o que devemos fazer. É um plano estúpido, mas é um plano. 

Apesar da certeza súbita, também sinto uma ponta de receio. E se não for nada disso? E se eu entendi errado? Ou, e se for isso, mas Dean não entendeu? Para dar certo, temos que agir juntos, em sintonia e, principalmente, muito rápido. Cada segundo é valioso. 

Dez Anjos nos rodeiam e se aproximam à medida que as luzes oscilam. Meu coração bate depressa. Mantenho os olhos abertos, fixos em uns três deles, os mais próximos de mim. A tensão cresce a um nível insuportável. Esperança e incerteza caminham lado a lado. Feições monstruosas e mãos sedentas por encostarem em suas potenciais vítimas nos cercam.  

— Okay — Dean sussurra baixinho. 

— Allons-y! — o Doutor dá o aval para colocarmos o plano em prática. 

Faço exatamente isso. Quando as luzes estão prestes a piscar mais uma vez, abaixo-me rápido, atingindo o chão com um dos joelhos. Por instinto, protejo o rosto com os braços e torço para ter parado de olhar os Anjos no momento certo. Sinto Dean e o Doutor a minha volta. Percebo que também se abaixaram. Conseguimos fazer isso juntos, no mesmo e crucial milésimo de segundo. 

Sem explicação aparente, as lanternas voltam a funcionar de forma normal. Há um silêncio sepulcral no quarto. A ausência de qualquer movimento me deixa em parte aliviado, em parte temeroso. 

O que será que vou encontrar quando abrir os olhos? Meu primeiro quarto ou um mundo diferente num passado qualquer? É possível que os Anjos tenham nos tocado e nos enviado para um mesmo ponto do passado? Para momentos diferentes? Isso aconteceu ou estamos a salvo? 

Bem, só existe um jeito de descobrir. 

Abro os olhos. Dean e o Doutor estão aqui. Estamos todos aqui, aliás. Ainda no mesmo lugar e na mesma hora.  

A nossa volta, como uma ciranda macabra, os Anjos Lamentadores quase se tocam, olhando uns para os outros. Estão congelados assim, travados e presos na forma de estátuas. Para sempre. 

Conseguimos

O alívio é inevitável e irrompe na respiração que solto na sequência. 

Devagar, levanto-me e observo as estátuas ao redor. Dean e o Doutor fazem o mesmo. Confesso que tenho certo receio em piscar, apesar dos Anjos parecerem derrotados e inofensivos agora.  

Encontro os olhares do meu irmão e do nosso mais novo aliado. Depois, torno a encarar os rostos de pedra cinza e constato que nada aconteceu nesse breve segundo, eles continuam travados. Convenço-me de uma vez por todas. Os Anjos Lamentadores são carta fora do baralho. 

Intrigado com um detalhe impossível de esquecer, indago: 

— O que aconteceu? Por que eles se multiplicaram daquela forma?  

Quase prontamente, o Doutor faz uma explicação resumida: 

— Quando eu e Deanno voltamos no tempo para te salvar, sua vida alternativa, aquela que só existia porque um dos Anjos te lançaria num passado remoto, foi completamente apagada. Isso gerou um efeito em grande escala e, por alguns segundos, o vórtice entrou em colapso para reajustar sua linha temporal no universo.  

— Em linguagem de pessoas normais, deu a louca no tempo? — Dean tenta traduzir, passando entre duas estátuas e deixando a roda. 

— No tempo e no espaço — o Doutor corrige, fazendo o mesmo. Abaixo-me e saio da ciranda macabra também. — Uma fenda rasgou esse momento, deixando tudo duplicado e confuso, universos paralelos se cruzaram e se misturaram. Uma verdadeira bagunça que desafiou a lógica. Por isso, os Anjos se multiplicaram e tão rápido. Eram apenas dois, na verdade, os primeiros que vimos ao chegarmos aqui. Várias versões deles ganharam vida nessa realidade. A ordem natural ficou comprometida, até o tempo e o espaço identificarem a falha, se restabelecerem e o curso cronológico e espacial se normalizar por completo. 

Se eu estou lutando para assimilar suas palavras, imagino que meu irmão tenha desistido de entendê-las há muito tempo. Pela cara de paisagem que sustenta agora, aposto que está perdido. Então também traduzo: 

— Uma fenda no tempo e espaço, resumindo. Uma porta para outros mundos? 

— Pode-se dizer que sim — o Doutor assente. — Nós tivemos sorte, Deanno. Podia ter sido muito pior, se a existência alternativa do Sammy estivesse atrelada a eventos fixos. Ao que parece, ficaremos bem. A fenda se foi, a porta foi selada, o mundo vai sobreviver. 

— Tô sabendo... — meu irmão balbucia, aliviado. — Acho que tivemos sorte. 

— Sorte? — repito, sem conseguir esconder a preocupação em minha voz, tampouco o tom de bronca. — Dean, essa foi a coisa mais estúpida que você já fez! 

Sem se intimidar, meu irmão se vira para mim e faz pouco caso do risco que assumiu: 

— Não sei, não, hein? Eu tenho uma lista grande de coisas estúpidas que já fiz. 

— Bem — Cruzo os braços contra o peito e o encaro mais incisivo —, essa vai para o topo da lista então. Ou pelo menos, está no pódio. 

Dean apenas me encara e esboça um sorriso torto. Parece sem graça por um instante, porém nem um pouco arrependido da escolha que fez. 

A verdade é que, apesar de indignado pelo risco que assumiu por mim, não estou de fato bravo com ele. Logo uma sensação de gratidão e uma emoção inevitável me levam a abandonar a postura defensiva. Descruzo os braços. 

Dean torna a me olhar e, desta vez, não parece constrangido. Ele me encara de um jeito firme, como quem diz, com todas as letras, que faria tudo de novo se fosse preciso. Sem sombra de dúvida, sei que ele faria mesmo. Sem pestanejar, sem pensar, de olhos fechados ou, nesse caso específico, sem piscar. 

Somos irmãos. Família, afinal. E família protege família. 

Há muito significado em seu olhar agora. Sua expressão está tão séria e, ainda assim, carregada de um sentimento palpável. Sei exatamente o que está passando pela sua cabeça e o que vai acontecer agora. É sempre assim. 

— Vem cá. — Dean dá um passo em minha direção, já com os braços meio abertos e desviando o olhar do meu apenas porque é impossível sustentá-lo assim. 

Quando dou por mim, já me aproximei também e aceitei o seu abraço com força e de bom grado. 

— Obrigado — dou-me por vencido. — Mesmo. Obrigado por ser tão estúpido. 

Dean limita-se a dar uns tapinhas nas minhas costas e me aperta com mais vigor. Tenho a impressão de que não vai me soltar nunca mais. Tenho certeza de que há muita coisa não dita nesse gesto, muito sentimento. Esse é um daqueles momentos especiais, durante o qual nosso lado emotivo está à flor da pele, lutando para romper a superfície e quebrar a fachada de dois lobos solitários, de dois caçadores que já passaram pelo diabo e endureceram com a vida. 

— Oh... Olhe só para vocês! — o Doutor se faz ouvir, com um tom emocionado e admirado na voz. — Tão lindos! Tão tocante o amor entre irmãos... 

Bem, diante dessa intromissão constrangedora, é óbvio que eu e Dean colocamos um fim no abraço, nos afastamos meio sem graça e olhamos para o Senhor do Tempo com expressões nada satisfeitas. 

Aliás, não sei como esquecemos que ele estava por perto. O alienígena sorri de orelha a orelha. Seus olhos expressivos, e indiscutivelmente arregalados, brilham com mais intensidade do que nunca. 

— Nem mais uma palavra, Doutor, ou a minha mão vai acertar a sua cara de um jeito nada gentil — meu irmão ameaça, da boca para fora, com um dedo em riste. Em seguida, caminha rumo à saída do quarto. 

Sem graça, lanço um sorriso amarelo para o Senhor do Tempo, coloco as mãos nos bolsos do casaco e digo: 

— Obrigado, Doutor. Por ter ouvido aquele maluco e me salvado também. 

Com uma expressão mais séria e, ainda assim, serena e feliz, ele responde: 

— A honra foi minha, Sam Winchester. 

Assinto com um meneio de cabeça e preparo-me para seguir Dean. No entanto, ao alcançar a soleira ainda com as palavras que ouvi ressoando em meus ouvidos, olho para trás, na direção do Doutor, e abro uma exceção: 

— Quer saber? Pode me chamar de Sammy. 

O alívio e alegria ficam evidentes em seu rosto e, já se pondo em movimento, ele exclama: 

— Allons-y, Sammy!  

O Doutor passa na minha frente sem qualquer cerimônia e cruza a porta com passadas rápidas. Balanço a cabeça negativamente e rio um pouco, antes de tomar a mesma direção que ele. 

Encontramos Dean já no andar de baixo. Ele sacode o spray de tinta, que geralmente usamos para fazer Chaves de Salomão para prender demônios em armadilhas. Depois, mira em uma parede da sala e começa a escrever um frase.  

Você pode salvá-lo. 

No fim, com uma satisfação tangível, volta-se para nós com um sorriso mal contido e reflete: 

— Eu me sinto como o Denzel Washington. 

Sem esperar por qualquer comentário — não que eu tenha muito a dizer diante disso —, ele guarda o spray e ruma na direção da saída. 

— Sim, claro. — Limito-me a rir e o sigo, logo após o Doutor se colocar em movimento também. 

*** 

Minutos depois, entramos na TARDIS. Antes de fechar a porta, observo minha antiga casa uma última vez. Um filme ganha vida na minha cabeça sem que eu consiga evitar. Um filme de tudo o que aconteceu comigo até hoje e nesta noite em especial. Um filme do que poderia ter ocorrido, caso Dean não tivesse sido tão teimoso e lutado por mim mais uma vez. Um filme que, graças a ele e ao Doutor, não aconteceu. 

Grato por ter recebido essa milésima chance da vida, do universo, do que quer que seja, esboço um leve sorriso. Finalmente, fecho a porta da nave. 

O barulho mecânico das engrenagens da TARDIS irrompem por toda a parte, assim que o Doutor aperta botões, aciona controles e puxa alavancas. Há uma tristeza implícita na alegria que demonstra. Apesar de não ter tocado no assunto, ele já deve estar ciente que estamos nos aproximando da despedida.  

Encontro o olhar de Dean. Solto a respiração, aliviado por tudo ter se resolvido da melhor forma que podíamos esperar. Os Anjos Lamentadores não são mais uma ameaça, foram devidamente derrotados. E eu e meu irmão estamos voltando para casa. A nossa real casa. O bunker dos Homens das Letras. Nosso lar. 


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Notas finais do capítulo

Não sejam tímidos ♥ Reviews são muito bem-vindos ♥

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Bjs!