Aconteceu escrita por Alanna Drumond


Capítulo 78
Capítulo 78




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— Você ama o meu irmão? – disse assim que eu atendi antes mesmo de eu dizer oi.
— Amo, amo muito. Mas por que a pergunta?
— Meu irmão tá trancado no quarto há dois dias, não fala com ninguém. Só tem a companhia de Whiskey. E ele tá sofrendo, ele nunca vai admitir, mas eu sei que tá. Ele não esta sabendo lidar com a morte de papai. Nós não sabemos o q fazer. Só você pode ajuda-lo Ana.
— Como? Ele não fala comigo, nem com ninguém. Sempre que eu tento me aproximar ele foge.
— Mas você o ama, então não vai desistir né?!
— Não
— Ele também te ama. Ele vai te ouvir. Eu sei disso. Só vem pra cá agora. E não se preocupe com horário de trabalho. Também sou dona desse lugar e estou te liberando.
— Eu estou indo.

E eu fui. Assim que cheguei na mansão, fui recebida por Camila e Marcella, ambas totalmente sem chão e preocupadas com Rafael. Elas me mostraram o caminho para o quarto de Rafael. Eu bati uma, duas, três vezes e nada dele abrir. Tentei abrir a porta, mas como já era de se esperar estava trancada. Então eu bati de novo, mais forte e então ele respondeu.

— SAI DAQUI MARCELLA – disse com a voz embolada. Ele estava bêbado.
— Não é a Marcella. Sou eu, Ana.
— O que você tá fazendo aqui? Volta pra Duarte – ele estava próximo a porta. Não sei como, mas eu consegui sentir o perfume dele.
— Não vou ir embora. Não enquanto eu não te ver. – ouvi o barulho da chave e ele abriu a porta. – Rafael... – ele estava com olheiras fundas e os olhos vermelhos e desfocados. Na mão carregava uma garrafa de vodka que estava pela metade.
— Você já me viu. Agora volta. – ele ia fechar a porta, mas eu não deixei.
— Espera. O que aconteceu?
— O que aconteceu? – ele repetiu e começou a gargalhar – meu pai morreu. Só isso. – os lábios dele tremeram, e seus olhou ficaram marejados. A gargalhada cessou e ele repetiu: – o meu pai morreu. – ele queria chorar, mas quando ele se deu conta disso balançou a cabeça e se virou começando a andar para dentro do quarto deixando a porta aberta.

Eu entrei no quarto, mesmo sem o convite dele e fechei a porta. Ele caminhou até a lareira. Se apoiou na estante em cima dela e deu um longo gole na vodka que restava na garrafa que ele segurava.

— Eu tentei esquecer – ele disse olhando pra garrafa – mas eu me dei conta de que eu não sei beber. Nunca soube na verdade. – ele riu – mas eu queria esquecer. Achei que esse foi o único jeito. Mas essa bonitinha aqui – balançou a garrafa – é de péssima qualidade e não tá me ajudando – ele jogou a garrafa na lareira e o fogo que subiu foi extremamente alto e eu puxei Rafael pela manga da blusa para longe dela. – Tá com medo de eu me machucar? – ele riu de novo – Não tem como. Já estou machucado demais. – ele olhou para mim de uma forma tão triste que partiu meu coração. Eu ergui a mão para tocar seu rosto, mas ele se afastou – não. Não faz isso. Não quero que sinta pena de mim.
— Eu não estou sentindo pena. – eu disse, mas ele não acreditou.  – sabe o que eu sinto por você? Amor, paixão, desejo... eu sinto infinitas coisas, mas nenhuma delas é pena. – ele olhou para mim e me puxou para perto.
— Obrigado. E me perdoa. Mas é que você tinha razão... o enterro não foi nada comparado a ausência dele nessa casa. Não tô aguentando ficar aqui e na Duarte, cada canto que eu olho eu vejo um pedacinho dele. – ele disse falando embolado.
— Quer ir lá pra casa?
— Não. Eu bebi um pouco demais, eu acho – disse sorrindo abertamente. – mas eu quero, eu preciso que fique comigo. Você é a única que consegue me tirar da escuridão. Preciso da sua luz, preciso de você.
— Eu sempre vou estar com você. – disse ficando na pontinha dos pés e abraçando Rafael que me apertava muito em seus braços. Ele tentou evitar, mas não conseguiu segurar e choro e ficou ali, me segurando como se eu fosse a única coisa que pudesse fazê-lo se sentir mais forte.

Conforme os dias foram passando, Rafael foi aprendendo a conviver com o luto. Não foi fácil. No comando da Duarte, Rafael parecia quase o mesmo. Conduzia as reuniões, acordos e audiências magistralmente e ninguém que olhava para ele poderia dizer que ele estava sofrendo, mas eu sabia. Os olhos não tinham mais o mesmo brilho e o sorriso não tinha mais tanta vida. Mas eu tinha certeza que ele iria voltar a ser o mesmo Rafael. A família Duarte estava em ruínas. Camila começou a tomar antidepressivos e Marcella, desestabilizada emocionalmente pela gravidez, não parava de chorar. Ora chorava pelo pai, ora chorava pela gravidez, ora chorava pelo casamento que se aproximava.

Meu prazo para falar com Rafael sobre a minha demissão da Duarte estava quase no fim e por mais que eu tentasse encontrar o jeito certo de falar com ele, esse momento parecia não existir. No almoço Alice me convenceu de hoje eu teria que falar de qualquer jeito. Aparentemente, Rafael estava em um dia bom. A agenda estava tranquila e não tinha nenhum cliente ou investidor chato que pudesse estressá-lo. Quando faltava quinze minutos para o fim do expediente, eu entrei na sala dele e fechei as cortinas. Ele estava no telefone e esperei que ele terminasse enquanto preparava um discurso mental.

— Era a Marcella. – disse Rafael sorrindo me tirando dos meus pensamentos – foi fazer um ultrassom hoje. Tá tudo bem com o bebê.
— Ah que bom. Já dá pra ver o sexo?
— Ela disse que ele estava com as perninhas fechadas. Talvez no próximo mês... Já está pronta pra ir embora? Estava pensando em te levar para jantar naquele novo restaurante tailandês que abriu no centro.
— É uma boa ideia. Mas Rafael... precisamos conversar.
— Aconteceu alguma coisa? – perguntou indicando a cadeira a sua frente para eu me sentar.
— Sim... é... eu queria... quer dizer, eu preciso...
— Ana, fale logo, tá me deixando nervoso.
— Eu quero demissão.


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