Aconteceu escrita por Alanna Drumond


Capítulo 6
Capítulo 6




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— E ai como foi? Entrevista longa essa.
— Ah não faço ideia. O cara tava me testando. Começou a falar em inglês e espanhol comigo e fiquei desorientada.
— Sério? Caramba.
— Pois é. Ah e obrigada por ter dito que seu chefe era um deus grego.
— Eu não acho. Na verdade acho que o constante mau humor do Rafael me fez criar um tipo de aversão. Não consigo nem pensar nele de outro jeito a não ser que ele é o idiota do meu chefe milionário.
— Ele não parecia muito mal humorado.
— Hoje é segunda-feira. A equipe inteira esta de mau humor por ser segunda-feira. Ele tá feliz porque nós estamos infelizes.
— Bom então eu diria que seu chefe é um cara muito estranho.
— Esse cara pode virar seu chefe se tudo der certo
— Ou se tudo der errado.
— Ué como assim? Você não quer o emprego?
— Quero. Mas sei lá. Trabalhar com um cara gostosão assim não deve ser fácil.
— Fato. Trabalhar com ele realmente não é fácil. Ele é muito exigente e mandão. Adora um prazo e faz com que os funcionários vivam perigosamente. Mas se conseguir a vaga, o máximo de contato que vai ter com ele é “Bom dia” ou” Boa tarde”. Nada mais. Se safou do pior.
— Menos mal. Vou nessa. Tô morta. Esse cara extraiu cada gota da minha sanidade nessa entrevista.
— Leva pra mim – disse me dando a chave do carro – Cuidado com a Polly. – Polly era o nome da caminhonete da Alice. Ela ganhou de presente do pai assim que conseguiu o primeiro emprego e tinha um carinho enorme pelo carro, tanto que deu até um nome pra ele. – E bom descanso. Não me espere, vou chegar tarde.
— Não bebe muito. Beijo. – sai da sala dela.               

Enquanto esperava o elevador, uma estranha dor de cabeça surgiu. Estava com fome e não podia gastar dinheiro então disse pro meu próprio estomago segurar a onda até chegar em casa. Quando finalmente o elevador chegou e eu ia entrar nele, uma mão tocou meu ombro.  
— Ana? – então aqueles olhos verdes me encararam.
— Sim Dr. Duarte?
— Creio que isso seja seu. – disse me entregando meu bom e velho celular que ultimamente só servia pra receber ligações, visto que não tinha dinheiro para recarregar e a câmera estava quebrada.
— Ah sim é meu. Puxa, obrigada. Eu nem vi cair. – Não vi, mas tinha uma teoria. Ele estava na minha mão o tempo todo. Eu fiquei apertando ele por conta do nervosismo. Quando minha bolsa foi parar no chão enquanto tentava juntar as canetas de Rafael, ele deve ter caído.
— Que bom que eu achei. Até breve, eu espero.
— Moça você não vai? – disse o homem do elevador impaciente.
— Vou sim. – me virei para Rafael de novo – Mais uma vez obrigada, e desculpa. Até. – entrei no elevador, e ele esperou que as portas se fechassem. Eu podia jurar que vi um sorriso se formando ali, mas com aquela imensidão de barba não tinha certeza. Espera ai, ele disse até breve? Ele pretendia me contratar?              

Enquanto dirigia para casa não conseguia parar de pensar naqueles olhos verdes. Tinha tanto mistério ali. Eu queria muito saber o que ele estava pensando quando me viu na recepção. Com certeza deve ter me achado uma idiota enquanto eu babava por ele. Ele quase sorriu na entrevista e depois dela quando me entregou o celular, e Alice disse que ele nunca sorria, então era um bom sinal não?              

Eu estava ficando louca. Por que diabos eu estava pensando naquele ser humano? Havia a possibilidade dele não me contratar e eu nunca mais o ver na vida. Mas também tinha a chance dele virar meu chefe e não se deve ficar pensando em chefes. Precisava esquecer esse homem. E só tinha um jeito de fazer isso. Consumo de álcool. Eu precisava de uma cerveja.              

Quando entrei no minúsculo apartamento fui direto para a cozinha apertada (que literalmente só cabia uma pessoa) e peguei uma das garrafas de cervejas que Alice tinha comprado. Não me dei ao trabalho de pegar um copo, segui para o quarto e continuei procurando vagas em alguns sites de emprego. Mas não tinha nada muito animador, isso me fez beber muito mais rápido que o normal e quando vi já estava na terceira garrafa admirando os anúncios do Google. Eu estava me sentindo tão inútil que fui dar faxina na casa e foi até bom já que eu e Alice fazíamos uma bagunça humanamente inimaginável.               

Depois disso eu apaguei no sofá e só acordei no dia seguinte, que se resumiu a uma nova busca frustrada de emprego regada por uma terrível dor de cabeça. Mas no meio do dia Alice me ligou e disse que segundo o meu horoscopo, “Grandes coisas estão por vir. Mudanças na sua vida profissional vão te direcionar para o caminho dos seus sonhos”. Sim, Alice também acredita em horoscopo. Eu não, claro. A sorte não era minha amiga, tenho certeza que se eu lesse o horoscopo ia arruinar a vida das milhões de pessoas de escorpião. Mas para não ser indelicada e nem frustrar minha amiga, fingi estar animada.
— Eu realmente espero que isso seja verdade. Tudo o que eu quero é um emprego que me leve de volta à arquitetura.
— Então, eu tô com um bom pressentimento e seu horoscopo tá dando um sinal. Vai ficar tudo bem. Relaxa      .         

E foi ai que aconteceu. Eu estava no meio da tarde, deitada no sofá, já tinha enviado milhões de currículos e não tive resposta em nenhum deles. Quando meu telefone toca.

— Alô?
—Senhorita Siqueira? Aqui é Rafael Duarte. – ah como eu poderia esquecer aquela voz? Só de ouvir eu fiquei nervosa.
— Sim?
— A senhorita foi a candidata selecionada para ocupar o cargo de recepcionista da “Duarte Advogados” – ai meu Deus! Eu consegui! — Gostaria que pudesse comparecer amanhã as oito para assinar o contrato.
— É claro.
— A senhorita vai ter auxilio médico e odontológico além de contar com os serviços de... – ele continuou falando, mas sinceramente eu parei de ouvir quando ele disse “Assinar o contrato”. – Bom, então é isso. Te espero amanhã. Seja bem vinda à empresa.

“Não pira, não pira, não pira, não...”.  - AAAAAAH EU CONSEGUI. Finalmente consegui. – disse assim que deliguei o telefone. Finalmente uma chance, um emprego. Alice iria ficar tão feliz por trabalharmos juntas. E eu ainda poderia ver o Rafael, não que fosse uma coisa boa, afinal ele nem é assim tão importante. Claro que não.  

Marchei para frente do espelho e olhei para o meu reflexo. - Você está proibida de fazer besteiras Ana Siqueira – disse pra mim mesma – Vai fazer tudo certo, nenhuma trapalhada e vai juntar a grana que precisa para voltar para a faculdade. Por favor, não desperdiça essa chance. – eu tinha mania de falar pro meu reflexo do espelho como um meio de fazer com que eu realmente me convencesse do que eu estava falando. Alice sempre disse que era estranho, mas vendo minha imagem ali, era como se eu tivesse a obrigação de não enganar a mim mesma. Talvez não faça o menor sentido, mas a questão é que isso sempre me deu confiança e uma vontade enorme de não me decepcionar. E eu iria fazer de tudo pra dar certo dessa vez.


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