Dragões do Norte escrita por Snowfall


Capítulo 20
Homens de Lama




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Os corvos não cessavam de chegar. Ned sofria ao pensar que o próximo vulto negro que chegasse em Correrrio trouxesse a notícia temida. Que a próxima mensagem fosse a que esperava que nunca chegasse.
Tentava se convencer que Bran e Rickon eram reféns valiosos e que os invasores não arriscariam perde-los, mas ainda sentia que algo podia dar terrivelmente errado. Que o pior aconteceria.
Esta guerra teria um preço terrível para o Norte. Os Lannisters abriram uma trilha de destruição de Bosque Profundo a Winterfell. Colheitas queimadas, rebanhos aniquilados. A população teve que abandonar suas aldeias e vilas para fugir da devastação.
— Esse conflito não pode durar muito mais – disse à família, que ele reunira ao redor do represeiro na esperança de que os deuses olhassem por eles e lhe dessem algum esclarecimento – O inverno está para chegar e temos que estar no Norte quando isso acontecer.
Cat e Robb sentavam a sua direita. A sua senhora parecia um pouco desconfortável no tronco que escolhera. Ela nunca sentia-se a vontade junto aos deuses antigos tal como Ned se sentia inadequado em um Septo.
A sua esquerda estava Jon, sentado em uma raiz da árvore, com Arya sentada aos seus pés. Também ao lado dele estava Sansa que, por mais surpreendente que fosse, tomara o irmão como uma espécie de herói das canções.
— Tywin Lannister tramou para que a vantagem que tínhamos fosse anulada e conseguiu – declarou Jon, seus olhos não deixavam um pedaço seco de represeiro que entalhava com uma adaga sob o olhar admirado de Arya.
— Por que diz isso? – a pergunta veio de Sansa.
Ned e a esposa trocaram olhares. A filha que conheciam nunca se envolveria em questões como essa, mas Sansa mudara. Todos os filhos mudaram.
— Qualquer movimento nosso nesse momento acarretará em retaliação. Não podemos usar Rochedo Castely porque eles têm Winterfell, não podemos usar o Regicida porque eles têm Bran e Rickon.
— Os dragões são inúteis para libertar Winterfell – completou Robb – não podemos queimar nosso próprio castelo. Não com os meninos presos lá.
— Um sitio também está fora de questão – concluiu Jon – Matariam as crianças antes que se rendessem.
— O que fazemos então? – indagou Arya, os olhos cinzas passaram de um rosto ao outro e não obtiveram resposta.
Incomodou à Ned como ela se incluíra na pergunta.
— No momento o jogo se encontra parcialmente equilibrado. Não temos o poder de barganha que tínhamos, mas não estamos nas piores condições.
— Jogo?! – elevou-se Catelyn – Tudo isso não passa de um jogo para você, não é mesmo?
A esposa tremia um pouco. Os filhos reféns e a situação cada vez pior do pai a deixaram com os nervos em frangalhos.
— Catelyn... – Começou Ned.
— Mãe. Por favor – pediu Robb.
— Não – insistiu ela – Meus filhos estão sendo mantidos prisioneiros em minha própria casa enquanto estamos aqui falando de jogos e táticas.
— Sinto muito, senhora – Jon ergueu os olhos do entalho pela primeira vez e encarou sua esposa sem nenhuma trepidação – foi uma escolha infeliz de palavras. Não pense que quis desmerecer a situação dos seus filhos de alguma forma.
Ned viu as lágrimas se formarem nos olhos da esposa, mas estas foram escondidas rapidamente. Com um revoar das saias, ela se retirou. Por certo a procura de um lugar em que o pranto pudesse ser solto sem refreio.
Ele entedia sua dor e a compartilhava. O medo e desespero de um pai cujo o filho estava em perigo eminente era sufocante e incapacitante.
— Me desculpe – pediu a Jon – A senhora minha esposa passou por muito nos últimos tempos.
Não era um motivo muito bom, mas era um único que tinha. A situação entre Jon e Catelyn estava longe de ser resolvida e não tinham tempo para lidar com isso no momento.
— O que acontecerá agora? – inquiriu Robb, tentando retomar ao âmago da discussão.
— Os Lannisters fizeram o último movimento. É nossa vez– explicou Ned.
— Está concluindo que Lorde Tywin ficará sentado esperando enquanto encontramos soluções para nossos problemas – comentou Jon – Seria um tolo se o fizesse. E podemos entender que ele é muitas coisas, menos tolo.
— O que acha que fará?
— O mesmo que nós. Nosso principal objetivo agora é resgatar as crianças e retomar Winterfell para recuperarmos a dianteira.
— Então Tywin Lannister vai tentar recuperar o Rochedo e o filho – concluiu Arya.
Sua filha ainda não havia completado dez anos e já se envolvia em assuntos de guerra. O que a sua família havia se tornado?
— Seria o que eu faria. No momento qualquer golpe que infligirmos ao inimigo, arriscará a segurança dos irmãos de vocês. Portanto devemos reverter essa situação imediatamente.
As palavras de Jon foram seguidas por um silêncio contemplativo.
Como nenhuma solução foi apresentada no tempo que se seguiu, Robb arrastou uma sonolenta Arya para o castelo.
E Ned achou que devia procurar Catelyn e tentar oferecer o pouco de consolo que podia. Só eles entendiam a dor e preocupação um do outro.
— Está na hora de se retirarem – disse a Jon e Sansa que permaneciam calados e não faziam menção de se mover.
O filho o mediu de cima a baixo, contemplativo. Incredulidade passou por suas feições antes de ser substituída por determinação.
— Pretendo ficar mais um pouco, meu lorde – disse secamente.
Em outras palavras: Eu decido quando é a hora de me retirar.
Uma fisgada inconveniente atravessou seu peito até o pé da garganta. A sentia toda as vezes que Jon sutilmente o lembrava da distância entre eles.
— Sansa? – perguntou, decidindo deixar essa batalha para um outro dia.
— Posso ficar mais uns instantes, por favor? Jon pode me acompanhar de volta ao castelo.
Espanto transpassou o olhar do filho, que encarou a irmã descrente. Seja lá o que fosse que esperava, não era isso.
Ned anuiu.
Era bom que Jon tivesse mais contato com os irmãos, concluiu enquanto se afastava.
O filho vinha mantendo-se afastado do resto da família durante sua estadia em Correrrio, preferindo a companhia dos selvagens. Algo que Ned compreendia, mas que precisava mudar imediatamente.
Encontrou Cat no quarto deles, encarando o rio através da grande janela.
— Eu os deixei sozinhos – disse ela – devia ter ficado lá com eles.
Ela sentia que havia falhado em seu dever para com os filhos. Esse era um sentimento que Ned conhecia bem, fora sua companhia constante na última década e parecia que permaneceria plantado em seu peito algum tempo mais.
— Não devia se culpar. Se há um responsável, sou eu.
— Comecei tudo isso, quando prendi o anão.
— Não, eu comecei tudo isso quando deixei Winterfell. Não é sua culpa, Cat. Tão pouco de Jon, não deve culpa-lo também.
— Espera que me desculpe com seu bastardo? – o semblante dela endurecera, como acontecia todas as vezes que falavam de Jon.
— Espero que dirija sua raiva a quem realmente merece. Foi eu que agi mal com você. Eu que quebrei os votos que lhe fiz. Não Jon, ele é inocente.
— Nem inocência dele nem a sua culpa me consola, Ned. Porque eu sei que se você pudesse escolher, escolheria ela.
Um fantasma. Shaena sempre seria um fantasma na vida deles.
Ned virou-se em silêncio.
..........

Enquanto entalhava o que esperava ser uma miniatura fiel de Morghon, Jon se remexia desconfortável. Estava penosamente ciente da irmã ao seu lado.
Sansa era tão parecida com a mãe que Jon esperava que a qualquer momento ela o chamasse de bastardo e mandasse que saísse de suas vistas.
Mesmo sem querer, ele soltou uma risada diante de pensamento tão absurdo. Um fruto insipido das lembranças infantis que pensara que havia esquecido, mas que voltavam com toda força desde que cruzara a Muralha.
Tentava se lembrar constantemente que não era mais aquele garotinho, que Lady Catelyn não tinha nenhum poder sobre ele e que era um homem do Povo Livre agora.
A irmã sobressaltou-se com sua risada amargurada.
Levantou os olhos para encara-la, mas ela baixou as vistas.
— O que quer, Sansa? – a pergunta saiu um pouco mais ríspida do que ele desejara, mas estava cansado e esperava ficar um pouco sozinho antes de se retirar.
A menina apenas encolheu-se mais.
Ela por certo tinha um motivo para ficar ali com ele. Dava para perceber que a algo a incomodava.
Jon soltou um suspiro frustrado e tentou outra abordagem.
— Desculpe, rudeza é uma consequência infeliz de se passar muito tempo com o Povo Livre – disse baixando o pequeno Morghon e concentrando toda atenção na irmã – muito tempo daquele lado da Muralha e você esquece como deve se comportar diante de uma lady.
— Está tudo bem – sussurrou.
— Se tem alguma coisa que deseja me falar, por favor fique à vontade – pronto, assim estava melhor. Gostava de pensar que conservara a maioria das boas maneiras que Miestre Lwin lhe ensinara.
A menina enrolava os dedos na manga do vestido, claramente procurando as palavras certas. Jon, que estava acostumado com outro tipo de mulher, ficou surpreendentemente desconfortável.
Se tem algo bom nas mulheres do Povo Livre é que elas sempre falam o que se passa em suas mentes. Com as senhoras sulistas, você tem que adivinhar a maior parte do que elas estão pensando.
— Seja lá o que queira dizer Sansa, fique segura não deixará esse lugar. Os deuses são testemunhas de minhas palavras.
Usando seus escassos poderes de adivinhação, Jon concluiu que Sansa reunira toda sua coragem para ficar ali com ele a sós. Nesse momento sua ousadia se esvaia deixando medo e apreensão no lugar. Se temia ele próprio ou outra coisa, não sabia dizer.
— Gostaria que aceitasse a minha gratidão, meu lorde – disse ela num fôlego só.
De todas as coisas que esperava, essa não era uma delas.
— Não há nada que agradecer, Sansa.
— Há, sim – disse ela, pela primeira vez o encarando – a mãe disse que eu não precisava, mas...
Era esse o problema. A garota desobedecera Lady Catelyn para falar com ele e temia as consequências. Jon simpatizou com a menina, por certo sabia o quanto a senhora podia ser aterrorizante.
— Mas ela estava errada – completou por fim – O pai foi preso por minha culpa e Joffrey ia mata-lo, sei que ia. Se não tivesse chegado naquele momento...
À luz fraca da lua, as lágrimas brilharam no rosto da irmã.
Ela enxugou o rosto rapidamente e sentou mais aprumada, tentando recuperar a compostura. Mesmo com o exterior sulista, podia ver que havia muito do Norte naquela ali. O inverno não a levaria com facilidade.
— Isso é passado, não deve se apegar a ele – aconselhou – estamos todos vivos ainda e temos que nos concentrar em permanecer assim.
— Precisamos de Winterfell.
— É.
— Você não sabe o que fazer – a afirmação soou mais como uma contemplação.
Pensou ter visto algo passar pela mente da garota.
— E o que você faria se estivesse em meu lugar?
— Não sei nada sobre armas e batalhas – pontuou ela.
— Acabei por perceber que guerras tem mais a ver com pessoas do que com armas e batalhas. Aprendi também que as mulheres são mais perceptivas quando se tratam das relações interpessoais.
Sansa pensou um pouco e depois falou, agora mais confiante:
— Não pode recuperar Winterfell de maneira direta.
— Os Lannisters e Greyjoys queimariam tudo antes que chegássemos aos portões – concordou Jon.
— Então é melhor não usar os portões.
Algo absurdo e surpreendente passou pela mente de Jon. Uma ideia tão estapafúrdia que poderia até dá certo.
Jon soltou uma risada.
— Por que está rindo?
— Porque você, irmã, acabou de nos dá a vantagem que precisávamos.
Estendeu o dragãozinho de madeira a Sansa.
— Tome, não é tão bonito como o verdadeiro. Mas toda lady deveria ter um dragão para lhe proteger.
Ela pegou o objeto hesitante.
— Fiquei feliz que você tenha voltado – contou ela.
Como não sabia como responder a essas palavras, Jon apenas assentiu. Não era algo que ouvira muito desde que descera ao Sul.
Depois que acompanhou Sansa em segurança até seus aposentos, procurou Kena. Tinham muito o que fazer e muito pouco tempo para isso.
O dia amanheceu e Jon não dormira nem por um instante, mas se satisfez com esperança de que os meninos Starks talvez tivessem melhores chances.
..........
Cat já vira muitas vezes os homens partindo para guerra, mas a repetitividade do acontecimento não o tornava mais fácil. Pelo contrário, a cada vez o fardo de ficar e esperar pesava mais.
Passaram-se dois dias desde a conversa do Bosque sagrado e na noite passada o dragão azul chegou de Rochedo Castely e se ocultara no Bosque Sagrado. Não saíra desde então.
Jon Snow aparentemente tentava esconder a presença dele em Correrrio.
Ele manteve segredo sobre o que pretende fazer para salvar os meninos, e Ned e Robb não o pressionaram. Por mais que Catelyn desejasse o contrário.
“Temos que confiar que ele sabe o que está fazendo, Cat. Até agora Jon não deu razão para o contrário”— lhe disse o marido quando ela expressou sua insatisfação.
Essa confiança cega nas boas intenções do bastardo a incomodava. Mas resolveu deixar essas preocupações para depois que os filhos estivessem em segurança.
Prometeu a si mesma que se tudo corresse como esperado, e Bran e Rickon fossem resgatados, ela voltaria para Winterfell e ficaria com suas crianças custasse o que custasse.
Sentia um alívio egoísta, em saber que os filhos que estavam ao seu alcance haviam ficado em Correrrio, em relativa segurança.
Robb e Arya protestaram, mas Ned partiu acompanhado apenas de Jon Snow.
O filho mais velho ficara para representar o pai. E Arya não passava de uma menina que não tinha nada que fazer em uma guerra.
Cat tinha esperanças que a filha tivesse idade e bom senso o suficiente para não tentar ir escondida nas carroças de mantimentos, mas pelo jeito se enganara. O quão longe Arya pretendia chegar com tal artimanha, não sabia dizer.
A filha mais velha se resignara as orações. Passara os dias que se seguiram à partida do pai aos pés do represeiro.
Catelyn passava seu tempo tentando acomodar os lordes o melhor que podia enquanto fazia de tudo para confortar os filhos que, cada um à sua maneira, expressavam suas frustrações.
Tudo isso somado o estado cada vez pior do pai, a deixou exaurida.
Mas naquela manhã, uma chegada elevou um pouco seu ânimo.
O tio, que até então guardava Harrenhal junto com boa parte das forças do rio, chegara para tratar de assuntos de guerra. Ou pelos menos foi o que o Peixe Negro disse a todos quando chegou.
Cat sabia que Tio Bryden viera por causa da carta que escrevera contando da sua preocupação que o pai não estaria entre eles por muito mais tempo.
Ele veio encontra-la logo que se desfez dos lordes que o cercaram assim que chegou.
— E as crianças?
— Robb tenta suprir a lacuna deixada pelo pai o melhor que pode. Passa a maior parte do tempo com os senhores estudando mapas de guerra.
— As meninas?
— Arya está no campo de treino, descontando sua frustração em um boneco de palha com uma espada de madeira que achou em algum lugar.
— Uma espada de madeira? – ele riu-se um pouco.
— Não achei em mim força suficiente para tomar dela. Ned sempre foi melhor em lidar com Arya do que eu. Tem o sangue do lobo diz ele, toda vez que coisas como essa acontecem.
— A outra saiu mais a você.
Catelyn não pôde evitar um leve sorriso.
— Sim. Mas mesmo ela, agora se apega aos deuses do pai.
Sansa sempre simpatizara com a fé dos Sete. A ajudava a colocar velas no Septo em Winterfell todos os dias. Mas em Correrrio, era em frente da Árvore Coração que se ajoelhava.
Quando inquirida sobre isso, Sansa apenas respondeu que o represeiro era um pouco do Norte que crescia por ali.
Era evidente que os filhos sentiam falta de casa. Correrrio fora um lar para ela, tudo naquele lugar lhe era conhecido. Suas crianças, porém, pertenciam ao Norte e estavam começando a perceber isso. Até mesmo Sansa, que se esforçara tanto para aprender a ser uma lady sulista como Cat.
Por regra geral, as pessoas tendem a ser apegadas ao lugar onde nasceram, contudo, os nortenhos se provaram um caso à parte. Parecem tão aclimatados a sua terra, com suas vastidões frias e desoladas, que não conseguem se desligar dela. Tal como uma árvore de raízes bem profundas e que se arrancadas, definham.
— Como ele está?
O “ele” em questão só podia ser uma pessoa. Cat ponderou se deveria gastar com o tio as mesmas palavras de consolo e otimismo vão que usava com Edmund.
Não, o tio veria facilmente através de suas mentiras.
— Não demorará muito. Penso que só está esperando para ver você e Lysa.
— Nenhuma resposta do Vale ainda?
Negou com a cabeça, enquanto voltava-se novamente para a janela. A recusa da irmã de visitar o pai no leito de morte, levantara muitas questões que Catelyn não tinha nenhuma intenção de lidar no momento. Ela já tinha um prato cheio nas mãos.
— Fico feliz que esteja aqui, tio.
— Família, Dever e Honra. A família vem primeiro, pequena Cat.
Ele beijou-lhe a testa e saiu. Por alguma razão naquele momento toda a angustia dos últimos dias se abateu sobre ela com toda a força.
Teve vontade de chorar. Pelo pai moribundo, por Bran e Rickon e por tudo que podia perder antes que essa guerra acabasse. Mas forçou as lágrimas a não escorrerem.
Se tem alguma coisa que aprendeu depois de mais de quase duas décadas vivendo no Norte é que lágrimas são inúteis quando o inverno chega.
Resolveu que reuniria o pouco de família que tinha para o almoço, só os deuses sabiam quando teria a chance de fazê-lo novamente.
O tio, Edmure e Robb não ofereceram muita resistência. Mas só a ameaça de uma tarde presa dentro do castelo fez Arya largar a espada de madeira.
Sansa deixou o Bosque Sagrado com uma expressão que não lhe era típica. Catelyn ainda se perguntava que duras lições a filha aprendera em sua desastrosa estadia na capital.
Ter todos eles na mesma mesa, lhe trouxe muita satisfação mesmo que o assunto principal ainda fosse a guerra.
— O que é isso? – perguntou tio Bryden a Sansa em certo ponto.
Seu olhar caiu sobre um objeto indistinto que a filha segurava. Só pôde perceber que era branco.
— Jon me deu – informou Sansa abrindo a mão para revelar um pequeno dragão de madeira.
— Por que? – perguntou Arya que se erguera da cadeira para poder ver melhor o entalhe.
— Ele disse que toda lady devia ter um dragão para lhe proteger – Sansa afastou a mão para tirar o dragãozinho do alcance da irmã.
— O mundo seria um lugar muito melhor para as mulheres se fosse assim – concordou o tio em tom sombrio.
— Quando ele te deu isso? – Catelyn inquiriu.
Algo em seu tom fez Sansa proteger o objeto contra o corpo e Robb interferir:
— É só um brinquedo, minha mãe. Não é...
— Sansa? – cortou em um tom que fez Arya voltar a sentar-se.
— Alguns dias atrás.
— Dê para mim – exigiu.
Sansa lhe lançou um olhar que muitas vezes vira no rosto de Arya.
— Não – disse ela simplesmente.
— Sansa...
— Foi um presente, é meu. Não tem o direito de tomar de mim.
— Não quero que aceite presentes do bast...
— Do meu irmão – Sansa não erguera a voz mais do que era aceitável para uma lady, mas a entonação era completamente estranha a ela – Ele é meu irmão.
Sansa se retirou, deixando os presentes aturdidos, Catelyn mais que os outros.
— Ela tem razão – sussurrou Robb, ainda olhando a porta pela qual a irmã saíra – Tem que aceitar que ele está aqui e vai fazer parte das nossas vidas.
— O que me pede é impossível.
Robb balançou a cabeça cansado e se levantou. Arya o seguiu.
— Ficarão o resto do dia no Bosque Sagrado – ressaltou Edmure com a boca cheia de guisado de peixe.
Catelyn se lembrou das palavras da filha.
— É um pouco do Norte que cresce no Sul.
...........

A ideia de Jon parecia um pouco estapafúrdia agora que ele parava para pensar.
Há alguns dias, diante da necessidade de um lugar seguro e secreto para executar seu plano, Atalaia da Água Cinzenta pareceu a melhor opção. Principalmente por sua posição estratégica entre Norte e Sul.
Afinal, um castelo móvel, indetectável e oculto proveria uma cobertura excepcional no caso em questão. Uma vez lá, ficariam longe do alcance dos Lannisters e de qualquer um que pudesse relatar sua posição e planos para o inimigo.
O problema, Jon descobrira enquanto atolava no pântano escuro e úmido, era que nenhuma das vantagens que o castelo podia prover seria de grande ajuda se não conseguissem encontra-lo.
Lorde Stark mandou uma mensagem, antes que partissem, avisando da visita. Mas se Lorde Reed a recebeu, não se incomodou em responder.
Mais provável que isso é assumir que o corvo não achou o castelo, assim como sua triste e encharcada caravana.
A situação deles só não era pior por causas dos mamutes. Os animais lhes serviram no pântano melhor do qualquer cavalo. Bahuk cruzava a água e a lama com a mesma dignidade que atravessava a neve fofa do outro lado da Muralha.
A única alguma coisa que lhe trazia prazer naquela situação era ver Lorde Stark se contorcendo em cima de um mamute. O homem tentava controlar sua montaria e falhava miseravelmente.
Vê-lo tentar esconder seu desconforto por trás de uma fachada de estoicidade quase fazia Jon esquecer que estava cansado, molhado e provavelmente perdido. Era o quase que o impedia de aproveitar a situação como deveria.
— Não precisa guiar. O animal seguirá Bahuk – disse à Lorde Stark, compadecendo-se um pouco dele.
—Hum – foi a única resposta que recebeu.
— Estamos chegando? – tinha consciência de que não era a primeira vez que fazia aquela pergunta, porém era impossível evita-la.
Era de se esperar que depois de dois dias em território de Lorde Reed, eles já tivessem chegado. O quão grande podia ser esse pântano?
— Difícil dizer – o homem olhou ao redor procurando algo nas sombras - Possivelmente.
Jon suprimiu uma risada pelo nariz que saiu como uma fungada. Era engraçado como os nobres e bem-nascidos se recusavam a dizer: Eu não sei.
A sua esquerda Kena que segurava-se firmemente nos pelos do mamute que montava enquanto seus olhos vagavam. O Warg procurava pelo castelo desde que chegaram e Jon começava a notar os primeiros sinais de fadiga.
Controlou-se para não perguntar se o amigo não tinha visto alguma coisa. Se Kena tivesse achado algum sinal dos cranogmanos não guardaria a informação só para si.
— Kena – chamou baixinho para não assustar o Warg. Jon conhecia bem a sensação de intestinos revirados que se sente quando voltamos a própria pele bruscamente.
O amigo fechou os olhos e quando voltou a abri-los seu foco estava em Jon.
— Nada ainda – Kena que na maioria das vezes era a epitome da calma e mansidão, demonstrava que já estava sendo afetado pela situação.
— Eu sei. Procure a carroça de mantimentos e coma alguma coisa, eu assumo a busca a partir de agora.
Jon vasculhara a floresta ainda essa manhã, mas nem a visão apurada de Valkius nem o olfato aguçado de Bahuk conseguiram encontrar o castelo fujão.
Mas não custava nada fazer uma nova vistoria, ao menos para que Kena descansasse um pouco.
Jon nunca gostara de compartilhar a mente de Bahuk e Valkius ao mesmo tempo. De natureza e temperamento opostos, eles disputavam espaço em sua cabeça e lhe causavam enxaqueca excruciante todas as vezes.
Voando quase à altura das árvores, Jon procurou por qualquer mudança na paisagem que indicasse a presença humana, mas tudo parecia igual. Uma cacofonia de tons de verde que escurecia em alguns lugares.
Enquanto cortava o vento em sua busca, suas asas ondulavam as águas do rio. Bahuk sentia o chorume criado pelas folhas apodrecendo na água, mas fora isso não havia nada que pudesse sugerir que estavam chegando ao seu destino.
Jon?
Aproveitou o momento para checar suas outras peles.
Jon?
Gaothrax dormia indolente no Bosque Sagrado de Correrrio. Quando sentiu sua presença o dragão revirou-se um pouco e Jon se banhou na sua tranquilidade. Pouca coisa perturbava Gaothrax.
Morghon pescava na baia do Rochedo, seus sentidos focados nas ondas.
Jon?
Alcançou Fantasma, e finalmente sentiu-se completo. Nunca antes se afastara tanto do seu lobo. Parecia ter deixado um braço para trás.
Jon!
Voltou ao seu corpo com um puxão que o desnorteou por alguns instantes.
— Você está bem? – perguntou Lorde Stark.
— Sim.
Ainda enjoado, Jon deixou que Bahuk conduzisse a caravana. Ouvia apenas parcialmente a voz preocupada dos outros.
— Não é bom chamar um Warg desse jeito quando ele tá em outra pele – avisou Kena tardiamente.
Jon ignorou as sobrancelhas contraídas do pai e piscou várias vezes rapidamente para recuperar o foco.
— O senhor deseja alguma coisa?
O vinco no meio da testa de Lorde Stark aprofundou-se, mas Jon percebeu que ele deixaria para proferir suas preocupações depois.
— Devemos parar para o almoço.
Jon assentiu.
— Vi um lugar razoavelmente seco perto daqui.
O pântano, embora fizesse uma calamidade com os pés, providenciava uma quantidade alarmante de peixes para cada refeição.
Quando enfim conseguiram fazer fogo, Lorde Stark sentou-se ao seu lado enquanto fincava alguns espetos de bagres na fogueira.
— Não me parece muito saudável – o comentário saiu hesitante.
— Hum?
— Trocar peles. Não é natural.
— É essa a sua maneira de me chamar de aberração?
O homem empalideceu.
— Nunca insinuaria uma coisa dessas, meu filho. É difícil para mim ver as histórias de terror da Velha Ama se tornarem realidade diante dos meus olhos.
Pensou em contar que ele tinha visto apenas o lado bom das histórias até então. Que o terror ainda estava do outro lado da Muralha. Mas essa era uma conversa para outra hora.
— Não há nenhuma reação colateral? – insistiu o pai.
— Há muitas. Tudo tem um preço.
— E assumo que dragões são muito mais difíceis que corujas.
— Assumiu corretamente.
A preocupação de Lorde Stark era evidente e deixou Jon desconfortável.
— Treinei a vida toda para isso – assegurou – cada dia fica mais fácil.
— Não pude deixar de notar que o garoto das corujas parece doentio.
— Kena tem mais de uma dúzia de peles e seu controle é muito melhor que o meu. Se tivesse a mente fraca já teria sucumbido há muito tempo.
— Sucumbido?
— Quando o homem não se separa mais do animal.
— É uma possibilidade?
— Ouvi histórias de que quando o Warg morre passa viver na sua pele. Também é possível que o contrário aconteça.
Lorde Stark se perdeu em pensamentos.
— É assim que eu sou. Sinto muito que isso o incomode.
— Temo por você.
— Não tem necessidade.
— Os pais se preocupam, receio que tal preocupação não tenha nada a ver com necessidade.
Os bagres soltavam o cheiro maravilhoso.
Eles comeram em silêncio.
Quando retomaram a caminhada, os ânimos se elevaram um pouco. São incríveis as maravilhas operadas por uma barriga cheia.
O contentamento infelizmente não durou até o fim da tarde. Três carroças atoladas os atrasaram penosamente.
Já iam acampar para a noite, quando Bahuk começou a agir estranhamente. Por fim todos os mamutes estancaram.
— Já devíamos ter achado o castelo – comentou Lorde Stark – É quase como se algo...
— Esteja nos impedindo – completou olhando ao redor – Os deuses são poderosos aqui, os animais sentem e se recusam a avançar. Estamos perto.
— Então devemos avançar.
— Não vamos passar daqui, não é seguro.
— Como pode saber?
— Bahuk sabe.
Na verdade, Jon sentia um trago estranho no céu da boca que sempre associara aos deuses. A impressão estranha de ser observado e pior ainda, julgado.
Os deuses antigos impediam que o castelo fosse achado e o bloqueavam dos visitantes. Proteção como essa podia significar várias coisas. Nenhuma delas era boa para eles naquele momento.
— Temos que alcançar o castelo de alguma maneira.
— É pouco provável que tenhamos chegado aqui despercebidos. Deixemos que os cranogmanos venham até nós.
A espera não durou muito. Assim que conseguiram acalmar os animais um pouco, estes se eriçaram novamente e em um piscar de olhos se viram cercados por meia centena de guerreiros.
Todos tinham uma aparência nodosa.
Jon nada conhecia sobre aquela gente além do que lera nos livros quando criança. Conhecidos como Homens de Lama, Demônios do Pântano e até Comedores de Sapos, eles não eram muito sociáveis para se dizer o mínimo.
Os homens que os rodearam eram de baixa estatura e feições pálidas e sombrias. As peles que usavam podiam facilmente ser confundidas com a paisagem que os rodeavam.
Os recém-chegados permaneceram em silêncio. Que só terminou quando Lorde Stark reconheceu alguém.
— Reed?
— Enfim chegou, meu lorde – respondeu um homem baixinho de aparência frágil.
— Recebeu minha carta? Não tinha fé que o corvo chegasse até você.
— Não chegou.
— Mesmo assim sabia que estávamos a caminho.
— Sim.
Lorde Stark abriu a boca, possivelmente para fazer uma pergunta, mas fechou novamente pensando melhor.
— Meu filho Jon Snow – apresentou.
O pequeno homem o avaliou de cima a baixo.
— É bom vê-lo novamente. Esperei muito para que viesse.
Tinha alguma coisa naquele homem que fazia o trago na boca de Jon se intensificar.
— É um prazer conhece-lo, meu lorde.
Mais algumas formalidades foram trocadas até que todos se puseram a caminho.
Atalaia da Água Cinzenta não era como nenhum castelo que Jon alguma vez tivesse visto. E o deixou completamente maravilhado.
Sempre soubera que a posição exata do castelo no Gargalo não era conhecida e acabara de descobria o porquê.
A fortaleza fica em uma ilha formada de alguma planta aquática. Flutuava mansamente na vastidão inundada. E possivelmente estaria a milhas dali na próxima semana.
Assim que se aproximara Jon foi surpreendido por centenas de pessoas treinando. Homens, mulheres, velhos e crianças. Todos empunhavam espadas e disparam flechas em alvos pendurados em árvores.
O pai também estranhou todo aquele movimento e pôde perceber que Howland Reed teria muito o que responder quando o momento chegasse.
Com a noite veio um pequeno banquete em que reinou o peixe em suas mais variadas formas e cozimentos.
Quando a maioria dos presentes estavam desfrutando do estupor que vem logo depois de uma boa refeição, Lorde Stark comentou com o anfitrião.
— Seu povo treina com afinco.
— Sim, meu lorde.
— Para qual finalidade me escapa.
— Que outra finalidade teríamos senão a guerra.
O rosto de Lorde Stark endureceu.
— Ainda assim não atendeu ao chamado quando Robb convocou os estandartes.
— Me desculpe, meu lorde. Me expressei mal. Nos preparamos para a única guerra que importa. Aquela que virá junto com o inverno.
— Do que está falando?
Lorde Reed se virou para Jon subitamente.
— Não contou a ele?
Jon baixou a taça de algum destilado inominado e se endireitou um pouco na cadeira. Não esperava ser chamado na conversa.
— Não diretamente.
Por certo o pai tinha ouvido os rumores. Tio Benjen lhe enviara uma carta relatando o que havia acontecido com ele em sua patrulha. Mas a oportunidade nunca chegara para discutirem o assunto.
— Estão falando dos Vagantes Brancos, não estão? Não pode realmente acreditar...
— São reais, meu senhor. Tão reais como qualquer um nesse salão.
— Mas são apenas histórias de assustar. Contos para fazer as crianças não se aventurarem na floresta sozinhas.
Jon achou que aquele momento era tão bom como qualquer outro para falar do motivo que o levara a descer ao sul.
— Não deixamos nossa terra por causa de contos. Não eram histórias de assustar que nos mantinha acordados a noite.
— Eles estão vindo meu lorde e temos que estar preparados.
Lorde Stark se entregou a um silêncio contemplativo, portanto Lorde Reed se voltou para Jon.
— Não devia estar preparando seu pai para o que tem a frente? Precisamos dele para que o Norte esteja pronto.
— Estou tentando lidar com uma guerra de cada vez.
A verdade é que, por um motivo que desconhecia, não quis somar os Outros aos problemas do pai. Queria que ele passasse mais algum tempo crendo que a ameaça maior à solta eram os Lannisters e suas maquinações pela coroa.
Uma tolice, é claro. Lorde Reed tinha sua razão em se resguardar para o verdadeiro inimigo. Jon se esquecera do mais importante. Se deixara levar pelas circunstâncias.
Se Mance estivesse seguindo suas ordens, e era melhor que estivesse, um grande exército do Povo Livre estava sendo treinado nesse exato momento. O quão preparado estariam quando o inverno chegasse era impossível dizer.
Mas seus homens nunca estariam preparados para a Grande Noite se não tivessem as armas certas. A questão do Vidro de Dragão, mais especificamente a falta dele, continuava sem solução.
— Onde estão seus filhos?
A pergunta de Lorde Stark foi recebida com um silêncio profundo.
— Pelo que sei você é pai de um menino e uma menina. Onde estão?
— Cumprindo seus destinos, meu lorde – foi a única resposta que Lorde Reed ofereceu.
Mais tarde naquela noite Jon confidenciou seu plano de retomada de Winterfell para o pai e os principais homens.
— Como vamos tomar Winterfell? – indagou Lady Mormont.
— Vocês não vão – informou Jon.
— O que quer dizer com isso? Temos que resgatar os garotos Stark.
— Garanto que faremos tudo ao nosso alcance para tomar de voltar o Castelo e as crianças.
— Então?
— Vocês não têm parte no plano de resgate. A senhora e o exército retornarão a Correrrio imediatamente.
— E para que viemos aqui?
— Para fazer o leão atacar. Nesse momento, Lorde Tywin já deve ter sido informado que subimos o Gargalo em direção ao Norte.
— Acha que tentará resgatar o filho.
— Exatamente. Um cerco a Correrrio deve está sendo arquitetado nesse exato momento. Lorde Lannister espera que o irmão nos segure em Winterfell tempo suficiente para que consiga o filho de volta.
— Por certo Correrrio pode suportar um cerco por muito tempo – comentou Lorde Glover.
— Assim como Winterfell – lembrou Jon – Tywin Lannister pretende esfriar essa guerra tempo suficiente para encontrar nossas fraquezas.
— Você quer dizer suas fraquezas. Devemos supor que o inimigo já compreendeu que você tem papel fundamental nessa guerra.
— Não daremos oportunidade para isso. Vocês marcharão de volta e encurralarão as tropas inimigas nas Terras do Rio. Enquanto isso Lorde Stark e eu voaremos até Winterfell e levaremos a lutar até Kevan Lannister.
— Como farão isso sem um exército?
— Oito mil homens do Povo Livre deixaram a Dádiva e somaram forças com os clãs das montanhas. Chegarão a Winterfell nos próximos dias.
— O que não será muito inútil. O castelo pode resistir a uma investida como essa facilmente. Pelo menos até durarem os suprimentos.
Que não são poucos. Winterfell armazena mantimentos para o inverno desde o primeiro raio da primavera.
— Se tudo ocorrer como planejei, teremos um homem dentro do castelo antes de deixarmos o Gargalo.
— Como?
O pai que desacreditava.
— Deve saber que poucas portas se fecham para um cantor. Em breve teremos olhos e orelhas dentro dos muros.
Mance chegaria em Winterfell a qualquer instante e, Jon esperava, proporcionaria a vantagem que precisavam.
— Devemos pensar em nossos próximos passos depois que reavermos Winterfell.
— Essa guerra já se arrastou mais do que deveria.
Jon abriu a boca para concordar, mas nenhum som saiu.
Um puxão na sua consciência o fez cair.
Uma parte da sua mente registrou o grito de Lorde Stark chamando seu nome.
A outra parte se viu na amurada de Rochedo Castely, o céu noturno era cortado por linhas amarelas flamejantes.
Quando sua razão clareou um pouco percebeu que catapultas disparavam bolas de fogo.
O Rochedo estava cercado. Uma armada cobria o mar até onde a vista alcançava. O Kraken e o leão eram discerníveis nas velas.
Na praia, homens desembarcavam e avançavam contra as defesas erguidas do Povo Livre.
Do outro lado um exército buscava chegar até as muralhas.
— O dragão! – alguém gritou.
Os olhos de Fantasma viam melhor a noite. Jon conseguiu ver com clareza o que podia ser uma visão difusa para um homem.
Todas as catapultas buscavam o alvo branco que era Morghon.
Embora conseguisse se manter fora do alcance da chuva de fogo. Seu dragão tinha que ficar bem acima das nuvens, impossibilitado de atacar. As chamas verdes se dispersavam antes de alcançarem os atacantes.
Jon percebeu um padrão nos ataques das catapultas. De alguma maneira pareciam tentar guiar Morghon para um local especifico.
Correu para o portão, onde Grande Jon resistia com os nortenhos. E percebeu imediatamente que não aguentariam por muito tempo.
Embora os números fossem equiparados, os atacantes conheciam o castelo. Os Lannisters sabiam exatamente onde estava cada uma das fraquezas.
Já haviam inimigos dentro dos muros.
Sua mente girou, tentando decidir o que fazer.
Tentou alcançar Morghon, mas a ira do dragão o atingiu como uma dor física.
— Jon! – chamou uma voz conhecida.
Se virou e viu Toregg correndo em sua direção. Como ele sabia que Jon estava na pele de Fantasma era um mistério.
— Tem alguma coisa nas colinas!
Jon se virou e viu cinco pontos de luz. Talvez mais catapultas. Percebeu, então, que Morghon se direcionava a elas.
Àquela altura um dragão poderia ser atingido. As colinas proporcionavam uma posição para uma mira limpa.
Ignorando a dor aguda que lhe cortava da têmpora à nuca, tentou se ligar com Morghon novamente.
O dragão, que nunca havia sido atacado na vida, lutava contra Jon. A fúria fazia com que não o reconhecesse.
Morghon sempre fora o mais sociável de seus dragões. Também o que Jon mantinha um controle mais curto.
Decidido como estava a não deixar que o incidente da primeira vez que Morghon soltou Fogo-Vivo se repetisse, Jon treinara com ele mais do que com qualquer dos outros.
Foi esse treinamento que salvou todos em Rochedo Castely até aquele momento. Mas a cada pedra incendiária, esse controle era testado e enfraquecia.
Jon lutou pelo controle com mais afinco. Tentando ficar o mais calmo possível. Não precisava adicionar o seu pânico às emoções já instáveis do dragão.
Quando Morghon cedeu o suficiente para que enxergasse por seus olhos, Jon se via sobrevoando a colina meio encurralado pelos disparos que vinham de todos os lados agora.
Só havia uma saída. Para cima.
Um dragão poderia voar acima do alcance de qualquer catapulta. Mas como atacar estando tão alto?
Antes que concebesse uma solução um zumbido de vento passou por ele. Sua asa esquerda quase fora atingida por alguma coisa.
Um segundo zumbido cortou o ar e Jon viu o brilho metálico de um dardo. Foi um vislumbre rápido, mas suficiente para perceber que o projétil tinha mais de um metro de comprimento.
Ardiloso. As catapultas guiaram o dragão para o alcance dos dardos. E enquanto Morghon desviava dos disparos flamejantes, se tornava vulnerável para as hastas praticamente invisíveis a noite.
Cinco pontos de luz foram disparados fazendo com que Morghon subisse mais. Exatamente como o inimigo esperava.
O terceiro zumbido foi ouvido tarde demais.
A dor foi tamanha que trouxe Jon de volta ao seu corpo.
Seu grito fez eco ao de Morghon.
— Jon!
Estava no chão. Tentou se mexer, mas tudo que conseguiu foi aumentar a agonia que atravessava seu corpo.
— Ajudem aqui! – gritou o pai tentando erguê-lo.
— Não – a voz saiu fraca. Sentia que ia vomitar.
— Está sagrando – informou Lorde Reed.
Só então Jon sentiu o sangue quente que descia do nariz.
De todas as coisas que podia sentir naquele momento, foi acometido pela mais improvável.
Soltou uma risada. Enquanto ria, o sangue entrava em sua boca. O gosto metálico parecia combinar com o que sentia.
— Jon? – Lorde Stark soou assustado – O que foi isso? O que aconteceu?
O pai parecia que encarava um louco. O que não devia está muito longe da verdade.
— Vou destruir todos eles – disse com uma frieza que surpreendeu até a ele, parecia que outra pessoa falava com a sua boca - Um por um.
Sua cabeça ainda girava, por isso teve que se apoiar na mesa para não cair novamente.
Em sua mente viu o mar coberto de chamas verdes. O mundo ardia e Jon ria.
Nunca nada lhe dera tanta satisfação.
— Jon, por favor – o pai o sacudia pelo ombro, mas tudo que Jon percebia eram gritos, tudo que queria ver era fogo e sangue.
Tentaram matar seu dragão.
Morghon, que nunca queria deixar seu ombro até que foi obrigado devido ao seu tamanho. Morghon, que não gostava quando Jon montava nas costas dos outros irmãos.
Colinas em chamas cobriram sua visão. Homens fugiam, mas era tarde demais. Os navios tentavam se afastar, porém não conseguiam chegar longe o suficiente.
— Jon? - tentou novamente Lorde Stark.
— Deixe, meu lorde. Não é bom falar com ele nesse momento. – aconselhou Lorde Reed.
— Você sabe o que está acontecendo?
Medo e fascinação cruzaram o semblante de Howland Reed quando respondeu.
— Acordaram o dragão.


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Notas finais do capítulo

Olá, finalmente voltei. Sei que demorei demais. Sinto muito mesmo. Garanto que não foi por escolha. O computado quebrado e o trabalho me impediram de postar com a frequência que eu gostaria.
Fiquei super triste que perdi o aniversário de um ano da fic. Tinha pensado em preparar algo especial para comemorar a data, mas infelizmente não foi possível.
Mas vou prepara tudo direitinho e postar assim que estiver satisfeita com tudo.
Voltando a Dragões do Norte, o próximo capítulo sairá no dia 10 de outubro.
Mais uma vez peço desculpas e agradeço pelo carinho. Bjs...