Back to Home escrita por Ana


Capítulo 24
Transplante


Notas iniciais do capítulo

Me perdoem o atraso, mas vocês não sabem o quanto fico feliz com os comentários.
Vamos lá a mais um capítulo dessa saga Back to Home.
Música: Birdy - Skinny Love
Perdoem os erros que passam despercebidos.



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Era cedo da noite, Luna e Luíza já tinham jantado, Regina já tinha ajudado as meninas com exercícios da escola e agora estava no escritório estudando sobre o transplante gastrintestinal que faria com Kristin, enquanto as filhas assistiam na sala. Não tinha mais tanto receio em deixa-las sozinhas uma com a outra, os dias passados tinham mostrado significativas mudanças em como elas se relacionavam, sem sombra de dúvidas estavam mais companheiras, Regina arriscava até a dizer confidentes, já que as vezes pegava as duas conversando pelos os cantos.

Os estudos sobre o transplante vinham se mostrando bastante promissores e um doador compatível com o garoto finalmente tinha sido encontrado, e ele seria realizado na manhã seguinte.

Tinha as suas próprias cirurgias, os seus próprios estudos, mas tinha gostado de Kristin tê-la convidado a participar do procedimento, pois caso ela tivesse optado por fazer o transplante sozinha, sem alguém do staff, caso desse certo, a glória seria toda dela, e mesmo que desse errado, a tentativa é sempre um passo para o acerto.

Era estranho pensar em Kristin depois da noite que tivera com Emma, era estranho por justamente continuar pesando nela. Tinha feito amor com Emma, o que foi tão bom quanto costumava ser, mas agora devido ao estudo e ao transplante estava cada vez mais próxima de Kristin.

Regia se sentia dividida, mas não queria assumir para si mesma ou conversar com a irmã, pois aí tornaria tudo real, estar dividida entre duas pessoas e uma delas ser Emma tornaria real o fato de ainda a amar depois de tudo, o que invalidava toda a sua mágoa e ressentimento, todo o sofrimento ao qual teve que passar, pelo menos era o que Regina pensava.

Lia um arquivo online quando as meninas entraram no escritório.

— O que você está fazendo, mamãe? — Luíza que vinha com a gata no colo perguntou.

— Estou estudando para uma cirurgia.

— Que cirurgia? — Luna se aproximou do monitor curiosa.

— É um transplante de intestino grosso, que fica bem aqui. — disse apontando em Luna onde ficava.

— A tia Ruby vai ajudar você?

— Não Luíza, eu vou fazer esse transplante com outra médica.

— A mamãe?

— Não Luna, a Dra. Bauer, vocês viram ela quando foram com a Emma no hospital.

— Ahh, a de Washington.

— Isso.

— Mamãe, nós podemos ficar aqui no escritório com você? A gente promete não fazer muito barulho. — Luíza pediu.

— Podem sim.

E enquanto Regina terminava as suas leituras, as meninas se deitaram lado a lado no sofá que tinha no cômodo, enquanto assistiam desenho no tablete. Luna segurava o aparelho enquanto Luíza tinha Lucy deitava sobre a sua barriga. Vez ou outra Regina tirava os olhos da tela para olhar para meninas, as suas meninas, antes o que parecia um sonho tão distante acontecia ali na sua frente.

— Vamos para cama, Luna e Luíza. — disse quando Luna quase derrubou o aparelho por causa de uma cochilada.

Quando subiram, colocou as meninas na cama e Lucy em sua caminha ao lado da caixa de areia, apagou a luminária, já que não precisavam mais dela, e quando saía do quarto foi chamada de volta por Luíza.

— Mamãe.

— Oi.

— Amanhã você vai operar com aquela loira, não é?

— Vou sim, filha, porque você tá perguntando isso agora?

— Eu acho ela um pouco parecida com a mamãe, você não acha? É loira, branca, alta...

— Talvez seja um pouco.

— Mas agora a mamãe tá com o cabelo vermelho, não dá mais para você confundir. — disse em meio a um bocejo.

— O que Luíza?

— Quando eu crescer também quero deixar o meu como o dela. — dito isso, Luíza se virou e apagou.

Regina saiu do quarto das meninas contrariada, não entendia o que Luíza tinha dito e nem porque tinha dito. Quando voltou para o escritório, não conseguiu mais se concentrar na leitura, então apenas permaneceu ali, encarado a tela do notebook, até ser desperta por miados.

— Vem cá, Lucy. — e a gatinha que estava a porta correu até os seus pés — Vida boa deve ser a sua não é? Recebe comida, carinho, banho, e não precisa se preocupar com ex-esposa ou com futuros relacionamentos. — disse suspirando e afagando a gatinha que agora estava em seu colo — Você acha que amanhã eu vou conseguir? Quer dizer, transplantar em si é simples, mas tem o depois, sempre tem o depois. Ele é só uma criança, tem uma vida ainda pela frente. — Lucy miava baixinho e ronronava enquanto Regina lhe fazia carinho.

— Você está falando sozinha, Regina? — Zelena perguntou assustando Regina que afagava distraidamente a bichinho das meninas.

— Você tem que parar de aparecer assim, sabia?

— Eu cheguei agora, ia subir mas ouvi a sua voz.

— Só estava pensando alto, tenho uma cirurgia importante amanhã.

— Seja lá o que for, vai ocorrer tudo bem.

— Obrigado, Zel.

— Não precisa agradecer, boa noite.

— Boa noite. É Lucy, talvez você seja mesmo a nossa terceira filha. — falou quando Zelena saiu da porta.

...

Tinha estado ocupada com o trauma e com o laboratório de mapeamento genético, mas sempre tentava cruzar “ao acaso” com Regina pelos corredores, acaso esse que parecia ser cada vez mais difícil, principalmente nos últimos dias, onde ela parecia se revezar entre as cirurgias eletivas e um dos laboratórios. Queria conversar com ela, falar sobre a noite que tinham tido e o quanto tinha sido importante, mas além de tudo, temia o que podia ouvir depois de algo tão significativo.

Emma estava em seu horário de almoço e já estava no hospital há doze horas, no refeitório depois de montada a sua bandeja, se encaminhou para uma mesa vaga onde não tinha ninguém sentado. Já tinha começado a comer quando Neal e Robin se aproximaram e pediram licença para se sentarem junto a ela.

— Vocês estão sabendo do Encontro Estadual Cirúrgico? — Robin perguntou.

— Não lembro disso quando trabalhei aqui.

— Ele acontece anualmente em alguma cidade do estado, esse ano vai ser em Springfield MA, e a chefe do departamento cirúrgico escolhe alguém para acompanha-la e apresentar um painel no evento, dessa vez vai ser em um hotel.

— E como que a Reg... A chefe escolhe quem vai com ela? — Emma perguntou.

— Geralmente ela escolhe quem estiver tendo maior destaque no hospital, como em pesquisas ou em cirurgias — Neal falou engolindo a comida. — Robin foi há dois anos, Ruby foi no ano passado e eu achei que esse ano seria meu, mas aí chegou você e agora também tem a Bauer, mas sem ressentimentos.

— A Bauer? — Emma perguntou se empertigando na cadeira.

— Sim, sei que ela não fez muitas cirurgias aqui ainda ou salvou a vida de alguém que estava empalado em uma árvore, mas o que elas vão fazer hoje...

— O que elas vão fazer hoje?

— Você está desatualizada em Swan. — Robin disse parando com o garfo em frente a sua boca.

— Eu estava me preparando para ir dormir depois de ter passado vinte e cinco horas aqui, quando fui bipada meia noite, um carro com cinco pessoas derrapou na pista molhada pela chuva e acertou duas motos que tinham duas pessoas em cada, então sim, estou desatualizada porque nos momentos em que saí do trauma fui para o centro cirúrgico, e quando saí dela voltei para o trauma. O que elas vão fazer?

— Elas vão fazer um transplante de intestino em um menino que elas atenderam na emergência com fortes dores abdominais onde precisou ser feito uma colectomia. Agora elas vão tentar reparar isso.

— Mas isso... — gaguejou ao lembrar do dia em que Regina pediu para que ela acompanhasse as meninas ao salão, foi para isso, para estar com a Kristin, no mesmo dia em que dormiram juntas. —  Isso é arriscado, o pré-operatório é de alto risco.

— Sabemos. — foi a vez de Neal falar — Nem o Gold tentou um desses antes de se aposentar.

— Bom, eu estou aqui desde a primeira hora do dia, e ainda vou plantonar a noite, preciso ir checar os meus pacientes acidentados da madrugada. — disse se levantando.

— Não vai não, Swan, o quadro mudou, adicionaram a cirurgia da chefe e da Bauer e te tiraram do plantão, eu que vou ficar nele com os internos quartanistas, você vai poder ir descansar.

— Ah, e para que horas a cirurgia está marcada?

— Daqui a pouco, ela deve começar em alguns minutos. As duas equipes, a de obtenção do intestino e a do transplante já estavam se preparando.

Emma assentiu com a cabeça e se retirou da mesa, depois que deixou o refeitório subiu direto para o centro cirúrgico.

...

— Está pronta? — Kristin perguntou enquanto se escovavam.

— Prontíssima. — disse amarrando a parte de baixo da máscara.

— Deixa que eu amarro em cima. — Regina virou de costas para ela.

— Aperta a minha toca também, por favor.

— Claro. Maçãs? — disse se referindo aos desenhos na toca de Regina.

— Gosto dessas frutas. — falou se virando. — Vamos?

— Iniciem o anti-histamínico. — Regina disse quando entrou no centro cirúrgico.

— Regina, a ideia foi sua, então a primeira incisão também será. — Kristin falou quando a equipe número um trouxe parte do intestino doador.

— Como quiser. — com um corte limpo e seguro, Regina fez uma incisão com a lâmina que se estendeu do abdômen baixo até a pelve —  Cauterizador. — pediu, e logo o cheiro de carne a ser queimada entrou em suas narinas, já estava acostumada com o odor, mas quem não trabalhava com aquilo todo os dias, o cheiro acre amargava a boca — Afastadores. — e a instrumentista lhe entregou, precisariam de espaço para poder trabalhar.

— Vou seccionar onde tínhamos feito a anastomose anterior, assim ele terá duas junções no intestino em vez de três. — Kristin disse se posicionando.

— De acordo.

— Aspiração. — pediu ao fazer o corte sobre onde antes havia a anastomose. —  Cauterizador.

— Wayne, o órgão.

August assistia atento aos procedimentos que eram realizados por Regina e Kristin, e as atendiam com exatidão a tudo que pediam, desde que tivera controle em uma sala de cirurgia com a chefe e realizou corretamente todos os procedimentos, vinha acompanhando Regina em suas cirurgias, e tinha sido o único interno convidado a participar da cirurgia, e se tudo ocorresse bem, junto com as cirurgiãs, acompanharia o paciente de perto depois do procedimento.

Agora Regina pedia para que ele lhe entregasse a porção do intestino que seria transplantada. Quando se aproximou do recipiente, levantou os seus olhos para a salinha, onde alguns médicos do staff, residentes e internos acompanhavam a tudo, inclusive Lilith, que desde o incidente com Mills em plena cirurgia, se mostrava hostil com August, e agora tinha seus olhos cravados nele. Wayne podia apostar que ela estava secando ele, desejando que órgão caísse no chão.

— Wayne! — Regina disse de dentes cerrados.

— Já estou indo, Dra.

— Cuidado ao manuseá-lo.

— Claro. — pinçou o intestino em cada uma das pontas e com firmeza o levou até o paciente.

— Muito bem. A primeira sutura é sua. — disse a Kristin.

Se Regina pudesse ver através da máscara, a veria sorrindo.

Kristin fez a ligação entre os vasos sanguíneos e com a sutura continua de connell ligou uma das pontas do órgão que estava sendo transplantado ao colón do garoto, e Regina fez o mesmo com a outra ponta.

— Quando vamos descobrir se deu tudo certo? — August perguntou.

— Ser o órgão corar é sinal de que está recebendo sangue e está sendo oxigenado. — Kristin respondeu.

— E quanto tempo isso leva, mais ou menos?

— Não muito. — foi a vez de Regina, que respondeu com um leve tom de preocupação, já que o pedaço de intestino que fora transplantado ainda não tinha ficado rosado.

De repente o monitor começou a apitar, um apito alto e constante.

— A TCO2 caiu de 24 para 22. — o anestesista falou.

— Vamos lá John. — Kristin disse, e mais uma vez ele voltou a soar, a região abdomino-pelvica estava inundada de sangue. A pediatra rapidamente começou a checar as suturas em busca do foco da hemorragia.

— A ausculta está alterada, Dra. Mills. — August disse.

— Injetem cinco de heparina.

— Os batimentos dele estão caindo, e tem sangue no tubo Dra.

— Ele não está coagulando, tragam plasma e fator sete. Não consigo achar o foco da hemorragia, preciso de mais compressas, Regina, fasta o intestino para mim. — Kristin pediu.

— Como está o sangramento?

— Ainda não parou. Aspiração.

— Consegue agora?

— Cauterizador, rápido. — enquanto os monitores apitavam descontrolados, mais uma vez o cheiro acre subia no ar. — Tá quase...

— Não dá para tentar mais uma transfusão? — o interno perguntou.

— Não, vai sobrecarrega-lo. — Regina respondeu ainda tentando dar melhor visibilidade a Kristin. — Mais aspiração.

— Consegui. Eu consegui.

— Iniciando massagem cardíaca.

— A pressão sistólica e arterial estão caindo, ele está tendo uma parada. — August as informou.

— Carreguem e 100. — Kristin mandou — Afastem! — imediatamente Regina cessou a massagem e Kristin o desfibrilou, mas não houve alteração no eletrocardiograma que era mostrado no monitor. — Carregar em 200. Afastem! — gritou mais uma vez, e após a desfibrilação os bipes passaram a soar continuamente, o garoto tinha tornado.

— Doutoras, o transplante... O transplante deu certo, a parte transplantada está sendo oxigenada, ele está rosa.

— Wayne, você quer fechar o paciente? — Kristin perguntou.

— Se permitirem.

Junto dos outros que viam tudo da galeria, Emma também se juntou para assistir à cirurgia. Regina e Kristin trabalhavam bem e com agilidade, trabalhavam em sintonia, a ação de uma completava a da outra, não parecia que aquela era a primeira vez que operavam juntas. Presenciar aquilo a machucava, era como se independente dos passos que desse com Regina, Kristin pouco a pouco avançasse ainda mais tomando o seu lugar. Chegava a se sentir como Luíza antes, Kristin havia chegado para roubar tudo que era seu.

— Nos próximos dias você vai ficar na pediatria. — Regina falou para August enquanto se lavavam.

— O pós-operatório é o período crucial para toda cirurgia, mas nessa é multiplicado por dez, a chance de infecção e rejeição são ainda maiores, então você precisa realmente acompanhar o garoto.

— Claro Dra. Mills e Dra. Bauer, farei o acompanhamento e informarei vocês de qualquer mudança.

— Você tem ido bem, Wayne.

— Obrigado Dra. Mills.

— O que você acha de apresentar um painel no Encontro Estadual Cirúrgico sobre o nosso plano cirúrgico e de recuperação desse transplante? — Regina e Kristin caminhavam por um dos corredores vazios do hospital depois de terem ido falar com a mãe do paciente.

— Isso é um evento médico aqui de Massachussetts?

— É, e ele é anual. Acho que esse transplante é uma boa pauta para ser debatida, e em um debate talvez possa surgir até boas ideia para o pós-operatório do John.

— E você apresentaria o caso comigo?

— Bom, ele é um paciente da pediatria.

— Mas a ideia foi sua.

— Podemos apresentar juntas, então.

— Esse transplante precisa dar certo. — Kristin disse parando e encarando Regina. — Se ele rejeitar e nós o tirarmos, o garoto vai ficar ainda pior.

— Eu sei, mas temos um plano traçado, temos uma terapia médica estipulada baseada em estudos e corrigidas nos pontos em que os outros deram errado. Como médica, só penso que isso vai dar certo.

— E como mãe também, não é? Eu percebi o jeito que você ficou na primeira cirurgia dele.

— É, não dá para negar.

— Você tem um coração enorme Regina, conheço outros médicos que tratariam esse caso como um experimento, como se esse menino fosse um ratinho de laboratório, mas você não é assim.

— E nem você.

— Eu sei, mas fazem anos que convivo com essas situações, meus baixinhos são hardcore. — falou sorrindo. — É... Tem um cabelo aqui. — Kristin disse tirando alguns fios de cabelo que se soltaram do meio rabo de cabelo que Regina usava e caiam sobre o seu rosto.

O toque foi sutil e lento, e fez com que Regina se perguntasse se aquela situação realente estava acontecendo ou se era fruto da sua carência e dos anos solitários.

— Kristin...

Mas antes que pudesse terminar, como se ambas tivessem tido a mesma ideia, as suas bocas se encontraram em um beijo, que tão rápido quanto aconteceu, foi interrompido por Regina, que levou as mãos ao rosto sem crer no que tinha acabado de fazer.

— Isso não... Isso... — mas novamente o seu raciocínio foi quebrado, dessa por vez por causa da figura que surgiu no corredor.

Depois que a cirurgia de Regina e Kristin acabou, Emma esperou um pouco para procurá-la, tinha tudo em mente, iria usar a desculpa da troca dos seus horários, quando na verdade só queria mesmo se fazer presente, mostrar que também estava ali, principalmente depois da noite que tinham tido.

Emma a procurou na sala dela, no saguão principal e na sala de espera, caminhava em direção ao quadro de cirurgia achando que ela pudesse estar lá atualizando o quadro quando virou em um corredor e desejou não ter feito aquilo. Mais uma vez as borboletas nervosas se agitaram lhe embrulhando estômago, queria voltar, ir embora à passos largos, mas os seus pés estavam grudados no chão. Quando os olhos de Regina se fixaram nos seus, desejou ser invisível, e enquanto uma lágrima solitária escorria pelo seu rosto, que Emma percebeu tarde mais para evitar, o peso de todos aqueles anos desabou sobre ela.

Emma não esperou que Regina pudesse dizer algo, se é que ela fosse dizer, voltou pelo o mesmo corredor em que veio, de início com passos vagos, que se tornaram rápidos e depois se transformaram em uma corrida em direção ao banheiro mais próximo, a sensação do embrulho no estômago não era mais metafórica, sabia que não conseguiria prender por muito mais tempo. Quando chegou ao banheiro, abriu a porta com tanta força que ela bateu na parede e tornou a fechar novamente, assustando Ruby que se olhava no espelho. Emma entrou na primeira cabine a sua frente e só teve tempo se subir a tampa do vaso sanitário.

— Você tá bem, Swan? — Ruby perguntou se aproximando, e como resposta outro jorro atingiu a privada com tosses e engasgos.

Quando finalmente pareceu que não provocaria mais, sentou ofegante no chão, seus olhos lagrimejavam, mas preferia acreditar que era por causa do que tinha acabado de fazer.

— Tá se sentindo bem, Emma? — perguntou mais uma vez e dando a descarga.

— É só... Eu tô bem. — respondeu limpando o canto da boca com o dorso da mão.

— Tem certeza? Você tá muito pálida, você comeu? Pode tá hipoglicemica.

— Comi sim, acho que foi alguma coisa do almoço que não me fez muito bem. — mentiu, sabia bem que não tinha sido comida alguma que tinha afetado o seu estômago.

— Faz um acesso venoso e toma soro, é bom se bom hidratar, e assim vai se sentir melhor mais rápido.

— Vou fazer isso sim, Ruby, obrigado.

— Melhoras, viu. — e com um sorriso simpático saiu do banheiro.

Quando se levantou foi direto a pia, lavou as mãos, limpou a boca e fez um gargarejo. Realmente estava muito pálida, concluiu enquanto se olhava no espelho, então deu umas batidinhas no rosto na esperança de devolver a cor para a pele, passou uma água na cara e fez um meio coque no cabelo para evitar que os fios colassem no rosto. Respirava fundo com as mãos apoiadas na pia e com a cabeça baixa tentando controlar as ânsias, a raiva e o pranto eminente quando o seu pager começou a soar, achou que fosse do trauma ou do laboratório, talvez Ivy estivesse com alguma dúvida e precisando de ajuda, mas não era nem um e nem outro.

Sua cabeça latejava quando chegou aporta da diretoria do setor cirúrgico.

— O que foi? É alguma coisa com o laboratório? Alguma amostra lida errada? — perguntou na defensiva assim que entrou na sala de Regina.

— Não é nada disso, sei que aqui não é lugar para falarmos sobre isso, mas...

— E onde é? Onde é um bom lugar para falarmos sobre isso? Porque você evita e sempre foge dele seja lá onde nós estejamos.

— Emma! — falou repreensiva e saindo detrás da mesa. — Sei que você está irritada por causa do que viu, mas você não vai falar assim comigo, eu só queria... Olha, eu não...

Skinny Love ♪

— Não me deve nenhuma satisfação, eu já sei, você já deixou bem claro isso, e mais de uma vez, mas eu estou cansada, estou cansada de você fingir que nada aconteceu, quando eu sei que aí dentro da sua cabeça está tudo de cabeça para baixo, cansada de te ver aparecer no outro dia como se nada tivesse acontecido quando o meu exterior reflete exatamente o que se passa dentro de mim!

— Olha quem está falando sobre fingir que nada aconteceu, por acaso você lembra de como você voltou? Como você chegou aqui? Arrogante e petulante. Depois de ter sumido por anos você me volta como a dona da razão, um próprio mártir, cheia de exigências. E eu continuou batendo na mesma tecla porque foram seis anos, Emma, e não seis dias, você não saiu só para comprar pão na esquina de baixo, você fez as suas malas e foi embora! Estava magoada, Deus, eu sei que estava, mas estava tanto assim ao ponto de sair praticamente fugida e levando a Luna junto?

— Eu fui embora, eu já sei, e eu pago o preço por esse erro, tenho pagado bem caro por ele, eu sei da dor que causei a você, vi ela crepitar em seus olhos enquanto você me dizia tudo aquilo naquela noite, vi ela transbordar e me atingir, mas assim como senti a sua dor, também senti as suas farpas, desde sempre você teve esse comportamento gélido como forma de defesa, ele protegia você, e parecia ser suficiente, até que vi ele falhar uma vez e você desmoronou, nós ainda namorávamos, nem estávamos noivas ainda, mas naquele dia eu jurei, prometi a mim mesma que quando as suas defesas falhassem, eu estaria lá, para te amparar, para te acolher.

— Você não cumpriu essa promessa. — disse com a voz carregada de dor e ressentimento pela a lembrança.

— Não, pelo contrário, fui eu que fiz com que você desmoronasse, magoei, te feri, e saber disso dói. Acho que não dá para eu te pedir desculpas, por que isso ainda sim seria muito raso, porque isso parece tão pouco, mas te peço perdão, Regina, te peço perdão por toda a mágoa que te causei, por ter separado as nossas filhas, por ter te separado da Luna, eu sei que isso são coisas que nem o tempo sendo bem generoso você vai esquecer, mas eu peço que me perdoe se o seu coração permitir. Eu precisei ouvir muitas coisas para compreender o mal que eu causei a todas nós, mesmo não achando que estivesse fazendo. Eu consegui o que eu queria, o que eu tinha ido buscar, mas só não sabia que o preço iria ser tão alto e tão difícil de pagar. Quero pedir perdão por o sentimento de abandono e por todas as lágrimas que você derramou por a minha causa, sei que isso tudo são só palavras e que não muda o que eu fiz, tenho consciência disso, mas é preciso que elas sejam ditas ou morrerei com elas entaladas na garganta.

— Emma...

— Por favor, só me deixa falar, só dessa vez, me deixa falar porque não sei quando que vou poder fazer isso de novo ou se vou conseguir... Nesse momento eu... Eu me sinto destruída, tem um buraco aberto no meu estômago e outro no meu peito, porque por mais que eu tenha sido egoísta, por mais que tenha pensado só em mim, em minhas realizações e no que eu queria, eu nunca deixei de amar você, e só há uma mulher em quem eu penso quando fecho os olhos, já que as outras duas ainda são crianças.

— Você está me dizendo tudo isso porque finalmente a sua consciência pesou, Emma? É para se sentir em paz consigo mesma e poder colocar a cabeça no travesseiro e dormir tranquila? — Regina precisou se valer do sarcasmo e da ironia para conter toda a torrente de sentimentos que lhe subiam pela garganta.

— Nunca mais vou conseguir pôr a minha cabeça no travesseiro e dormir tranquila, não sabendo que talvez eu tenha perdido a mulher que eu amo. Assumo todos os meus erros e defeitos, minha prepotência, meu egoísmo, meu orgulho, minha fraqueza... — seus olhos ardiam, as orbes verdes agora estava rodeadas de um mar vermelho, estava despida de qualquer capa.

Sem conseguir mais sustentar olhar e encarar Emma que estava a um passo do choro, Regina virou de costas se apoiando no aparador, quando as suas próprias pernas falhavam na função de sustento.

— Eu preciso saber o que há entre vocês, isso é de verdade, Regina?

— Eu não sei... Não posso mentir, Emma, ela é tudo que eu esperava de você, e ela me vê além de você, você entende isso? Entende que ela me enxerga além do fato de eu ter sido deixada? Eu sou a chefe daqui, e eles me respeitam por isso, me respeitam por a profissional que eu sou, mas nem sempre foi assim, durante muito tempo a minha vida pessoal foi assunto para eles, e eu me tornei um relacionamento que deu errado, eu me tornei o nosso erro, Emma, mas ela não vê assim. Você consegue entender o significado disso? —ainda de costas e fungando continuou: — Foram seis anos, seis fodidos anos, e eu permaneci aqui, bem aqui onde você me deixou, permaneci parada no mesmo lugar, te amando, mas você me abandonou, foi você que foi embora, Emma, e eu sinto tanta raiva disso, tanta raiva de mim por estar entre ela que tem tanto a me oferecer, e você que fez isso com o nosso casamento.

— Isso dói, isso dói tanto, porque mesmo sem saber, mesmo estando em “dúvida”, você já escolheu ela, depois da noite que nós tivemos você escolheu ela, depois de todos os passos que demos você tem escolhido ela, é ela que vai com você para o tal evento, não é? É, realmente é impressionante a rapidez com que você tem esquecido tudo isso. Não é a primeira vez que vocês ficam, sei que não é, e você ficou com ela antes de ter estado comigo, e depois do que aconteceu ficou com ela logo em seguida. Foi nela que você pensou enquanto estava comigo? Enquanto nós... Olha para mim Regina! Olha nos meus olhos e me diz!

Quando se virou para enfim encará-la, o seu rosto estava lavado de lágrimas e grossas gotas escorriam pelas as suas bochechas até o seu queixo, e findavam no jaleco.

— Não quero mais viver de memórias, Regina, sejam elas boas ou não, quero fazer novas lembranças, algumas que não nos tragam magoa ou dor, quero que possamos caminhar juntas daqui para frente — falou se aproximando, assim como Regina, Emma não continha mais o seu choro —  Mas para isso eu preciso que você diga que me ama, diga que ainda sente o mesmo, que ainda estou em você como você está em mim. Diga e então seremos capazes de fazer qualquer coisa, de superar esses anos, de superar a Kristin, diga, desde que realmente sinta, porque se não... Se não, não valerá apena ter lutado tanto, e então vai ser a hora de darmos um basta nisso tudo, de pôr um ponto final de uma vez, porque sei que você está tão exausta quanto eu. — disse enxugando o rosto. — Então eu preciso que diga, porque não dá mais para correr em círculos.

— Isso é um ultimato?

— Não, isso é desespero, isso sou eu me despedaçando, você sabe melhor do que ninguém o quanto pesa nadar contra a correnteza, eu não tenho a mesma força que você tem, eu nunca tive.

Regina fechou os olhos respirou fundo, aquele era o momento em que tinha a faca e queijo em mãos, tinha a tesoura e o fio estava bem ali na sua frente. Emma estava certa ao dizer que estavam exaustas daquela situação.

— Os nossos erros nunca serão compensados, Emma, você não vai me perdoar por completo por eu não ter te apoiado quando você precisou, e nem eu por você ter me separado da Luna, e não somos nós que vamos curar uma a outra, muito pelo contrário — precisou respirar fundo mais uma vez para poder continuar. — Nós só nos ferimos cada vez mais. Talvez segundas chances não tenham sido feitas para nós, Emma.

O chão faltou sob os pés de Emma, a ânsia de vômito e a dor de cabeça não eram nada diante da dor em seu peito que lhe roubava todo o ar, a imagem de Regina e sua frente tinha ficado difusa tamanha a cortina enevoada de lágrimas que cobriam os seus olhos, tinha acabado, depois de todos esses anos criando coragem para voltar e lutar, tinha acabado. Saiu da sala de Regina batendo a porta, assim como tinha corrido mais cedo para chegar ao banheiro, Emma corria para ir embora dali o mais rápido que pudesse. Quando alcançou o elevador, as portas já se fechavam, mas como a pessoa que estava dentro tinha percebido que ela entraria, estendeu a mão evitando que as portas se fechassem. Emma estava com o corpo dividido entre o lado de dentro e o lado de fora do elevador quando percebeu quem tinha segurado as portas para ela.

Kristin olhava atônica para o estado de Emma, completamente desestabilizada. Viu as portas do elevador de fecharem diante de si quando ela deu meia volta e preferiu descer pelas escadas.

Mais uma vez, independente da forma como tinha feito, Regina a tinha empurrado para fora, e dessa vez, definitivamente. Suas pernas que já ameaçavam fazer isso, cederam assim que a porta se fechou atrás de Emma, sua sala era a prova de som, mas mesmo que não fosse, um grito gutural e roco escapou da sua garganta sem que tivesse controle algum, cheio de dor e de pesar. O que estava feito estava feito, não sabia o que fazer agora ou qual seria o próximo passo a dar, e a sua cabeça girava só em pensar, então permaneceu ali, no chão, por um tempo que foi incapaz de quantificar.

"Não importa o quanto algo nos machuca, às vezes se livrar dele dói mais ainda." 

Meredith Grey – Grey’s Anatomy


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Notas finais do capítulo

Estão todas bem?
Talvez algumas estejam desejando coisas não tão boas assim para mim, mas pensem, todas já percorreram os seus caminhos, Luna e Luíza se entenderam e agora veem as duas como mães, Emma deixou de lado a prepotência e se arrependeu de coração pelo que fez, mas está faltando alguém, não é? Está chegando a vez da pessoa que mais tem sido relutante e arredia.

Rapidinho aqui, o que vocês acham de um overpost até sexta? Comparado com a outra plataforma onde eu também estou postando, lá está mais adianta porque comecei primeiro, então até sexta eu pretendo postar capítulos novos para deixar as duas iguais, mas para isso eu preciso dessa participação de sempre nos capítulos. O que você acham, me digam.

Quando eu demorar, me cobrem, me lembrem
Twitter: @xnxruth
IG: anxruth
Estou sempre por lá.

Bjus e não desistam, porque coisas boas ainda vão acontecer.



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