10 anos depois escrita por LightHunter


Capítulo 9
Capítulo 9 - Lena


Notas iniciais do capítulo

Oi galeris. Então, esse capítulo tá mais pesado que os outros (pelo menos eu achei), mas é importante entender esse lado da personagem que vai ser melhor explorado no decorrer da história. E não, não são todos os capítulos dela que vão ser assim. Boa leitura :)



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Presente

Olho para as pessoas ao meu redor, que um dia chamei de amigos. Estávamos no saguão do hospital após Lara ter expulsado todo mundo do quarto para cuidar de BB. Victor estava a duas cadeiras de distância, acariciando a mão de Skye enquanto comia uma bala Fini. Gus estava sentado a vários metros de distância, de frente para mim, mexendo no celular, e Maya estava ao seu lado, se distraindo com qualquer coisa que emitisse barulho ou se mexesse. No momento, estava olhando os mosquitos que voavam em volta da lâmpada que iluminava o local. Nina estava no banheiro, deixando o gatinho em uma das cadeiras, que estava enrolado em seu próprio corpo, dormindo.

O silêncio desconfortável foi quebrado pela voz de Skye:

— OK, deixa eu ver se entendi. Todos vocês já se conheciam desde a época do colégio, e acabaram se separando dez anos atrás?

— Nós não apenas nos separamos; nós brigamos e resolvemos não nos falar nunca mais. – Gus havia deixado guardado o celular no bolso e olhava para o teto, pensando.

— E que briga foi essa?

— Com todo o respeito, mas nada que seja da sua conta. – Me levanto e sinto uma pontada de dor no braço. Onde estava Lara ou qualquer outro médico pra me ajudar? Suspiro e decido andar para clarear as ideias.

Passo por diversos corredores à procura de alguém para recolocar meu ombro de volta no lugar, mas o hospital parecia deserto. Ou era apenas eu que estava procurando errado. Entro em um quarto onde um paciente dorme, e me encosto na parede, tentando controlar minha respiração. Me abaixo e fico sentada, fechando os olhos. Tudo o que havia acontecido há dez anos estava voltando à minha mente, e eu não podia lidar com isso de novo. Mas tampouco podia deixar que isso me afetasse na frente de todos.

Volto para o saguão e ouço a voz de Lara ecoando pelas paredes.

— … E ele está descansando agora. Esperamos que ele acorde em algumas semanas e não tenha sequelas. Assim que ele acordar, será atendido por um psicólogo. – Ela suspira e coloca a prancheta contra a barriga, mostrando cansaço. – Podem ir para a casa de vocês. Garanto que ele não vai sair daqui.

— Ahn… Eu não estou aqui por causa dele. Eu esperava que você ou algum médico competente pudesse arrumar meu braço. – Olho para Lara, e ela retribui o olhar com faíscas saindo de seus olhos.

— Certo, venha aqui. – Ela me leva para um quarto mal-iluminado e me pede para morder um pedaço de pano para não gritar e incomodar os outros pacientes. – No três. Um.. – Ela torce o meu braço, e sinto uma dor agoniante, que extravaso em forma de um grito abafado pelo pano em minha boca. A dor logo passa, mas o incômodo continua, apesar de menos intenso. Ela me entrega uma compressa de gelo e eu pressiono no ombro. – Deixe até amanhã para não ficar dolorido ou inchar.

Volto para o saguão, e Nina pega as chaves do carro, se levantando.

— Vamos então? – Ela soa impaciente.

Começo a andar quando ouço a voz de Lara atrás de mim, sendo dirigida a todos nós.

— Espera um pouco. Vamos todos ignorar o fato de que estamos todos reunidos aqui, depois de dez anos sem nos falarmos, com um dos nossos amigos internados?

Viro para encará-la, e todos estão se olhando.

— O que você espera que a gente faça, Lara? – Dessa vez a pergunta veio de Maya, que estava de pé e olhava para todos apreensiva. – Queria que todo mundo se abraçasse e esquecesse tudo o que aconteceu?

— Mas dez anos se passaram…

— Maya está certa. E estamos todos cansados. Podemos conversar melhor amanhã, se quiserem. – Gus se levanta também e começa a andar em direção a saída. Olho para Lara, e sua expressão logo se torna dura, e ela volta para seu escritório.

— Ei, será que podemos ir agora? – Nina me pega pelo braço bom e me puxa em direção à saída, o gato malhado nos seguindo de perto.

Durante todo o caminho de volta ficamos em silêncio, que era quebrado por um miado ou outro, ou por um resmungo por parte de Nina. Assim que chegamos na minha casa, ela me entrega o livro de rituais e eu saio, apertando ainda a compressa contra o ombro.

— Nina… - Chamo quando ela dá a partida.

— Não, Lena. Apenas não, OK? Pelo menos não agora. – Ela acelera e entra na garagem ao lado, parando o carro perto do meu, estragando a saída dramática. – Não mesmo! – Ela sai do carro, o gato atrás dela, e entra na casa batendo a porta.

Olho para o livro em minha mão e entro em casa. Levanto a escada com certa dificuldade e deixo perto da porta. Coloco os livros que tinham caído no chão com a minha queda de volta na prateleira, e sento na minha poltrona vermelho-sangue com vista para as outras casas da vizinhança, onde eu poderia beber chocolate quente em paz enquanto observava os vizinhos. O caminhão de mudança tinha chegado na hora certa hoje de manhã, e agora todos os móveis já estavam no lugar, a maioria deles importado.

Começo a ler o livro para ver o que poderia fazer amanhã, mas o encontro de nós todos hoje de manhã não saía da minha cabeça. Fecho o livro violentamente e me levanto, suando frio. Minha mão esquerda estava fechada em um punho, as unhas deixando marcas na minha palma. Deixo o livro na mesinha em frente à poltrona. Vou até a cozinha e pego uma chave preta que havia deixado em cima da geladeira vermelha logo após os homens da mudança irem embora. Caminho até a porta que levava ao porão, e destranco-a. As emoções já haviam tomado conta de mim.

Eu havia estado na casa dois dias antes para arrumar o porão, organizando seu conteúdo. Seria imprudente da minha parte deixar que pessoas desconhecidas cuidassem disso. Aperto um interruptor e várias luzes se acendem, revelando um corredor com paredes repletas de vinhos, destilados, champanhes, cervejas importadas, vodkas, uísques e outras bebidas. No fundo, uma parede cheia de post-its de diversas cores, todos eles dizendo: “NÃO!” “DÊ MEIA-VOLTA!” “ESQUEÇA ISSO!” “VOCÊ NÃO PRECISA DISSO!” “VÁ PARA A CAMA!” “ISSO NÃO VALE A PENA!”

Ignoro as mensagens de alerta. Caminho até a última seção e pego duas garrafas de tequila e uma de vinho tinto. No caminho de volta para a sala, abro uma das garrafas de tequila e começo a beber direto do gargalo, o líquido queimando a garganta me trazendo familiaridade. Tento tirar da minha cabeça os acontecimentos do primeiro ano da faculdade, e dou mais um gole demorado de tequila.


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