Vai sonhando escrita por Cínthia Zagatto


Capítulo 5
Capítulo 5


Notas iniciais do capítulo

Aproveitando que teve uma recomendação linda de uma leitora daqui que já leu o livro. ♥ Vocês são sempre os melhores, e eu nem sei como agradecer por isso.

Sobre a formatação: como não dá para mudar a fonte aqui, eu preferi usar as aspas do que o itálico, porque o trecho é grandinho e pode cansar um pouco a leitura.



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Shaun arrastou os pés dentro do trailer, ainda com um sorriso para o que tinha acontecido atrás dele. Umedeceu os lábios com o gosto da garota ainda na boca e escutou sons que indicaram que um dos amigos tinha outra delas lá dentro. Todas as cabines estavam fechadas quando se aproximou para se deitar e não tardou a descobrir em qual bater. Esmurrou a madeira que separava sua cama da de Peter, logo acima.

─ Façam em silêncio.

─ Desculpa. ─ A voz do amigo veio em um sussurro, mas logo ele e a garota estavam rindo de novo.

Shaun chacoalhou a cabeça com uma risada abafada e se fechou em seu beliche. Estava cansado demais para se preocupar com os barulhos que ouvia, para tentar ir até o banheiro ou para até mesmo tirar a roupa. Limitou-se a arrancar a camiseta, lembrando-se de que tinha um novo colar bonito apenas quando ficou enroscado nele.

Passou o tecido pelos braços e a preguiça de movê-los o fez repousá-los ali mesmo, acima da cabeça. Sentia que cheirava mal nas axilas, mas nem isso o impediria de dormir. Sem que conseguisse pensar em mais nada sobre Evelyn ou Emily, fosse lá o nome dela, apagou em um sono pesado.

Shaun apertou a mão de um homem alto, de cabelos grisalhos. Os dedos dele espremeram os seus e, com isso, viu uma careta de incômodo aparecer em seu rosto enquanto os olhava de longe. Só então percebeu que não estava dentro do próprio corpo, mas ainda conseguia senti-lo. Estavam parados no centro do que parecia um consultório médico.

 

— Tem só mais uma coisa que eu preciso dizer pra você. É sobre o zelador.

 

— Por favor, Ted, não começa com aquela história de hospital mal-assombrado. Se um fantasma entrar na minha sala no meio da madrugada, eu espanco o que quer que seja por baixo do lençol.

 

O homem de cabelo grisalhos, Ted, chacoalhou a cabeça com uma risada sonora, embora abafada em respeito aos quartos ao redor.

 

— Ninguém vai te pregar uma peça assim, Shaun, não por ordem minha. É só um homem que apareceu aqui há uns três anos e nunca mais foi embora. Não sabemos quem ele é e ele insistiu que quer ficar até descobrir, mas o problema é que ele tem recaídas sempre que tocamos nesse assunto. O nome dele é Pietro. Ele tem um sotaque engraçado e achamos que ele veio do México, mas ninguém desaparecido por lá bate com as informações dele. Bom, seja o que for, não pergunte sobre ele, não faça ele tentar se lembrar.

 

— Parece uma bomba-relógio. — O comentário de Shaun veio em tom desacreditado, seguido por um riso leve. Não se opôs ao que escutara e também não tentou estender o assunto. — Eu vou pegar meu jaleco e comer alguma coisa. Estarei de volta às dez.

 

— Eu espero que sim.

 

Os próximos acontecimentos piscaram em questão de segundos. Seu corpo estava sentado na lanchonete do hospital, acompanhado por um copo de suco de laranja e uma porção de pequenas bolinhas que, por algum motivo, sabia que se chamavam pão de queijo. Depois, estava vestindo o jaleco dentro do banheiro da sala do plantão. E, então, com um livro aberto em frente ao rosto e os pés cruzados sobre a mesa, lutava para ficar acordado enquanto o relógio já marcava duas da manhã.

 

Uma batida na porta o fez baixar os pés, e um homem alto, de cabelos castanhos no formato arrepiado e pele bastante branca, colocou apenas a cabeça para dentro.

 

É o Peter. Sua tentativa de se meter nos acontecimentos foi fracassada. Ouviu a própria voz como um eco abafado, mas ela soava apenas para si mesmo. O Shaun sentado à mesa e Peter, à porta, não pareciam escutá-lo.

 

— Oi, eu sou o Pietro. Posso recolher o lixo? — Aquele sotaque latino era a coisa mais engraçada que já havia presenciado. Queria se entregar a um ataque de risos, mas seu corpo permanecia sério na cadeira do consultório.

 

— Claro. — Shaun se colocou debaixo da mesa para pegar um cesto que apenas continha papéis e embalagens de remédio recicláveis. Foi quando se ergueu novamente sentado, com o zelador de quem havia escutado parando perto dele para pegar o que lhe entregava, que um ofego de pavor escorregou para fora de sua boca.

 

De cabeça baixa, Peter se ergueu para vê-lo, com o rosto torcido em uma expressão confusa. Os olhos de Shaun ardiam e seu corpo estava retesado na cadeira. O primeiro movimento que veio depois disso foi o reflexo de erguer a mão para alcançar o rosto do zelador desconhecido. De desconhecido, na verdade, ele nada tinha. Antes que concluísse o toque, levantou-se com as pálpebras equilibrando as lágrimas que se formavam e disparou para fora da sala, com um murmúrio que mais parecia um pedido de desculpas:

 

— Minha carteira. Deixei na lanchonete.

 

Era uma mentira.

Shaun abriu lentamente os olhos úmidos e ergueu o corpo para enxergar ao redor. Estava dentro da cabine escura do trailer. Todas as luzes haviam sido apagadas e os barulhos sobre sua cabeça, com os quais fora dormir, já não existiam mais. Soltou o ar pelo nariz ao pensar na bizarrice que estava sonhando, ainda que ela o deixasse de coração acelerado, assim como sentira no sonho ao correr para fora do consultório. Voltou a se deitar e não demorou meio minuto para adormecer outra vez.


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Notas finais do capítulo

Lembrando, sempre, que já dá para comprar o livro em http://bit.ly/vaisonhandoloja (precisa colar no navegador porque o Nyah não gera o link aqui, mas é esse mesmo) e que, embora esteja em pré-venda até o lançamento, eu já coloco nos correios para quem comprar on-line. Beijo beijo!



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