Ao seu lado escrita por nanacfabreti


Capítulo 6
Fogos, sinos e violinos




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—E então, tem muita gente aí? —Ian apontou com a cabeça para o interior da sala.

Eu mal podia acreditar que ele viera mesmo para nos ajudar com os cartões.

—Nem a metade do que esperávamos. —Avisei enquanto entravamos.

Haviam dois professores nos supervisionando, ambos demonstraram satisfação com a presença de Ian ali, já alguns alunos pareciam estar vendo um alienígena.Mostrei à ele alguns cartões do ano anterior, expliquei um pouco da técnica que usávamos e como Ian estava instruído a não usar nenhum um tipo de objeto cortante no colégio, ele ficou com a parte da colagem.

Eu já imaginava que nem todos agiriam com naturalidade, e até era compreensível,estávamos falando de alguém com uma doença grave, no entanto,tudo corria tecnicamente bem até Cristina e Leonardo juntarem-se ao grupo.

Ele, já havia dias,me tratava com indiferença, já Cristina lançou um olhar desprezível a Ian,fiquei aliviada por ele não ter visto.

Os dois sentaram-se próximos e passaram todo o tempo cochichando, achei que a tensão havia passado, todos estavam trabalhando da melhor forma possível quando Cristina se levantou.

—Minha tesoura está cega, tem alguma sobrando? —Ela avisou com sua voz estridente.

Havia uma  bem ao lado de Ian e nem mesma eu previ o desastre, quando ele inocentemente ofereceu a Cristina.

Foi como uma cena de filme, todos se voltaram ao mesmo tempo para os dois esperando  pelo desfecho daquele simples ato.

 Cristina  arregalou os olhos como se estivesse sofrendo uma ameaça , ninguém mais parecia respirar tamanho o silencio que tomou conta do lugar.

 —Me desculpe, mas não vou pegar sua tesoura. —Ela disse alto e bom som, sem sutileza, sem titubear.

Ian permaneceu com a tesoura na mão por alguns instantes, ele não esperava por aquilo, meu instinto me fez tirá-la de sua mão e com raiva a recoloquei sobre a mesa.Meu Sangue ferveu e corria queimando minhas veias.

—Sabe que isso é preconceito,não sabe? —Levantei-me e coloquei meu dedo em riste.

Ela sorriu com desdém.

 —Eu só não quero ficar doente como ele. —Cristina prosseguiu, como se fosse uma afirmação justa.

Todos nos olhavam boquiabertos.

—Livia, não precisa fazer isso. —Ian sussurrou para mim, já em pé ao meu lado.

—Sabe o que é isso?Despeito. —Continuei. —Está agindo assim porque há pouco tempo atrás você se jogou para cima de Ian e ele a rejeitou. —Falei sem ter certeza do que dizia.

Ela riu irônica.

—E agora que ele está doente, acha que vai sobrar alguma coisa para você? —Ela colocou as mãos na cintura e começou a deferir ofensas sobre mim.— Isso chega a ser nojento.Eu...

Antes mesmo que ela pudesse terminar a frase , seu rosto estava coberto de cola branca.Peguei o recipiente que estava sobre a mesa e joguei sobre ela, não pensei, apenas fiz, era isso ou eu grudada em seu pescoço.

—Livia, veja o que você fez. —Ian me repreendeu, segurando firme meu braço.

 —Eu não a reconheço mais...—Leo olhou-me com decepção.
 

Alguns alunos se afastaram, já outros, rodearam Cristina como se quisessem defendê-la, isso dava a ideia de quem estava errada ali.

   —Mil vezes ser doente fisicamente a ser como você, podre e sem alma!—Caminhei até a porta.— Você não passa de uma ignorante.—Ainda falei antes de me retirar.

Ian praticamente me arrastou até sua moto, colocou o capacete em mim e me tirou de lá num instante.

Sabia que poderia ser suspensa, teria sido naquele mesmo momento não fosse o estado de choque com que deixei os professores.

— Você ficou louca? — Ian parou a moto numa esquina qualquer e começou a me cobrar explicações.

— Ela não podia ter agido daquela forma. — Argumentei.

Ele pareceu decepcionado.

— Se for revidar a cada ataque contra mim, vai brigar contra meio mundo, afinal, muitos pensam como ela. — Ele afirmou um pouco mais calmo.

— Na hora eu não pensei, o sangue me subiu à cabeça.

Ian lançou-me um olhar desconfiado.

— Lívia, eu não entendo essa sua dedicação por mim, é estranho... — Ele começou a me inquirir sobre algo que nem bem eu entendia.

— Eu só não gosto de injustiças, faria isso por qualquer pessoa. — Fui firme, estava magoada com o que ele acabava de falar. — Agora me leve para casa.

Seus olhos correram perdidos por mim, talvez ele não esperasse por minha reação hostil, subi na moto e seguimos para nosso prédio.Um sentimento amargo estava tomando conta de mim, eu estava exageradamente afetada com suas palavras.

— Lívia, não quero que me interprete mal. — Ian começou a falar quando parou a moto.

— Sem problemas. -Encolhi meus ombros antes de entregar-lhe o capacete. — Até mais.

  — Não vou subir com você por que tenho médico. — Ele falou antes que eu desse as costas.

— Algum problema? — Voltei já totalmente desarmada.

— Consulta rotineira, vou começar a tomar o coquetel. — Ele baixou os olhos como se estivesse envergonhado.

Senti meu coração pesar.

— Quer que eu vá com você. — Me ofereci impulsivamente.

Ian balançou a cabeça numa negativa.

— Minha mãe já deve estar lá, então...

— Oh, tudo bem. — Assenti.

— Certo... a gente se vê... — Ele mais uma vez evitou me encarar e sem mais,partiu.

Sozinha em meu quarto eu tentava entender o que se passava comigo, o porquê de eu estar tão extrema e tão sensível, meu estômago continuava enjoado e eu permanecia com aqueles sintomas parecidos com os de uma gripe, o pior de tudo, é que no fundo aquilo tudo não era ruim.

Eu precisava conversar com alguém, espairecer minha cabeça, até porque não poderia ficar ali contando os minutos para a volta de Ian.

— Liv, que surpresa! — Meu pai veio ao meu encontro quando cheguei em sua casa sem avisar.

— Me desculpe por não ter vindo antes. — Tentei me redimir.

— Estou certo de que estava fazendo algo muito importante, algo como vir à praia com um garoto. — Ele falou convicto.

Encarei-o assustada, estaria ele deduzindo ou afirmando?

— Por que está dizendo isso? — Perguntei me sentando em uma das espreguiçadeiras que ficavam em sua varanda.

Meu pai me olhou com suspense.

— Eu a vi ontem com um rapaz, deduzi que antes de ontem também estivesse com ele, estou certo? — Ele foi direto.

Sorri confessando.

— Está certo, pai.

— E quem é ele?

— Apenas um amigo. — Falei sem titubear.

— É claro que você não me diria outra coisa. — Ele riu mais uma vez.

— É serio...ele está passando por um momento difícil e acabamos nos aproximando, mas acho que não vai passar disso. — Disse resignada.

— Não é o que parece. Eu sou mais experiente que você e posso afirmar que não é isso que você quer.

Respirei fundo enquanto pensava.

— Pai, ele é diferente de mim... Sei lá,talvez ele não me veja dessa forma. — Tentei explicar como eu me sentia diante de Ian.

— Já parou para pesar que ele pode raciocinar da mesma forma, achar que você não quer ser nada além de amiga dele?

Sabia que se eu respondesse qualquer coisa, estaria confirmando suas suspeitas, por outro lado eu precisava por para fora um pouco do que me afligia.

— Pai, estou me sentindo perdida, como se estivesse doente... — Segurei uma de suas mãos.

Ele tinha uma maneira diferente de lidar com as situações, era sempre muito pratico e direto, sabia que ele de uma forma ou de outra acabaria me entendendo.

— Não se preocupe, você está apenas apaixonada. — Ele foi enfático.

Apaixonada? Por Ian Sodier? Eu não acreditava que havia deixado aquilo acontecer comigo,só que por mais relutante que eu pudesse estar diante daquela confirmação, era a única coisa que fazia sentido e explicava as minhas reações.

Abracei meu pai como se ele pudesse me salvar de todas aquelas incertezas.

Não falei com Ian durante a noite e quando cheguei ao colégio no dia seguinte, notei a falta de sua moto. Antes de ir para a minha sala tive de passar na diretoria, e já sabia  o por quê.

O diretor chamou minha atenção e só não me deu suspensão por estarmos fora do horário de aulas, mesmo assim, frisou o quanto Cristina estava abalada com tudo aquilo além de me dar a conta do cabeleireiro dela.

— Vou ter que pagar por isso? — Indaguei ao ler uma nota que descriminava os serviços realizados na operação de salvamento dos cabelos de Cristina.

Havia recebido minha mesada na tarde anterior, acabei deixando quase que a metade para pagar o salão de beleza. Sobre o que ela havia feito para Ian, nenhuma palavra foi dita, preferi me abster naquele momento, não estava a fim de outra confusão.

Durante a aula tive que aguentar olhares atravessados da maioria das pessoas, até Julia parecia estar me estranhando.

— Por que está me olhando com essa cara? — Quis saber enquanto ela mantinha os olhos fixos em mim.

— Nada, eu só estou tentando entender você. — Ela disse tímida.

— Sobre ontem? — Me referi a Cristina.

Ela virou seu corpo completamente ficando em minha frente.

— Liv, eu me refiro há alguns dias, não foi agora que você mudou. — Ela constatou.

Balancei a cabeça, não sabia o que dizer.

Aquele foi mais um dia assombroso, além de estar sendo apontada como a desequilibrada do colégio e, de possivelmente estar apaixonada por Ian, eu não tive nenhuma notícia dele.

Ao cair da noite já cansada da angustia que me dominava resolvi ligar para sua casa, a empregada atendeu.

— Boa noite, o Ian está? — Perguntei tremula, não sabia se de ansiedade ou se de vergonha.

— Ele está no quarto, estava meio indisposto. — Ela afirmou sem deixar duvidas.

— Está tudo bem , falo com ele outra hora, obrigada. — Fui rápida e desliguei antes que ela pudesse perguntar quem era eu.

Não que aquilo tenha acalmado meu coração, mas ao menos eu sabia que ele não estava exatamente me evitando.

Não estava com vontade de ver TV, nem de ouvir musica, tudo o que eu fazia era pensar, e milhares e milhares de coisas me vinham em mente, uma delas era que Ian certamente havia notado meu interesse por ele,  quando pensava nisso sentia meu rosto queimar.

Na sexta-feira não me senti nenhum pouco disposta a ir ao colégio, estava tão mal que preferi não sair da cama.Uma angustia fazia meu coração pesar toneladas, e tudo o que eu fazia era chorar.

Parecia uma boba, as lágrimas corriam por minha face sem que eu pudesse controlá-las, era intenso e doloroso de mais o que eu estava sentindo.Quando me lembrava do pouco tempo que passei com Ian, aquela dor se potencializava.

Quando minha mãe chegou e me viu daquele jeito, inventei uma gripe, ela estava tão cansada que tomou um banho e foi deitar.Eu decididamente não podia contar o que realmente estava acontecendo.

Sufocada, coloquei roupas mais adequadas e resolvi sair um pouco. Passei pela portaria e fui para o play ground sem que ninguém percebesse.A noite estava fresca e ventava como uma brisa, sentei-me em um dos balanços e deixei meus pensamentos livres.Enchi meus pulmões de ar e depois o soltei lentamente, queria que aquela dor fosse embora.

— Olá...   — Um sussurro me trouxe de volta.

— Que susto! — Levei minha mão ao peito. — O que está fazendo aqui? — Perguntei a Ian que estava parado em minha frente.

— Vim ver você. — Ele colocou cruzou os braços.

—  Como soube que eu estaria aqui? — Perguntei nervosa, estava prestes a ter um colapso.

—  De lá eu posso ver tudo. — Ele apontou para cima. — Fiquei um bom tempo observando você, então decidi descer.

Ian estava particularmente diferente, camiseta clara e cabelos despenteados, ainda mais bonito do que eu me lembrava.

— Então... você sumiu. — Tentei usar um tom que não parecesse de cobrança.

Ele sentou-se no balanço ao meu lado, meu coração quase parou.

— Os remédios acabaram comigo. — Ele relatou com amargura. — Mas me diga, o que houve no colégio, você foi suspensa?

Desviei meus olhos dos seus.

— Não, na verdade só tive que pagar o cabeleireiro de Cristina. — Dei com os ombros.

— Me fale quanto foi, eu... sou eu quem tem que pagar por isso. — Ele se preocupou.

— Ian... — Toquei seu braço e senti meu corpo estremecer. — não se preocupe com isso.

Ele segurou minha mão e eu achei que ficaria tudo bem ,no entanto seus olho estavam aflitos e sua respiração alterada.

— Livia, eu acho que é melhor nos afastarmos. — Ele disse num sussurro.

Tive certeza naquele instante de que minhas teorias estavam certas, Ian havia percebido meus sentimentos por ele.

— Ian, eu... — Comecei a falar enquanto um nó se formava em minha garganta.

— Por favor, me deixe falar. — Ele apertou minha mão com mais força. — Você me faz bem, me faz esquecer meus problemas, só que eu deixei isso passar dos limites. — Ele se levantou e ficou parado em minha frente. — Tudo aconteceu tão rápido, eu fiquei tão confuso...perdido. — Ele se abaixou e apoiou os braços em minhas pernas.

Eu já não tinha mais certeza de nada, não sabia onde ele queria chegar com aquelas explicações, mas no meio de tudo aquilo tudo o que eu sabia era o quanto eu o queria, o quanto ele mexia comigo.

 Ian estava vulnerável, seu rosto ali, tão ao meu alcance e sem pensar em mais nada eu comecei acaricia-lo.Sua pele era lisa, macia como de um adolescente.

  Ele não resistiu, parecia gostar do meu toque, fechou os olhos e permitiu que eu o acariciasse. Sabia os riscos que estava correndo, sabia que ele poderia me repelir a qualquer momento, mesmo assim eu queria mais. 

Eu estava queimando, e como Ian nunca tomaria aquela iniciativa, eu o fiz. Encostei meu rosto no seu, eu podia sentir sua respiração ofegante, a minha também estava, nossos lábios se encostaram por vontade minha, Ian abriu os olhos, assustado. Não quis esperar que ele me afastasse, beijei-o com toda minha vontade reprimida, ele não correspondeu num primeiro instante e depois seus lábios se mexeram entre os meus com cautela, com medo.

— Livia, você não sabe o que está fazendo. — Ele afastou seu rosto.

— Eu sei... —Balancei minha cabeça afirmando — Eu estou completamente certa do que quero.

  — Não precisa fazer nada por pena de mim... —Ele murmurou com o cenho franzido.

Me levantei e posicionei-me em sua frente¸ sabia que era tudo ou nada, meus sentimentos estavam gritando e eu precisava externá-los.

— Ian... eu estou apaixonada por você. — Confessei segurando suas mãos.

Seus olhos se arregalaram, ele parecia surpreso, senti o ar faltar em meus pulmões diante o seu silêncio. Quando eu pensei em dizer mais alguma coisa Ian se inclinou em minha direção e me beijou, desta vez sem barreiras sem reservas, ele envolveu minha cintura com uma das mãos e com a outra segurou minha nuca, parecia temer que eu quisesse fugir.

Como se eu pudesse...

 Naquele beijo sim, sinos, violinos, fogos de artifício e tudo mais que eu nem imaginava, aconteceu. Aquela foi sem dúvida a melhor sensação que eu já havia vivenciado.

— Quer sair daqui? — Ian me perguntou ainda ofegante.

— Quero. —  Assenti.

— Então espere um minuto. — Ele pediu já seguindo em direção da portaria.

Em pouco tempo Ian voltou segurando dois capacetes e sua inseparável jaqueta preta.

— Quero levá-la a um lugar que fica há quase uma hora daqui, tudo bem?

— Tudo bem. — Aceitei sem pensar em nada, eu estava mesmo inconsequente, e esperava que minha mãe não acordasse e fosse me procurar no quarto.

Ian colocou sua jaqueta em mim e seguimos noite a dentro para onde ele queria me levar.O silencio do inicio da madrugada era cortado pelo barulho do motor da sua moto, barulho aquele que muitas vezes havia me irritado.

Eu estava tremendo, mas não era de frio, apertei-me mais em seu corpo e Ian acariciou rapidamente uma das minhas mãos.Algum tempo depois percebi que estávamos indo para alguma praia.

— Chegamos. — Ela avisou-me enquanto descia da moto.

Olhei em volta e mesmo estando escuro pude notar que a areia era mais clara que a das praias que eu costumava ir.

— Que lugar é este? — Perguntei admirada com as casas em volta, todas davam frente para a areia.

— É uma praia privativa, minha irmã tem uma casa aqui e eu fico com as chaves. — Ele explicou já caminhando em direção a um sobrado bege.

Segui atrás, entreguei meu capacete à ele que colocou os dois na varanda da casa.

Ian segurou minha mão e caminhamos na direção do mar.As água estavam agitadas, nos sentamos onde as ondas não podiam nos alcançar.Fiquei de frente para ele, apenas olhando-o, admirando sua beleza que a cada momento me conquistava mais.

— Eu sinto tanto medo. — Ele  falou em voz baixa.

Imaginei que fosse quanto a sua doença.

— É normal que sinta, mas você sabe como a medicina está avançada. — Tentei consolá-lo.

Ian riu contido.

— Não é quanto a isso, não diretamente. — Ele foi enigmático.

Entrelacei meus dedos nos seus, isso me fez arfar.

— O que é então? — Fiquei curiosa.

— Tenho medo de que em algum momento você deixe de me olhar desta forma.Que você perceba no que está se envolvendo e se arrependa. — Ele desviou os olhos de mim como se estivesse com vergonha do que acabava de dizer.

— Nunca, isso não vai acontecer porque eu sei o que sinto e posso afirmar que é bem maior do que qualquer outra coisa. — Afirmei com toda a certeza que eu tinha dentro de mim.

Ian sorriu.

— Eu sempre acreditei que encontraria uma pessoa como você, não já e muito menos nessas circunstâncias. — Ele confessou.

Acabei rindo.

— Você não parece o tipo de rapaz que espera pela princesa encantada. — Falei em tom escárnio.

Ele balançou a cabeça.

— Poucos sabem o verdadeiro motivo de minha mãe ser tão religiosa, mas na verdade eu sou o culpado. -Ele começou a contar.

— Como assim? — Indaguei sem entender.

Ele se ajeitou.

— Sua gravidez foi considerada de alto risco, houve um momento em que os médicos pediram que ela escolhesse entre a sua ou minha vida, foi então que ela se apegou a religião, esgotou sua fé e desafiou a medicina quando nós dois sobrevivemos. — Seus olhos encheram-se de lágrimas. — Cresci ouvindo esta história e sempre me perguntava como eu poderia retribuir o que ela fez por mim.Um dia encontrei uma carta onde ele descrevia qual era seu maior sonho...

— O que dizia? — Adiantei-me diante da sua pausa.

— Bem, nesse papel ela escreveu que seu maior sonho era que eu me casasse, tradicionalmente, e que lhe desse ao menos um neto para que ela pudesse aproveitar cada instante da gestação, coisa que ela não pode fazer na dela.

— E você pretende realizar esse desejo dela? — Passei as mãos por seus cabelos.

  — Eu pretendia. — Ele disse com resignação.

  — Por que, pretendia? — Insisti mesmo notando um certo desconforto em suas palavras.

 — Acha mesmo que vou poder me casar?Ter filhos? — Ele pareceu-me irritado.

Tudo o que eu não queria era que entrássemos num clima ruim, decidi desfazer aquilo, arrastei-me para mais perto dele , coloquei minhas pernas em torno da sua cintura e comecei a beijá-lo.

— Você faz com que as coisas pareçam tão simples. — Ele sussurrou.

Segurei se rosto mais uma vez entre minhas mãos.

  — Elas podem ser, basta você querer...

Nem  mesma eu conhecia esse meu lado positivo e tão otimista, talvez  Ian tenha o despertado em mim. A vontade de estar com ele e de provar que sua doença não era nada perto de um sentimento tão forte, me fazia sentir  poderosa.

Permanecemos ali na areia por um bom tempo, estava sentada com a cabeça recostada em seu peito.Seu coração batia num ritmo calmo e regular.

— Como isso foi acontecer? — Ian afastou os cabelos da minha nuca e beijou-a delicadamente.

  — Como o quê foi acontecer? — Perguntei rindo da sensação boa que corria por meu corpo.

  — Me refiro a esse sentimento mutuo, a essa paixão explosiva. — Ele explicou ainda acariciando minhas costas.

— Achei que só eu estava apaixonada aqui. — Provoquei.

  — Pensou errado. — Ele foi firme.

  — Quando percebeu? — Perguntei bastante interessada.

  Ian ficou pensativo.

— Quando você passou a dominar todos os meus pensamentos. — Ele foi vago.

  — Antes ou depois da tempestade? — Insisti.

— Depois. — Ele riu. — Quero deixar bem claro que naquele dia eu não tinha nada em mente.

  — Que animador, isso prova o quanto sou interessante. — Fingi indignação.

   Ian beijou minha nuca mais uma vez, me desarmei.

  — Como aconteceu com você? E não vale dizer que sou sua paixão platônica adolescente.

Virei meu corpo para poder olhá-lo.

— Como soube? — Perguntei seria.

Ian franziu a testa, preocupado.

—Jura?

— Não. Detesto decepcioná-lo mas excepcionalmente você não era o garoto que tinha o nome rabiscado nas capas do meu caderno. — Fui sincera. — Pra ser honesta, eu meio que não gostava de você.

  — Uau!!!E como foi então? — Ele me desafiou.

Respirei fundo relembrando tudo o que senti nos últimos dias.

  — Tenho certeza de que me apaixonei por você quando soube de seu retorno no colégio.Sua coragem foi determinante para chamar minha atenção. — Expus exatamente o que pensava.

Ian permaneceu em silêncio, seus dedos quentes corriam pelas minhas costas e meus cabelos.

— Faz tão pouco tempo que nos aproximamos, mas... Como é possível que isso seja assim tão forte? — Ele parecia descutir consigo mesmo.

Entrelacei meus dedos nos seus, respirei fundo e fechei meus olhos.

 — Essas coisas não têm explicação, simplesmente acontecem. — Abri meus olhos para encará-lo — É o destino agindo, fazendo seu papel.

 Ele me olhou como se tentasse desvendar algum mistério, passou a mão por meus cabelos e depois num rompante me puxou para cima dele. Fiquei deitada sobre seu corpo,meus olhos estavam nos seus, aflitos.

— Que seja nosso destino, então. — Ian sussurrou antes de me beijar como nunca.

 Foi como se o mundo tivesse parado para nós, eu estava de alma lavada, como se não precisasse de mais nada em minha vida.Ficamos deitados na areia olhando o céu clarear lentamente.

O céu estava dividido, haviam estrelas ainda quando o sol despontou.

— Ficaria aqui para sempre, mas... minha mãe vai me matar se acordar e não me encontrar em casa. — Tive que voltar para à realidade.

— Tem razão. — Num salto Ian colocou-se em pé. — Já disse que não quero prejudicá-la.

— Não se preocupe assim, — fiquei em pé também — ela tem um sono bem pesado.

Sabia que tínhamos um longo caminho a frente, encostei meu rosto em sua costa e seguimos de volta para casa.Meia hora depois avistei as margens da avenida, algo parecido com uma roda gigante , bati nas costas de Ian e ele reduziu a velocidade.

— É um parque? — Gritei para que ele me ouvisse.

— Sim, acho que sim. — Ele respondeu incerto.

Com a proximidade, outros brinquedos foram tomando forma, era mesmo um parque de diversões.

— Nossa, é grande. — Ian observou enquanto parava a moto.

Embora estivessem todos desligados, os brinquedos pareciam modernos, era um parque amplo e nostálgico.

— Não sabia da existência desse lugar. — Falei encantada.

Ian me encarou por alguns instantes

— Você gosta de parques? — Ele sorriu.

— Apesar de fazer muito tempo que não vou a um, eu gosto das lembranças que um lugar como esse pode trazer, tem cheiro de infância. — Argumentei melancólica.

  — Então nós voltaremos aqui hoje a noite. — Ele segurou minhas mãos.

  — Jura? — perguntei incrédula. -Não imagino você ema roda gigante.

Ian ergueu uma das sobrancelhas.

— Você tem muito o que descobrir sobre mim. — Ele fez ar misterioso.

Embora estivesse em estado de graça, comecei a cair na real imaginado o que aconteceria se minha mãe estivesse acordada.Faltava pouco para as seis da manhã e eu rezei rapidamente antes de girar a maçaneta da porta da sala.

Abri a porta com o maior cuidado possível, coloquei primeiro minha cabeça para ver se estava tudo bem.Eu sequer estava respirando e apesar da falta de iluminação local, tudo parecia certo,segui quase que flutuando para o meu quarto, fechei a porta e me atirei na cama, estava cheia de areia pelo corpo e cabelos, mas não podia tomar banho àquela hora.

Fiquei relembrando cada instante, cada beijo e cada palavra dita por Ian.Minha boca parecia estar paralisada, eu não conseguia deixar de sorrir.Estava apaixonada, inquestionavelmente apaixonada.

Cansada acabei pegando no sono, o rosto de Ian foi a ultima coisa em que pensei antes de apagar.


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