Nós escrita por Graciela Pettrov


Capítulo 9
Aulas


Notas iniciais do capítulo

Voltei ♥



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Sei que o Kakashi te designou para ser meu monitor de matemática, mas nós dois sabemos que vai ser bem difícil para nos comunicarmos. Você não faz ideia do quanto acho essa "linguagem de mãos" fascinante! E, bom, eu com certeza não quero reprovar.

Então, só queria saber se você não gostaria de me ensinar uma ou duas coisinhas, sabe, para melhorar nossa comunicação e tornar nossa monitoria mais fácil...

Sasuke leu estas sessenta e nove palavras, algumas tremidas por ela tê-las escrito enquanto andava.

Ele as leu calmamente, absorvendo o que estava escrito e observando quem as escreveu.

Estavam sentados no banco, frente a frente, e Sakura o olhava de forma questionadora e até mesmo acanhada. Ela lembrou-se de quando soube que Sasuke era surdo e Kakashi lhe dissera que não havia ninguém melhor para ensiná-la a Língua de Sinais que o próprio Uchiha, mas agora, ali, vendo-o correr os olhos por sua proposta, ele não tinha cara de quem o faria.

Na verdade, Sasuke não tinha expressão de nada que ela conseguia identificar, mas pelo menos ele não havia erguido as sobrancelhas como muitas vezes fazia; ou franzido o cenho, coisa que também era um hábito.

O fato era que o Uchiha estava atento às palavras, temendo interpretá-las de forma equivocada. Ele ponderou por apenas alguns instantes sobre o desejo de Sakura. É claro que a ensinaria se ela quisesse, até mesmo estava surpreso com o fato de ela querer. Geralmente era ele quem tinha que se virar para que os ouvintes o entendesse, ninguém antes havia demostrado tal interesse em aprender sua língua para se comunicar com ele.

Bem, ninguém, a não ser Naruto, mas já fazia um bom tempo.

Sasuke a encarou antes de responder, em uma pergunta silenciosa se ela estava mesmo falando sério, e, veja só, ela pareceu entender a pergunta e prontamente assentiu. Parecia até mesmo animada com a ideia! Então não lhe restou nada a não ser assentir também e discretamente guardar aquelas sessenta e nove palavras.

Elas com certeza iriam para o seu mural fazer companhia o número de telefone.

[...]

Era engraçado vê-la tentando gesticular. Sakura parecia tão animada que ele resolveu ensiná-la algo ali mesmo. Por isso, estava agora a olhando enquanto ela tentava representar o alfabeto em datilologia. Era a coisa mais óbvia que ele pensara em ensinar naquele momento.

Sasuke havia pego uma folha de sua mochila e, com um piloto, escreveu todas as letras do alfabeto na folha e ia as apontando conforme gesticulava.

Ele agora apontava para a sexta letra do alfabeto e negava com a cabeça, pois ela estava mais uma vez confundindo a letra T com a F, sempre esquecendo de colocar o polegar por trás do indicador.

Sakura o observou negar mais vez e seus ombros murcharam, aqueles sinais para as letras eram muito parecidos e ela estava mais uma vez se passando por idiota na frente dele! A verdade é que a Haruno queria logo aprender a gesticular determinados sinais, como, por exemplo, o que representava o nome dele.

Ela esperou ele lhe mostrar mais uma vez como gesticulava a letra F, colocando o polegar na frente do indicador, e depois a T, apenas mudando o polegar para trás do indicador. Terminada sua demonstração, ela os repetiu, usando a mãos direita para gesticular e a esquerda para apontar a letra correspondente na folha de papel. Acertou dessa vez.

Mas nem se animou muito, pois havia muitas letras parecidas, além do F e do T, A com o S. Também tinha o trio diabólico:  H, K e a P, que invariavelmente só mudava o movimento da mão.

....

As luzes nos postes espalhados pela praça já estavam acesas.

Ficaram treinando por uma hora inteira, negligenciando a monitoria sem nem mesmo se darem conta. Sakura já pegara algumas letras: C, B, D, I, L, M, N, O, U e V. Vez ou outra ainda trocava os movimentos quanto datilografava o trio do mal, mas Sasuke era bem paciente e estava realmente se divertindo com os erros dela.

Às vezes, ela errava de proposito só para ver, fascinada, aquela risada muda dele, mesmo que ele sempre tentasse a esconder virando o rosto para o outro lado. Mas a Haruno tinha que admitir a si mesma que, mesmo achando Língua de Sinais uma coisa fascinante, a parte de datilologia era bem tediosa e cansativa. Por isso, se animou quando acertara três vezes seguidas o trio "H — K — P".

Viu isso como um incentivo para pular para a parte em que aprendia a gesticular palavras completas, ou sinais que representavam palavras.

Esperou Sasuke assentir em aprovação para pescar seu caderno e a caneta de sua bolsa. O Uchiha acompanhava com os olhos, curioso, o que ela escrevia.

"Aprender isso é maçante, mas juro que vou treinar em casa. Você pode me ensinar uma coisa que eu quero muito aprender?"

Ela o observava ler, imaginando se não fora rude ou algo do tipo. Ela estava sim, achando datilologia chato, mas isso não significava que não estava gostando de aprender. No entanto, era meio difícil demonstrar isso através de palavras escritas em um pedaço de papel.

Esperava sinceramente que ele não interpretasse errado.

Se ficou chateado, Sasuke não demonstrou, ele apenas escreveu de volta, com seu piloto:

"O quê?"

Sakura não pensou duas vezes para escrever de volta, afinal ela queria isso desde o dia em que vira Kakashi interagindo com ele.

"Seu nome!"

Ele leu e a encarou bem nos olhos.

Sakura perdeu o fôlego. Não era a primeira vez que ele fazia isso, a encarava. Desde que começaram a interagir, ele sempre lhe dava aquelas encaradas.

Mas nenhuma delas fora daquela forma.

A expressão de Sasuke a fez lembrar de Konohamaru, filho de sua professora Kurenai. Algumas vezes, a mulher levava o pequeno de seis anos para o teatro e todos acabaram se apegando bastante ao garotinho. Uma vez, quando a viu demonstrar para os amigos de palco um de seus saltos que fazia na equipe de torcida, Konohamaru se aproximou dela e a olhava de forma curiosa, como se tentasse entender como diabos ela conseguia fazer aquilo.

Ele a olhava como se a achasse a pessoa mais fascinante do mundo simplesmente por conseguir dar aqueles mortais.

Sakura não sabia se Sasuke a achava a pessoa mais fascinante do mundo — duvida muito disso até — mas seus olhos e sua expressão, tão parecidas com a do pequeno Konohamaru, a levou a crer que o fato de ela querer aprender seu nome o deixara realmente surpreso.

Sem falar que foi extremamente fofo.

Em vez de escrever de volta, o Uchiha pousou o caderno no espaço do banco que havia entre eles e gesticulou calmamente: levou os dois dedos da mão (indicador e maior) ao lado esquerdo do peito e depois o colocou sobre os lábios.

Ela observou atentamente seus movimentos e quando ele a olhou, aguardando, ela os repetiu incerta. O sinal que representava o nome dele era bem mais fácil que o sinal do dela, então era mais que óbvio para Sakura que ele esperasse que ela acertasse logo na primeira tentativa.

Sakura gesticulou devagar. E então mais uma vez para ratificar que, sim, ela aprendera.

Para Sasuke, o modo como ela gesticulou, mais precisamente sua expressão corporal, lhe lembrou de quando Itachi chamava sua atenção.

Ela estava perguntando seu nome, não o dizendo.

O gesto saiu mais interrogativo que exclamativo, era como se ela estivesse dizendo:

— Sasuke? Sasuke?

Ele ainda não tivera tempo de lhe explicar como as expressões, tanto corporal como facial, influenciavam na hora de qualquer surdo interpretar os gestos de quem estava sinalizando.

Mesmo assim não deixava de ser fascinante vê-la gesticulando seu nome. Até o momento, em seu círculo limitado de pessoas que sabia Língua de Sinais, apenas Itachi e Kakashi sinalizavam seu nome com frequência. Ter mais uma pessoa para adicionar a essa lista era enervante!

Sakura baixou a mão, mas manteve a expressão interrogativa.

Ele se aproximou mais dela, ergueu os braços e levou as mãos aos seus ombros delicados, como se pedisse para que relaxasse. Sakura tentou relaxar e seus ombros baixaram.

Sasuke voltou a se afastar e a avaliou, ainda faltava alguma coisa... e ele já sabia o que era.

Havia dois vincos no cenho franzido dela, coisa que ela sempre fazia quando gesticulava qualquer coisa. Fora isso que ele achara engraçado mais cedo, enquanto a assistia datilografar. Para Sasuke cada letra saia como uma interrogação: A? B? C?

Mas apesar disso, ela estava aprendendo bem rápido as coisas.

Enquanto Sasuke tirava suas próprias conclusões em sua mente, Sakura o observava ir para aquele mundo particular de novo.

Depois de ajustar seus ombros tensos, ele voltou a olhá-la como sempre fazia. A avaliando ao mesmo tempo em que estava naquele mundo inalcançável, sem fazer ideia do efeito que causava nela. A Haruno imaginava se estava dando mais trabalho do que ele pressupôs que daria para ensiná-la Língua de Sinais, e se já havia se arrependido internamente...

Sua linha de pensamento estava pendendo para este rumo quando, para sua surpresa, Sasuke esticou o braço esquerdo e tocou dois dedos bem no espaço entre suas sobrancelhas.

Tão rápido quando a tocou, ele retraiu o braço.

Sakura levou a própria mão ao local, sentindo uma quentura onde antes os dedos longos e pálidos dele estavam. Ele claramente já havia a tocado antes, sempre para lhe mostrar como proceder na hora de gesticular, mas aquele gesto havia sido diferente. Havia sido direcionado a ela, como se Sasuke estivesse falando com ela e não para ela.

O movimento pareceu não surpreender só a Sakura como a ele também.

A curiosidade logo venceu a surpresa, e a Haruno já queria saber do que se tratava aquele sinal. Por isso fez a pergunta da única forma que ainda sabia:

"O que significa esse gesto?"

O problema era que nem mesmo Sasuke sabia.

Aquele gesto era o mesmo que Itachi usava, desde que eram crianças, como um pedido para que o caçula relaxasse (muitas vezes ao entrar em seu quarto no meio da madrugada e se deparar com o mesmo debruçado sobre papéis e cálculos). Era um sinal particular que usavam somente entre eles. Mas, mais que isso, era uma expressão silenciosa de que o irmão se preocupava com ele. Aquele gesto, que Itachi executava mais como um peteleco, muitas vezes fora também aplicado com carinho.

Com a mesma suavidade que Sasuke usara nela.

Certa vez, quando Itachi mais uma vez usara o gesto ao encontrá-lo jogando no lixo uma frigideira totalmente carbonizada, numa tentativa falha de preparar um café da manhã para ele que estava de ressaca, Sasuke questionou ao irmão o que significava.

Em resposta, Itachi dera de ombros e gesticulara, com a expressão zombeteira.

— Depende do momento... agora, por exemplo, significa:  obrigado, mas não tente queimar toda a cozinha novamente.

Então, basicamente, aquele sinal especial tinha um significado para cada ocasião. E, bem, o Uchiha não entendera ao certo porque fizera aquilo nela. Num momento estava a olhando e no outro seu braço automaticamente se esticava em direção ao rosto dela.

Por isso Sasuke deu sua explicação.

"Relaxar."

Sakura suspirou ao ler sua resposta. Não era fácil relaxar com aquele par de olhos negros a encarando daquele jeito. Deu mais um suspiro e gesticulou, demorando um pouco mais os dedos dobre os lábios.

— Sasuke...

Ele interpretou assim, como uma fala arrastada e ficou a olhando, como se esperasse que ela gesticulasse mais alguma coisa, mesmo sabendo que nada mais sairia. Seu subconsciente teimava em imaginá-la conversando com ele, imaginar suas expressões para cada gesto, imaginá-la...

E lá estava ele viajando de novo!

Sakura estava tão absorta na ideia do tal gesto inesperado, que tomou um susto quando seu celular apitou. Ela levantou a mão para que Sasuke esperasse e o procurou dentro da bolsa.

Era uma mensagem de Gaara, claro:

"Tô no seu aprto. Vc não tá aqui..."

Só depois de ler a mensagem e olhar as horas no celular, foi que se deu conta do quanto o tempo havia passado. Antes de Sasuke chegar à lanchonete, ela marcara com o namorado de jantarem no apartamento dela. Era um pedido de desculpas implícito por ter ido embora sem nem se despedir.

"Estou na facul, voc pode vir me buscar?"

A resposta chegou em poucos segundos:

"Ah cara, eu vim de carona, meu carro tá emprestado pro meu irmão."

"Tudo bem, vou de ônibus. Pode pedir uma pizza enquanto isso?"

Ela já podia imaginar a irritação de Gaara pelo cano no jantar, mas Sakura realmente não vira a hora passar. Olhou para Sasuke enquanto esperava a resposta do ruivo, o Uchiha encarava o chão, onde a ponta de seu tênis cutucava um dos muitos paralelepípedos que formavam o calçadão da praça.

Parecia totalmente alheio do mundo ao seu redor.

"Ok" fora a resposta seca de Gaara. Já prevendo o que a esperava em casa, ela escreveu em seu caderninho e gentilmente tocou o ombro do Uchiha para chamar sua atenção.

O tecido da camisa era macio como ela imaginara que fosse.

"Preciso ir agora"

Sasuke leu as três breves palavras, não muito surpreso. Quando ela começou sua conversa já imaginara algo do gênero. Ele apenas anuiu em resposta, observando-a guardar suas coisas na bolsa.

Sakura posicionou sua bolsa no braço esquerdo e ficou de pé, o olhando de cima enquanto ele arrumava a própria mochila. Ela não fazia ideia de como ele iria para casa. Nem mesmo sabia onde ele morava, poderia ser ali perto ou há km de distância.

Ela começou a se afastar de costas, vagarosamente, ainda o olhando arrumar, alheio, os papéis em sua mochila. Então depois de organizar suas coisas, notou, surpresa, que ele vinha na mesma direção que ela.

Sasuke a olhou interrogativamente, e a Haruno apontou para o ponto de ônibus, um pouco mais a frente. O Uchiha apontou para si mesmo e depois para o ponto também, depois de ombros, como se dissesse “Parece que vamos para o mesmo lugar.”

A Haruno olhou para ele e então sorriu.

Sasuke retribuiu o sorriso, mas depois baixou a cabeça, encarando os paralelepípedos.

“Por que está sorrindo?” Ele queria perguntar.

O motivo do sorriso nada mais era por ela ter notado, surpresa, que eles já estavam se comunicando sem nem mesmo precisar da Língua de Sinais.


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