Um arrepio percorreu todo seu corpo quando o barulho daquela porta de madeira se fechando ecoou pela casa, não havia vento, como ela poderia ter se fechado daquela meneira? O pequeno animal agora escondera-se dentro da blusa da menina, entre os seios desta, onde lhe parecera o lugar mais seguro que encontrara, enquanto Ayumi agora ia em direção a porta com a intenção de abri-la, mas todas as tentativas foram inúteis, ela parecia estar emperrada. Suspirou, olhando em volta a procura de alguma janela, mas todas elas estavam bloqueadas por placas de madeira pregadas sobre ela, desviou o olhar para baixo, tentando pensar em algo que a ajudasse a sair dali, mas todo e qualquer pensamento que pudesse ter havia sido interrompido por grunhido, era baixo, mas monstruoso. Gelou, nunca havia ouvido nada igual a aquilo, nem mesmo em filmes de terror, em seguida pôde ouvir passos sobre o chão de madeira apodrecida, a única coisa que passou em sua mente foi correr, e assim o fez em direção a primeira porta que lhe apareceu e no mesmo instante ouviu os passos se apressarem, aquilo só fez aumentar seu pavor.

Após entrar no cômodo fechou a porta, a trancando, para em seguida se virar de costas para a mesma, estava em outra sala, bem similar à outra, mas esta não tinha nenhum móvel além de uma mesa ao centro e uma escada ao fundo, devia ser uma sala de jantar ou algo do tipo. Correu até as escadas e as subiu até o segundo andar, tendo tempo de ver a porta do cômodo que estava ser reduzida a pedaços por uma criatura que se assimilava a um cão, mas com certeza era bem maior que isso. Seu coração parecia que ia sair pela boca enquanto corria pelo corredor do segundo andar até entrar em uma das portas, segurando com uma das mãos o pequeno animal que estava em sua blusa para que este não caísse no chão. Novamente trancou a porta, mesmo sabendo que não adiantaria muito, correu até a outra extremidade do cômodo, olhando fixamente para a porta. Não poderia sair dali, a única janela estava lacrada e não havia mais portas além da que estava agora trancada, a sua única esperança era que a criatura não entrasse naquele quarto. Ao novamente ouvir o som de passos fortes pôs uma das mãos na boca, prendendo até mesmo a respiração, temendo que essa fosse ouvida por ele, até que ouviu os passos pararem por um tempo, tirou até mesmo a mão da boca achando que talvez ele tivesse ido embora, o que não era muito provável. Deu dois lentos passos para frente, e no mesmo instante a porta foi arrebentada, o que levou a menina à não conseguir conter um grito e cair para trás com o susto, podendo agora ver perfeitamente, mesmo com aquela densa escuridão, o que era a criatura que a perseguia. Como já havia notando antes se assimilava a um cão, mas era muito maior, seus dentes eram enormes e sua saliva escorria por eles sem cessar, estava em pé sobre duas patas, que continham garras enormes e negras, por todo seu corpo estavam espalhados desenhos estranhos e sem sentido, e seus olhos vermelhos estavam fixos em Ayumi, que neles só conseguia ver a vontade de matar. Não conseguiu conter as lágrimas que começavam a escorrer de seus olhos enquanto aquela criatura se aproximava dela, e a medida que a distância entre eles diminuía o medo só crescia na menina, mas...Não podia morrer agora.

Pegou um pedaço de madeira que estava ao seu lado e o usou como arma, batendo com este na cabeça da criatura, que no mesmo instante soltou um urro de dor e balançou a cabeça, Ayumi aproveitou aquele momento para correr pela sala até a porta, vendo uma esperança de fugir, mas antes que pudesse sair de lá a criatura a atingiu no abdômen com a pata, fazendo-a bater com as costas na parede oposta e novamente cair no chão. Levou a mão até a barriga, que devido a pancada estava doendo bastante, mas não teve tempo para se preocupar com isso, pois agora a criatura já estava bastante próxima a ela, podia até mesmo sentir o péssimo hálito dela tocar seu rosto. Fechou os olhos, sentindo novamente lágrimas rolarem deste, não podia mais fazer nada, realmente iria morrer.

Um disparo pôde ser ouvido, para em seguida Ayumi sentir um líquido quente ser despejado por todo seu corpo e nesse momento abriu seus olhos, deparando-se com seu corpo coberto de sangue, e a criatura que a instantes iria devora-la estava caída para trás, aparentemente morta. Elevou seu olhar para o outro lado da sala, e ao lado da porta estava ele, o loiro que havia praticamente expulsado Ayumi de sua casa, tinha uma arma em mãos, da qual havia saído o disparo que acabara com a vida da criatura que estava prestes a mata-la, diria algo se pudesse, mas no estado em que estava não conseguia dizer nada, estava praticamente em choque.

O-o que....que...? – Consegui balbuciar, abaixando o rosto quando sentiu um movimento entre seus seios, o pequeno hamster não havia fugido, e agora colocava sua cabeça para fora da blusa de Ayumi, esta que apenas o fitou brevemente, voltando em seguida a olhar para o loiro, que agora prendia sua arma na calça.

- Aquilo era um Espectro, aquele era de nível um, por isso não deu trabalho. Minha missão era mata-lo. – Fitava-a enquanto a mesma de levantava com um pouco de dificuldade, podia ver claramente agora, aquela menina era possuidora de uma enorme Energia Espiritual. Pôde perceber isso quando ela estava prestes a morrer, com o medo da morte a energia se manifestou, e foi só isso que atraiu aquela criatura, mas provavelmente ela ainda não havia se dado conta disso. Mas Hiero ainda não estava certo da força dela, tinha que ter certeza.

- Hey, pirralha. – Chamou, recebendo um olhar de reprovação pelo “pirralha” de Ayumi, o loiro novamente pegou sua arma, andando até ela e lhe estendendo.

- Atire uma vez com essa arma. – A menina arregalou os olhos, nunca havia tocado em uma arma e nunca achou que fosse tocar, e com qual propósito atiraria? E em quê?

- Atirar? Onde? Porque? – Seu tom era infantil como sempre assim como sua expressão, mas só recebeu frieza da parte de Hiero, que agora assumia um tom mais agressivo, era como uma ordem.

- Só atire. – A voz dele provocou um estranho calafrio em Ayumi, que somente pegou a arma da mão dele com uma expressão de criancinha magoada. Era pesada, não sabia como usar aquilo, fez um esforço tremendo para conseguir manter o braço reto, quando apontando para um canto qualquer apertou o gatilho.

Uma bola de energia de cor azulada particularmente grande deixou a arma, se chocando com a outra parede deixando uma enorme marca, junto com um estrondoso barulho. Quando aquilo saiu da arma Ayumi não conteve um gritinho, dando um pulo para trás e largando a arma no chão, aquela arma com certeza não era normal . Com os olhos ainda arregalados dirigiu-se a Hiero, com o tom bastante surpreso.

- Nossa!! O que era aquilo mochi? – Piscava algumas vezes seus olhos enquanto encarava loiro, que olhava fixamente para o ponto em que a bola de energia havia atingido. Realmente, ela tinha poder, e aquela bola de energia não era de tamanho normal, era bem maior. Com algum treino ele tinha certeza de que ela se tornaria uma boa agente da Shinkatsu. Abaixou para pegar a arma, guardado-a novamente na calça, enquanto novamente se virava para Ayumi.

- Aquilo era Energia Espiritual, todos os humanos possuem, mas aparentemente você tem bem mais do que os humanos normais.

- Uhh, legal. – Pela primeira desde que encontrara o loiro sorriu, um sorriso como todo o resto, infantil, mas que logo foi substituído por uma expressão de pura curiosidade.

- Mas o que se faz com essa energia? Pra quê ela serve? – Hiero suspirou, provavelmente ainda teria muita explicação pra dar, e aquilo o entediava.

- Bem, ela pode ser usada em combates, pois com ela você pode desenvolver uma série de “poderes”, mas ela é muito mais destrutiva sendo usada contra um Espectro do que contra um humano.

- Ah...E o que exatamente é um Espectro mochi? – Perguntou, olhando de relance para o lugar onde estava o cadáver da criatura que havia perseguido-a, fazendo uma expressão de nojo para em seguida voltar a encarar Hiero.

- Espectros são criaturas que normalmente vivem em um mundo paralelo ao nosso, separado por uma barreira, mas os Espectros de nível baixo, como os de nível um, podem passar livremente pela barreira, tendo acesso direto ao mundo humano. Mas ultimamente nós temos visto Espectros até de nível três no mundo humano, o que indica que pode estar havendo algo de errado na barreira, provavelmente uma rachadura. Eles se alimentam de Energia Espiritual e de Energia Vital, por isso atacam humanos, e o meu trabalho é acabar com todos eles. – Ayumi prestava completa atenção em tudo que ele dizia, aquilo estava sendo a coisa mais estranha, mas ao mesmo tempo interessante que havia visto, e tudo aquilo dela ter uma grande Energia Espiritual estava deixando-a empolgada.

- Hey, posso fazer uma pergunta? – Disse, em tom doce enquanto levantava uma das mãos, como um aluno que pede permissão para falar a um professor.

- Fale. - Respondeu Hiero, sendo como sempre frio e breve.

- Eu posso ajudar você a matar Espectros? – olhava para Hiero esperançosa em relação a resposta, de alguma forma sentia que devia fazer isso, como seu nível de Energia Espiritual era alto sentiu que podia ajudar a humanidade lutando contra essas criaturas que tentam aniquilá-la. O loiro somente arqueou uma de suas sobrancelhas, parecendo pensativo em relação a resposta antes de se virar de costas e começar a caminhar por aquele corredor velho.

- Não! – Disse, já estando no meio do corredor, sendo seguido por Ayumi que quase corria para alcançar os passos dele.

- Porque nãããããão? Eu posso ajudar! Você só precisa me ensinar a usar essa tal Energia Espiritual que eu ajudo mochii. – Gesticulava bastante enquanto caminhava atrás dele, sendo praticamente ignorada pelo mesmo.

- Já disse que não! – Repetia, até que quando estava prestes a sair daquela velha casa Ayumi o segurou pela manga do sobretudo impedindo que este saísse, para só assim ele para de caminhar e se virar pra ela, que o encarava com uma expressão bastante emburrada.

- Olha, e se eu provar pra você que posso te ajudar? – Perguntou, ainda mantendo aquela expressão, e com isso fez com que o loiro arquear uma de suas sobrancelhas, a proposta lhe pareceu interessante.

- Como assim?

- Eto...Você me treina por uma semana, ou o tempo que quiser, ai depois eu faço um teste pra ver se mereço te ajudar. Se passar eu te ajudo, se não passar sumo da sua vida pra sempre mochii. – Completou com uma pequena piscadela, fazendo um “v” com os dedos indicador e médio da mão direita. Por alguns segundos Hiero pareceu pensativo, realmente, teria algo para se distrair durante esse tempo, mas aturar aquela pirralha durante todo esse tempo não lhe agradava, mas se concordasse pelo menos ela lhe deixaria em paz por um dia, o suficiente para ele sair da cidade sem que ela percebesse.

- Tudo bem...Amanhã à tarde começaremos o seu treinamento. – Por fim concordou, mas já tinha seu “plano” para despista-la. Um enorme sorriso apareceu no rosto da menina com essa resposta, e o loiro já se encaminhava para sair da casa quando novamente foi puxado pela manga do sobretudo por Ayumi.

- O que quer agora? – Perguntou, novamente arqueando uma de suas sobrancelhas.

- Quero saber o seu nome. – O sorriso ainda não desaparecera da face na menina, tudo havia acontecido tão rápido que mal dava para acreditar, mas aquilo a estava deixando tão feliz.

- Hiero, Hiero Hikurasaki.

- Prazer Hiero, meu nome é Ayumi Takaaki.