Retorne Ao Remetente escrita por Mandy-Jam


Capítulo 17
We Will Rock You


Notas iniciais do capítulo

Voltei, meus queridos!

Espero que não tenham desistido de mim nesse meio tempo. A todos os que me mandaram mensagens, muito obrigada por esperarem tão pacientemente por essa atualização!

Boa leitura!



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HERMES

 

Desci os degraus do prédio devagar, tentando não ser percebido por ninguém. Passei todo o caminho do apartamento de Jenny até o térreo pensando em como faria para domar aquela fera.

Abri a porta lentamente, e vi que Ares esperava por mim na calçada, do outro lado da rua. Ao me ver descer os últimos degraus, ele avançou com a moto até mim, parando-a atravessada na minha frente. Desmontou, e lançou-me um olhar de fúria e diversão sádica.

— Finalmente. — Declarou — Achei que teria que destruir essa cidade toda para te encontrar, seu medroso covarde.

— Sou um homem civilizado. Um simples pedido bastaria. — Respondi com humildade — Mas suponho que você sinta prazer em aterrorizar mortais.

As pessoas que passavam na rua olhavam para Ares com medo, e as que estavam nos prédios espiavam timidamente pelas janelas. Meu meio irmão riu e assentiu com a cabeça.

— Sinto, não vou negar. — Concordou — Eu também sinto enorme prazer em esmagar a cabeça de idiotas que pensam que podem roubar de mim e sair impune.

— Esmagar cabeças não é algo um pouco exagerado? — Perguntei com um riso nervoso.

— Você roubou minha jaqueta favorita, e agora merece sofrer.

Ares, como vocês podem perceber, era um pouco extremo. Não era a primeira vez que o via julgar crimes pequenos com punições gigantes. Lembro-me de quando ele mandou um espartano fazer sua nova armadura de guerra tamanho GG e recebeu do mortal uma tamanho G. Amarrou os pés do homem em uma pedra e lançou-o no mar.

Eu deveria ter roubado uma peça de roupa de Apolo, mesmo que isso significasse andar por aí com lantejoulas ou glitter demais.

— Espera aí, isso não é justo.

— Não? — Questionou ele, pouco convencido — Pois eu acho que é.

— Você está me acusando de um crime que nem sequer sabe se eu cometi. — Falei tentando pensar em alguma forma de não ter a minha cabeça esmagada — Eu conheço meus direitos.

— Só um criminoso fala que conhece seus direitos. — Rosnou Ares, acusador — Gente de bem nem mesmo sabe que tem direitos!

A burrice dele me tonteou por alguns instantes.

— Não seja idiota, todos tem direitos. Sendo um olimpiano, tenho direito a um julgamento justo perante Zeus. — Exigi com seriedade. Ares coçou o queixo.

— Está bem. Desde que ele permita que eu esmague você depois. — Resmungou parcialmente frustrado — Vamos logo. Quero resolver isso o quanto antes.

— O quê? Agora? — Dei uma risada casual — Querido irmão, não sabe como isso funciona? Para ter um julgamento com Zeus é preciso agendar com antecedência. Nosso pai é muito ocupado, e por sinal, eu também sou. Todos nós temos compromissos, então acredito que a agenda deve estar cheia para esse ano. Mas… — Olhei para o relógio de pulso — Se você chegar lá antes de meio dia, e preencher os papéis-

— Papéis? Que papéis? — Perguntou confuso.

— Os protocolos, é claro. — Expliquei — Vai ter que preencher os protocolos e enviar para o setor responsável. Eles vão avaliar a queixa, e combinar uma data com o todo poderoso. Depois nós vamos ser convocados, em uma data que nós três possamos ir. Mas cada um de nós pode faltar 2 vezes, porque a vida é bem imprevisível. Então, voltando, se você conseguir chegar antes de meio dia, acho que podemos resolver tudo isso daqui a cinco anos.

— Cinco anos? — Repetiu incrédulo.

Se chegar antes de meio dia. — Repeti — Acho que deveria se apressar.

Por um segundo, Ares quase foi. Ele bambeou, como se fosse montar na moto novamente e dirigir até o Olimpo, para preencher toda a papelada de mentirinha que eu acabara de inventar. No entanto, ele teve um momento de esperteza e voltou-se para mim novamente.

— Está tentando me fazer de idiota?

— Eu jamais faria isso. — Menti — Você tem o dobro do meu tamanho. Se eu te fizesse de idiota, estaria bem encrencado.

— Que bom que reconhece isso. — Disse com ar de superioridade — Mas isso não muda o fato de que você está tentando escapar.

— Escapar? De forma alguma. Estou instruindo você da forma certa de resolvermos esse problema. — Falei, fingindo estar chocado — Você me acusou, e eu respeito isso. Perdeu sua jaqueta e está furioso, procurando alguém para culpar. Eu entendo.

— Eu não perdi minha jaqueta, paspalho. Você roubou ela! — Exclamou com raiva.

— Eu sou inocente! — Prontifiquei-me a dizer — E por sinal, todos nós somos inocentes até que se prove o contrário.

— Isso é muito conveniente para você, não é mesmo?

Era.

Sempre que eu fazia algo errado e ia parar na frente de Zeus, eu recitava essa frase maravilhosa. Inocente até que se prove ao contrário. Sorri para Ares e encolhi os ombros, como se nada pudesse fazer quanto ao assunto.

— Eu não faço a lei, Ares. — Respondi devagar — É assim que as coisas são, e se não se apressar só poderá marcar o julgamento para a próxima década.

Meu irmão parou e pensou no assunto.

— Você está me dizendo que se alguém comete um crime, o julgamento precisa ser marcado com antecedência. Certo? — Concordei com a cabeça e ele franziu o cenho, continuando pensativo — E que todos nós somos inocentes até que seja provado o contrário.

— Exatamente.

— Ok. — Sorriu satisfeito e voltou-se para a moto. Achei que ele iria finalmente embora, mas tudo que Ares fez foi levantar o banco da Harley Davison e tirar de lá um taco de baseball com pregos. Tirou de lá um par de luvas com espinhos, como as que um punk usa, e olhou para mim sorrindo sádico — Qual você prefere? Posso esmagar sua cabeça com o taco ou com minhas próprias mãos.

— Você não ouviu nada do que eu disse? — Perguntei, nervoso — Você não pode-

— Eu ouvi sim, e foi muito instrutivo. — Concordou com a cabeça, e começou a brincar com o taco.

— Agressão física é crime, e Zeus não vai gostar disso. — Alertei.

— Então você pode ir até o Olimpo, preencher a papelada e marcar um julgamento para a próxima década. — Respondeu cantarolando.

— Próxima década uma ova! Eu vou contar no mesmo instante para Zeus de que seu filho psicopata me agrediu por causa de uma acusação infundada! — Exclamei para ele.

— Eu sou inocente, Hermes. — Sorriu, diabólico e homicida como ninguém — Até que prove o contrário. E isso seria… Daqui a 10 anos? Bem, 5 se você conseguir arrastar seu traseiro magrelo até o Olimpo e chorar nos pés do papai.

— Ares, espera aí. — Falei, vendo-o girar o taco com destreza.

— Acho que vou usar o taco, porque não quero seu sangue sujando as minhas mãos. Tenho um encontro mais tarde, e Afrodite detesta quando fico cheirando a covardes. — Comentou aproximando-se.

Minha melhor arma, como qualquer um poderia saber só de me olhar, era minha lábia, não minha força física. Na frente de Ares, eu praticamente não existia, e existira menos ainda quando ele acertasse meu rosto com aquele taco de baseball vandalizado.

Estava prestes a correr, quando ouvi a voz de alguém atrás de Ares.

Je vais appeler la police!

Ares se virou como um javali furioso, por ter seu momento de violência interrompido por um mortal. Dei um passo para o lado para ver quem era o corajoso e me deparei com Jenny.

A mortal olhou para mim e depois para Ares, sem um pingo de medo. Seu cenho franzido em um sinal de insatisfação. O deus da guerra rosnou para ela e deu um passo em sua direção, fazendo-me gelar.

— Do que você chamou a minha mãe? — Ares obviamente não falava francês.

— Eu disse que vou chamar a polícia. — Ameaçou ela novamente, dessa vez para ele entender. O deus da guerra gargalhou perante aquela tentativa ridícula de pará-lo.

— Vai. Chama a polícia. — Zombou ele — Deve ter um telefone em outro quarteirão, boneca. Se manda daqui.

— Eu moro aqui. — Insistiu Jenny pisando forte no chão. Ela passou por ele com uma atitude que eu não acreditava ser possível para uma garota na idade dela, e parou nos degraus do prédio — Eu moro aqui, e você está me incomodando.

Ares ergueu as sobrancelhas, surpreso com o que ouvira. Jenny olhou para mim.

— Ele está te incomodando também? — Perguntou.

— Um pouco. — Confirmei, pego desprevenido.

— Está incomodando meu convidado também. — Falou dura, olhando novamente para Ares — Eu não vou ser perturbada na minha própria residência, então é melhor se retirar.

Ares olhou para Jenny sem palavras e depois olhou para mim, como se tentasse ligar os pontos sozinho. Dei um passo para o lado, ficando no degrau entre meu irmão e ela, para que a mortal não se ferisse.

— Explica para mim. — Pediu Ares, apontando para Jenny — A sua vadia de estimação está mandando eu me retirar?

— Ei! Você não chama ela assim, entendeu? — Exclamei com raiva, pela primeira vez desde que a confusão tinha começado. Ares riu na minha cara.

— Então é isso. Você roubou minha jaqueta para impressionar essa garota? — Perguntou cutucando meu peito com o dedo — Deu certo, pelo menos? Vocês dois pombinhos foram para a cama?

— Você é burro, sabia? Muito burro. — Rosnei para ele. O instinto masculino de proteção falando mais alto — Eu disse que não estou com a sua jaqueta. Mas se eu estivesse, se eu estivesse mesmo mentindo para você, você nunca ia vê-la de novo. Eu ia queimar ela e te mandar as cinzas por correio.

Ares trincou os dentes e avançou, grudando em mim. Ele olhou para Jenny, atrás de mim nos degraus com a mesma expressão zangada de antes, e depois riu.

— Você tem sorte que eu não abro crânios na frente de mulheres. — Falou. Virou de costas para mim e colocou o taco de volta no compartimento embaixo do banco. Suspirei visivelmente aliviado, e olhei para Jenny para vez se estava tudo bem com ela. Tive menos de um segundo, antes da mão de Ares me puxar pelo ombro — Mas não tem nada de errado com um pouco de sangue.

— Nã-!

Antes de completar a palavra, Ares me acertou no olho com um soco. Tombei para trás, batendo com a nuca nos degraus, para completar a dor. Meu irmão puxou-me pela gola da camisa e acertou-me mais uma vez, dessa no nariz.

Jenny gritou alguma coisa, Ares riu, mas tudo estava borrado para mim. Era como se minha cabeça estivesse debaixo d’água, não conseguia entender mais o que estava acontecendo.

Pisquei os olhos lentamente, e senti o esquerdo mais pesado. Meu rosto estava ardendo quando Jenny o tocou com suas mãos quentes. Entrou no meu campo de visão, tampando o céu nublado.

— Você está bem? — Perguntou preocupada — Hermes? Você está bem?

Tentei me ajeitar nos degraus, e ela me ajudou. Gemi dolorido toquei meu nariz, sentindo-o escorrer. Jenny parecia chocada, olhando para mim com uma mistura de medo e pena.

— Fala comigo. Fala alguma coisa.

— Eu devo estar mais feio que o Quasímodo.

 

 

Voltei de onde eu começara: a cama de Jenny.

Sentado com travesseiros nas minhas costas e com lenços de papel sobre meu nariz, eu sentia toda minha cabeça latejar de dor. Perguntei-me como fora parar naquela situação, e não soube achar uma resposta clara de porquê eu não havia simplesmente corrido para longe quando vira Ares.

Parte de mim tinha medo dele saber que eu estava lá, e ficar esperando na porta do prédio para sempre até eventualmente descontar sua raiva em um mortal inocente. Não que eu me importasse muito com mortais inocentes, mas se Jenny fosse um deles eu ficaria mal.

— Toma.

Jenny apareceu do meu lado, entrando no minúsculo cômodo que ela chamava de quarto.

— O que é isso? — Até franzir o cenho doía.

— Um bife.

Fiquei olhando para ela com meu único olho bom, sem entender porque a mortal me trouxera um bife congelado.

— Que infernos eu faço com isso? — Questionei.

— É para o seu olho. — Respondeu como se fosse óbvio.

— Quer que eu coloque um bife congelado no meu olho? — Repeti achando aquilo absurdo.

— Eu não tinha ervilha. — Respondeu como se aquilo fizesse algum sentido.

— Isso era para ser uma piada? — Perguntei confuso. Ela esticou a mão, inclinando-me para trás e repousando o bife em meu olho roxo e inchado. Segurou minha mão esquerda e levou até lá para que eu mantivesse-o no lugar. Senti o frio do alimento congelado percorrer meu corpo, mas também trazer alívio parcial — Você vai comer isso depois? Porque seria no mínimo nojento.

Jenny riu, mas não respondeu a pergunta.

— Quem era aquele punk? — Perguntou para mim.

— Meu irmão. — Respondi em um resmungo doloroso — Ele é um babaca.

— Acho que você tem irmãos demais. — Comentou ajeitando-se na cama ao meu lado — E acho que eles têm o péssimo hábito de serem babacas.

Ri sem conseguir evitar, mesmo sentindo dor ao fazê-lo. Jenny, no meu lado direito, olhava para mim como uma médica olha para o paciente.

— Acho que seu nariz parou de sangrar. E acho que seu olho vai ficar um pouco inchado hoje, mas vai estar melhor amanhã. — Falou tentando passar segurança. Gesticulei em desdém.

— Já disse para você, isso não é nada. — Disse com um tom cansado — Eu me recupero rápido.

— Não precisa bancar o machão. — Jenny revirou os olhos, achando que eu estava contando vantagem — Um homem do tamanho de um armário te acertou um soco na fuça. Já é um milagre você estar consciente.

— Eu não tenho uma fuça, tenho um rosto. — Resmunguei incomodado — E não estou tentando bancar o machão, eu realmente me recupero rápido. Se tem alguém que tentou bancar o machão aqui foi você, ameaçando ele.

Jenny olhou para mim incrédula.

— Ele estava te ameaçando com um porrete!

— Um taco de baseball! — Corrigi.

— Com pregos. — Completou chocada — O que queria que eu fizesse? Fingisse que não tinha visto nada e fugido?

— Bem, sim! Era isso que eu esperava. — Confirmei, um tanto irritado. Em parte com Jenny, em parte com a dor que eu sentia — A não ser que você tenha a força de Hércules ou algum super-poder que eu não esteja sabendo, você devia ter ido embora. Devia ter chamado a polícia, eu não sei.

— Quer chamar a polícia agora? — Perguntou com uma expressão séria — Isso foi muito além de uma briga de família, ele podia ter te matado. Devia dar queixa na delegacia.

Fechei meu olho bom e suspirei pesadamente.

— Jenny, eu estou com um nariz quebrado e com um bife no olho. — Murmurei — Eu não quero ir a lugar nenhum assim.

— Não está tão ruim. — Disse com compaixão. Abriu a mesinha de cabeceira e pegou um espelho. Estendeu-o na frente do meu rosto e falou — Olhe, você está razoável.

Ao ver meu reflexo, me assustei. Se tem uma coisa que deuses não gostam é de ver sua imagem de uma forma feia, e naquele instante eu estava tudo, menos bonito.

— Razoável? — A minha voz desafinou — Estou horrível! Tire esse espelho da minha frente!

Jenny recuou a mão, assustada com o desespero e a autoridade em minha voz.

— Ah, deuses! — Exclamei frustrado e em agonia. Olhei para o lado, decidido a jogar minha raiva em alguma coisa — A culpa é sua.

— Minha? — Jenny ergueu as sobrancelhas, surpresa.

— Sua, sua! Toda sua! — Exclamei com ainda mais raiva — Se você tivesse ficado na cama comigo, nada disso teria acontecido!

— Eu te disse que eu tinha um compromisso com um amigo.

— Um amigo! Claro! — Repeti, petulante — Que tipo de amigo é esse? Você gostou de encontrar com ele? Ele te fez bem?

Jenny estava prestes a ficar com raiva e devolver toda a minha arrogância em dobro, quando percebeu uma coisa em minha voz.

— Está com ciúmes? — Perguntou devagar, um sorriso bobo lentamente se formando.

Trinquei meus dentes, e senti dor.

— Você acha engraçado? — Perguntei, pronto para despejar minha fúria sobre ela. Talvez transformá-la em uma lesma e fazer um labirinto de sal para ela se perder. Talvez transformá-la em uma galinha e jogá-la em uma fazenda de abate.

No entanto, Jenny se aproximou de mim sem temer-me por um único segundo e beijou meus lábios devagar. Quando se separou, sorriu para mim de novo.

— Acho adorável. — Respondeu, fazendo-me corar como uma garotinha.


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Notas finais do capítulo

O que acharam?

Aguardo pelo review de vocês! Muito obrigada por lerem, e não esqueçam de comentar. Gosto muito de ver a consideração de vocês sobre o capítulo!

E quem quiser recomendar a fic também, fica a vontade haha

Beijos e até semana que vem!



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