Gentleness escrita por U can call me A


Capítulo 10
Tudo (dentro dos limites)


Notas iniciais do capítulo

Eu adquiri com umas doenças perigosas recentemente, então decidi postar o que tenho acumulado antes que, sei lá, aconteça algo comigo, então bom proveito.



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— Testar...? - Nante praticamente sussurrou. Ephir não lhe deu tempo de sequer processar as palavras, agilmente o empurrando para o lado desocupado da cama, e sentando em seu colo com as duas mãos segurando a cabeça do moreno para olhar para cima, nos seus olhos. 

— Você disse que sua necessidade é me ver feliz, não é? - Ephir apertou os joelhos de Nante entre os seus. Perdido, o garoto que não sabia nem se ainda eram amigos pôde apenas assentir, vendo no outro algo completamente longe de bom senso e tentando não morrer com aquele contato físico ou a posição. - Mas eu não posso ser feliz com essa escuridão dentro de mim. É algo que já faz parte de quem eu sou. Você só pode me fazer feliz se aceitar ela completamente, e eu não espero que seja capaz disso. 

— Eu... Me deixe tentar. - Coração batendo rápido, rosto ruborizado, suando loucamente com o calor do corpo de Ephir tão próximo, ele ainda se preocupava se sua sinceridade estava sendo transmitida. Pensando "Ah, já não tem mais volta, o jeito é dizer tudo mesmo", sorriu tristemente e continuou: - Eu queria você por completo desde o começo. A esse ponto, faria quase de tudo por você. 

— Você tem uma boa cabeça nos ombros, pra dizer "quase". Assim não vai estar mentindo, não é? - Ephir franziu as sobrancelhas e soltou um riso desdenhoso. 

— Meu senso moral não se dobra tão fácil pra que eu diga "qualquer coisa" com uma consciência limpa, Ephir... Mas dentro dos meu limites, eu faço de tudo pra que você não se sinta mais vazio. Minha honra seria preencher você com amor por mim, mas eu sei que isso é ser iludido demais... 

Ephir riu pelo nariz. 

— Você percebe como sua frasezinha pura soou, considerando nossa posição agora? - ele mordeu a orelha de Nante, como que descontando a raiva que ainda borbulhava. O coração do mais novo bateu tão rápido nessa hora que ele pensou que realmente ia morrer. Ephir ainda estava sentado no colo dele, precisava se controlar... Ah, como ele ia se controlar? Aquilo já era demais. 

— N-Não foi a intenção... - balbuciou. 

— Não é o que parece... - Ephir olhou para baixo. Bem mais baixo. Se pudesse, Nante teria ficado três tons mais vermelho. - O que você faria se eu dissesse que quero testar até mesmo os seus limites, hein? Você aceitaria até as partes ruins de mim que podem te causar mal? 

— ...Aceitar e ajudar a melhorar, não faz parte do amor? - Se deixando levar, Nante hesitantemente começou a acariciar as costas de Ephir, que tensionaram com o contato. Na verdade, ele queria tocar por debaixo da blusa, já que não tinha mais o que esconder sobre seu estado físico, mas a sensação de que alguma forma isso fosse "ir longe demais" e Ephir o rejeitasse era forte. Seu coração quase gelou quando o outro soltou seu rosto, mas  então virou uma escola de samba ao Ephir afundar a cabeça em seu pescoço. Os dois caíram em silêncio, Nante nervoso demais para rompê-lo e Ephir tentando descobrir se sentia alguma coisa com o calor de alguém que considerava importante dizendo que o amava. 

— Eu não sei, Anne só fingia fazer isso. - Disse, de olhos fechados, gravando os detalhes na memória. Iria precisar pra quando fosse se arrepender amargamente mais tarde. Por fim, mordeu com força ali, embora isso ainda tivesse um toque sensual. - Ela sabia que eu gostava dela, e usou isso como uma vantagem pra me manipular. - mais uma mordida, mais embaixo. - Meu primeiro amor foi um jogo doentio, e eu que perdi. Só piorei desde então. Não há nada de interessante nisso. - E então chupou forte na clavícula, sem dúvida deixando uma marca. 

— Aah... - Nante se encolheu um pouco. Ele com certeza não estava acostumado com essas coisas, nem iria tão cedo, e era difícil se concentrar no que Ephir dizia. Parecia que havia névoa em sua cabeça. - Você que gostava dela...? Eu... Não fique me comparando. Eu não vou te manipular, e eu quero você de verdade, então é claro que vou te aceitar. 

— Então seja meu. Seja meu antes, por completo. - Os dedos de Ephir começaram a passear por debaixo do casaco e a farda de Nante, fazendo a pele do outro queimar onde tocava. - Saiba que as chances de eu me aproveitar e te usar são altas, mas ainda assim, aceita? 

Como se alguém fosse conseguir dizer não numa situação dessas. 

— Tudo, dentro dos limites. - Disse o moreno, ofegante. 

— E quais são os limites? 

— ...Não era isso o que você disse que queria descobrir, agora pouco? 

Subitamente silencioso, Ephir arranhou as costas de Nante, como se para responder a provocação. 

— Ngh! - A vítima o apertou mais para perto de si, num reflexo. 

— Como eu pensei, você consegue ser muito interessante. - O de cabelo caramelo riu, e afastou a cabeça para ver o rosto do outro. O seu próprio estava um pouco vermelho, embora com um sorriso arrogante estampado. 

Nante não resistiu a urgência de beijar aquele sorriso fora dali, o que surpreendeu Ephir. Foi mais desastrado do que antes, então ele se separou rápido, mas Ephir capturou seus lábios de volta, com o impulso de o ensinar a fazer direito. A mente do moreno ficou ao mesmo tempo em branco e cheia no momento que suas línguas tiveram o primeiro contato. 

Quando se afastaram, a primeira coisa que Ephir disse foi: 

— Eu não gosto muito de olhar pra essa farda, você deveria tirar. 

O que deixou Nante chocado, por dentro. Até onde Ephir queria ir? Tudo bem que ele queria bater de frente com limites ou o que fosse, mas não fazia nem quinze minutos que a declaração do moreno tinha chegado nos ouvidos dele... Ainda que pensasse isso, por pouco que Nante não tirava a roupa imediatamente. 

— Quer tirar pra mim? - Tentou manter sua compostura e provocar. Parecia funcionar com Ephir mais do que falhava. 

E o de cabelo caramelo talvez tivesse feito isso mesmo, se não fossem as batidas na porta. Saindo de cima de Nante sem ligar o que ele achava disso, chegou perto da porta e soltou um "Quem é?" sem ânimo. 

Alguns soluços foram sua resposta. Ephir levou um choque ao reconhecê-los e ao lembrat do que havia dito pra Lori mais cedo rapidamente abriu a porta. Deu de cara com o garoto tentando conter as lágrimas e secar o rosto com as mangas longas do pijama. Quando viu Ephir, desatou num choro intenso e pulou nos braços dele assim que a grade também foi aberta. 

— O que houve, Lori? - Ephir se assustou com tamanha reação. 

Lori tentou dizer alguma coisa, mas ficou incompreensível de tão misturada aos soluços. Ephir fechou o apartamento com dificuldade e sentou ambos no sofá com cuidado. 

— Eu vou pegar um copo d'água pra você. Ou prefere outra coisa? Acho que ainda temos um pote de doce... - O mais velho ia dizendo, porém o garoto segurou forte em sua camisa e sacudiu a cabeça, tremendo. - ...Ok. 

Ephir sentou e abraçou aquela cabeça pequena contra seu peito. Tão jovem, mas tanto peso nas costas. Não era de se admirar que uma mera criança não aguentasse mais ser tratada como adulta uma hora. 

Se nas horas que seu pequeno eu precisou Ephir pudesse abraçá-lo também... Mas quem ele teve foi Anne e querendo ou não, ela foi o que ele era agora pra Lori. Seu conforto. Alguém que o entendia. Alguém de quem ele podia depender quando se manter sobre os dois pés era difícil, e que se importava com ele. Ela até mesmo o amava. 

Até ele descobrir que foi tudo mentira. 

Mas foi culpa dele ela desenvolver um complexo de inferioridade, não foi? Embora ele só estivesse tentando ser o melhor por necessidade, ela disse que era culpa dele, que as coisas não teriam sido daquele jeito se ele tivesse simplesmente evitado fazê-la se sentir inferior. Ephir não percebeu isso nem conseguiu andar lado a lado com ela, então talvez fosse culpa dele, mesmo. 

Ele era egoísta ou não era? Ele não se importava com ninguém ou era empático demais? Usava as pessoas ou elas usavam ele? Talvez ele já estivesse distorcido demais, mas talvez fosse dramático demais por só um pouco de dor. Todo mundo sofre. E agora era culpa dele que Lori estivesse assim, não era? Se alguém pudesse consertar só um deles, ele faria que consertasse Lori. 

Não por gentileza. Ephir só queria se livrar da culpa que o sufocava. A culpa em que se afogava mais e mais. 

Os dois ficaram ali, imersos em seus desesperos, Ephir afagando o cabelo de Lori e esse lhe apertando forte. Nante fora completamente esquecido. Embora ele tivesse passado pra descobrir o estava acontecendo, só deram atenção a ele quando o moreno apareceu na sala com duas canecas nas mãos e um cachecol no pescoço. 

Ephir ficou encarando a peça pensando no quão familiar era até se dar conta que era dele, mas isso veio acompanhado da lembrança de como o pescoço de Nante estava mordido e com um chupão. 

— Aqui, chocolate quente pra vocês. - Disse o moreno, e entregou uma caneca pra cada um. Seu rosto ainda estava um pouco corado, mas havia voltado ao seu estado sério normal... Pelo menos aparentemente. - Desculpe se usar sua cozinha foi rude, mas pareceu necessário... 

Lori começou a tomar pequenos goles quietamente, enquanto Ephir ficou encarando o líquido. 

— O que você usou? - perguntou. 

— Água. Leite em pó. Achocolatado. Eu adocei com um pouco de doce de leite que achei, também. 

— Hm... 

— Você não vai beber..? 

Ele não queria. Nante vinha de uma família um pouco mais do que bem financeiramente, então Ephir estava se perguntando quantas vezes ele teria tido chances de treinar fazer chocolate quente na vida, tendo alguém pago pra fazer isso por ele. Ele olhou pra Nante, e então pro líquido na caneca de novo. Acabou por tomar um gole. 

Pra sua surpresa, tinha um gosto normal. Pra um iniciante que não fazia ideia do que realmente estava fazendo e provavelmente não provou em momento algum, pelo menos. 

Lori começou a rir do nada. Ephir pensou que sua cara devia ter sido engraçada. 

— Você deveria chamar de doce de leite quente. - disse o menino, entre risinhos. Ele só queria alguma razão pra tentar rir, afinal. - Porque é doce demais. 

— É, talvez. - respondeu o moreno, um pouco envergonhado, um pouco sorrindo. Ele afagou os cabelos de Lori, que grunhiu um pouco. 

— Então... - começou Ephir. - O que houve, Lori? 

O menino pressionou os lábios, tentando se conter de voltar a chorar de novo. 

— Ei, ei. Calma. - Ephir tentou massagear as costas do garoto, o que só fez algumas lágrimas caírem. Sem saber o que fazer, enquanto secava os olhos de Lo com a mão livre, disse: - Você vai alimentar o fantasma com toda essa energia negativa. 

Lori soltou um pequeno soluço e murmurou: "fantasma?", o que fez Nante acabar encarando Ephir também, já que ele também queria entender a história do bendito fantasma. 

— É. Quando minha mãe comprou este apartamento, ele estava baratíssimo porque os antigos donos acreditavam que tinha um fantasma aqui... Se você der ao fantasma energia ruim ele fica mais forte, então que tal se acalmar e explicar a situação? 

— Uh, wuh... - O pequeno esfregou as mãos sobre os olhos, mas começou a tremer levemente. - Então... O fantasma deve ser super forte! 

— Ah... Huh, por quê? - Ephir perguntou, já se arrependendo de contar aquilo, assim como do restante de suas escolhas na vida. 

— Porque... Phir é a pessoa mais negativa do mundo...  

Silêncio. 

Nante tentou não rir, consoderando inapropriado para a situação, e Ephir o ajudou com uma forte cotovelada na barriga dele. Se virando pra Lori como se nada tivesse acontecido, disse: 

— Lo, não se preocupe com isso, porque eu sei um pouco sobre como controlar meus sentimentos. - Ele abraçou a cabeça de Lori de novo. - Já você precisa aproveitar a desculpa da sua idade pra chorar tudo o que tem que chorar antes de poderem te cobrar de se controlar também. Eu só estou tentando te parar porque se não souber o que aconteceu, não vou ter como ajudar. 

O tremor das mãos de Lori agarrando a blusa fina de Ephir finalmente diminui. 

— E Lori... Hum, sabe, vários adultos sentem vontade de chorar e não choram, e também guardam muitos outros sentimentos. Talvez os seus pais tenham coisas que querem te dizer, mas nunca disseram. - Nante complementou. 

— Mas o fantasma... - Lori murmurou. 

— Esqueça o fantasma, eu sei lidar com ele. E ele nem sai deste apartamento, então não se preocupe quando estiver no seu. - Ephir deu tapinhas gentis na cabeça do menino. 

Lori não estava se sentindo muito convencido, e parecia que as pessoas falavam qualquer coisa positiva quando viam que alguém estava triste, mas estavam tentando tanto acalmá-lo e animá-lo que acabou funcionando mesmo. Ao finalmente se sentir pronto para falar sem chorar, começou a explicar que seu pai estava com ele naquele dia. Embora estivesse acostumado a ser tratado com indiferença, isso não o deixava menos triste e a tensão no ar era horrível. Recebeu a ordem de cumprir todos os exercícios que tivesse, e por ter ido um instante na cozinha ver se a empregada tinha deixado algo para o jantar, ganhou bronca. "Está tentando escapar das tarefas?" perguntou seu pai, com um tom de quem esrava julgando sem nem querer saber a história. O que quer que Lori dissesse, seria considerado "responder", então o menino sacudiu a cabeça negativamente, tremendo um pouco. 

Continuou a estudar mesmo quando sua cabeça dava sinais que não dava mais. Se dormisse antes de acabar, quem sabe o que aconteceria quando seu pai saísse do quarto-escritório? 

— Ainda nessas tarefas? Vá se preparar logo para dormir. Você vai pra escola cedo, esqueceu? - Seu pai aparecera e rapidamente reagiu ao pequeno Lori sentado à mesa, pescando com a cabeça. 

— ...Hum? Mas... 

— Não me ouviu? Quer atrasar a rotina de todo mundo amanhã? - A voz grave, e com uma raiva contida enlaçada por frieza fez o menino começar a tremer de novo. Ainda assim, assentiu e correu para tomar banho. 

Depois disso, mais e mais demonstrações que ele recebia menos amor que um pano de chão seguiram. "Por que você não guardou seu material ainda?!", "Pare de molhar a casa e dar mais trabalho pra Márcia. É ela que vai limpar, não você.", "Um filho meu desse tamanho ainda tem medo de escuro, como pode? Não, vou desligar isso aqui e nem faça essa cara. Trate de superar esse medo em vez de desperdiçar tempo e dinheiro." e muitas outras entraram nos ouvidos de Lori, causando grande turbulência em sua cabeça. Os dias que seu pai ficava em casa eram os piores, já que não tinham o mínimo de intimidade, mas pelo menos  geralmente não passava de ser ignorado e tratado como um animal de estimação indesejado. Alguma coisa devia ter acontecido pra ser especialmente horrível naquele dia. 

Não que importasse. Ele se escondeu no edredom e se encolheu como uma bola. Escuro. Indiferente. Um lugar vazio de amor. Só medo, medo e a escuridão impaciente para .abraçá-lo. Um abraço sufocante, aterrorizante, que fazia cada pelo de seu corpo se arrepiar. Quando viu, estava tentando abafar os soluços no travesseiro e as lágrimas escorriam por seu rosto com impaciência, mas não podia fazer barulho, então silenciosamente sofreu aquela tortura. Não tinha a menor noção de quanto tempo se passou, mas seu travesseiro estava encharcado quando a única luz até então ligada, a do quarto-escritório, se apagou. 

— Eu entrei em pânico. - Disse Lori, encarando o fundo da caneca ainda com um amontoado absurdo de doce de leite. - Acho que quase senti meu sangue gelar. Fiquei ali, imóvel,  como se estivesse esperando morrer a qualquer momento, mas no meio de todas as coisas que passaram pela minha cabeça, eu pensei em como podia tentar fugir e vir pra cá. Ainda passei mais algum tempo num dilema por falta de coragem e incerteza se conseguiria sair sem ser visto, mas, hum... Dá pra ver no que deu. 

Ephir deu um beijo na cabeça do garoto. 

— Obrigado por me contar. - Sorriu. - Eu deixaria você dormir aqui, mas seu pai ficou em casa por isso, então não sei se ele reagiria bem... Como você saiu, pegou a chave? 

— A cópia. - murmurou o menino. 

O de cabelo cor de caramelo fez uma cara pensativa bem séria e ficou em silêncio. 

— Eu sei que o motivo de eu ter saído é estúpido, mas... 

— Não é estúpido. - Interrompeu Ephir. - Se fosse, eu diria. Seu pai pode até ter uma forma própria de cuidar de você que ele acha certa, mas tem uma grande diferença disso pra o que te faz bem ou não. Você acha que ser repentinamente forçado a superar seu medo te fez bem? 

Os olhos de Lori ficaram marejados e ele roucamente disse "não", balançando a cabeça. 

Ephir soltou um suspiro bem longo. 

— Você fica aqui. Eu cubro a história depois. 

— H-huh? 

— Talvez te demitam se você fizer isso, Ephir. - Nante comentou. 

— Eu vou pra mesma escola que ele, sou um aluno prodígio, vivo num apartamento do mesmo andar e além de cuidar de Lori há anos, sou quem melhor conseguiu dar conta do serviço. - Ephir contou suas qualidades profissionais principais. - Nah, acho que não. No máximo, podem cortar meu salário, mas só se eu não conseguir inventar uma boa história. E convenhamos, sou eu. É claro que vou conseguir. 

Os olhos de Lori brilharam de admiração, com a ajuda das lágrimas. 

— Tão humilde. - Nante revirou os olhos, sorrindo. Lori olhou pra ele, e silenciosamente começou a encará-lo. - O-o que foi? 

— Você está suando tanto, pra quê esse chachecol? 

— Ah... É, haha... - Nante começou a nervosamente desviar o olhar. 

— Eu... - Ephir interviu, mas precisou de um segundo pra se impedir de tagarelar "mordi ele". - desafiei ele. Ele vai ter que tentar usar cachecol por um tempo. 

— Ah, entendi... - Lori lançou um olhar para Nante dividido entre simpatia e "bem feito". 

— Bem, Lori, vem comigo. Vou ajeitar minha cama pra você dormir lá. - Ele colocou sua caneca ainda cheia nas mãos de Nante e pegou a mão do pequeno. - Daqui uns vinte minutos eu vou lá falar com seu pai, não se preocupe. 

— Huh, Ephir... 

— Oi? 

— Se ele vai dormir na sua cama, onde você vai dormir...? 

Ephir deu de ombros e disse: - Eu durmo quase em qualquer canto, e lugar não falta aqui em casa. Por quê? Você quer que eu durma com você? 

O duplo sentido somado a possibilidade foram suficientes para deixar Nante sem palavras e por reflexo sacudir a cabeça negativamente, corando. Ephir sorriu e levou Lori pro quarto, embora esse ainda tenha virado e feito cara feia para o moreno. 

Nante olhou para a caneca de Ephir e deu um gole onde os lábios do outro haviam encostado, seus olhos queimando com sentimentos enquanto relembrava o que acontecera antes do menino chegar. De repente, engasgou e fez careta, tossindo. 

"Tá muito doce! Augh, como ele conseguiu beber isso?" choramingou em seus pensamentos e foi levar a caneca de Lori para a pia. 

Um bom tempo depois de limpar sua sujeira e começar a refletir se deveria tentar fazer jantar, Ephir saiu de seu quarto e respirou fundo, parecendo realmente estressado. 

— Você não parece tão confiante que isso vai dar certo. 

O de cabelo caramelo abanou a mão para ele. 

— Impressão sua. 

— Uhum, tá. E o que você pretende dizer? 

Ephir olhou distraidamente pra cópia da chave que Lori havia lhe entregado. 

— Algo nas linhas de que eu fui lá porque esqueci algo, Lori abriu pra mim, Lori se interessou em algo que eu estava vendo ou fazendo no meu apartamento e acabou caindo no sono enquanto isso. E não tem motivo pra ele se preocupar, eu posso usar a cópia da chave pra levar o garoto pro apartamento dele cedo, ajudá-lo a se arrumar e levar pra escola. - Ephir deslizou pela parede e sentou no chão da cozinha. - E eu sei, tem um monte de furos, mas eu vou tornar mais coerente enquanto espero um tempo pra história dele ter acabado dormindo fazer sentido. 

— Mas Lori não deveria estar na cama? Por que ele teria atendido a porta? 

— Ugh... Eu sei. - Ephir baixou a cabeça. - Ele estava inquieto por dormir no escuro? Faria sentido ele ser o único a ter atendido a porta se o pai dele tiver ido dormir na hora que aquela luz se apagou, mas ainda me parece cedo pra um adulto obcecado com trabalho dormir... 

— Por falar em hora, você percebeu que não jantou? 

— Você também não. 

— Exatamente. - Ephir deu de ombros e abriu a boca para falar algo, mas Nante foi mais rápido: - Estou pensando em tentar fazer o jantar. 

— É sério isso? - Ephir impacientemente lançou um olhar irritado para o outro. - Você quer usar a cozinha da minha casa como laboratório?  

— Tem ideia melhor? 

— Sei lá, me come, ou algo assim. 

Nante engasgou com a própria saliva, e se apoiou na pia enquanto tossia loucamente e lutava pra se manter controlado. 

— Vo... Vo, Vo, Você prefere isso a cozinhar no meu lugar? Ou provar o que eu faço? - Tentou retrucar. 

— Atualmente eu prefiro ver o que tem na geladeira e no armário, mas fazer o quê? A preguiça é maior. - Ephir fez uma cara de alguém enjoado da própria existência. - Eu nem iria me preocupar de comer se estivesse só em casa. Pra que isso quando eu posso só estudar o que eu tenho que estudar e ir dormir? 

— Talvez seja por isso que você tem gastrite e é um palito, Ephir. Você sequer sabe cozinhar? - Nante lançou um olhar reprovador pra ele enquanto dava uma olhada no que tinha na geladeira. 

— Melhor que você, com certeza. - O garoto sentado riu pelo nariz. 

— Ephir... A geladeira é uma bagunça tão grande que eu estou com medo de me perder nela. 

— Bobagem. - Suspirou o garoto, se levantando e indo até onde Nante estava. Tirou dali queijo e laranjas, dando elas para Nante e lhe instruindo a fazer um suco usando uma máquina enquanto ele preparava arroz e acompanhamentos. - Você só tem que cortar elas no meio e colocar nessa coisa que espreme pra você. A única dificuldade é não se cortar. É difícil demais? 

— Não zombe de mim. - O moreno reclamou, e os dois focaram em suas tarefas. Ephir colocou hambúrgueres para descongelar no microondas e deixou o arroz fervendo antes de jogar no chão de novo. 

— Ainda não se cortou, Nante? 

— Você está jogando praga em mim? 

— Claro que não. Eu com certeza não gosto de ver sua cara de dor enquanto você insiste em parecer forte. De jeito nenhum. De onde você tirou essa ideia? Eu com certeza não fiz algo ainda hoje pra você pensar isso de mim. 

— Certo Ephir, eu já entendi. - Nante suspirou. 

— Como você já entendeu, eu vou deixar você de olho nas coisas quando eu for. 

— Huh? Mas... 

— Acho até que eu vou agora. - Ele se levantou e começou a andar até a porta. 

— Espera aí, Ephir... 

O garoto já havia fechado a porta quando Nante o alcançou, e esse não coragem de deixar a cozinha abandonada. 

Coincidentemente, a mãe de Lori estava no telefone, parada num dos degraus da escada para aquele andar. Ephir pacientemente esperou que ela terminasse a chamada, imaginando que seria mais fácil conversar com alguém que conhecia melhor. 

— Ephir? Você não tinha avisado que estaria com visita em casa? - Ela perguntou, assim que desligou a chamada. 

— Eu estou. Em dobro agora. 

— Como assim? 

— Lori acabou dormindo na minha casa. 

— O quê? - Ela franziu as sobrancelhas e abriu a boca para falar algo. 

— Não foi nada demais. Eu não estava conseguindo encontrar um livro do colégio e fui bater no seu apartamento pra perguntar dele. Quem abriu pra mim foi Lori, que depois me disse que estava com dificuldade pra dormir e por isso ainda estava acordado, e depois que eu achei meu livro Lori viu que meu colega de classe estava vendo um filme histórico que interessava a ele. Ele me perguntou se podia assistir até que ficasse com sono, e acabamos num acordo que eu levaria ele pra casa e explicaria a situação depois que o filme acabasse, mas... Lori acabou dormindo. Eu não tinha certeza sobre acordar ele e o garoto não dormir depois, então ia falar com o pai dele pra levar Lori comigo pra escola. - Ephir tagarelou com sua melhor atuação pra não parecer um robô falando e mostrou a cópia da chave. - Só que acabei encontrando com a senhora. 

A mãe de Lori massageou as têmporas. 

— Tá. Que seja, eu precisava ter uma boa conversa com o pai dele mesmo, é melhor que ele fique com você. Quanto... 

— Não precisa me pagar. - O adolescente abriu um sorriso digno de comercial de pasta de dente. - Eu só peço que vocês não fiquem bravos com ele. Era um filme sobre um assunto que ele tinha estudado recentemente, até. 

— Você é realmente um menino de ouro, não é Ephir? - Ela abriu um sorriso cansado. - Sua mãe tem sorte de ter um filho assim mesmo te criando sozinha. 

— Haha, eu só faço o que eu posso. Bem, até mais e boa noite para a senhora. - Ele entrou no apartamento de novo e suspirou quando fechou a porta. 

Se ele tivesse status como num jogo, provavelmente poderia ver -90 de energia. Estava se sentindo horrível, mas pelo menos conseguiu ajudar Lori um pouco. 

Nante estava na cozinha, como era de se esperar. Felizmente, não parecia que alguma coisa tinha queimado, mas o moreno ainda estava batalhando com as laranjas. Ephir rapidamente verificou que Lori estava dormindo bem relaxado com a luz ligada e voltou a se preocupar com o jantar. 

— Tá tão difícil assim, Nante? - Provocou. 

— Tanto quanto é pra você não implicar comigo. 

— Fazer o quê se eu amo... - Ele deu uma pausa, dando tempo pro coração do outro acelerar esperando ele terminar a frase. - ...testar a sua paciência? 

— Você é o manipulador mais adoravelmente chato deste mundo, Phir. - Resmungou Nante. 

O manipulador adoravelmente chato riu. Um riso fraco, porque era estranho estar com Nante depois de revelar um lado seu e coisas inimagináveis. Como se ele tivesse se tornado bem mais transparente. Por mais que para alguns isso fosse algo bom, nele causava algum tipo muito forte de desconforto. 

"Eu não sei se eu realmente deveria ter feito isso", pensou, remoendo e olhando fixamente para o cachecol no pescoço de Nante. 

Mas por mais estranho e desconfortável que fosse ter Nante, um garoto bonito, bom aluno, de família rica e uma boa companhia dizendo que gostava dele também lhe dava uma pontada de uma sensação que conhecia muito bem. 

Ego massageado, provavelmente? 

Sua confusão não lhe impediu de muito arrogantemente se enfiar no mesmo saco de dormir que Nante estava, depois de terem jantado, escovado os dentes e o moreno ter tomado banho. 

— Você não ia dormir na rede? - Nante sussurou um grito. 

— Mudei de ideia. - Ephir murmurou, se fazendo confortável de costas dadas para o outro. O espaço não era muito, então ele podia claramente sentir o calor daquele corpo que havia mordido mais cedo. 

O único som no quarto passou a ser o do ventilador. 

— Desculpe se hoje foi um dia horrível para você, Ephir. 

O de cabelo caramelo fechou os olhos, deixando pra lá as memórias do dia e focando em quanto tempo fazia que havia sentido aquele conforto. 

— Mas eu... realmente sou feliz por termos conseguido conversar e chegar numa conclusão. Ou pelo menos eu acho que foi uma conclusão? 

Debaixo da camada de saco de dormir e cobertas, Nante hesitantemente procurou pela mão de Ephir e a segurou com cuidado. 

— Boa noite, Phir. 

Ele recebeu um ronco muito falso em resposta. 


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Notas finais do capítulo

Basicamente, a piada do fantasma é que o apartamento deveria estar barato por ser assombrado, mas nem Ephir nem a mãe dele ligam o suficiente pra isso. "Quem liga se é um fantasma derrubando panelas no chão de madrugada? O que importa é se ele vai colocar no lugar."
Eu teria escrito essa cena se o capítulo não tivesse ficado tão grande.
O Ephir tá muito surtado no capítulo mais recente que estou escrevendo, então... Um pouco de feedback é sempre bem-vindo.



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