v i l a v e l h a

Armelyne seguia rapidamente pelos corredores, em um furacão de seda e cinza. Estava animada, havia chegado à presilha de esmeralda que Lyra iria usar no casamento. Preparar um grande evento como aquele estava sendo divertido e trabalhoso, era um bom passatempo para ela esquecer o próprio casamento.

Os criados a reverenciavam, mais polidamente do que antes, afinal agora não era mais Armelyne Hightower, era Princesa Armelyne Hightower, filha de um rei e irmã do próximo. Um título honroso e com grande peso.

Ela suspirou pensando em seu casamento que não tardaria a chegar e em seu noivo.

Otto não era ruim ou algo de gênero, era gentil e cortês. Perguntava-se se aquilo era uma máscara, uma parecida com a que ela usava. Seria engraçado se não fosse assustador, duas pessoas fingindo ser quem não eram. Pelo menos o papel que ela atuava não era para encobrir nada de ruim, beijar era algo ruim?

Preferiu não gastar mais tempo para pensar nisso, o casamento de Lyra já era distração suficiente.

Ela esbarrou com alguém, esse alguém era maior e mais forte que ela, o que resultou em sua queda. Focou-se na presilha que valia uma fortuna, não haveria tempo para arranjar mais uma em pouco tanto tempo. E ficou aliviada quando percebeu que o objeto estava inteiro.

Estava com raiva, quem seria o idiota que a havia derrubado no chão?

Estava pronta para gritar e ralhar, mas percebeu o cabelo ruivo e a mão estendida.

— A senhorita está bem? — A voz de Otto Redwyne era cheia de preocupação.

Teriam os deuses ouvido seus pensamentos sobre seu noivo e o trago para perto? Era uma ideia boba, aquilo era pura coincidência. Ela ficou um pouco atordoada pensando no fato e nem percebeu que a mão dele pendia no ar há alguns segundos. Ela aceitou a ajuda com um sorriso bondoso.

— Peço perdão minha senhora! Não a tinha visto... — O ruivo realmente parecia preocupado com ela, talvez até um pouco acanhado.

— Ora não se preocupa, sou mais consistente do que vidro, não racharia tão facilmente — Lyne disse com um sorriso brincalhão que pareceu quebrar a preocupação do mais velho.

— Princesa, creio que nosso encontro tenha sido muito oportuno. Estava mesmo pensando em te encontrar para te fazer um convite.

— E qual convite seria esse? — Armelyne questionou extremamente curiosa.

— O que acha de passearmos pela tarde, como o casamento real será amanhã creio que daqui a dois dias será perfeito. O que me diz?

Ela ponderou um pouco sobre o assunto, nada muito demorado já que Otto aguardava uma resposta. Por fim ela aceitou com um sorriso doce.

— Não vejo a hora de nosso encontro milady. Nos vemos no casamento! — Foi o que ele disse antes de sair por um corredor.

A Hightower seguiu para a sala de costura com um sorriso satisfeito.

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Blair estava concentrada observando o trabalho meticuloso das costureiras no vestido de Lyra, por isso quase deu um pulo quando a porta escancarou-se. Ela levou a mão ao coração tentando se acalmar, era apenas Lyne com algo bem guardado entre as mãos.

— A presilha chegou e é belíssima, os pentoshi realmente sabem como lapidar pedras. — Armelyne arfava, deveria ter vindo correndo ao algo do tipo.

— Que ótimo — Foi tudo o que a Tyrell disse, com uma feição que Blair acreditou ser tristeza.

A mais nova estava sobre um púlpito, usando seu vestido de casamento enquanto as costureiras davam os últimos retoques. Era um vestido na cor verde-relva, com fios de ouro nas mangas longas, no corpete apertado e na base da saia. Uma saia rodada e longa, que escondia os pés de Lyra. Sobre uma mesa encontrava-se o manto da casa Tyrell, também na cor verde-relva, com uma rosa dourada trabalhada em pedras preciosas douradas vindas de Essos. Um trabalho belo e difícil, obviamente que Armelyne havia cuidado de tudo pessoalmente.

As duas irmãs Hightower além de fazerem parte das Sete Donzelas ajudavam a jovem Tyrell com o casamento. Blair com a cerimônia e decoração, Lyne com o vestido e o manto. Tudo estava pronto para amanhã, até as roupas de Niklaus, mesmo que o noivo ainda não havia chegado. A mensagem dizia que estavam próximos, todavia ainda nenhum sinal da frota.

Ela passou o peso de um pé para o outro, levemente incomodada, esperava que logo fosse sua vez de se casar. Gostaria de ter um bom marido, criar sua própria família, ser dona de seu próprio castelo, mas tinha vezes que pensava que nunca conseguiria aquilo pelo simples fato de fazer algumas atividades consideradas masculinas. Aparentemente uma mulher que soubesse usar um arco era inapta para se casar, não seria uma boa mãe e esposa. Blair sempre se irritava com isso, quando soube que Armelyne iria se casar e ela não, ficou triste. Afinal ela era a mais velha, a oferta de casamento deveria ser para ela não?

Preferiu tirar esses pensamentos da cabeça, Lyra já parecia apreensiva demais com o casamento, não queria mostrar nada além de alegria para ela.

— Você está magnífica, tudo será perfeito! — Exclamou Lyne com um sorriso de ponta a ponta.

Lyra forçou um sorriso também, mas aquilo pareceu mais careta do que qualquer coisa. Ela segurou a mão da Tyrell com delicadeza, tentando transmitir força e apoio.

— Não se preocupe, tudo vai ocorrer bem, Klaus será muito gentil com você, tenho pura certeza! — Disse a Hightower mais velha. — Afinal ele é meu irmão, o conheço melhor que ninguém.

— Espero que sim — Lyra cochichou.

— Ah, tenho ótimas notícias. — Começou Lyne tentando mudar o rumo da conversa. — Otto chamou-me para um passeio.

— Isso é um ótimo começo, poderão se conhecer melhor. — Blair falou sorridente.

— Eu sei, creio que o Redwyne quer me conquistar... — Armelyne sorria de um jeito malicioso, o que fez Blair dar um leve murro em seu ombro.

Logo as três damas estavam gargalhando pela sala de costura, só pararam quando a porta novamente foi aberta, dessa vez por um pajem de feições simples.

— Princesas... Milady. — O jovem fez uma reverência que Blair acreditou ser demorada demais. — Trago uma mensagem do Rei. Vosso irmão, sua graça, o príncipe herdeiro está próximo. Os navios de vosso pai foram avistados e logo estarão no porto. O Rei pede a presença das três, uma pequena comitiva irá receber o príncipe.

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O dia estava cinzento, tudo indicava que iria chover, contudo sequer uma gota caía. O vento estava se tornando seu pior inimigo aquele dia, frio e forte, açoitava seus fios longos que voavam em todas as direções. Felizmente a ventania fazia com que a volta para casa fosse mais rápida. Ela já conseguia ver o porto e suas embarcações, umas grandiosas e outras simplórias.

O príncipe gostaria de ter voltado para casa vitorioso, trazendo orgulho para o nome Hightower e suas irmãs, todavia de tudo que ele poderia considerar ter trago consigo, vitória não era uma delas. Voltava com menos da metade da frota com que havia partido, apenas cerca de quatro dezenas. Ele tentava esquecer os homens que haviam morrido pela espada ou afogados no Vago. Cada rosto que vinha em sua mente era um sinal de fracasso e de falha, seus rostos mórbidos o atormentavam em pesadelos e Niklaus muitas vezes acordava ofegante.

Pelo menos poderia ver suas irmãs mais uma vez, elas eram tudo para ele. Dentro de seu amontoado de peles ele sentiu certo calor por pensar em suas pequenas “irmãzinhas”, Armelyne com seus sorrisos doces e seu jeito gracioso e Blair, uma moça tão doce e gentil quanto se poderia ser. Seu coração encheu-se de saudade, havia sido criado com o conceito de que um homem que ama era fraco, ele nunca havia acreditado completamente nisso, por mais que fosse uma pessoa mais fechada e séria ainda assim não dava ouvidos a esses tipos de ensinamentos.

Klaus continuou divagando na proa do navio, o que fez o tempo passar rapidamente. Logo já estava tão próximo que ele pôde perceber o pequeno amontoado de pessoas no porto, não conseguir distinguir seus rostos, mas reconhecia suas cores. Cinza para Hightower, Azul e branco para Florent, verde e dourado para... Verde e dourado para Tyrell. Era um fato para todos os que tinham um nome nobre que o casamento arranjado era praticamente algo inevitável. Um acontecimento que um dia ou outro chegaria, o dele estava próximo e isso o assustava um pouco.

Casar-se, ter filhos e dividir uma cama com uma mulher. Afinal quem nesse mundo estava pronto para isso? Ter de comprometer-se com uma pessoa desconhecida, que você não conhecia os gostos, defeitos ou qualidades. Ele tinha de admitir, era assustador, até para ele.

O grito de Lorde Redwyne o tirou de seu transe. A proa estava sendo montada e as cargas sendo retiradas dos galpões. Era hora de enfrentar a corte e sua noiva.

Desceu e rapidamente foi flanqueado por dois guardas de mantos cinzentos. Eles o escoltaram até onde o pequeno grupo aguardava, todos bem protegidos por peles, eram sulistas não estavam acostumados a nenhum outro clima senão o ensolarado. Mesmo no inverno a Campina era um lugar agradável.

Ele rapidamente viu a família. Blair foi a primeira a reconhecê-lo e a correr em sua direção, sem medo da reprovação dos nobres. Os dois deram um abraço apertado e cheio de saudade, o mais velho girou a princesa no ar, o que fez a mesma gargalhar alegremente.

Logo depois veio Lyne, mais contida, mesmo assim o apertou fortemente. Era sua maneira de demonstrar saudade.

Por fim veio seu pai, o Rei. Ele ainda não tinha esquecido a briga que os dois tiveram há semanas atrás. De toda forma o príncipe se prostrou sobre um joelho e inclinou a cabeça. Sentiu uma mão sobre seu ombro e ele levantou a cabeça. Gerold tinha um sorriso feliz estampado no rosto.

— Estou feliz que tenha retornado são e salvo!

Niklaus apenas acenou com a cabeça antes de seguir para cumprimentar o restante dos nobres. Foi até os Florent, Lorde Robert apertou sua mão com força e rugiu saudações mais alto do que um arauto. Erren seu filho apenas apertou sua mão e o saudou cordialmente. Passou para os Redwyne, novamente foi algo muito cordial.

Por fim veio os Tyrell, ele percebeu a falta de dois, contudo achou indelicado perguntar pelos mesmos naquele momento. Primeiramente veio Lady Terresa, vestia-se de branco e azul, as cores da casa do pai. Ela o olhou como se procurasse por defeitos, de cima para baixo, ele nada comentou, apenas beijou sua mão e seguiu para o próximo.

Era o mais novo, mas era alto, os dois cumprimentaram-se com um aperto de mão.

Klaus teve de se segurar para não suspirar antes de virar para a última pessoa. Lady Lyra vinha de verde como o irmão mais novo. Era bela, isso ele não podia negar, seus cachos estavam cuidadosamente arrumados em um penteados, os olhos dela o olhavam com curiosidade. Os dois se encararam por alguns momentos antes dele se ajoelhar perante ela e estender sua mão.

Ele percebeu que ela tremia e tinhas as mãos geladas, mas mesmo assim a beijou delicadamente.

— Lady Lyra, saiba que estou muito feliz com nossa união e espero que nosso casamento seja frutífero. — Ele disse algumas palavras ensaiadas.

— Serei a mais honrada das moças em receber o manto dos Hightower. — Ela respondeu fazendo uma pequena reverência.

Logo todos já se arrumavam para ir embora, Armelyne e seu pai foram em uma carruagem, como alguns outros nobres também faziam. Blair apareceu rapidamente, com duas rédeas na mão. Uma para ela e outra para ele, o príncipe pensou com um sorriso.

Ele montou seguido da irmã e logo os dois iam juntos rumo a Torralta.

— O que achou dela? — Niklaus não resistiu à curiosidade de perguntar.

— Quem? Lyra? — Ele concordou com um aceno. — Oh, ela é ótima e um amor de pessoa. Vai ser uma esposa exemplar, mas seja gentil com ela, a coitadinha está morrendo de medo de se casar, está estampado na face dela.

— Não se preocupe com isso... — Ele respondeu olhando para a carruagem onde a Tyrell estava. — Onde está o pai e o outro irmão dela?

Blair abaixou o olhar por um momento, parecia receosa sobre a resposta, mas não demorou muito para levantar o olhar para ele.

— Bom, eles não vieram, papai disse que não vão se juntar a nossa causa. Lyra veio aqui apenas com alguns cavaleiros o irmão mais novo e a mãe...

— O que?! — Ele respondeu incrédulo. — Quer dizer que não vamos mais ter o apoio de Lorde Filip?

A mais nova negou com a cabeça.

— De qualquer forma não há mais nada a se fazer...

— Como assim? — Ele questionou.

— O casamento será amanhã, ao pôr do sol.

— Amanhã?! — Não pode conter a surpresa na voz.

— Como disse já está tudo marcado, todos os convidados já chegaram e a notícia já se espalhou pelo vento. Não há mais volta! — A irmã de Klaus disse com serenidade.

— Como o nosso pai aceitou tudo isso? — Ele teria de ter uma conversa com Gerold e acreditava não fosse acabar muito bem.

— Eu não sei de todos os detalhes, papai vive preso no alto da torre e eu quase nunca o vejo descer de lá. Mas só de uma coisa eu tenho certeza, não há como cancelar o casamento sem sangue.