O nascimento de Lucy Iordache (Lucy, Origem) escrita por Natália Alonso


Capítulo 11
Capítulo 11 — Sangue, poder e traição




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“Eu não me entreguei ao meu primeiro amor, mas a um homem que precisava de mim. E depois disso, apenas a Dorian, seus olhos acinzentados nunca se fechavam quando me beijava.” — Lucy Iordache

 

 

 

 

Valahia, 1460 - tenda de Mehmed II

 

 

Eu me abaixo para pegar as faixas no chão, mas olho para elas e não vejo mais sentido em me esconder. Eu já me tornei um ser amaldiçoado, nada pode piorar agora. Eu as deixo, tranço meus cabelos, pego o elmo de Mehmed e sua cimitarra, uma linda e grandiosa espada curva. No movimento, posso ouvir o ar sendo cortado. Com ela eu decepo a sua cabeça, não porque achasse necessário, apenas por prazer.

Vestida como um de seus soldados, afasto devagar o véu da entrada da tenda. Observo a grande fogueira e em volta dela, os homens comem, bebem e riem enquanto atacam mulheres romenas. Vejo o pulsar de seus corpos fétidos, o cheiro da carne sendo digerida em seus estômagos. O odor férreo do sangue na terra sendo absorvido pela grama pisoteada.

Aproveito a distração macabra para sair mansamente, me esgueirando na parede de tecido. Não tiro meus olhos deles enquanto caminho lateralmente. Este é o meu erro. Minha perna esbarra em uma pilha de lenha, as toras rolam pelo chão, alertando minha fuga. Um deles olha e grita, por pouco tempo, pois eu atiro uma faca entre seus olhos. A lâmina atravessa sua cabeça, despontando dentre sua cabeleira com o gume brilhando em vermelho. Eles se levantam rapidamente com suas armas em punho, olhando chocados para mim enquanto carrego a cabeça de seu líder. Pensei em levar de presente para Shiva, por sua tentativa de me matar.

Um dos homens grita e corre em minha direção. Eu atiro a cabeça em seu rosto e com as unhas, corto seu baixo ventre. Ele para diante de mim, tentando segurar seus pertences internos e cai. Alguns soltam as armas e recuam para ir embora, outros levantam as espadas e tiram facas da cintura. As mulheres compatriotas fogem enquanto podem. Eu observo o caos eminente, o amarelo e vermelho do fogo iluminam a densa noite.

Um deles corre para mim, brandindo sua espada. Eu desvio e deixo-o prender a lâmina na tora atrás de mim. Com ele tentando libertar a arma eu o perfuro com a minha, ele ganiu como um animal antes de escorregar para trás convulsivo. Arranco a espada dele da tora e alinho junto à minha, de forma paralela, para fazer em fatias o barbudo que já se aproximara. Outro chega e preciso bloquear seu machado acima de minha cabeça, segurando as espadas em X. Chuto seu dorso fazendo-o se afastar, o suficiente para minhas espadas cruzadas chegar ao seu pescoço. Sua cabeça salta pelo ar, fico um instante olhando o movimento voador quando sou perfurada pelas costas. A lâmina entrou por trás e sai pelo meu peito, ele grita muito próximo de meu rosto. Viro uma de minhas espadas ao contrário e o acerto em um movimento ascendente. Minha ponta atinge o seu ventre enquanto eu giro o corpo para me libertar.

Mais um me ataca de frente com sua espada acima da cabeça, eu bloqueio com a minha. Assim, posso atingi-lo no estômago e depois um que berrava já ao meu lado. Estou sendo acuada no canto da tenda, então subo nas toras para saltar por cima deles. Caio entre homens e tenho que girar a espada para me dar espaço, mas dessa vez, eu giro as espadas agachada. As pernas são decepadas. Quando ainda estou abaixada, sou atingida por uma flecha em meu ombro. Levanto-me e outra atravessa o meu joelho. O arqueiro está querendo me fazer de tela, eu jogo a minha espada o acertando violentamente no peito, ele cai no chão em um som surdo.

Um homem tenta me acertar com uma clava, eu desvio e depois decepo o seu braço. Me viro rapidamente quando um me atinge com um martelo nas costas, tento cortá-lo, mas ele desvia de minha espada e acaba me atingindo novamente no ombro. Então paro e lhe dou uma cabeçada e ele fica desnorteado. Aproveito para puxá-lo até mim, a espada e flecha ainda cravadas em meu corpo agora o perfuram, então afasto deixando-o cair. Eu finalmente posso empurrar a espada de meu peito para trás. Ela cai no chão, sinto meu dorso regenerar com ardor. Então ouço mais espadas sendo sacadas, um murmuro entre homens atrás de mim. Viro para trás e olho para um grupo, preparado para me atacar, então sorrio para os futuros cadáveres à minha frente.

— Que bom que são teimosos, quero mesmo me divertir essa noite.

 

 

 

*********

 

O amanhecer é frio, a brisa refresca minha face coberta de líquido escarlate e pegajoso. Eu respiro aliviada, cansada e feliz, olho o sol subindo nas montanhas cobertas pela floresta temperada. As árvores começaram a soltar suas folhas, estamos no fim do verão e o vento anuncia a chegada do outono. As folhas já amareladas cobrem alguns dos cadáveres, moscas competem com as folhas pelo espaço na carne fria. Sentada em minha poltrona macabra eu observo a imagem do caos, dezenas de homens espalhados no chão. Penso no que será de mim no inferno, o que irá acontecer, mas estranhamente, não tenho medo.

Tenho é uma sensação muito ruim que algo está muito errado, eu me levanto, vou até a tenda novamente. Ao entrar, flagro uma lince cinza clara devorando a carne do líder decapitado. Ela para de comer suas vísceras quando eu entro, olha para mim e lambe os lábios rosados.

— Olá... — Ela me ouve. — Não se preocupe, não quero te incomodar. — Observa em silêncio e volta a comer tranquilamente.

Eu me viro e desato os laços de minha armadura. Posso sentir que minha pele ainda está fedendo dos resquícios de Mehmed. Tiro os trapos de minhas roupas, vou até a banheira de madeira cheia d’água fria e entro tingindo a água em tom rúbeo. Mergulho minha cabeça por trás, soltando meus cabelos. Apoio as costas na madeira e relaxo meus braços para os lados. Minha mão direita pende do lado de fora e sinto a pelagem macia da lince. Ela se posiciona ao meu lado deitada, satisfeita, alimentada, tranquila.

— Boa garota. — falo enquanto toco no seu pelo macio.

Ouço a água se mover comigo, então paro. Fecho os olhos. O silêncio reina. Tudo à volta é morte. Essa quietude é o que os guerreiros fizeram, o que Mehmed fez, o que Shiva fez... e eu também. Eu matei aqueles que seguiam um líder insano. Eu matei tantos em Londres, mas isso não me afetava. Até agora. Esse bando de loucos... Sinto algo escorrer em minhas pernas, um ardor... então percebo o que estava realmente fazendo.

Meus movimentos repetitivos golpeando aquelas pessoas, os movimentos repetitivos do general. Eu o matei, e depois continuei sendo um monstro, tal como ele. Lutei tanto para que me deixassem em paz, e agora, me sinto engolida. Tragada diretamente para meu lado mais sombrio. Eu encosto a cabeça na banheira de madeira, minha mão toca no pelo macio da fera. Ela dorme ouvindo a água da banheira, eu durmo com o silêncio.

 

 

 

*********

 

Jekyll se arrasta no chão. Seu corpo se contorce enquanto ouço seus ossos estalarem. Ele grita de dor enquanto Dorian ri em minha frente.

— Porque está fazendo isso? Nem mesmo seu amigo de infância irá poupar?

— Lucy... você ainda não entendeu? Tudo isso é para nós. Estou cansado de ser o mais fraco. De ser mais um. Eu quero tudo o que é de melhor. Eu posso ser muito mais que Vlad jamais foi, e você, será a Drácula ao meu lado.

— Está insano, Dorian, eu nunca quis isso...

— MAS EU QUIS! E VOCÊ ME NEGOU! ACHA QUE LIGO PARA SHIVA? — grita Dorian apontando para Shiva morta no chão ao lado.

Neste momento sinto uma pequena gota cair em minha mão. Vejo e percebo ser uma gota de sangue, cai outra em minha bochecha e escorre na pele branca. Olho para os vampiros que se alimentam do Clã, a chuva de sangue cai cobrindo todos nós, ela escorre em meu rosto se acumulando no queixo antes de pingar no chão.

— Dorian, isso é...

A tempestade densa ocupa todo o salão. Os vampiros estão por toda parte, posso ver o seu mastigar, seus risos com presas como animais selvagens. Eles riem uns para os outros, brincando de arremessar um braço que fora arrancado de um vampiro do Clã. Selvagens e demoníacos sem nenhum valor a vida daqueles que tiraram.

— Qual é, Lucy, você não pode ser tão estúpida assim. Acha mesmo que pode me negar alguma coisa?

Sinto então a mão de Jekyll em meu tornozelo. Seus olhos enegrecidos, seu rosto deformado coberto de sangue. Ele me avisa em desespero:

— CORRA!

 

 

 

 

Eu acordo na banheira de Mehmed. Percebo que adormeci cansada por todo o dia. A lince já se fora, restos do decapitado fedem no meio das almofadas. Eu me visto, pego alguns lenços do líder morto e completo meu traje embaixo da armadura. Pego sua cimitarra, lavo-a na banheira, gostei dela e sua curvatura, me foi útil durante o dia. Tenho ainda um dia inteiro de viajem até chegar no Castelo de Bran, um mal pressentimento paira em mim como uma névoa.

Assim que saio da tenda vejo os mortos no chão. O cheiro li fora consegue ser ainda pior, afinal, o sol não costuma ser gentil com a carne em decomposição. Algumas pessoas de vilarejos próximos saqueiam os cadáveres, outros pegam os restos de comida da fogueira. A fome da Romênia não mudara, e com a chegada do inverno, tudo tende a ficar pior. Subo em um dos cavalos e começo a voltar, quando sinto um braço em volta de meu corpo.

— Isso será interessante. — fala Mefisto ao meu ouvido, ele está sentado na sela atrás de mim, seu corpo muito próximo ao meu.

— Mas como você...

— Eu faço o que quiser. — responde ele maliciosamente no meu ouvido.

— O que quer agora?

— Apenas vou observar. Haverá um jogo interessante, do qual você irá participar.

— Jogo? Por que será interessante?

— Porque não sei o final. Gosta de surpresas? — Ouço sua voz se esvaindo em meu ouvido. Viro o rosto para frente e esporeio o cavalo para correr mais rápido.

O galopar rompe o silêncio da relva que atravesso. Eu não paro para comer, nem me alimentar, eu tenho pressa e medo. O cavalo deixa escapar grandes gotas de saliva enquanto respira de forma barulhenta, mostrando seu cansaço. Perdoe-me, mas não posso lhe deixar descansar.

Ao chegar no castelo corro para o salão central e atravesso os portões daquele inferno. Os vampiros do Clã se amontoam no chão, uns sobre os outros. Decapitados e sem sua maldita vida. Vejo muitos sendo devorados pela Ordem de Shiva, bem que Mina me avisara que ela estava formando um grupo paralelo, eu não dei a devida importância. Ela está sentada lateralmente no chão, ao lado da poltrona central. Sentado no trono, Dorian observa toda a cena diabólica, mostrando grande satisfação.

— O que está acontecendo? — questiono enquanto atravesso pela horrenda cena.

— É a revolução, Lucy. É a nova Ordem que vai dominar o mundo. O mundo dos Homens é fraco, o meu será melhor.

— Do que está falando, Dorian... porque est... — Sinto um enjoo e uma fraqueza tomando o meu corpo.

Dorian se levanta, ele segura a ponta de lança antiga em sua mão e caminha até Shiva. Abaixa-se tocando a lateral da lâmina em seu braço e sussurra em seu ouvido. Shiva suspira, ela levanta uma das mãos e começa a arranhar seu próprio rosto. A cada descida de unhas vejo sua pele se abrir em um vale, e se fechar novamente. Ela geme baixo de dor ainda que contida, sua expressão é de terror e alguma confusão mental.

— Ela me procurou, Lucy. Queria que eu te matasse, mas Shiva, sempre será apenas uma marionete. Foi de Vlad, e agora, é minha boneca pessoal. — Ele me mostra a lâmina em suas mãos — Sabe o que é isso?

Balanço a cabeça negando.

— Essa é a ponta da lança de Longinus. Uma peça amaldiçoada que dá um poder de influência ao portador. Shiva quis me convencer para que eu te matasse, para atacarmos Drácula e Mina, tomando seu reino com a Ordem, dominando o Clã. Eu gostei da ideia, mas não da forma que ela me propôs, acho que ela não esperava isso.

— Não teria sido mais simples se tivesse me influenciado?

Ele sorri para mim e caminha enquanto balança a lança no ar.

— E quem disse que não o fiz? Acha mesmo que foi você quem decidiu nos trazer aqui? Se quisesse nos proteger não teria nos trazido... Lucy, como acha que ficamos juntos em tão pouco tempo? Acha que Jekyll tem tanta gana assim pela fórmula, para trabalhar tantas horas sem dormir? Ou que ele quem teve a ideia de usar o seu sangue, ou o sangue de Drácula na fórmula?

— Onde está Jekyll? — Olho para os inúmeros corpos desmembrados a nossa volta e não o encontro.

— Ele está bem, até participou da festa. — Jekyll entra no salão, suas roupas estão muito rasgadas. Sua aparência cansada e muito melancólica entrega a culpa do que fez. — Ele conseguiu criar a fórmula a partir do sangue de Drácula, porém, isso criou uma outra personalidade, da qual ele chamou de Mr. Hyde. Mas nada que a lâmina de Longinus não possa controlar.

Eu caio de joelhos. Vejo todos os vampiros do Clã no chão, alguns ainda em agonia que são contidos pelos vampiros da Ordem. Shiva ainda mutila o próprio rosto. Jekyll pega um frasco de seu casaco, o cheiro férreo de sangue a nossa volta me atordoa. Como se meu corpo não pudesse parar e girasse verticalmente.

— Essa sensação de enjoo é normal. É a influência da lâmina, no começo eu também tinha, mas prendi a controlar. Confesso que você tem ficado um pouco resistente ás minhas ordens, por isso tive que adaptar o plano.

— O plano?

— Eu pedi que me transformasse. Mas você me negou. Então a convenci a vir para cá. Assim eu conseguiria alguém que o fizesse.

— Como pôde...

— Shiva era mais fácil, mas quando soube que haviam mais possibilidades do ser um sugador de sangue, fiquei contente. Afinal essa não é exatamente saboroso, seria degradante.

Enquanto Dorian fala, Jekyll bebe o conteúdo do frasco, ele grita, e cai no chão segurando a própria garganta. Se contorce e vira o corpo como se algo tentasse sair de seu peito. Seu dorso exala um cheiro forte como de um animal ferido.

— Jekyll! O que está acontecendo com ele? — grito preocupada com meu amigo.

— Ele está ficando melhor, superior. Não vê a beleza nisso? — fala Dorian enquanto aponta para o amigo em agonia no chão.

— Você é um monstro, Dorian.

— Todos nós somos, Lucy — Ele vê Jekyll dando um urro. Seu dorso se curva, se tornando cada vez maior —, somos todos monstros e alguns de nós são mais feios.

Sinto então a mão de Jekyll em meu tornozelo. Seus olhos enegrecidos, seu rosto deformado me avisa em desespero:

— CORRA!

Eu estranho por um momento, dou dois passos para trás enquanto Jekyll se levanta ofegante e devagar. Ele levanta o rosto e seus olhos completamente negros me encontram. Seu rosto em fúria grita enquanto corre para mim. Eu corro, subo a parede e me seguro no teto, paro tentando entender o que ouve com meu amigo.

— Jekyll! Pare com isso! Não me reconhece? — A besta olha do chão para mim presa no alto do teto e me responde.

— Jekyll não está mais. Aqui é Mr. Hyde. Mr. Hyde quer ver teus ossos! — Ele salta e se agarra na parede quebrando as pedras, como um cão grotesco ele sobe e me agarra pela perna, me bate na parede e me atira no chão.

A queda gera um buraco no piso, do qual eu tento me arrastar para sair. Mas o gigante deformado salta em minhas costas. Sinto claramente meus ossos quebrarem dentro da armadura. Pego uma adaga e perfuro um de seus gigantes pés, ele grita enquanto aproveito para sair. Eu me levanto e dou um soco em seu estômago e um chute no baixo ventre, ele dá um passo para trás.

Dou mais dois socos em seu queixo e ele segura o meu pulso. Nos olhamos antes dele torcer meu braço com facilidade, quase que irritado por minha inútil tentativa. Um jato de sangue escapa da armadura já quase destruída. Ele passa a arrancar o resto de minha armadura. Eu tento segurar sua mão, mas ele me soca uma vez, sinto que nada mais faz parte de meu rosto, meu maxilar virou algo solto e pendurado. Enquanto a regeneração apenas garante que eu não morra ele me arrasta até os pés de Dorian. Deitada no piso, Jekyll pousa um de seus pés em minhas costas, para que eu permaneça no chão.

— Hrmrrr... — Tento falar, mas minha boca não obedece.

— O quê? — Dorian se aproxima de mim se curvando.

— Onrrrdrr estlll Vrrrad... ?

— Onde está Vlad?

Dorian faz um gesto, e um grupo de vampiros trazem o rei dos vampiros acorrentado. Ele é colocado em minha frente de joelhos. Shiva se levanta e saca sua espada.

— Lucy, entenda que com isso você será a minha noiva. Eu infelizmente terei que manter Shiva viva, mas ela pode ir para o mesmo calabouço que te colocaram. Irônico não acha?

— O-que... corrrr como vocêêêê sab...? — minha boca parece finalmente responder.

— Você me contou, é claro, não por sua vontade também. — Ele balança a lâmina de Longinus apontando para o meu rosto — Você me contou tantas coisas, tantos segredos mórbidos... Francamente, Lucy, você nunca teria obedecido e voltado a Drácula depois do que ele lhe fez, é ridículo. Mas eu precisava que você fizesse isso. Já que você não me transformou, eu precisava de alguém que o fizesse. Mas ter uma Ordem aqui, apenas aguardando um grande líder para tomar o trono de Drácula. Por isso nem eu esperava.

A risada tosca de Vlad interrompe as divagações de Dorian.

— Você o trouxe aqui para nos destruir... — Vlad fala, voltando seus olhos vermelhos para mim. Seu rosto carcomido pela longa batalha que deve ter enfrentado me questiona.

— Eu não... Vlad, foi você quem me obrigou a vir!

— Eu mandei buscar você, não Dorian, não a besta-fera que ele trouxe e libertou devorando meus filhos de sangue!

— Vlad, você ouviu sobre a lança...

— Eu ouvi o suficiente! Dois dias que desde que você saiu em batalha e esse castelo se tornou um inferno! — Vlad vocifera, Dorian parece se divertir! — Eu sabia que você poderia querer vingança, mas tomar meu trono? Querer destruir o Clã? Eu disse que te deixaria livre, era para você só lutar por questões de hierarquia, eu disse que não precisaria fazer mais nada!

— Eu fiz minha parte, seu idiota, não enxerga que isso é Dorian com a lança! Você está louco!

Eu questiono Vlad, mas ele parece não entender nada do que ocorreu realmente, então olho para Dorian, ele está com a ponteira da lança brilhando em sua mão. Ele balança a ponta de um lado a outro para mim e pousa a lâmina no ombro de Vlad. O Drácula continua com os olhos fixos e vermelhos em mim e completa:

— Que lança, Lucy? Não tem lança alguma.

Percebo então que ele está sob efeito da influência de Dorian, de alguma forma ele só entende o que Dorian permite. Na cabeça do líder vampírico eu trouxe aliados que se uniram em batalha para tomar seu trono enquanto eu estava fora, para ele, eu orquestrei tudo.

— Você é um desgraçado, Dorian. — falo já em cansaço.

— Eu tenho nojo de todos vocês. — fala Drácula enquanto puxa o ar resistindo aos ferimentos.

Dorian se aproxima, se curva para o seu prisioneiro fala rente ao seu rosto.

— Você também, Vlad. Com todo o poder que tem e ainda é um fraco sentimental. — Ele se levanta e faz um gesto, acena para alguém atrás de nós. Viramos e vemos Reinfild segurando Mina no alto da sacada. Ela chora para seu amado imortal, Vlad, ajoelhado ao meu lado. Instantes depois Reinfild faz um movimento limpo de espada separando sua loura cabeça de seu corpo. Ele empurra o corpo dela, a corrente faz um barulho estridente ao se esticar pendendo o cadáver de ponta cabeça muito próximo ao chão.

Drácula ao meu lado não fala nada, ele olha aquela cena com pesar, uma lágrima desce em seu rosto. Dorian se aproxima dele, se abaixa.

— Não vai falar nada? Um grito? Me amaldiçoar? — Dorian provoca com sarcasmo.

Vlad permanece mudo, olhando para Dorian quase que com pena dele.

— Achei que gritaria. — Dorian se vira para Reinfild e o manda descer. Shiva se aproxima com a espada em punho.

Reinfild já próximo, olha pra Vlad e recua um passo. Dorian toca com a lâmina na lateral de seu corpo, sussurra em seu ouvido fazendo-o parar.

— Isso é cruel. — falo com minha boca já completamente regenerada.

— Eu sei. — Dorian diz se virando a mim, ele controla a todos com a lâmina, como um mestre de uma sinistra orquestra.

Vlad ainda observa o corpo pendurado de Mina, ele se vira a mim resiliente do que está por vir. Respira profundamente por uma última vez e me avisa.

— Espero que tenha ficado satisfeita, Lucy. Eu vou te compensar por tudo isso um dia.

Eu me viro para falar, mas Hyde aperta seu pé em cima de meu corpo. Neste momento Reinfild ataca com uma adaga no peito de Vlad, eles caem no chão. Seu amigo, companheiro e familiar é manipulado por Dorian. Em repetidos movimentos, o servo leal perfura o peito de Vlad inúmeras vezes, o sangue se espalha por todo o rosto do leal servo que chora através dos olhos paralisados. Posso ouvir que ele murmura muito baixo “perdão, mestre”. Sua face se torna rubra quando estende a mão recebendo de Shiva a espada. Ele a levanta enquanto Vlad vira seu rosto de lado para mim sorrindo. Neste momento a espada assobia no ar decapitando o Rei dos Condenados e sua cabeça rola pelo chão vermelho imundo. Assim que a cabeça para, Reinfild olha para mim em horror, por um momento, seus olhos encontram os meus como se dissessem “o que foi que eu fiz?”, seu corpo treme um instante enquanto vira pó, grão por grão, o grande amigo de Drácula é dissolvido no ar e desaparece, como se nunca tivesse existido. Estou paralisada, não sei o que fazer.

 

 


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