Aventureiro De All Star escrita por Gabriel Lima


Capítulo 4
Capitulo 4


Notas iniciais do capítulo

Eu demorei pra ter a sabedoria necessária pra escrever esse capitulo...



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— Onde está me levando? — perguntei — É algum tipo de templo Inca? — ele olhou pra trás, arqueando as sobrancelhas e voltou a caminhar, fazendo barulho no cascalho daquela trilha — Não devo fazer perguntas?
— É claro que deve, mas a si mesmo — disse ele.
— Ah, é claro... Senhor sábio da montanha — disse ele.
— Gostei do nome, me chame assim de agora em diante — disse ele.
— Eu não! Sabe, às vezes você me lembra dum cara que encontrei num beco uma vez... Ele também falava vagamente... — perguntei.
— Sei, e você respondia vagamente... — disse ele. Eu ri.
— Na verdade eu ignorei o cara... — eu ri — Enfim, continuo escutando a correnteza daquele rio, não sai da minha cabeça... Parece até um jingle... Não foi boa ideia dormir l... — quase esbarrei nele — Por que parou? — eu logo percebi porque, acho que eu podia chamar aquilo de periferia da cidade, apesar de parecer mais uma vila Inca. Havia crianças brincando, e jogando bola entre as casas de pedra, e casebres de madeira, aquilo lembrava muito Machu Picchu. “Crianças brincando na rua, há quanto tempo não vejo isso?” pensei.
— Está bem, essa pergunta eu respondo — disse ele — Aqui é a parte que os turistas não veem... Escondemos os outros templos do país, na verdade até moramos em alguns deles, mantendo-nos ainda como Incas...
— E agora você pretende me ensinar a sabedoria antiga dos Incas... — dei-lhe uns tapinhas no ombro e caminhei a sua frente — Vá em frente... Vai ser fascinante! — ele riu em deboche.
— Talvez o fato de se empolgar rápido demais seja o motivo de se desmotivar na mesma velocidade... — disse ele.
— Pode parar de ler a minha mente um minuto e me deixar apreciar o momento? — eu disse. Eu até ia caminhar em direção aos templos entre os casebres de madeira, mas quando reparei naquelas pessoas, interagindo, rindo, com expressões tão naturais como eu nunca havia visto antes, eu travei na metade de qualquer passo que pretendia dar. Ele continuou a caminhar, e ao passar por mim disse:
— É, eu sei... Mas a presença de uma teia não significa a da aranha... — disse ele.
— Estou quase usando suas frases pra colocar em camisetas e vende-las, eu ficaria milionário... — eu disse. Ele riu.
— Você sempre usa o humor pra fugir? — perguntou ele, caminhou até uma roda de amigos que se reunia em torno de uma mesinha que tinha um jogo que eu não conhecia, interagiu com eles enquanto eu permanecia congelado no lugar, me olhou e acenou. Fui até lá, sem tirar os olhos dos meus pés, olhei pra eles, que me observavam com empolgação.
— Então gente, esse é o gordo, ele veio conhecer a aldeia e ficar alguns dias — disse o sábio da montanha.
— Gordo? Ah entendi... A parada do homem da barriga grande... — eu disse — Mas na verdade eu me chamo... Quer saber? Vou entrar na brincadeira... Olá gente, sou o gordo, vim do Brasil... — ouvi vários olás em resposta. Eles eram alegres, casais, solteiros, crianças, todos em comunhão para ver um jogo, como uma enorme família.
— Sente-se! Estamos assistindo o jogo enquanto esperamos o almoço, hoje teremos Olluquito con charqui, a Yomira e a Deysi estão preparando... — disse um cara do meu lado, que usava uma toca engraçada. Procurei pelo sábio, mas ele tinha saído de perto de nós, então o vi indo em direção a um casebre, na porta havia uma garotinha com vestido vermelho, ela estava sentada, com cara emburrada.
— O que houve Juanita? Por que está tão emburrada? — perguntou ele.
— Você disse que traria uma surpresa e voltou de mãos vazias! — disse ela. Ele riu.
— É porque o que eu trouxe não cabia em minhas mãos... — ele olhou pras próprias mãos, enfático — Quer ver?
— Então você trouxe mesmo? — perguntou ela.
— É claro, está sentado ali, usando tênis brancos e olhando pra nós... — disse ele, a garotinha olhou pra mim animada, e eu tentei me concentrar no jogo que eu nem sequer sabia o nome. Então senti alguém me cutucando no ombro, era a garotinha, que me lembrava da Tainá (ah vai, você sabe do que eu tô falando).
— Ei! Moço! Como você se chama? — perguntou Juanita, empolgada e sorridente.
— Pode chama-lo de gordo — disse o sábio.
— Gordo? Mas ele parece um palito — disse ela.
— É que eu sou um homem da barriga grande — cochichei em seu ouvido.
— Ah! Vem comigo! Tenho que te mostrar pra todo mundo! — disse ela, puxando minha mão, eu não tive como resistir, não se corta a empolgação de uma criança. Ela me arrastou pela aldeia.
— De onde você veio? — perguntou ela.
— Do Brasil...
— Sério? E é verdade que todo mundo lá sabe lutar capoeira? E que todo mundo samba? — perguntou ela.
— Err... Mais ou menos... — eu disse.
— Ah eu me chamo Juanita, tenho quarenta e três amigos, sendo um deles um tatu! — disse ela — Não é legal?
— Ahn... É sim! — eu disse. Ela me levou até uma grande cozinha numa casa que era de madeira por fora, com tijolos e cerâmica por dentro.
— Yomira! Deysi! Vejam meu novo amigo! O gordo! Ele é um homem da barriga grande! — havia uma senhora cortando algum tipo de carne, e uma jovem descascando um tipo de batata que eu também não conhecia. A cozinha era um pouco precária, havia um barril enorme em cima de uma pia, continha uma torneira, supus que estava cheio de agua, já que não vi canos em nenhuma parte. “Eles não tem agua encanada”. Olhei para o teto e não vi nenhuma lâmpada também. Eu não sabia qual era a Yomira, e qual era a Deysi, mas cumprimentei do mesmo jeito.
— Olá! — eu disse.
— Olá — as duas disseram num uníssono.
— Ele veio do Brasil! — disse Juanita.
— E ele é bem bonito, — disse a mais velha — não é mesmo Yomira? — as bochechas da mais nova se enrubesceram, e foi assim que eu soube qual era qual. Juanita me puxou, e cochichou em meu ouvido:
— Não se ilude não, ela fala isso pra todo moço jovem que aparece aqui, acho que ela quer arranjar um marido pra Yomira — eu ri com o comentário dela, Yomira e Deysi se entreolharam.
— O que você fofocou dessa vez Juanita? — perguntou Deysi.
— Nada, só avisei que o zíper dele estava aberto... — levei um susto com essa resposta ao perceber que meu zíper estava mesmo aberto, o fechei bruscamente e quase tive um pequeno acidente entre o tecido e a pele.
— Desculpe...
— Tudo bem — disse Deysi.
— Ei, deixa eu te mostrar o Frank! — chamou Juanita, me puxando outra vez.
— Até mais tarde... — eu disse.
— Cuide bem da nossa menina! — disse Deysi.
Juanita me arrastou até a parte de trás dos casebres, onde havia um buraco perto de uma floresta, ela se abaixou perto dele e chamou:
— Frank! Você tá ai? Acorda! — afastou-se um pouco, e esperou.
— É o tatu de que me falou? — perguntei.
— Sim! — disse ela — Frank! Você tá aí?
— Acho que ele foi dar um passeio... — eu disse. Ela ficou de pé, desanimada.
— É... Também acho — disse ela.
— Seu pai sempre lhe trás presentes? — perguntei.
— O que? Ah ele não é meu pai! É só o doutor.
— Doutor? Ele é cientista, estudioso ou é médico?
— Humm... Eu acho que é médico, cuida de muita gente na cidade, e às vezes de alguns aqui na vila... — disse ela.
— E onde estão seus pais? — perguntei. Ela fez um olhar perdido.
— Eu... Não sei... Todos da vila cuidam de mim desde que eu era menor...
— Você gosta daqui? — perguntei, e seu olhar mudou na hora.
— Sim! Faço amigos por toda a parte! Ás vezes tomo banho na Laguna Piuray, no rio Urubamba... Brinco com Juan, Inez, Carlo... — ela começou a contar nos dedos, abaixei-me, e segurei seu ombro.
— Então é isso que importa! Vamos voltar para o doutor? Meu estomago já está roncando — eu disse. Ela assentiu.
— Você é legal, vou te colocar na minha lista! — disse ela.
— Que lista? — perguntei.
— Da minha coleção de amigos, oras... — disse ela.
Caminhamos de volta.
— Vai mesmo me usar como desculpa por ter esquecido o presente daquela garotinha? — perguntei ao sábio doutor depois de minha primeira mordida, estávamos sentados num tronco afastado daquela roda de amigos.
— E quem disse que estou te usando? — perguntou ele.
— Ah tá! Então agora eu sou algum tipo de presente pra essa menina... Era isso que tinha pra me mostrar?
— Não sei, talvez você ainda não tenha visto... — disse ele.
— O que houve com os pais dela? — perguntei. Ele suspirou, e pela primeira vez vi tristeza em seu rosto.
— Ela ia fazer dois anos, seu pai tinha um problema, tentei de todas as formas ajuda-lo e quando ele se foi sua mãe não suportou a perda e partiu... Ela ficou um tempo perguntando por eles, cada um dava uma resposta diferente, mas nunca a verdade, até que ela se esqueceu de que um dia teve contato com eles... — disse ele.
— Eu... Sinto muito... — disse ele.
— É mais difícil quando é alegria não é mesmo? — perguntou ele.
— Como assim? — perguntei.
— Quando eu fui frio você se abriu, só quando estava triste é que você demonstrou empatia... A sós sua personalidade era uma, mas quando lhe trouxe a uma multidão se tornou outra... Você gosta das pessoas, mas parece querer distancia delas... Aposto que se toda essa gente estivesse triste, você seria o primeiro a consola-las, mas porque é sempre o ultimo a sorrir com elas?
— Eu não sei... Não gosto multidões, mas gosto de ajudar, isso acaba sendo mais forte... — eu disse.
— Aquela garotinha... Cada novo amigo é um presente pra ela, porque já que ela perdeu sua família, o mundo inteiro é uma família... Ela coleciona amigos, como se colecionasse pedrinhas, e isso não a torna nem um pouco ingênua, por incrível que pareça, talvez devesse aprender algo com ela... — disse ele. Eu ri.
— Sabe o que eu quero começar a colecionar também?
— O que? — perguntou ele.
— Aventuras... — eu disse — E se o que esse lugar... E essa garotinha tem a me ensinar for uma aventura, eu topo...
— Pode apostar que será... Agora coma, essa carne só é boa quando está quente...
— Sim, senhor sábio da montanha! — eu disse. Rimos com vontade, e minha empatia não falhou dessa vez. “Até que viver não é tão ruim” pensei. 

                                                                                                          


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