Aventureiro De All Star escrita por Gabriel Lima


Capítulo 3
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

Eu sei que demorei a postar a continuação, mas juro que não demoro mais haha



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Eu não tinha interesse nas ruinas de Machu Picchu, e as roupas que comprei faziam com que nenhum vendedor me parasse, meu espanhol era bom o suficiente pra pensarem que eu era um deles. As ruas de Cusco pareciam o intermédio entre o século vinte e o tempo Inca, e a sensação era muito boa, mas ainda assim me sentia mal por não ter avisado a ninguém de minha viagem. Eu havia fugido, então que explicação poderia dar? Imagino que agora nenhuma. Ninguém costuma manter a primeira impressão comigo, então que se dane. Daqui uma hora anoiteceria, e eu precisava logo encontrar um local pra dormir, me aproximava do Rio Huatanay, raios de luz cruzavam as montanhas e faziam um reflexo bonito na agua. O cheiro da agua não atraia ninguém para um mergulho, mas dava pra curtir o lugar. Então percebi um homem encostado numa arvore na margem, ele usava um poncho colorido.
—Não importa aonde você vá, alguém sempre vai perceber que você é brasileiro... — disse ele, mantendo o olhar no pôr do sol.
—Você também é? — perguntei.
—Não, nunca saí da terra dos Incas... — ele disse em espanhol, mas estou traduzindo pra você — Mas estou acostumado a vê-los em Machu Picchu, memorizei seus comportamentos e hábitos, e você... É o mais estranho que já vi — eu ri.
—Acho que é a única coisa boa em mim, porém é raro eu chamar a atenção de estranhos... — eu disse.
—Tenho te observado há alguns dias, não come em nenhum restaurante, apenas em algumas barraquinhas por aí... E mais de uma vez o vi dormindo em um banco na estação, ou embaixo de uma arvore... — disse ele.
—Alugo um quarto por uma hora todos os dias, apenas para tomar banho — eu disse.
—Tem algum problema com dormir em um quarto? — perguntou ele.
—Apenas não quero ficar muito tempo em um lugar que me lembre de casa... — eu disse.
—Problemas em seu país? — perguntou ele.
—Problemas em minha vida, as pessoas são complicadas... — eu disse.
—E ser mais complicado do que elas, não ajuda muito... — disse ele — Se começar a fugir disso, as coisas nunca vão mudar.
—Passei a minha vida toda enfrentando isso e nada melhorou... — eu disse.
—Não importa quantas vezes entre num ringue, se não souber lutar vai sempre apanhar... — disse ele. Eu ri.
—E como se aprende a lutar? — perguntei.
—Apanhando é que não é... — “Turn of down” pensei. Ele riu, e continuou a dizer — Normalmente podemos praticar em bonecos, sacos de pancada... Mas a vida não é assim, você só sabe de verdade que o fogo queima quando se queima... Só sabe que palavras machucam quando magoa alguém, não é possível se preparar pra vida, só é possível viver... E se não pegou o jeito com a prática é porque ou não compreendeu bem, ou tem algo de errado com você...
—Por que acha que estou aqui? — perguntei — Tentei fazer das pessoas um motivo pra viver, sabe, entende-las, ajuda-las, mas enquanto eu estava lá, me esforçando, comecei a decepciona-las varias vezes seguidas, e nem sei direito o porquê... Quando seu propósito de servir aos outros falha, viver também perde sentido, porque além de não entender os outros, você não entende a si mesmo...
—Então você queria ajudar os outros sem conseguir ajudar a si mesmo, por que queria servir aos outros?
—Com o passar dos anos me cansei de ser alguém que não acrescentava nada ao mundo, e quando estava prestes a conseguir percebi que não havia acrescentado nada a mim mesmo... Nada além de bens, currículos, e contatos promissores... Isso não acrescenta nada de verdade a ninguém!
—Então você é o homem da barriga grande, que agora quer emagrecer — disse ele.
—O que? — ele riu.
—Meu pai vivia dizendo isso, eu achava hilário, mas é verdade. Ele dizia que os homens costumam querer comer tudo que podem, às vezes pra se exibir, às vezes por ganancia, e... De vez em quando porque era a única coisa que tinha pra se sentir satisfeitos... Depois disso sempre ficavam com a barriga grande, engordavam, tanto que se arrependiam... — disse ele.
—Mas que história de índio! — eu ri — É interessante, mas acho que eu sou mais um caso de alguém que comeu a coisa errada pra obter a... Eu... Gostei do que disse, é uma verdade e também uma metáfora.
—Você fala cada vez mais — disse ele.
—É... Com você eu consigo me expressar muito melhor, e acabei de te conhecer... Você não é algum tipo de guru, é? — ele riu.
—Não, acho que sou apenas um bom homem que fala com todo mundo... — disse ele.
—Eu queria ser assim... — eu disse.
—Posso te mostrar como, mas não posso ensinar, terá de aprender sozinho... — disse ele.
—Agora sim está parecendo um guru — eu disse. E rimos.
—Não sou um guru, apenas acho que se saiu por aí numa jornada, foi pra encontrar alguma coisa, e ficarei feliz em ajudar... Não é todo dia que vejo um homem bem sucedido largar tudo pra...
—Viver... — eu disse. Ele sorriu, levantando as sobrancelhas e abrindo a boca, sem deixar que uma palavra sequer saísse, então disse:
—Viver — assentiu varias vezes — Me encontre aqui ao amanhecer, que vou te mostrar o que acho que tenho pra mostrar... — disse ele.
—Eu não vou sair daqui — eu disse jogando minha mochila perto da arvore onde ele estava, tirei o embrulho do meu bolso, abri-o e dei uma mordida no meu sanduiche de frango grelhado.
—Ah claro... O cheiro não te incomoda? — perguntou ele. Olhei para o rio atrás de mim.
—Estou acostumado com coisa pior, eu dou conta — eu disse de boca cheia.
—Bem, eu vou indo — ele deu um aceno e ia se virando.
—Ah! Eu não perguntei seu nome...
—Dizem que quando algo é bom, o nome é a ultima coisa que importa — disse ele.
—Isso foi ego ou...
—Eu não falei de mim... — ele me olhou sob os ombros — E nem de você...
—Então tá! Nos vemos amanhã! — eu disse. Ele apenas acenou, e seguiu na direção oposta do sol, avançando direto pra noite. Sentei-me, recostando-me na arvore, dando a última mordida no sanduiche. Uma parte de mim queria muito olhar, e a outra se recusava com mais força do que eu podia resistir, “Uma hora vai ter de olhar, acaba logo com isso”. Então com as mãos tremendo tornei a puxar o zíper da mochila, vislumbrando meu tablet lá dentro, o peguei e desbloqueei a tela e cliquei no ícone de noticias. “Empresário brasileiro, indicado para o Nobel da paz por ação humanitária em parceria com a Kaito Company continua desaparecido”, era a primeira noticia, bloqueei a tela e joguei o aparelho de volta na mochila. Abracei meus joelhos, olhando para meus tênis brancos, e suspirei.
—A noite vai ser longa — eu disse.


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