Nada será como Antes escrita por Crica


Capítulo 3
Capítulo 3




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Capítulo 3: 

 Não havia uma única estrela no céu. O ar estava gelado e uma chuva fina dançava com o vento. Até os grilos estavam em silêncio. 

 Dean puxou o zíper do casaco até o alto e levantou a gola. Um arrepio funesto percorreu-lhe a espinha. Olhou mais uma vez o relógio. Agora faltava pouco. Não havia para onde ir, para onde fugir. Era tudo ou nada. Encaixou as mãos nos bolsos do casaco e esperou pacientemente que lhe viessem cobrar o pagamento pela vida de seu irmão. 

 Quando o último segundo passou, sentiu o cheiro pútrido dos cérberos que o cercavam. Mal podia manter o coração dentro da boca. Os rugidos grotescos, aquele cheiro nauseante, a umidade, o frio. O cheiro da morte. 

 A chuva cessou, o vento silenciou e o tempo pareceu estagnado.

 Um terror avassalador preencheu todo o corpo de Dean. Cada célula de seu organismo estava tomada pela tensão. Não podia mover-se, não conseguia dizer nada. O gosto amargo da hora fatal subia-lhe pela garganta. 

-Ora,ora,ora... Pontualidade britânica. Gostei de ver, Dean Winchester...  

- O q...- a pressão sobre seu peito aumentou - quem... Não... 

-Calma, querido, respire. Não fique tão ansioso. Surpreso?

 -E... Eu... Eu ...-ofegante- ...Nunca imaginei... 

-O papai não te ensinou que o diabo tem cara de coelho? Deveria ter mais cuidado com velhinhas atenciosas e prestativas de bochechas coradas. Elas podem guardar segredos infernais...ops! Trocadilho infame... 

-Me responde uma coisa? – Dean começava a recobrar suas forças e a pensar com mais clareza. 

-Por que não? Não se nega um último desejo a um condenado, não é mesmo? Ninguém pode me acusar de ser mal educada. Cruel, talvez, mas mal educada, nunca! 

- Por que tudo isso? Por que nós? 

-Apesar de a escolha não ter sido minha, tem a coisa da hierarquia, você sabe. Então, o patrão falou, está falado. É isso. 

-Então, você não detém o contrato?

 -Olha, meu bem, não tenho a noite inteira par ficar de conversa com você, sabia? Sou uma senhora bastante atarefada. Tenho que arrebatar umas centenas de milhares aqui, provocar e incitar umas guerras ali, e outros pequenos e tediosos detalhes que você não vai querer saber. 

 -Eu prometo que não vou mais causar problemas, mas me diga: quem é você? 

-Você já deveria saber que temos muitos nomes e que, provavelmente, não conseguiria pronunciá-los corretamente, mas gosto de Trude - sorriu para ele e apertou-lhe o queixo - O que importa é  que adoro brincar neste seu mundinho e não tenho a menor vontade de voltar lá para baixo... –

A mulher observou, silenciosamente, as árvores que ladeavam a estrada deserta, e finalmente, sorriu

- Ruby, Ruby, Ruby... saia daí, querida. Posso sentir seu cheiro de ratazana ladina  há  milhas de distância. 

Ruby saiu de seu esconderijo e caminhou lentamente em direção à Trude. Passou por Dean e pôs-se entre eles. 

-Eu tenho o direito de entregar a minha alma só ao dono do contrato, estou errado? – Dean empurrou Ruby um pouco para o lado -Se não é você, trate de chamá-lo.

 -É verdade. Tem mesmo, mas infelizmente, o chefe não está disponível no momento. Uma pena. 

-Pensei que demônios tivessem palavra, que cumprissem seus acordos. – tentava ganhar tempo. 

-Eu adoraria fazer a sua vontade, benzinho, mas realmente, será impossível. – antes que o rapaz continuasse, Trude voltou o rosto para a estrada e sorriu novamente – Vejam só... a coisa está ficando muitíssimo interessante...O resto da família está chegando para se juntar à festa... 

-Está certo. Chega de conversa mole.  – Dean percebeu o perigo. 

-Calma aí, rapazinho. Acho que teremos que esperar só mais um pouquinho pra acertar as nossas contas. O pequeno Sammy vai ficar muito feliz em negociar a sua vidinha pobre, não acha?

 -Se você pensa que vai trocar a minha vida pela dele, está muito enganada. – a ira cintilava nos olhos do rapaz.

 -Quer apostar que eu não vou nem precisar oferecer?

 -Você só está esquecendo de um detalhe, sua coisa maldita: não pode negociar a minha vida sem o meu consentimento. – Os olhos de Dean se prenderam aos da criatura à espera de uma resposta. Inconscientemente rezava para que o carro que se aproximava, não trouxesse seu irmão. 

 -Nisso ele está certo. – interveio Ruby.

 -Tarde demais pra você, querido. Seu tempo está esgotado.Vamos deixar o tempo esquentar... Veja, Dean, como corre o querido Sam... vamos dar a ele um pequeno incentivo? -A criatura indicou com um gesto e o mais velho dos Winchester foi atirado de encontro a um velho carvalho. -Nada como expor a mercadoria pra aguçar o desejo do cliente... 

Dean ouviu seus ossos estalarem ao chocar-se contra a árvore. Dor. Medo. Sam correndo. A vista turva. Pânico.

 -SAM, SAIA DAQUI!!! 

 -Faça-o calar-se! – Trude ordenou. 

 Ruby retirou sua adaga da cintura e aproximou-se do jovem. Parou, olhou para trás, e sussurrou  em seu ouvido: 

- Não vai demorar....  

A dor provocada pelo metal gelado rasgando sua carne era brutal. Faltava ar. Confusão. Sam está chegando... Mas não conseguia ouvir seu grito de desespero. As imagens movimentavam-se lentamente. Faltava ar. Sentiu o calor de seu sangue escorrer pelo tórax e abdome. Não conseguia manter a cabeça equilibrada sobre o pescoço. Dor. Suas pálpebras estavam incrivelmente pesadas. Sam estava ali, do outro lado da estrada. As mãos de Ruby estavam cobertas com o seu sangue. Já não sentia mais nada. Sam... Escuridão. 

-DEEEEEAAANN!!!  - Samuel gritou ao depara-se com o corpo do irmão ensangüentado e não pensou,apenas atirou-se sobre Ruby e ergueu-a pelo pescoço, apertando, deixando esvair todo o seu ódio e sua dor.

– Como você pôde? Eu confiei em você, sua vadia...

 - Sammy, Sammy... ponha-a  no chão. Você está sendo um menino muito malvado. – Trude debochava. 

- E você... – ainda sustentando a moça no ar -Leve a minha alma. Deixe-o viver! 

- Vamos nos acalmar, Sam querido. - a criatura pôs a mão sobre o braço de Samuel – Ponha a pequena Ruby no chão. Está perdendo seu tempo com ela. Veja: o precioso sangue do irmãozinho está escorrendo bem depressa. Não vai durar muito... 

- Já disse pra me levar no lugar dele. – o rapaz largou o demônio. 

-É uma pena, mas a sua alma não nos interessa. 

 - O que??? 

 -É isso aí, meu bem. Não nos interessa nem um pouco. - Eu não vou deixar o meu irmão morrer!-

Sam largou Ruby, correu para junto de Dean, ergueu seu corpo desfalecido, apoiando-o contra o peito e pressionou o ferimento com força.

 - Mas quem disse que ele precisa morrer?  

-Chega de brincadeiras, por favor... Dean está sangrando muito, ele vai morrer e sua alma...

 -Vai diretinho pro inferno. Viagem pré-paga, só de ida. – Trude aproximou-se dos irmãos e abaixou-se até a altura dos olhos de Samuel - Mas não precisa ser assim, não é? 

- Não dê ouvidos a ela, Sam – Bobby chegou mais perto, empunhando o Colt, mas foi afastado e imobilizado por um gesto da criatura. 

- Qualquer coisa. Eu faria qualquer coisa, morreria mil vezes para salvá-lo.

 - Não será preciso tanto, Sammy.  Não queremos nada menos que você, vivo e forte. –levantou-se - Bem, o acordo é esse: você vem comigo, faz o que eu mandar e revogamos o contrato do seu irmão. Parece-me uma troca justa. O que me diz? 

- Vão deixá-los ir? Os dois? – Samuel queria certificar-se.

 - Com certeza. Ruby vai cuidar para que ambos cheguem em casa são e salvos, não é querida?

 A outra mulher concordou com um gesto da cabeça. 

Sam levou a mão ao rosto para secar as lágrimas que derramava, mas elas estavam cobertas pelo sangue do irmão. Abraçou-o longamente e enxugou os olhos com a manga do casaco. 

-Não esqueça do que prometeu ao pai, Dean – sussurrou junto ao ouvido do mais velho -... Do que prometeu a mim. 

 O caçula deixou Dean deitado sobre o lamaçal e dirigiu-se ao demônio da encruzilhada, estendendo-lhe a mão direita.

 - Um acordo selado com sangue...- apertou a mão encharcada de Samuel - muito apropriado. Podemos ir? 

Bobby assistiu toda a cena, estático. Viu Sam caminhar pela estrada até desaparecer dentro do automóvel, que partiu apressado. Seu coração estava partido. Sabia que o que todos mais temiam estava acontecendo. Sabia que o caminho da escuridão poderia não ter volta. Viu Ruby arrastar Dean e colocá-lo no banco de trás do Impala. Como poderia explicar a ele que Sam estava perdido? 

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FLASH BACK
 * no apartamento em Palo Alto, após a fuga de Dean:

- Pra que tanta pressa, Sam?

-Saia da minha frente, Ruby!


- Vai atrás do seu amargurado irmão?

- Já disse que não tenho tempo para os seus joguinhos!

- Está bem, se não que me ouvir, tudo bem. Mas também não vou dizer para onde Dean está indo.

- Eu não vou cair nessa, Ruby. Saia do caminho!

- Pense um pouco, Sam. Conhecendo bem o seu irmão, depois de ser humilhado, desrespeitado, tratado como a mosca que pousou no cocô do cavalo do bandido pelo idolatrado caçulinha e tendo dois, três dias de vida... Para onde você iria? Hum? 

-Se você realmente sabe, diga-me logo. Estou perdendo a paciência!

- Vou dizer. Mas primeiro preciso que me ajude com uma coisa.

-Que coisa?!

- Você ainda tem o colt? Está com você?


- É claro, mas fale logo ou saia do caminho de uma vez.

- Preciso que me ajude a destruir Semjaza quando este vier cobrar o acordo com o Dean.

- Semjaza? Quem é esse?


- Semjaza, ao lado de Azazael, liderou um exército de duzentos anjos na revolta contra Deus. Durante eras os dois causaram a anarquia entre os homens e começaram a procriar com as mulheres humanas, gerando criaturas abomináveis. Então, Miguel foi mandado com uma legião para encarcerá-los no inferno.

- Mas se foram derrotados, como escaparam? E o que isso tem a ver com o acordo que o meu irmão fez?

- A fuga de Azazael é um mistério até para nós. Mas o fato é que Semjaza ficou por lá, administrando as conquistas do outro. Ele sempre viveu à sombra de Azazael. E agora, ao que parece, está querendo dar o fora e assumir seu lugar já que o general foi pro espaço pelas mãos do querido Dean.

-Vingança...

- Sim, mas nem tanto... Na realidade, ele quer você porque Azazael queria você.

- Eu não entendo. Se esses anjos caídos ou demônios, seja lá o que forem são tão poderosos, por que precisam de mim ou de qualquer humano para conduzir seu exército maligno?

- Quando a guerra finalmente terminou, houve um acordo em que a terra seria campo neutro. Mas nem todos concordaram e cumpriram o combinado. Daí ter sido dado a vocês,humanos, o livre arbítrio, para evitar que fossem dominados pelos seguidores de Lúcifer.

- Mas pessoas são possuídas.

- Porque permitem. Nenhum de nós é capaz de obrigá-los a fazer qualquer coisa, Sam. Foi dado aos seres humanos o maior dos dons: a liberdade de escolha. O máximo que conseguimos é mover uns pauzinhos para que a situação os leve para onde queremos.

- É como estar num local infectado com a imunidade baixa...Basta desejarmos, mesmo que inconscientemente, não estar no comando de nossas vidas e vocês tomam conta, não é?.

- Agora você está entendendo.

-Então, foi assim que a Meg me possuiu... Vocês só aceitaram o pacto para usar Dean e me forçarem ser a marionete de vocês nessa loucura toda...


-E sendo você, um humano, voluntariamente no comando do exército de mal, o outro lado, cumprindo sua parte no acordo, não poderia  interferir.Como pode ver, a alma do seu irmão só tem valor enquanto puder ser usada para trazê-lo para o nosso lado.

- Estou pasmo...

- Então, te dou os detalhes do nosso pequeno ardil e passamos ao próximo passo?


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