Hoseok abriu os olhos com dificuldade logo que o sol nasceu pela manhã. Revirando-se na cama bagunçada, resmungou baixinho sobre ter de se levantar bem mais cedo do que o horário de sempre. Sentou-se enquanto bocejava e olhou para a sua direita, de onde a luz do dia ousava invadir seu quarto pelos pequenos espaços que a cortina não cobria.

No entanto, ao invés da vista lá fora, ele viu Tae dormindo logo ali, ao seu lado. Os cabelos espalhados no travesseiro branco, o lençol ameaçando cair da cama de tanto que ele se mexera durante a noite, e a boca aberta, deixando um filete de baba molhar a fronha. Hoseok riu, como era meigo. 

Pisou o pé no chão e recuou no mesmo instante. Os ladrilhos quadrados estavam absurdamente frios, seria o inverno chegando? O rapaz queria erguer-se, enrolar o menino adormecido e protegê-lo do vento gelado, mas sabia que não podia. Ao invés disso, girou na cama e, sorrindo, enxugou a saliva escorrendo do menino adormecido.

"Tae, está na hora de acordar" sussurrou, alisando os fios macios do cabelo dele.

O dorminhoco protestou, franzindo as sobrancelhas e escondendo o rosto com o lençol. 

"Tae, não estamos aqui para descansarmos. Temos uma missão, lembra?" disse Hoseok, levantando-se e indo até a janela. Afastou os panos salmão e o quarto se iluminou por completo. 

Ele sempre se perguntara o que os humanos viam todas as manhãs por aquele pequeno retângulo de vidro. Agora, tendo sua primeira impressão sobre isso, acreditava que poderia melhorar. As ruas estavam sujas e silenciosas, os muros pichados e, mesmo que o sol nascesse, o ambiente ainda mantinha um clima sombrio. Hoseok imaginava se a neve poderia melhorar a visão daquela região.

Os anjos desceram durante a madrugada anterior e, como sugerido pelo Mensageiro, eles procuraram um lugar barato para passarem a noite. O mais próximo e mais acessível com o pouco dinheiro que conseguiram era um motel nos subúrbios da cidade. Desconsiderando os rangidos insistentes da cama com qualquer mínimo movimento e os olhares estranhos que receberam na recepção, a noite fora bem dormida.

Estava prestes a retornar em seu objetivo de acordar o amigo quando ouviu um barulho e virou-se. Tae estava sentado, mesmo que ainda com os olhos fechados, e lentamente puxava o lençol para se enrolar. 

"Ei, ouvi do recepcionista que o chuveiro tem água quente, não quer ir tomar um banho?" perguntou Hoseok, sentando-se na frente de Tae, que abriu os olhos devagar e sorriu. 

"Eu vou antes, estou congelando" comentou, deixando o amigo sozinho na cama e indo em direção à porta clara com os lençóis ainda enrolados em seu corpo magro. "O inverno já começou?"

Hoseok negou com a cabeça. "Não, mas não deve demorar muito para começar".

Enquanto Taehyung tomava banho, Hoseok, ouvindo os sons da água e o cantarolar baixo do anjo, arrumava alguns materiais que haviam conseguido do Mensageiro. No total eram quatro grandes malas, duas mochilas com livros, cadernos, lápis e outros materiais escolares diversos, e mais duas contendo roupas e objetos de higiene. 

Quando eles ouviram sobre a missão, imaginaram que teriam de seguir como qualquer outro anjo da guarda — silenciosamente e oculto. No entanto, lhes fora indicado que deveriam estar mais presentes nas vidas daqueles cinco garotos do que qualquer anjo já estivera. Por isso estavam indo a uma universidade, fingindo-se de alunos novatos.

Convenientemente, todos cursavam a mesmo área — eram amigos de faculdade, afinal —, o que tornava fácil na hora de cadastrar-se. Evitava a escolha aleatória das aulas para a aproximação. 

Hoseok havia acabado de verificar as duas bolsas quando Tae abriu a porta do banheiro, com os cabelos úmidos, uma toalha amarrada na cintura e outra sobre os ombros.

"Onde está a minha mochila de roupas?" perguntou, mas logo viu Hoseok arrumando-a e roubou da mão dele. Tirou algumas roupas escolhidas aleatoriamente e retornou ao banheiro. 

Não mais do que vinte minutos depois, os dois com suas malas chegavam na universidade que cursariam pelos próximos dias. Desceram do táxi completamente boquiabertos. 

O lugar era simplesmente enorme, até se assimilava a uma grande empresa. Tinha paredes azuis e brancas como a neve que em breve cairia, com diversas janelas pelos vários andares, e portas de vidro na entrada. Adentraram no prédio intimidados com a grandeza do ambiente. Hoseok aproximou-se da recepcionista e, hesitante, disse:

"Ahn... bom dia. Nós viemos confirmar a matrícula." 

A mulher atrás da bancada sorriu. "Chegaram alguns dias atrasados, já perderam três dias de aula. Tiveram uma longa viagem?"

"Sim, viemos de muito longe" Tae comentou, sorrindo. Hoseok suspirou, tornando a olhar para a mulher. 

"A matrícula já está pronta, tentamos avisar, mas não conseguimos contatá-los", explicou a recepcionista.

"Meu celular caiu de um lugar extremamente alto" Tae disse novamente. Deus, até quando ele ia fazer piadas com a situação deles?"

"Não tem problema", respondia ela. "O dormitório é subindo essa pequena ladeira, vocês já podem ir para lá e também amanhã para a aula neste edifício que estão agora. Vou apenas pegar as chaves, me aguardem aqui". Então, levantou-se e saiu. 

Hoseok, que estivera com os braços apoiados na bancada, virou-se para o amigo. 

"Você está adorando brincar com isso, não é?"

"É uma oportunidade única", riu o menino. "Mas... como vamos saber quem são os meninos da missão?" 

"Ah. O Mensageiro me contou quando você saiu para despedir-se dos outros. Ele disse apenas que... nós veremos."

"Bem vago, estou preocupado."

Antes que Hoseok respondesse, a mulher retornou, girando duas chaves no dedo. Entregou uma para cada e sorriu.

"Cuidado para não perdê-las."

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A ladeira que lhes fora ensinado a seguir era pequena e rápida, mas Tae reclamara durante todo o percurso sobre o quão estava cansado. 

Entraram no edifício e seguiram as instruções que pediram aos funcionários do local. Encontrando o dormitório masculino,  passaram os cartões na máquina que bloqueava a entrada de estranhos e subiram para o décimo andar. Os quartos eram divididos entre duas ou quatro pessoas, e Hoseok esperava pegar um com apenas dois. Como iria discutir sobre a missão com humanos a sua volta?

No entanto, assim que parou na entrada do quarto indicado na chave – 1004 –, ouviu conversas altas e suspirou. 

"Parece que teremos companheiros de quarto, Tae."

"Quanto mais, melhor. Sempre quis conversar com um humano". Ao contrário de Hoseok, ele estava animado com o que encontraria ali e afastou o amigo do caminho, passando a mão na maçaneta e abrindo a porta com um sorrisão no rosto. 

Não haviam duas pessoas ali, mas cinco. Cinco meninos aparentando idades semelhantes que jogavam cartas sentados no chão, gritavam e divertiam-se juntos.

"Ah, licença", Hoseok falou, baixinho, aparecendo atrás de Tae, tímido. 

Os olhares que receberam seguidos do silêncio deixaram os dois com calafrios na espinha. Mas logo um deles, um menino de cabelos negros presenteou-os com uma risada baixa.

"Querem se juntar a nós?"