Hoseok estava sozinho enquanto assistia o sol nascer, e o brilho dourado já surgia por trás das altas torres quadradas que ameaçavam as nuvens. Os outros anjos haviam partido para suas respectivas missões — anjos da guarda, da morte e da vida, os vigilantes etc — e agora o céu estava vazio. Ou quase, já que ele fora proibido pelos superiores de abandonar as nuvens naquela manhã.

Ele balançava as pernas soltas no ar, sentado na beirada de uma construção pálida totalmente abandonado. Não importava que o vento estivesse forte naquele dia, mesmo que caísse as longas asas se abririam para protegê-lo.

Em suas mãos, segurava uma pena negra. Ao focar naquilo que outrora pertencera a um anjo, os olhos lacrimejavam. Poder voar não tornaria a sua existência mais fácil, como muitos humanos acreditavam.

Mas um amigo talvez sim.

Assustou-se por não pressentir a chegada de outro anjo, um rapaz bonito de cabelos castanhos e sorriso contagioso colorindo o rosto. O anjo solitário enxugou as lágrimas discretamente.

"Por que está aqui tão sozinho?" perguntou a figura que se aproximava, logo sentando ao lado dele.

"Ah, Tae. Não o vi chegar."

"Ainda não respondeu a minha pergunta."

Hoseok soltou um longo suspiro antes de responder.

"Estou esperando os arcanjos, eles temporariamente me impediram de sair por causa da última missão. E você?"

"Ahn, dia de folga?" respondeu, fazendo o outro rir.

"Está tudo bem se não quiser me contar. Minha situação está feia, de qualquer forma. "

Tae não respondeu, pelo menos não de imediato, apenas pareceu entristecido ao ver o objeto entre os dedos magricelos do amigo. Descansou a cabeça no ombro de Hoseok e fechou a mão sobre a dele.

"Não chore pela pena caída, há milhares delas atrás de ti, sempre dando cobertura. Além disso, eu sempre estarei aqui, ao seu lado. Sou seu anjo, lembra?"

Hoseok riu, olhando para a cidade abaixo de seus pés. Fechou a mão sobre a do garoto.

"Você é a minha esperança."

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Os ponteiros tique-taquearam por meros segundos até que as batidas suaves das asas douradas de um arcanjo se aproximassem, anunciando que ambos deveriam segui-lo. Sem questionar, obedeceram.

O destino era, como esperado, o grande castelo onde sempre recebiam suas ordens. Entraram no palácio hesitantes, temendo o pior. Talvez suas asas fossem retiradas, ou ele seria banido temporariamente, ou ainda mandado para um cargo mais baixo.

No entanto, ao contrário de todas as coisas ruins que vieram à sua mente, ele foi recepcionado com um sorriso.

Estava diante do Anjo das Muitas Faces. A história daquele ser divino era belíssima, a maior inspiração para qualquer um que nascesse com um par de asas nas costas. O Anjo das Muitas Faces já fora humano. Mais especificamente, fora o primeiro e único humano a alcançar a pureza plena.

Já teve inúmeras formas humanas, e poderia ser conhecido por muitos nomes, estes que marcaram milhares de culturas diferentes, sempre ensinando algo inovador para a época e lugar. Sua mais conhecida encarnação, no entanto, era como Jesus.

Deus não se comunicava diretamente, Ele era uma certeza que os anjos tinham, mas não conheciam. Portanto, aquele que os recebera era o mensageiro do Senhor, o único que recebia e transmitia Suas mensagens.

"Não fiquem tensos" sussurrou o Anjo das Muitas Faces. Ele estava lendo um livro quando os meninos entraram no castelo. "Não os culparei pelo ocorrido, sei que também foram vítimas".

Hoseok não entendeu por que tivera tanto medo. Quando ergueu o rosto que teimara em manter curvado para o chão, e viu o sorriso que o Anjo dava ao abaixar a estória em que estivera entretido, todos os horrores de sua imaginação sumiram.

"Por que o proibiu de sair, então?" perguntou Taehyung, sendo direto e até indiscreto. Hoseok o lançou um olhar preocupado, falando sem palavras que não se conversava assim de modo tão desleixado com aquele ser em especial.

Então veio o som esplêndido da risada do Anjo. Ele se levantara de sua cadeira, e agora caminhava em direção aos dois anjos encrencados. "Não sejam tão formais assim. Não há necessidade."

Olhou de um para o outro, e em seguida falou, ainda com um sorriso estampado no rosto: "Não os proibi de sair porque estou ressentido com o que fizeram ou deixaram de fazer, mas porque tenho uma missão extremamente importante e preciso de vocês, especificamente".

Os dois anjos pareceram confusos.

"Por que nós?" Tae questionou-o mais uma vez. "Digo, há muitos outros anjos muito melhores e mais aptos do que nós dois".

Hoseok não disse nada, mas concordou com a cabeça. Sua mente estava recheada de pensamentos ruins, e agora estava sendo mandado para uma missão extremamente importante. Preocupava-se em não cumprir às expectativas do Mensageiro.

"Os outros são muito... anjos. Robóticos. Foram todos criados e ensinados desde o nascimento a como agir e ao que fazer pelos humanos. Eles são sérios e não deixam os princípios que aprenderam de lado, nunca. Hum.... como poderia explicar?" perguntava-se o Anjo, cruzando os braços e parecendo conflituado por um instante. "Já sei, estamos em um jardim. O jardim é belo, verde e tem um vento agradável, mas no centro dele há uma parede grande construída com tijolos que mostra todas as regras a serem seguidas, e uma delas é nunca ultrapassar o muro. Estão seguindo a lógica? Um anjo olharia apenas para a parede e obedeceria às ordens, e eu preciso de alguém com sentimentos, alguém que sinta o ar e as plantas, que saiba desviar da parede com um sorriso, e não olhar apenas para aquela direção".

"E... nós somos esse tipo de anjos?" Agora era a vez de Hoseok interrogar-se.

"Sim" respondeu o Anjo, ainda com a felicidade na face. Olhou para o Tae. "Preciso de alguém que tenha a alma de uma criança, que veja tudo como uma novidade, e saiba conversar com todos e ajudar qualquer um sem questionar ou julgar". Em seguida, virou os olhos para o Hoseok, com um olhar consolador. "E de alguém que já tenha enfrentado a crueldade e o egoísmo, que tenha experimentado do amor e conheça as consequências boas e cruéis dele. Mas, acima de tudo, saiba como ser forte".

Tae, instintivamente, colocou a mão no ombro do amigo. Sabia que as lembranças ruins deveriam estar retornando à sua mente, e sentiu que deveria protegê-lo de todas elas. Adiantou-se, para não fazer Hoseok pensar muito sobre as palavras do Anjo. "E qual a missão?"

"Há um grupo de jovens humanos que precisa de ajuda. São cinco garotos que terão um futuro horrível. Normalmente nós não temos a permissão de nos meter nas vidas humanas, mas vi o que acontecerá, e garanto que nos atingirá também." Agora o sorriso desaparecera de seu rosto, o assunto tornara-se sério. Olhando para os rostos assombrados daqueles que recebiam a missão, o Anjo continuou. "Preciso que desçam e se passem por humanos. Que os proteja e mude os pensamentos ruins. Que os salve das maldades e das más influências. Em outras, palavras, preciso que os salve. E que nos salve."