It's just a trick escrita por KCWatson


Capítulo 20
Sense




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Ele achou que uma traição de John ia me afetar o suficiente para me destruir?

Por algum motivo a frase surgiu enquanto observava seu parceiro. Sentados lado a lado na beira da cama, Sherlock sabia que nada seria como antes, que qualquer que fosse o plano mencionado no banheiro daquele bar ainda estava lá, inquietando os olhos e assombrando a mente de John. Era obvio que o Detetive se arrependia de ter dito aquela frase, magoando-o novamente com uma espontaneidade que servia como sua defesa. Devia ter notado antes o quanto a situação afetava o parceiro de uma maneira desconhecida e inesperada, e que seu foco deveria ser o caso e não unicamente a lealdade de John.

Foi pensando sobre isso que impediu o médico de se levantar, segurando sua mão e buscando seus olhos.

― Algum problema? ―  John questionou confuso.

― Quero apenas deixar claro... Sei que ainda esconde seu plano de mim ― Sherlock revelou inexpressivo.

― Sherlock, não há plano nenhum além daquele que já conhece.

― Sei que não o conheço por completo.

O médico ficou em silêncio, mas Sherlock não queria lhe dar a chance de fugir... tampouco exigiria mais do que já tinha no momento.

― Qualquer que seja esse... maldito plano... Estarei ao seu lado ― garantiu com firmeza.

John ergueu as sobrancelhas, surpreso com o que ouvia, e hesitou. Sherlock sabia que o parceiro estava cogitando alguma maneira de sair do assunto, então insistiu:

― Não me faça de idiota, John. Por favor.

― Se soubesse de tudo... ― John finalmente falou. ― Jamais estaria ao meu lado.

Sherlock se surpreendeu com as palavras, determinadas e quase rudes, carregando uma certeza assustadora.

― Como pode dizer isso? ― Sherlock respondeu tentando não soar completamente ofendido. ― Olha o que já fez comigo, o quanto escondeu e quem sabe até o quanto me colocou em perigo... e eu ainda estou aqui, tentando entender o seu lado, os seus motivos.

― Não imagina o tamanho da verdade nessa frase, Sherlock ― John respondeu fugindo do seu olhar. ― Não tem ideia...

― Você se arrepende?

John piscou repetidas vezes e sacudiu a cabeça, negando:

― Não, tudo foi necessário.

― Então precisa seguir em frente ― Sherlock devolveu com determinação.

O médico suspirou trêmulo, como se tivesse pensamentos demais para conter. E Sherlock notou, novamente, a hesitação e aflição nos olhos claros e se perguntou se deveria mergulhar naquela confiança cega que sempre reprimia, ajudá-lo sem conhecer os fatos, ignorando sua desconfiança e seus ideais que o faziam ser racional.

Não, nem mesmo o parceiro gostaria disso.

Repentinamente o olhar de John se tornou determinado, livrando-se da hesitação anterior. Sherlock franziu o cenho notando a diferença.

― O que foi?

― Acha que o Greg consegue trabalhar sozinho hoje?

― Acho que ele nunca consegue.

― E você consegue andar?

― Por quê? ― Sherlock questionou desconfiado.

Em resposta John apenas riu suavemente e se levantou, puxando-o pela mão e o forçando a andar.

― John? ― Sherlock questionou confuso enquanto saiam do quarto e iam em direção às escadas. ― John, onde estamos indo?

John parou na porta e o olhou, sorrindo despreocupado antes de certificar:

― Você confia em mim, certo?

― Não deveria, mas sim ― Sherlock respondeu sem hesitar.

― Então confie em mim e não faça perguntas ― John insistiu antes de selar seus lábios rapidamente e recomeçar a andar, puxando-o no processo. ― Só vou te mostrar um lugar especial.

Sherlock se sentiu tentado a impedi-lo, forçá-lo a parar e perguntar para onde, exatamente, iriam naquele momento. Queria motivos, detalhes, caminhos, respostas que não o deixariam no escuro depois de tudo o que vinha acontecendo com e ao redor dos dois. No entanto, a determinação do parceiro o fazia perder a coragem para fazer qualquer outra coisa além de se calar e segui-lo, mesmo com a ferida na perna o atrapalhando um pouco. Era uma determinação incomum, quase aliviada, como se, pela primeira vez, John estivesse ansioso para fazer algo que realmente queria.

Então mesmo quando entraram em um carro aparentemente desconhecido, onde John assumiu o volante e sua mente gritou exigindo seu direito de questionar, Sherlock permaneceu calado. Assim como no resto do caminho. Tentava não olhar para o outro, mas ainda quando seus olhos estavam distraídos com o cenário fora do carro, sua atenção ainda estava presa no mesmo. Sua mente tentava criar situações onde aquela nova informação se tornava comum e sem importância, mas o Detetive não conseguia parar de pensar se aquele carro sempre estivera do outro lado da Baker Street e se John o usava com mais frequência.

Sherlock estava começando a classificar a si mesmo como um grande idiota e isso ultrapassava qualquer um dos seus limites pré-determinados.

― Estamos chegando ― John anunciou em um certo momento.

Suspirou, olhando ao redor de forma inquieta. Observou as casas simples e as ruas quase vazias de Luton, uma cidade ao norte de Londres, perguntando-se o motivo de estarem ali. Não sabia se John tinha algum conhecido morando na cidade que, na visão do Detetive, deveria ser igualmente desconhecida por ambos, mas considerando tudo o que vinha acontecendo, não descartaria a possibilidade de estar se aproximando de mais um segredo do parceiro.

A contragosto concluiu que isso ainda o irritava. Na verdade, odiava o fato de John ser tão bom em guardar segredos... ou era Sherlock que estava muito distraído para descobrir sozinho? De qualquer maneira, como não conseguia mais ser indiferente à situação, o Detetive precisava encontrar um modo mais eficiente de conseguir respostas, visto que suas deduções e confiança em pistas soltas não estavam sendo mais do que meramente aceitáveis.

― Chegamos.

Parando de divagar, Sherlock saiu do carro junto com o parceiro, remexendo os dedos das mãos de forma inquieta. Não mais do que alguns segundos depois, uma mulher de cabelos castanhos e sorriso amplo surgiu na porta, logo em seguida uma garota, de cabelos loiros e roupas sujas com pequenas manchas de tinta, saiu correndo da casa e pulou no colo de John, compartilhando sorrisos e um abraço que parecia ser esperado há muito tempo.

Sherlock não conseguia deixar de prestar atenção no sorriso do seu parceiro, aberto e luminoso, fazendo-o concluir mais do que qualquer informação clara faria. Podia não saber quem exatamente eram aquelas pessoas, mas com aquele sorriso sabia da relação que possuíam. Eram família.

    ― Essa é minha sobrinha, Julienne ―  John apresentou ainda sorridente com a pequena garota nos braços. ― Julie, diga oi para o Sherlock.

    A menina, que não aparentava ter mais do que sete anos de idade, concordou animadamente com a cabeça e saiu dos braços de John para ficar em frente ao Detetive.

    ― Oi, tio Sherlock. O tio John falou muito sobre você, disse que é muito esperto, mas eu queria saber-

    ― Julie ― a mulher de cabelos castanhos repreendeu ao se aproximar. ― Sobre o que conversamos?

    ― Perguntas depois ― Julie respondeu revirando os olhos e se virando para voltar para dentro da casa. ― Sim, mamãe.

     A mulher sorriu satisfeita e finalmente o olhou. Sherlock quase recuou com a surpresa de reconhecê-la sem nunca terem se encontrado antes. Sendo honesto com sua própria consciência, reconheceu os olhos.

    ― Finalmente estou conhecendo o famoso Sherlock Holmes ― a mulher falou lançando um rápido e sugestivo olhar a John, que apenas deu de ombros. ― Aposto que ele nunca falou de mim antes.

    ― John já comentou sobre você, eventualmente ― Sherlock respondeu da forma mais gentil que conseguiu. ― E apesar de nunca nos encontrarmos antes, posso reconhecê-la pelos olhos. São idênticos ao do seu irmão. É um prazer conhecê-la, Harriet.

    ― O prazer é todo meu, Sr. Holmes.

    ― Apenas Sherlock, por favor.

Harriet esboçou um sorriso malicioso e lançou um olhar ainda mais malicioso a John que praticamente se encolheu pelo constrangimento.

― Agora vejo porque meu irmão comete tantos atos loucos por você, Sherlock ― ela comentou em tom similar.

― De quais atos loucos você está falando, exatamente? ― Sherlock perguntou, olhando-a com atenção.

― Por que não entramos logo? ― John interrompeu energético. ― Clara deve estar esperando.

Harriet riu enquanto os acompanhava para dentro e de repente Sherlock estava ansioso pelas oportunidades que aquela visita lhe proporcionaria. Não era exatamente um segredo, mas estava diante de uma fonte confiável de informações sobre seu parceiro, nunca se perdoaria se perdesse essa chance.

― Vocês moram aqui há muito tempo? ― perguntou assim que entrou, observando a decoração simples e um pouco desorganizada da sala.

― Nos mudamos recentemente.

― Proteção?

― Confiança ― Harriet corrigiu enquanto trancava a porta. ― Não entendo muito do que está acontecendo, nem tenho ideia, mas se meu irmão diz que é perigoso, então é perigoso.

Sherlock engoliu em seco, sendo verdadeiramente atingido pelas palavras da Watson mais velha. Tratava-se daquela confiança cega que ele sempre cogitava, mas nunca tivera antes, nem com um parente e muito menos em John, mesmo o parceiro sendo a pessoa mais próxima que já tivera em vida.

― Harry? ― uma mulher chamou saindo da cozinha. ― Eles chegaram?

― Sim, Clara, eles finalmente chegaram ― Harriet respondeu afastando alguns caixas do sofá de dois lugares. ― Por favor, sentem-se antes que ela decida nos arrastar pra cozinha. Eu não aguento mais cozinhar e comer.

― Eu ouvi isso! ― Clara resmungou exasperada jogando um pano de prato na outra. ― Não me culpe por querer um hobby como distração.

― Não culpo, mas insisto que você pode cozinhar sozinha às vezes.

Clara revirou os olhos e finalmente se virou para as visitas.

― Por que você ficou com todo o romantismo da família, John? ― brincou fingindo seriedade. ― Enfim, o que traz vocês aqui? Anúncio ou problema? Eu posso fazer cookies recheados pra comemorar e aprendi a fazer um bolo de casamento delicioso.

Sherlock lançou um olhar confuso para John que já adquiria um tom avermelhado nas bochechas.

― Clara, pelo amor de Deus ― John limpou a garganta, constrangido mais uma vez. ― Eu e Sherlock não vamos casar.

Imediatamente resmungos cansados e decepcionados puderam ser ouvidos, as duas mulheres os olharam com descrença e Harriet jogou a cabeça para trás como se não aguentasse mais ouvir aquelas palavras. Sherlock sentiu o rosto esquentar com a reação tão espontânea e inesperada.

― Retiro meus cookies então, vocês não merecem mais do que um chá e sem açúcar ― Clara resmungou lhes dando as costas e voltando para a cozinha.

― Aquela, como já deve notar, é Clara Watson. ― John sussurrou ainda envergonhado. ― Ela casou com Harriet cerca de três anos atrás.

― Mais corajosa que você ― Harriet implicou se jogando na poltrona próxima da janela.

― Harriet!

Sherlock segurou o riso enquanto observava a interação entre os irmãos, nova em seus olhos. Obviamente a implicância com o casamento não era rara e não se limitava à sua presença, o que criava uma certa verdade nas palavras que tanto deixavam John corado. As Watson realmente esperavam um casamento entre eles e Sherlock não conseguia decifrar o que realmente sentia em relação a isso.

Deveria ficar com raiva ou sentir alguma repulsa?

― Se não é anúncio, então qual é problema dessa vez? ― Harriet questionou indiferente.

― Não tem problema nenhum, Harry ― John respondeu aparentando cansaço. ― Só achei que, depois de tudo o que aconteceu, estava na hora do Sherlock conhecer vocês.

Foi nesse momento que Sherlock teve certeza de que ter uma conversa com Harriet seria mais do que vantajosa, seria esclarecedora para ambos os lados, porque o olhar da Watson ao ouvir a resposta do irmão expressava muito mais que preocupação espontânea, havia também irritação e impaciência. Aparentemente as palavras de John não foram completamente usuais ou comuns e Harriet encontrara nelas um bom motivo para se preocupar, mas estava claro que não conhecia todas as informações e isso a irritava.

Sherlock adorava a transparência dos Watson e agora agradecia por pelo um deles ter se mantido assim.

― Aqui está o chá ― Clara anunciou voltando à sala e colocando a bandeja sobre a pequena mesa de centro. ― Engasguem-se.

― Vocês realmente não aprendem... ― John murmurou enquanto servia uma xícara ao parceiro.

― Está perdendo a oportunidade de se engasgar em outra coisa agora, então é você que não aprende ― Harriet rebateu displicente.

O chá oscilou nas mãos de John e acabou derramando sobre a mesa. Ele rapidamente desistiu do ato e se afastou com o rosto vermelho.

― Eu disse que você tinha ficado com todo o romantismo da família, John ― Clara murmurou com diversão.

― E ele nem é tão romântico assim ― Sherlock se arriscou a dizer, ganhando um olhar incrédulo do médico. ― O quê? É verdade.

Incapazes de se controlar ainda mais, Harriet e Clara se entregaram às gargalhadas até começarem a ficar sem ar e, pela primeira vez, Sherlock não se preocupou com a fidelidade dos fatos à realidade e muito menos com seus significados. E daí se elas insinuavam tanto sobre o relacionamento deles? Qual era o problema se ambos ficavam constrangidos com o que, supostamente, não queriam enxergar? As Watson se divertiam e, melhor, era a primeira vez que não tinha a sensação de que John tentava se esconder atrás de alguma máscara.

― Tio John! ― Julie exclamou quando entrou correndo na sala.

Por um momento Sherlock achou que havia algo errado, até ver a criança pular sobre o colo de John e lhe entregar um papel manchado, manchas que o Detetive logo percebeu se tratarem de uma pintura. Isso explicava os resquícios de tinta nas roupas da garota.

― O que temos dessa vez? ― John questionou, amável.

― A Rainha Má e o Pequeno Príncipe, mas preciso de ajuda pra desenhar a Alice e o senhor prometeu que me ajudaria.

― Você está ficando tão exigente quanto suas mães, sabia?

― Vá, John ― Sherlock interferiu servindo chá a si mesmo. ― Ela não tem muitas oportunidades para pedir isso.

John ponderou por um momento, fitando-o, e logo em seguida suspirou, cedendo ao pedido.

― Tudo bem ― concordou levantando do sofá. ― Onde estão as tintas?

Como se tivesse acabado de ganhar o melhor dos presentes, Julie gritou com animação e o puxou para o andar de cima o mais rápido que conseguiu. Sherlock poderia dizer que era uma cena adorável se não estivesse mais focado no que tinha acabado de conseguir.

A oportunidade de conversar com Harriet.

Visivelmente não era o único preparado. Quase imediatamente Clara trocou um olhar cheio de significados e avisos com a esposa e saiu. Deixando-os sozinhos.

― Sei menos do que imagina ― Harriet se adiantou neutra. ― Então acho que não vou ser muito útil.

― Comece me dizendo o motivo de tanto medo ― Sherlock incentivou. ―  Vi como olhou para o seu irmão. Pode não ter certeza, mas você tem uma ideia do que pode dar errado no plano dele.

― Conversei com seu irmão, Mycroft, sobre tudo o que aconteceu e sobre os... crimes. Muita coisa pode dar errado nisso que eles chamam de plano. É um contrato de morte. E o que mais me irrita é que John está bem ciente de tudo isso.

― E o que você sabe sobre o plano?

― Eu sei que ele vai se arriscar até onde for possível e então vai tentar fazer o impossível se tornar possível. Mas o objetivo é bem simples, na verdade.

― Capturar Moriarty?

― Matá-lo ― Harriet corrigiu sóbria. ― E dar o mesmo fim a qualquer um que esteja ajudando.

Um vinco se formou entre as sobrancelhas de Sherlock, que suspirou pesadamente antes de responder.

― Isso não faz sentido, Harriet. John não é um assassino e nunca se tornaria um por minha causa sem um grande motivo.

Harriet suspirou e esboçou um sorriso triste. Sherlock se ergueu aflito, compreendendo.

― Ele não fez isso por mim, não é?

― Com todo o respeito, Sherlock, mas é incrível como uma pergunta mostra o seu egoísmo ― Harriet respondeu, permissiva. ― Na sua cabeça é sempre com ou sem você, nunca você e mais alguém. É tão difícil imaginar que, fora das paredes daquele apartamento, John possui mais alguém na vida? Alguém tão importante quanto você, talvez mais importante... mas ainda assim, sabe, sem excluir você?

― Nunca quis ofendê-la, Harry. Sei o quanto você é importante para o seu irmão, assim como sua família ―  Sherlock se apressou em responder.

― O engraçado é que não estou falando de mim... ou da minha família.

Sherlock prendeu o ar nos pulmões, questionando sua linha de pensamento.

― Você está dizendo que... John-

Uma risada no andar de cima chamou a atenção de ambos, sinalizando que logo não estariam mais sozinhos. Harriet espiou a escada para garantir que ninguém se aproximava e subitamente se levantou e agarrou as mãos do Detetive, puxando-o para mais perto.

― Não estava no roteiro, mas posso dar um conselho? ― sussurrou com urgência. ― Pare de ser tão previsível.

― Previsível? ― Sherlock questionou confuso. ― Não sou previsível.

― Sim, você é. Não para mim ou para a polícia, mas John conhece quase todas as suas reações e já consegue calcular aquilo que não conhece. Os seus gostos, seus métodos, sua organização, sua visão do mundo, apesar de excêntricos e complexos, raramente mudam, certo? É impossível para mim, alguém tão distante, entender essa sua cabeça maluca, mas John está com você há anos, mais perto do que qualquer um. Não o subestime, Sherlock, meu irmão pode ser um idiota, mas aprende rápido.

― Acha que é assim que ele consegue me enganar?

― Depende ― Harriet pensou por um momento antes de completar. ― John sempre disse que você se mete em problemas com facilidade, que é seu vício.

― O meu trabalho é solucionar crimes ― Sherlock argumentou. ― Não farei isso sentado em um escritório.

― Então você investiga tudo ao seu redor, certo? John também me disse que você é capaz de descobrir qualquer coisa sobre qualquer um, mas que não se importa com o perigo.

― O perigo faz parte-

― Isso significa... ― Harriet o interrompeu vigorosa. ― Isso significa que se houvesse um caso perigoso e eu quisesse manter você seguro... bastaria não contar sobre ele? Você não sabe do caso, então não se mete em problemas.

Sherlock observava a mulher com extrema atenção, notando o aperto forte de suas mãos e os sussurros urgentes, como se não tivesse tempo suficiente para colocar em palavras tudo que se emaranhava em sua mente. Ainda não sabia exatamente até que ponto ela queria chegar, mas precisava negar o obvio.

― Não... Harriet, eu descobriria. Posso não ter notado o envolvimento de John no caso atual, mas notei o caso. É algo grande e abrangente demais para ser silencioso.

Harriet respirou fundo e mordeu os lábios, pensativa. Então, subitamente, arregalou os olhos e se voltou para ele.

― E se houvesse uma distração?

― Se há uma distração, então não está funcionando. Estou mais focado depois de tudo o que aconteceu ― Sherlock assegurou.

― Mas e se o caso for uma distração?

Sherlock ergueu uma sobrancelha, atordoado pela primeira vez.

― Um caso para me distrair de outro caso?

― Pode ser algo menor, não acha? Um problema, um crime, um simples segredo ― Harriet sugeriu prestativa.

Sherlock ficou sério. Não era uma ideia incomum, tampouco absurda. Distração sempre fora a forma mais comum e tradicional de fuga, a melhor opção quando se queria esconder algo. Mas como fariam isso? O que seria tão importante para justificar tantos crimes?

― Mycroft me contou que Moriarty esperava uma traição de John, que ele traísse você ― Harriet continuou. ― Mas eu conheço meu irmão, ele nunca faria isso.

― Acha que John é o motivo de tudo isso? ― Sherlock indagou cético. ― Harriet, ele pode não ter trabalhado contra mim, mas me escondeu provas-

― Ok, já sei. E tudo isso fez você desconfiar dele, certo?

Um novo barulho os interrompeu. Julie falava alto sobre um desenho qualquer e a voz se aproximava.

― Onde quer chegar, Harriet? ― Sherlock apressou.

Harriet engoliu em seco e abaixou o tom de voz, respondendo:

― E se o responsável que você procura não for Moriarty?

― Está falando do seu irmão? ― Sherlock refutou, incrédulo. ― Ele não cometeria tantos crimes.

― Pode ser mais complicado do que parece. Ele pode não ser o assassino que você procura, talvez não seja um único assassino... Ou você já encontrou provas que mostram uma ligação entre todas as vítimas?

Com a resposta negativa, Sherlock ficou em silêncio. Começava a compreender onde Harriet queria chegar e se surpreendeu ao perceber que estava começando a concordar com tais conclusões. Pensar em distrações era fácil, alguém se aproveitando de uma situação causada por um outro alguém. No entanto, como procederia se fosse mais complicado que isso? John poderia ser o assassino, mas também poderia ser apenas aquele que se aproveitava da situação para distrair outra pessoa, no caso, o próprio Detetive e assim conseguir manter a salvo qualquer que fosse o segredo.

Entretanto, ainda havia um problema.

― Se John é, de alguma forma, responsável por qualquer um desses eventos, então está planejando muito mal ― respondeu tentando argumentar. ― Nunca desconfiei tanto dele quanto agora. Cada conversa que temos me faz pensar sobre o quanto ele pode me enganar, esconder fatos importantes. Me faz questionar sua lealdade desde o princípio.

― E como um bom amigo sociopata altamente funcional, você fica desconfiado e se afasta, deixando-o sozinho ― Harriet retorquiu convicta. ― E aí está o objetivo.

E aí estava, mais uma opção na lista de Sherlock. John usando a distração para gerar desconfiança. Porque talvez, só talvez, a única forma de mantê-lo a salvo, era mantê-lo longe de John Watson.


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