It's just a trick escrita por KCWatson


Capítulo 19
Impulsive


Notas iniciais do capítulo

Pra quem não entendeu muito bem o capítulo anterior, calma, que Sherlock um dia vai ter que entender também



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Sherlock não abriu os olhos de imediato. Seu corpo doía inteiramente, como se estivesse inegavelmente esgotado. Tentou pensar com mais calma, lembrar do motivo de seu corpo reclamar tanto a cada tentativa mínima de movimento, mas nenhuma resposta plausível surgia em sua mente inesperadamente mais lenta. Houve algum problema no caso? Fora atacado? Sofrera algum acidente um pouco mais sério?

Nada, nenhuma resposta. Suas lembranças acabavam enquanto lia seu caderno de anotações, como podia ter saído disso para essa dolorosa inércia?

Ei, espera aí!

Se pudesse teria franzido as sobrancelhas. De quem era aquela voz e da onde vinha? Parecia tão próximo e simultaneamente tão distante. Seria Lestrade?

Não pode me pedir algo assim e sair andando como se fosse algo completamente normal!

A consciência finalmente estava retornando completamente ao seu corpo e agora podia ter certeza de que a voz pertencia ao Inspetor.

― Não podemos falar sobre isso aqui.

Precisou de um esforço maior para não reagir ao escutar a voz de John, sussurrada e repreensiva como se estivesse comentando algo que não deveria ser dito em voz alta. No momento compreendeu que estava em casa, provavelmente deitado em sua própria cama. Pronto, agora entendia um por cento do que estava acontecendo.

― Ele está dormindo há horas, por favor! Não invente desculpas para fugir ― Lestrade rebateu irritado.

― Sherlock finge preocupação muito bem, fingir estar dormindo deve ser brincadeira de criança.

Quis sorrir por John estar mais atento aos seus métodos e trejeitos, mas o mesmo fato deixou uma sensação estranha na boca do seu estômago. Reconhecia que algumas vezes fingia quando necessário, aproveitando-se do lado sentimental das pessoas e principalmente do parceiro, mas nunca quis que o outro pensasse que tudo não passava de fingimento.

― Que se dane, ele escutaria de um jeito ou de outro se estivesse acordado. Não posso fazer isso John! Nem pensar! ― Lestrade exclamou indignado.

― Fale baixo, pelo amor de Deus! ― John pediu desesperado ― Se Sherlock ouvir tudo vai ser em vão!

― Não pode me pedir isso ― Lestrade voltou a argumentar sussurrando ― Eles vão me odiar, eu vou me odiar!

― Ninguém vai odiar ninguém ― John garantiu no mesmo tom ― E não temos outra escolha, eu só vou ter a nova senha e a localização algumas horas antes, não vou conseguir fazer nada sem que Moriarty perceba. Greg, não podemos perder essa chance, quando chegar a hora certa você vai ter que fazer isso.

Escutou passos mais pesados e logo Lestrade voltou a falar, parecendo indignado:

― Escuta, eu não posso sair atirando... você sabe! Não posso fazer nada disso se não me explicar exatamente o que está acontecendo John e estou falando muito sério.

― Greg, você não-

― Não me venha com essa história de que é perigoso! Sherlock pode ser cego, mas você é meu amigo e eu sei reconhecer quando um amigo está mal. Olhe pra você, John! Está mais magro e tem tantas olheiras que parece estar de plantão no hospital há dias, sem mencionar aquela sua recaída no pub...

― Shh, não fala isso tão perto dele! ― John o interrompeu, então houve passos apressados e novamente a voz de John, dessa vez mais longe. ― Foi apenas um mal-estar.

― Um mal... um mal-estar? ― Lestrade retorquiu descrente. ― Na última vez que estive aqui você quase desmaiou na minha frente e no pub, o modo como Mycroft te olhou mostra que é mais frequente do que imagino, então não me venha com mal-estar. Eu não sou idiota e estou cansado de só assistir vocês dois se destruírem!

― O quê? Você e a Molly combinaram uma revolta ou algo assim?

― Estamos apenas preocupados, é difícil aceitar isso?

Houve um silêncio que para Sherlock era insuportável. Podia ouvir seu próprio coração batendo com força e a vontade de abrir os olhos aumentava cada vez mais. Queria ver, queria olhar para John e questionar o que significava tudo o que acabara de ouvir, queria prendê-lo em algum lugar e exigir por explicações, assim como também queria simplesmente fugir com ele. Deixar tudo para trás.

― Eu prometo que um dia você saberá de tudo, logo, mas antes... antes precisa me ajudar, vai ser muito mais difícil sem você ― John garantiu veementemente. ― Quando a hora chegar, por favor, apenas... apenas faça.

Um novo silêncio onde Lestrade, provavelmente, pensava no que responder e logo Sherlock quase não conseguia mais suportar estar parado, fingindo que um plano não se montava bem ao seu lado e sem sua participação.

― Tudo bem... ― Lestrade concordou contrariado. ― Deus, vou me arrepender disso. Sherlock vai me torturar, Mycroft nunca mais querer olhar na minha cara.

― Não se preocupe com isso ― John forçou um sorriso. ― Quando tudo acabar, eles vão entender.

Sherlock esperou os passos se afastarem e o silêncio voltar a dominar o quarto para então arriscar abrir, minimamente, os olhos. Confirmando que estava sozinho, finalmente cedeu às suas vontades e lentamente se ergueu. Até onde podia ver não estava ferido e seu corpo respondia bem, apenas a dor insistia em continuar.

Não vou conseguir fazer nada sem que Moriarty perceba.

A voz de John voltou a intrigá-lo enquanto se sentava, empurrando as pernas para fora da cama. Imediatamente se lembrou da conversa que teve com o médico e o irmão no banheiro do pub. Agora sabia que John se aliara a Moriarty por causa de Harriet, que havia vidas em risco e que tentara traí-lo por um bem maior, mas até que ponto ia os esforços de John? Até onde fora aliado de Moriarty? E o plano ainda estava de pé? A última pergunta era a que mais o preocupava, afinal, Harriet e a família estavam seguras, mas ninguém lhe disse sobre um ponto final.

Na verdade, nada do plano foi explicado em detalhes porque logo depois houve a briga entre A Mulher e em seguida John decidiu seguir caminho com Lawrence.

Quantos dias se passaram desde então?

O barulho da porta se fechando no andar de cima chamou sua atenção. John e Lestrade estavam discutindo mais uma vez? Disposto a descobrir mais do que estava acontecendo, ergueu-se com cuidado e imediatamente notou que sua primeira conclusão estava errada. Estava, de fato, ferido. Havia um curativo relativamente grande em sua perna, marcando a calça que estava usando, mas não se lembrava a causa do ferimento. Mesmo confuso seguiu andando, qualquer resposta era válida e se ninguém lhe esclarecia nada, então descobriria sozinho.

Abriu a porta o mais silenciosamente que conseguiu e saiu do quarto, esforçando-se para não mancar e não fazer qualquer barulho. Como esperava, a cozinha e a sala estavam vazias, então continuou sem caminho até às escadas que dava acesso ao quarto de John, de onde já podia ouvir algumas vozes baixas.

Mas ainda precisava estar um pouco mais perto.

Sherlock arrastou os pés pelo corredor cautelosamente, o quarto de John nunca pareceu tão distante, mas as vozes quase compreensíveis não o deixavam desistir e ignorar sua curiosidade.

― Você prometeu que o protegeria! ― a voz de John se tornou clara e irritada.

Aproximou-se apenas mais alguns centímetros e parou completamente. Não arriscaria ser ouvido. Do que John estava falando? A quem se referia?

― O que pensa que está falando, Doutor Watson? ― Mycroft rebateu ácido. ― É do meu irmão que estamos falando, não preciso de uma promessa para protegê-lo.

Um finco se formou entre as sobrancelhas de Sherlock. O que Mycroft fazia ali? Não havia mais trabalho ou Rainha que o deixasse ocupado demais para seguir John onde quer que fosse? E por que ambos discutiam sobre sua proteção? O que havia acontecido?

― A culpa é minha, não é? ― a voz de John se tornou amargurada, fazendo o detetive franzir o cenho.

Como John poderia ter culpa em qualquer coisa? Sherlock sabia que uma irritante ausência de memória estava cegando suas conclusões, mas não compreendia o que poderia ter acontecido e como o médico poderia estar envolvido a tal ponto de se sentir tão culpado.

Houve um silêncio momentâneo até Sherlock escutar som de passos leves que o fizeram recuar minimamente, então Mycroft voltou a falar. Mais calmo e mais gentil.

― Tudo bem John... escute-me com atenção.

Franziu o cenho ainda mais, repentinamente seus pensamentos ganharam outro rumo. Seu irmão agora parecia estar tão próximo quanto John, facilmente arriscaria dizer que estavam praticamente no mesmo lugar. O que ainda não havia concluído da relação entre os dois? Desde quando Mycroft suportava a proximidade de alguém?

― Não posso isentar sua culpa, mas garanto que a falha foi de ambas as partes.

― Precisamos contar, Mycroft ― o médico pediu em tom suplicante. ― Tem que haver um jeito...

― Não estamos prontos, John, não podemos arriscar ― Mycroft interviu.

Sherlock engoliu em seco, sentindo um gosto azedo contaminando sua boca. Seus pensamentos estavam tomando um rumo correto? Seu irmão e seu melhor amigo estavam mesmo escondendo um segredo? Compartilhando o mesmo segredo? Talvez, um relacionamento? De onde vinha mesmo essa aproximação?

Está apaixonando, irmão?

Por que, de repente, está interessado em John?

Não acha que está passando muito tempo com ele? Pelo o que sei, John é meu amigo, não seu.

As lembranças de quando fizera essas perguntas insistiam em voltar, mas Sherlock sacudiu a cabeça tentando espantar suas dúvidas.

― Preciso contar a ele ― John insistiu com mais determinação.

― Não, John! ― Mycroft exclamou antes de voltar a baixar a voz. ― Pense um pouco, Sherlock não vai reagir bem.

― Tenho certeza disso, mas não vou conseguir esconder dele por muito tempo! Nossa aproximação repentina, eu saindo às escondidas, Moriarty dando indiretas. Qualquer dia desses ele vai descobrir da pior maneira.

― E quando isso acontecer eu estarei lá para impedir um desastre.

― Ora, Mycroft, o errado sou eu, com certeza não tentarei nada contra ele e sei me defender sozinho.

― Você sequer vai tentar.

― Obviamente ― John riu sem humor.

Mais silêncio e Sherlock teve absoluta certeza de que não nascera para escutar nada escondido daquele jeito, não importava quantas tocaias feitas lhe mostrassem o contrário. Precisava se mover, falar, questionar, chacoalhar John e perguntar o que infernos estava acontecendo.

― Logo isso tudo vai acabar, aguente um pouco mais ― Mycroft voltou a falar. ― A conversa que tivemos naquele banheiro... com Sherlock-

― Foi muito arriscada ― John o interrompeu, sério.

― Foi necessária ― Mycroft corrigiu. ― Mesmo não sabendo tudo ou entendendo... Sherlock vai ajudar.

― Como pode ter certeza de que ele vai ajudar da maneira que espera? Eu sempre estive lá por ele, mas não significa que o contrário seja verdade.

― É claro que significa. Meu irmão pode ser tudo, mas não é injusto... pelo menos não com você.

― Não é o que parece nos últimos dias... ― John comentou soando magoado.

― Aquilo no pub foi apenas ciúmes, Lawrence foi demais para todos nós.

― Mike...

― Sherlock ama você, John ― Mycroft revelou subitamente, em tom cansado. ― Ele ama você como eu...

― Como você... ― John incentivou subitamente interessado e quando recebeu apenas o silencio do outro, completou ― Disse que falaríamos sobre isso um dia.

― Não hoje, definitivamente. Ainda nos vemos a noite?

― Hoje não, Sherlock precisa de mim.

― Meu irmão já passou muitas noites sem você e em pior estado, pode passar mais algumas.

― Mycroft, por favor.

― Esteja na minha casa amanhã, sem falta.

Apressadamente Sherlock recuou ao ouvir o barulho de passos novamente, sentindo seu coração bater mais forte do que o esperado e tendo certa dificuldade de respirar. Afastou-se do quarto e desceu as escadas, um pé atrás do outro, temendo chamar a atenção do irmão, então, assim que viu a possiblidade, adiantou-se para dentro do quarto. Deitou-se em sua cama sentindo sua coxa esquerda latejar por causa do ferimento.

Sacudiu a cabeça e deixou seus ombros subirem e descerem com o esforço para respirar normalmente. Nunca pensou que imploraria pela normalidade, mas queria que tudo tivesse um fim, queria sair dali, queria voltar a ter os mesmos e simples problemas que tinha com seu parceiro, mais que tudo... queria paz.

Era muito o que pensar e muito o que decidir, sendo que tudo tinha um risco alto demais para arriscar sem um bom motivo. Com tudo o que aconteceu, tudo o que ouviu e o que lhe foi mostrado, confiar em John era mais do que insensato, era estúpido. No entanto, a confiança podia existir pelos mesmos motivos. Claramente havia mais segredos do que imaginava ou suspeitava e ainda sim havia a sinceridade em cada palavra do amigo, cada ação. Ambos já arriscaram suas próprias vidas um pelo outro, incontáveis vezes e por anos, uma confiança e uma afinidade fora criada tão intensamente que se tornava impossível decidir, simplesmente, que nada disso podia existir ou que existira em vão. Sherlock sabia, com plena certeza, que jamais criaria tal vinculo novamente e que nada semelhante existiria com qualquer outra pessoa que não fosse John.

E isso o destruía internamente. Não pelo fato do vínculo existir, não, tentara lutar contra isso por anos e precisou de muito tempo para finalmente admitir seu fracasso, admitir a existência de um sentimento do qual não podia escapar ou ter controle. O problema estava na mais simples verdade: ter um vínculo tão forte com John não extinguia a desconfiança, muito pelo contrário, a desconfiança queimava tão forte quanto qualquer outro sentimento.

E isso o enlouquecia.

Lembrava-se bem do momento em que concluiu que John e Moriarty compartilhavam mais do que o mesmo ambiente, que havia segredos e uma traição, ainda sentia a raiva palpitar em ao lugar, mas então... Revivia o beijo, a sensação quente em seu peito, das mãos o apertando, do seu desespero em adiar o fim, revivia o medo, o medo que sentira ao ver John caído no chão depois de ser atropelado. Não conseguia esquecer o sangue, o temor, a sensação agradável que o inundou ao beijá-lo e a ânsia de repetir o ato.

Parecia que os sentimentos ditos como bons e agradáveis eram diretamente proporcionais aos ruins. Isso era loucura! Não era um expert em sentimentalismo, mas como algo assim podia ser possível? Como podia confiar e desconfiar tanto de uma pessoa na mesma vida? Parecia que sua mente estava dividida ao meio e ambas as partes lutavam entre si diariamente, brigando por uma única verdade.

Era insano.

Queria chorar e quebrar tudo ao seu redor.

― Sherlock?

Ergueu a cabeça e encontrou os olhos preocupados de John que imediatamente se aproximou, sentando-se ao seu lado na cama.

― Sherlock, por que está chorando?

Sherlock não respondeu, nem percebera que havia começado a chorar pateticamente, mas não diria seus motivos em voz alta.

Inesperadamente sentiu a cama afundar mais um pouco e braços o rodearam, firme e carinhosamente. John havia deitado ao seu lado e agora o abraçava, como se o consolasse e o protegesse simultaneamente.

― O que está fazendo? ― perguntou com a voz embargada.

― Meu melhor amigo precisa de um abraço ― John respondeu sorrindo levemente.

O detetive pensou em sorrir, em agradecer e dizer que estava tudo bem, que aquele abraço não era realmente necessário, mas agora seu peito doía, como se sufocasse lentamente, e seus olhos ardiam enquanto as lagrimas caiam sem permissão. Se fosse falar algo, provavelmente gritaria todos os seus motivos e todas as suas dúvidas, explodindo, expondo-se mais do que fizera em toda sua vida. Então, optou por não dizer nada do assunto.

― Sei que não quer conversar agora... ― John sussurrou contra sua testa. ― Mas quando se sentir melhor e quiser falar sobre o que fez você ficar assim... estarei aqui.

Sherlock respirou e tentou cessar as lágrimas ao encará-lo.

― Apenas... me diga o que aconteceu ― tentou fugir da pergunta. ― Por que meu corpo todo dói?

― Não se lembra de nada?

― Absolutamente nada. Seja completo.

Ouviu John suspirar e o observou se movimentar até que ficassem frente a frente.

― Moriarty sequestrou você.

― Como? ― questionou confuso.

― Não sei exatamente como, aparentemente ele simplesmente entrou aqui e te levou.

― Eu nunca iria tão pacificamente.

― Sabemos disso, mas não há testemunhas e agora... você não lembra de nada mesmo?

― Não ― Sherlock negou firme, finalmente conseguindo cessar suas lágrimas. ― Eu... eu estava na sala e agora estou aqui. É tudo. Quando aconteceu?

― Quase cinco dias atrás ― John respondeu com uma careta. ― Moriarty nos contatou assim que você sumiu e só permitiu sua liberdade depois de dois dias, quando Mycroft finalmente cedeu. Depois disso você ficou no hospital cuidando da ferida na sua perna e fazendo todos os exames que eu exigi.

― O que ele queria?

― Uma conversa com seu irmão.

Sherlock arqueou as sobrancelhas.

― Uma conversa? E o que foi tão importante que não podia ser dito por telefone?

― Não sei ― John respondeu dando de ombros. ― Mycroft não quis me dizer, assim como você também não faria.

O detetive quis gritar enraivecido sobre os furos naqueles acontecimentos enunciados tão vagamente, mas sentia que seria uma explosão sem resultados, inútil como quase que andara fazendo nos últimos dias, então focou em John. E pela primeira vez em muito tempo o enxergou, enxergou-o de verdade, puro, sem procurar por algo especifico ou suspeitas. Esquadrinhou seu rosto, notando as olheiras e a expressão cansada mencionadas por Lestrade, mas também um algo estranho em seu olhar, algo que Sherlock conseguia deduzir apenas como tristeza.

― O que estamos fazendo conosco, John?

Por um momento viu a confusão no rosto do loiro, mas logo a compreensão suavizou sua expressão e lhe devolveu a tristeza.

― Não sei, Sherlock. Sinceramente... não entendo mais nada do que está acontecendo ― respondeu em tom penoso.

― Acho que estamos nos destruindo, silenciosamente, mas estamos ― Sherlock comentou olhando em seus olhos.

Repentinamente percebeu uma sutil diferença nos olhos azuis do parceiro. Estavam mais alertas e inquietos, como se John estivesse indeciso demais entre falar ou não alguma coisa.

Então se recordou de momentos antes, das conversas que escutara às escondidas, e decidiu ser mais rápido.

― Você o ama?

― O quê? ― John perguntou atordoado com a súbita mudança de assunto.

― Você ama Mycroft?

John abriu e fechou a boca diversas vezes e isso aumentou aquela sensação estranha no estômago do detetive enquanto fatos atacavam sua coragem, as conversas, os olhares, o beijo entre John e Mycroft, tudo estava ocupando um espaço desnecessário em seu Palácio Mental e Sherlock precisava se livrar disso. Dessas dúvidas e desconfianças que não lhe deixavam em paz! Mas por que o parceiro hesitava? Tentava, por acaso, encontrar um meio gentil de dizer que sim? Tentava pensar em alguma desculpa para sair do assunto? Por que simplesmente não falava alguma coisa? Qualquer coisa!

― Não ― a resposta finalmente surgiu. ― Eu não amo seu irmão.

Sherlock engoliu em seco e hesitou em seu próximo ato. Aquela negação não respondia sua questão principal, aquela que o movera rapidamente até aquele momento. Aquela era uma simples e vaga resposta que não inibia qualquer outro nome que não fosse o de Mycroft. Mas espera, desde quando o foco era John? A questão principal não era descobrir seus próprios sentimentos? Livrar-se de todas aquelas perguntas desnecessárias?

Prometera a si mesmo que aquilo não aconteceria novamente e repetira mentalmente por muitas noites que o maior sentimento dali era o arrependimento, repetira de novo e de novo até que chegasse ao menos perto de se convencer. No entanto, não conseguia esquecer, não conseguia superar e, surpreendentemente, não se importava se estava sendo insensato ou muito idiota. Então seria impulsivo mais uma vez.

― Desculpe por isso ― murmurou sincero.

Então respirou fundo e, munido de uma nova e extasiante coragem, avançou os poucos centímetros que os separavam e se inclinou, selando seus lábios em um beijo firme e nada indeciso. Sentiu a respiração de John travar, como a sua própria, mas não se conteve em erguer as mãos e agarrar a nuca do outro, que se arrepiou ao seu toque.

― Eu posso não entender o que está acontecendo, mas não gosto de fugir ― Sherlock confessou se afastando minimamente.

― Isso é muito cruel ― John respondeu ainda de olhos fechados, sorrindo minimante.

― Por qual motivo, exatamente?

― Eu entrei nesse quarto para avisar que você tem um novo assassinato para analisar... mas finja que não ouviu isso, por favor.

― Por que não disse antes? ― repentinamente, como se recebesse uma nova carga de adrenalina, Sherlock selou seus lábios rapidamente e se levantou, começando a mancar pelo quarto. ― Vamos, John, quero resolver esse caso o mais rápido possível.

John resmungou e sentou na cama a contragosto.

― Pelo amor de Deus, Sherlock. Você precisa se recuperar e eu preciso entender o que acabou de acontecer, deixe Lestrade trabalhar sozinho.

Sherlock parou subitamente e imediatamente sentou ao lado de John, agarrando seus ombros:

― Não preciso de recuperação para um simples ferimento na perna, não é o fim do mundo ― argumentou com palavras apressadas. ― E tudo o que precisa entender sobre esse beijo é que eu confio em você. Não quero nada sério agora, por favor John, entenda que temos outras prioridades no momento, mas o que importa, acima de tudo, é que eu confio em você, escolhi isso e vou aceitar as consequências em silêncio... mas eu também preciso que confie em mim.

― E o que isso quer dizer? ― John questionou hesitante.

Sherlock sorriu abertamente pela primeira vez em dias e seus olhos brilharam de excitação.

― Significa que vamos destruir Moriarty... juntos. 


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