—Não acredito que a gente tá aqui, parece que voltamos a ser crianças de novo. –Simon me lançou um sorriso nostálgico e eu percebi que ele também estava se lembrando de quando o papai nos trazia aqui. Éramos crianças e a nossa maior preocupação era se poderíamos tomar sorvete antes do almoço.

Às vezes eu gostaria de poder voltar a ser criança, onde eu não percebia a intransigência da minha mãe, onde eu não estava cercada por pessoas falsas, onde não existia uma Aline, onde as coisas eram muito mais fáceis. Se eu pudesse voltar no tempo eu teria feito muitas coisas de maneira diferente e eu sabia que apesar da dor, tudo pelo o que passei foi necessário pra me fazer chegar até aqui e mesmo estando feliz agora era inevitável pensar no passado.

Uma vez li em um livro que crescer acontece quando você olha pra trás e vê coisas que gostaria de mudar, acho que isso significa que eu cresci.

—Clary, tá me ouvindo? –Simon me sacudiu levemente e me trouxe de volta à realidade, eu pisquei repetidas vezes para clarear a mente e voltei meu olhar pra ele. –Desculpa, é só que esse lugar traz tantas lembranças que é quase impossível evitar. –Vi em seus olhos que ele entendia e finalmente resolvamos entrar no parque. 

West Park era um paraíso infantil, entre carrosséis, rodas gigantes e barracas de algodão doce o lugar emanava alegria e diversão e era impossível estar ali e não ser contagiado por essa energia.

Apesar de estar aqui devido à “operação Sizzy”, eu não podia negar que estava mais do que feliz em visitar o lugar que marcou a minha infância.

Eu procurava por Jace de forma discreta, havíamos combinado de nos encontrar perto da roda gigante nesse horário e eu fiz questão de acertar todos os detalhes antes, pois não podíamos correr o risco de trocar mensagens agora e os nossos irmãos perceberem.

—Simon, vamos dar uma volta primeiro? Quero ver se tudo está como eu me lembro. –Ele concordou parecendo distraído e começamos a andar, ele estava tão avoado que não percebeu que eu estava tomando um caminho próximo à roda gigante e eu dei graças a Deus por isso, já que se meu irmão estivesse prestando a devida atenção nas coisas ele logo perguntaria o que estávamos fazendo por ali devido ao fato de que ele tinha certo medo de altura.

Foi impossível não avistar Isabelle com aqueles saltos altos, até no parque? Sério, ela tem algum calçado que não tenha pelo menos 15 cm?

Respirei fundo e me preparei pra começar a atuação.

—Espera, é o Jace ali? Mas como? Ele disse que ia estar na escola. –Nesse momento meu irmão me olhou parecendo finalmente “acordar” e seguiu meu olhar. –Aquele loiro ali é o seu namorado? E ele está com uma garota?  -Ele me lançava um olhar confuso e eu dei uma leve risada. –Vamos lá confirmar, a garota parece ser a Izzy, a irmã dele. –Ele assentiu e caminhamos calmamente, assim que chegamos bem perto Jace pareceu me enxergar e soltou uma expressão confusa. Eu estava me segurando pra não gargalhar.

—Clary? O que você...? –Eu dei de ombros parecendo confusa. –Fazia muito tempo que eu não vinha aqui e como Simon estava na cidade pedi pra ele me acompanhar, não te falei nada porque não queria que você ficasse com vontade de vir já que estava na escola. A propósito, você não deveria estar na escola ensaiando ou sei lá? –Jace encolheu os ombros e pelo seu olhar eu vi reconhecimento, como se ele finalmente entendesse o que estava acontecendo. Ele logo começou a gargalhar e eu lhe lancei a minha melhor cara de inocente. –Quais são as chances da gente vir pro mesmo lugar sem saber? Eu estava na escola, mas o professor teve alguma emergência familiar e teve que sair mais cedo, então eu decidi dar uma volta por aqui, eu te liguei várias vezes, mas você não atendeu.

Nesse momento coloquei a mão no bolso e franzi a testa. –Droga, esqueci meu celular em casa. –Jace assentiu em entendimento e continuou. –Bom, eu até pensei em passar na sua casa, mas tem a sua mãe e eu achei que pudesse acontecer algum tipo de situação desconfortável. Daí eu me lembrei de que tinha falado com a Izzy ontem sobre vir aqui e pensei por que não?

Foi a minha vez de dar uma risada incrédula. –Ok, essa foi a campeã das coincidências. –Jace se aproximou de mim e me abraçou pela cintura. –Mas você não gostou? –Sorri pra ele e passei os braços ao redor dos seus ombros. –É claro que gostei. Oi namorado! –Ele sorriu parecendo deliciado com aquela palavra e aproximou o rosto do meu. –Oi namorada!

Eu acabei com a distância entre nós e lhe dei um longo selinho, mas antes que pudéssemos aprofundar o beijo escutamos um pigarro e nos afastamos.

Me virei e vi que meu irmão parecia um pouco deslocado, tanto que nem havia reparado na morena.

—Bom, gente esse é o meu irmão Simon, Simon esses aqui são Jace e Isabelle. –Na mesma hora Jace e Simon trocaram um aperto de mãos, mas percebi que os olhos dele estavam focados na morena, que também lhe lançava olhares interessados. Eu estava me segurando muito pra não fazer a dancinha da vitória, esse plano iria por água a baixo caso eles não demonstrassem nenhum tipo de interesse um pelo outro.

Fingindo que não estava vendo nada, voltei o meu olhar para o meu namorado.

—Então, vocês já foram a algum brinquedo? –Jace negou com a cabeça e pareceu chateado. –Ainda não, eu queria ir na roda gigante, mas Izzy tem medo de altura. Mas agora que vocês estão aqui, poderiam ir comigo. –Eu sorri concordando com a ideia enquanto Izzy soltava um bufo frustrado. –Ótimo, você me tira do meu conforto pra me deixar sozinha aqui. Sério? –Jace pareceu pensar na questão e eu abaixei a cabeça sem graça, porém logo a levantei com um sorriso como se tivesse acabado de ter uma ideia. –Já sei, Simon também não é o maior fã de altura, então eu vou com o Jace e vocês nos esperam aqui ou vão dar uma volta sei lá.

Izzy e Simon deram de ombros ao mesmo tempo tentando demonstrar desinteresse, mas estava mais do que claro que os dois estavam bem interessados. Eu joguei um beijo na direção do meu irmão e peguei a mão que Jace me estendia, então fomos juntos em direção à roda gigante.

Entregamos os nossos ingressos e assim que entramos na cabine respiramos fundo e continuamos mantendo a expressão, pelo canto do olho vi que Simon e Izzy ainda estavam por perto e começavam a conversar. Apenas quando subimos a uma altura considerável e eu percebi que já estávamos longe dos olhares de todos lá embaixo, me permiti gargalhar e fazer a dancinha da vitória, mesmo sentada.

Jace logo acompanhou a minha risada e passou o braço pela minha cintura, me puxando pra mais perto.

—Você é uma gênia do mal Clarissa. –Eu ri mais ainda diante do seu comentário e aproximei o rosto do seu. –Você viu só? Deu tudo certo, o plano foi perfeito. Eu te disse que a operação Sizzy ia ser um sucesso. –Jace revirou os olhos. –Você vai continuar insistindo com esses nomes? Sinto muito, mas você não é muito boa com isso. –Eu sorri ainda mais e aproximei a boca da sua orelha. –Ah é? Pois saiba que eu criei mais um plano pra essa noite e tenho certeza que você vai gostar independente se tiver um nome ou não. –Vi que Jace ficou arrepiado e respirou fundo. – Que plano? –Eu mordi o lóbulo da sua orelha e o senti tremendo. –Beijar o meu namorado no topo da roda gigante.

Em um timing perfeito a roda gigante parou conosco bem no topo e pudemos ter uma visão completa de todo o parque, mas nesse momento eu não estava ligando muito pra parque nenhum.

Jace me lançou um olhar quente e deixou a sua boca a milímetros da minha. –Acho que posso te ajudar com esse plano.

Dito isso ele grudou a boca na minha e tomou tudo o que eu estava oferecendo!

Deus, por que isso tinha que ser tão bom?

...

—Então Isabelle, a noite de sábado não foi ótima? –Ela revirou os olhos e começou a admirar as unhas em sinal de desinteresse, mas estava claro que a minha cunhada evitava olhar pra mim. –Pra vocês com certeza, o casal decidiu sumir e aposto que aproveitaram bastante. –Olhei maliciosa pra ela e joguei uma caneta em sua direção, estávamos na biblioteca e graças ao bom Deus a bibliotecária ainda não havia chegado, aquela velhinha esquisita odiava barulho.

—Aham, nem vem cunhadinha que eu sei que você e meu irmão se divertiram tanto quanto eu e o Jace. –Ela me lançou um olhar divertido como se estivesse me mandando uma clara mensagem de “você está louca”, e eu decidi que a abordaria de um jeito diferente pra conseguir informações já que com Simon não havia funcionado. Ele havia ido embora ontem bem cedo, pois hoje já tinha um trabalho super importante pra apresentar, mas eu posso dizer que o pressionei no sábado a noite quando chegamos em casa e não deu certo.

Flashback On

Havíamos acabado de chegar e percebi que nossos pais já estavam dormindo devido ao silêncio que tinha se instalado na casa, subimos as escadas rapidamente e fomos para o meu o meu quarto. Simon parecia pensativo desde que o encontramos umas duas horas depois de o deixarmos na companhia da Isabelle.

Sim, eu e Jace havíamos dado um perdido no casal e só aparecemos horas depois.

—Tá tudo bem Simon? Você tá meio estranho, quieto. –Ele pareceu se assustar comigo e percebi que ele estava fazendo tudo no automático e que até o momento não estava prestando atenção em mim. –O que? Não, tá tudo bem sim. É impressão sua. –Eu decidi pressionar mais um pouco e me sentei ao seu lado. –Tem certeza? Eu conheço você Simon. –Ele me olhou e suspirou, mas eu conseguia enxergar o seu desconforto. –Não é nada demais, é só esse trabalho que eu tenho que apresentar na segunda feira, ele vale 30% da nota bimestral e eu tô meio nervoso.

Eu sabia que era mentira, Simon era um dos melhores alunos da turma dele, ele era muito bom no que fazia e por isso nunca ficava com medo, ele sempre arrasava em qualquer apresentação e era tão confiante que chegava a ser exagerado.

—Tá bom, entendi. E sobre o nosso passeio? Você gostou do Jace e da Izzy? –Ele pareceu meio encabulado diante da minha inocente pergunta e se mexeu desconfortável na minha cama. –Vocês dois sumiram então não deu pra falar muito com o seu namorado, mas ele me parece ser um cara legal e acho que até um cego perceberia o quanto ele gosta de você, ele te olha como se você fosse a coisa mais preciosa do mundo. –Meu coração se acelerou diante daquelas palavras, eu sabia que Jace me amava, mas ouvir isso do meu irmão e saber que ele aceitava o meu namorado me deixava mais do que feliz. –E sobre a Isabelle, bem é que... –Eu me inclinei na direção dele totalmente ansiosa e esperei pela sua resposta, será que havia rolado um clima? Um beijinho? Alguma coisa? –Que? Pode me falar qualquer coisa Simon, sabe disso. –Percebi meu irmão corando levemente e ele se levantou da minha cama logo em seguida. –Te falar o que Clary? Ela é legal, divertida, nada demais. Eu vou dormir, boa noite maninha.

Simon saiu do meu quarto com tamanha velocidade que nem consegui responder ao seu boa noite, percebi nesse exato momento que algo havia acontecido e mesmo não tendo conseguido tirar nada do meu irmão, eu tentaria com a Isabelle na segunda feira.

Flashback Off

A morena continuava me encarando enquanto fingia desinteresse e eu decidi que precisava arriscar. –Qual é Isabelle, eu tentei ser legal e te deixar me contar a verdade, mas você parece achar que eu sou idiota. O Simon me contou tudo. –Ela pareceu sem graça por um momento, mas logo recuperou a pose. –Contou o que ruiva? Não tem nada pra contar. –Eu suspirei parecendo cansada e a olhei ironicamente. –É logico que tem e é óbvio que ele não iria me contar nada, mas foi meio impossível tentar esconder depois que eu vi a marca do seu batom no pescoço dele, vocês podiam ao menos ter apagado as evidências cunhadinha.

Isabelle pareceu desesperada e colocou a cabeça entre as mãos.

—Isso não é possível, eu olhei e tinha certeza que não tinha nada ali, como...-Ela foi interrompida diante da minha mais do que sonora gargalhada, nesse momento a  senhora Hoover entrou na biblioteca já me lançando um olhar desgostoso.  Eu abaixei o volume da minha risada e a lancei um olhar de deboche. –Ele não tinha marca nenhuma no pescoço Izzy, mas obrigada por compartilhar isso comigo. Tenha um bom dia de aula! –Eu saí rapidamente da biblioteca antes que ela jogasse algum livro em mim e pude escutar claramente ela amaldiçoando até a minha décima geração.

O corredor já estava lotado de gente, todos estavam colocando os livros no armário ansiosos pra aproveitar o intervalo e eu dei graças a Deus por ter tido essa aula livre, o professor de economia havia faltado e eu arrastei Izzy até a biblioteca com uma desculpa qualquer.

Peguei o meu celular e comecei a digitar uma mensagem pro Jace contando que a “operação Sizzy” havia sido um sucesso e de repente esbarrei em alguém. Eu estava pronta pra pedir desculpas quando vi que a tal pessoa era a Aline e logo atrás dela estavam Emma e Maia.

—Presta atenção garota, achei que esses óculos tinham alguma outra função além de te deixar ridícula. –Nesse momento escutei algumas risadinhas e decidi que já havia aguentado o bastante.

—Escuta aqui Aline, já passou da hora de alguém te colocar no seu devido lugar!