007 Contra o Fim do Mundo escrita por Junovic


Capítulo 3
Eles estão vindo. Eles estão vindo


Notas iniciais do capítulo

James Bond vai ao encontro de Steve Moses, um velho hacker inimigo do governo francês. Repleto das mais variadas teorias sobre a SPECTRE, alguém considera-o perigoso demais para mantê-lo vivo.



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Peckham, ao sul de Londres, reunia conjuntos habitacionais e casas geminadas com aspecto encardido, as fachadas pichadas e jardins abandonados. Não era exatamente a região mais acostumada com a presença de um Jaguar C-X75, mas Bond achava muito pouco versátil tomar o metrô em plena hora do rush.

Sob os olhares de alguns jovens que se reuniam em grupo no meio da tarde, após o fim do confinamento causado pela chuva, Bond estacionou a dois quarteirões do Nº 70.

Ele colocara seus óculos escuros e caminhara com as mãos nos bolsos do sobretudo imaginando o que exatamente encontraria ao chegar no endereço que Moneypenny lhe passou.

Bond deveria procurar por um tal de Steve Moses. Não sabia sua idade ou suas características físicas, apenas que ele invadira o sistema da inteligência francesa, que na tentativa de fazê-lo não tornar público suas descobertas, fizera um acordo, obrigando-o, porém, a sair do país.

Depois de uma longa caminhada, Bond chegara ao Nº 70 — uma casa de dois andares tão descuidada quanta às demais da rua.

As janelas estavam fechadas e veladas por cortinas escuras. Bond andara mais duas ou três casas à esquerda do número setenta e entrara pela lateral de uma delas, acessando o jardim dos fundos. Não encontrara ninguém.

Indo sempre à sua esquerda, Bond pulara os muros baixos que demarcavam os terrenos das propriedades, até chegar ao jardim abandonado do Nº 70.

A porta de vidro dos fundos estava trancada e era possível ver o lado de dentro escuro da casa. Tudo estava muito calmo nas redondezas; Bond, que usava luvas de couros, guardara seus óculos, aproximou-se da porta e socara um dos ladrilhos, que se partiu com um barulho seco.

Bond enfiou a mão no lado de dentro e abriu a fechadura, liberando a entrada.

***

James Bond não encontrara ninguém no primeiro piso da casa. Todos os cômodos estavam escuros e silenciosos. Havia uma escada de madeira que dava acesso ao primeiro andar, ele acreditara que se fosse encontrar alguém ali, seria lá em cima.

Pusera-se a subir as escadas. A madeira velha rangia a cada pisada, parecia podre por dentro e Bond até começou a acreditar que a escada tremia vagamente.

Tudo aconteceu muito rápido. Bond ouviu passos rápidos vindo do teto e no momento seguinte uma silhueta parara de frente a ele no alto da escada. A silhueta apontava uma arma para Bond, que, antes mesmo de sacar a sua, viu-se tombando de costas de volta para o chão, sentindo todo o seu corpo ser eletrocutado.

Bond, meio inconsciente, ouvira o próprio baque de seu corpo e uma sombra magra espreitando-o, segundos depois.

— Oh, meu Deus! — exclamou a sombra. Era uma voz rouca, de um homem aparentemente bem mais velho.

O “sombra” andou com dificuldades para a cozinha e acendeu as luzes, voltando em seguida.

Bond ainda tremia devido à descarga elétrica que recebera e com dificuldades sentara-se no chão, incapaz de se defender.

— Me desculpe, pensei que fosse um daqueles safados que estão vigiando a casa desde o dia que pisei na Inglaterra!

Com as luzes claras em seu rosto, Bond não conseguia distinguir as sombras que se formavam em seus olhos. Aos poucos o efeito da arma de choque ia se esvaindo.

— Moses? Steve Moses? — perguntou.

— Me esqueci por completo que você viria. O próprio Q me informou da sua visita.

Bond, finalmente, conseguira ver quem era seu interlocutor. Um senhor com seus setenta anos, branco de olhos claros; era baixo e corcunda e também muito magro, mostrando-se fisicamente vulnerável. Usava um casado de lã e grandes óculos no rosto, que aumentavam consideravelmente seus olhos claríssimos.

— Moses? Você é o Moses? — repetiu Bond, incrédulo.

— Qual é o seu problema? Só foi um choquinho de nada, não me diga que um cara do seu tamanho nunca foi torturado? Que espécie de agente e você, oras!

Steve Moses dirigiu-se às escadas arrastando os pés e sobre os ombros disse:

— Quando a garotinha parar de se tremer, suba e vamos conversar como homens.

***

A sala ficava no segundo andar e a luz ambiente vinha dos vários monitores que Moses não desgrudava os olhos. Ele digitava freneticamente em telas com códigos e logo uma nova janela era aberta e novas funções começavam a ser executadas.

Bond sentara próximo da porta aberta e apenas observava-o, pouco curioso. Minutos depois, Moses virou-se para ele, em sua cadeira giratória, e toda sua atenção era para James Bond.

— Te vi no The Guardian de hoje — começou.

— Todos viram.

— Isso é mal, bem mal.

Bond observava-o sem emoção. Moses dera uma risadinha aguda e sem graça.

— Pensou que eu seria um novo Q, não é mesmo? Jovem, nerd e esquisito...

— Exatamente.

— Ele é um bom garoto, está na pista certa, mas seguindo o caminho errado.

Fora a vez de Bond forçar uma risada irônica.

— Então, não acha que a SPECTRE está envolvida com grupos terroristas — afirmou, com convicção.

— Não seria própria SPECTRE um grupo terrorista? — replicou; Bond permaneceu calado, agora sim com toda sua atenção em Moses — Vamos, James. Eles não precisam sair por aí explodindo pessoas ou jogando aviões em prédios enormes.

Moses saltara outra risadinha aguda e com um gesto indicara todos os seus equipamentos high-tech.

— Eles são terroristas, mas em um mundo paralelo, Bond. Um mundo que, aos poucos, vai se diferindo menos do nosso.

— Do mundo real — completara Bond.

Moses, sorrindo, cruzara as pernas finas e encarara Bond.

— O que é o “mundo real”, Bond? O que é a realidade?

Bond não hesitou, entrara no jogo de Moses.

— Eu sou real, Moses e acredito que você também seja.

— Somos pessoas reais vivendo uma realidade, muito bem. Mas a realidade é uma espécie de verdade, um mundo... “físico”.

—E a verdade é não mais do que um ponto de vista — emendou Bond.

— Muito bem, muito bem, James! Você está entendendo o que eu quero dizer.

O computador de Moses emitira um som entrecortado e longo. No monitor Bond via algo processando. Moses clicara uma tecla e o barulho cessara; o processo avançou velozmente chegando rapidamente a cem por cento.

— Aonde quer chegar, Moses? — continuou Bond.

— Sendo a verdade um ponto de vista, nossa realidade, nossa... verdade, pode ser apenas uma invenção daqueles que fazem a história.

— Eu faço minha história, Moses.

Moses ri novamente, seu guincho ecoou pela casa silenciosa e morreu ao longe.

— Não sou um peão perdido no tabuleiro, Moses, isso eu lhe garanto — conclui.

— Sim, você é o peão bonzinho lutando bravamente contra as forças do mal! E se não existisse a separação de bem e de mal, Bond? Em que lado você estaria?

— Da just...

Justiça? Justiça de quem?

Por mais surreal que poderia ser as palavras de Moses, Bond, por algum motivo, acreditava saber distinguir o que era concreto do que não passava de delírio. No fundo de sua dramatização, Moses parecia ter uma teoria que se sustentava.

— Diga-me, Moses. Diga-me o que sabe.

— O MI6 não estava completamente errado em relacionar as atividades da SPECTRE com terroristas. Mas o que ele ignorou por completo foi que...

Bond ouviu a porta escancarar-se lá embaixo e botas subirem freneticamente as escadas, fazendo a madeira gemer alto.

— Está esperando visitas, Moses?

Bond puxou Moses e colocara-se ao lado da porta aberta. De repente o silencio tomou conta da casa, obrigando Bond a apurar os ouvidos.

Bond, então, ouviu passos lentos vindos, provavelmente, do andar de baixo, ao mesmo tempo em que sentia a presença de alguém no corredor escuro. Os dois pares de botas movimentam-se no mesmo ritmo — cada um em um andar — quase em sincronia.

Os passos no corredor cessaram. Bond imaginara que do outro lado da parede alguém com intenções não muito boas procurava por Moses. No momento em que ele colocasse a cabeça para dentro do quarto, porém, ele não veria ninguém, dando a Bond um milésimo de segundo para agir.

Dito e feito. Um homem alto, fardado, segurando um fuzil, colocara parte do seu corpo para dentro do cômodo e não vira nada a não ser vários monitores ligados. Bond agiu imediatamente.

Com a mão livre, ele levantara seu braço e socara o rosto do que parecia ser um soldado. O homem reagira, debatendo-se, enquanto Bond mantinha sua cabeça segura por debaixo de seu braço. Sufocando, o soldado apertara o gatilho do fuzil. A sala fora iluminada pela rajada de balas que atingiram em cheio os equipamentos de Moses. Um minuto depois as balas acabaram.

Bond projetara seu corpo e consequentemente o corpo do soldado, ficando de frente para a porta aberta, ainda com o pescoço seguro em seu braço.

O segundo soldado surgira no corredor e antes de poder agir, Bond disparara três, quatro, cinco tiros em seu abdômen, fazendo-o tombar sentado contra a parede.

Em seguida, Bond largara sua arma e apertara ainda mais o pescoço do soldado, deixando-o inconsciente. Seu corpo tombou no chão e o silêncio voltou a tomar conta da casa.

— Mercenários — disse Moses, olhando para o que sobrou da cena anterior — Provavelmente vieram nos buscar a mando do governo.

Bond pegara sua arma do chão e colocara dentro de seu sobretudo. Tirara a poeira de seus ombros, endireitou a postura e dirigiu-se a Moses.

— “Nos buscar”?

— Mas é claro. Você acha mesmo que eles deixariam um agente secreto andando a solta por aí?

Bonde continuava encarando Moses sem realmente entender o que ele dizia. Moses logo percebeu que sua expressão, que beirava a ingenuidade, era legítima, o que não o impediu de soltar outra longa risada fina.

—Bond! Pensava mesmo que finalmente receberia sua tão almejada aposentadoria?

— Não devo mais nada para o governo.

— Não, não mesmo. Mas pense comigo: vocês foram dispensando no meio de uma investigação, sob a desculpa que os relatórios não eram críveis e logo em seguida são substituídos por americanos, franceses e sabe-se lá se não terá algum japonês envolvido, agora... Há uma crise em andamento, James. Eles não iriam querer ninguém atrapalhando os planos deles.

Durante todo o relato de Moses, James mantinha-se atento a qualquer nova movimentação nos arredores da casa, e por mais que a curiosidade o instigasse a continuar ali ouvindo tudo, sabia também que mais um minuto em Peckham poderia acarretar em mais mortes, se não a dele, de outras pessoas.

— Precisamos sair daqui e te enfiar no próximo voo que te leve para bem longe do Reino Unido. Há essa hora já deve haver mais desses à caminho — disse, indicando os dois mercenários no chão.

— A boa notícia é que não precisarei fazer minhas malas. Esses desgraçados acabaram com o meu material!


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