Foclore Oculto. escrita por Júlia Riber


Capítulo 7
Capítulo 6


Notas iniciais do capítulo

E eles não conseguiram mais resistir...



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Ângela arrumava as malas em seu pequeno quarto no andar de baixo.

— Você não precisa ir hoje _ dizia Núbia ao seu lado. _ Ele disse para ir amanhã cedo.

Ângela entortou os lábios e olhou Núbia com tristeza.

— Eu sinto muito... Mas não consigo ficar nem mais um minuto aqui. Preciso ir para vila, preciso pensar num jeito de salvar Iara, mas longe daqui.

— Mas e eu? Vai me deixar sozinha aqui com Edgar?

Ângela suspirou.

— Me perdoe, eu te adoro, mas... Eu sei que Edgar não vai fazer mal para você, não, não vai. Você mais do que nunca se tornou a neta dele, ele está com orgulho de você, ele começou enfim a gostar de você, não vai te fazer mal, não vai não. Já eu... sou só a empregada, uma empregada. Não quero abusar da paciência de Edgar, não quero, não quero mesmo.

Não houve como impedi-la e assim Ângela partiu, mesmo na escuridão. Núbia foi para o quarto e tentou por horas dormir, mas não conseguiu.

Primeiro porque era cedo; segundo, pois a ideia de dormir sobre mesmo teto de Edgar lhe deixava nervosa. Ela nem tomou banho, não trocou de roupa, somente ficou deitada na cama olhando para o teto.

Ás onze em ponto Núbia não conseguiu mais suportar, e como de costume, agiu por impulso. Desceu as escadas e saiu do casarão em disparada para o bosque. Logo começou a chover, mas isso não a fez dar meia volta, ela prosseguiu reto, tentava lembrar os caminhos, mas de noite aquela floresta só ficava mais confusa.

Ela caminhou, viu corujas, morcegos, uma cobra passou pela sua frente e ela não ligou, somente andou e andou mais um pouco, por vezes as  árvores não lhe protegeram da chuva e as gotas de água se misturavam as lagrimas de Núbia, até que enfim ela chegou a algum lugar. Logo mais adiante viu a cabana de Cissa e correu até lá. As luzes estavam acesas e ela imediatamente bateu na porta várias vezes em desespero, logo Cissa abriu e ao fitar Núbia molhada e com rosto inchado arregalou os olhos.

— Oxalá. Menina, o que aconteceu com você?

— Posso ficar aqui? _ pediu ela.

Cissa pegou no braço dela e a fez entrar.

— Você está louca de sair assim na chuva e na mata em plena á noite?

— Eu precisava sair daquela casa, Cissa.

Cissa franziu os olhos.

— Edgar fez algo com você?

— Não exatamente, mas... Ele é um monstro, em todos os sentidos e Ângela foi embora, eu estava sozinha com ele e eu estou tão confusa... Não consegui ficar no casarão.

Núbia quase chorou, mas segurou as lágrimas.

Cissa que estava com uma calça simples, sem camisa, mas com a cintura enfaixada, fitava Núbia mais perdido do que a própria garota.

— Está bem, pode ficar aqui essa noite, mas temos que resolver isso logo, não quero um gaúcho chato metido a gótico trevoso batendo na minha porta amanhã cedo perguntando “cadê a guria tchê?”.

Núbia conseguiu dar uma risadinha o que fez com que Cissa sorrisse também.

— Obrigada.

— Por nada, mas vai estar me devendo um jantar inteiro depois dessa.

Núbia revirou os olhos, ela então o observou.

— Curupira te ajudou mesmo, ne, você não conseguia nem se mexer da ultima vez que te vi.

— O que o monstro tem de chato tem de útil. Ele conhece cada planta medicinal e faz umas mágicas também. Os hospitais precisam de caras como ele. Agora vem comigo.

Cissa foi mancando para uma entrada que ficava ao lado da estante da sala e Núbia o seguiu.

No caminho, Núbia notou cicatrizes grandes e horríveis na costa de Cissa, o que poderia explicar por que ele nunca tirava a camisa. Eram longas como garras, mas grossas e profundas de mais para Isso.

—O que é isso na sua costa?

Cissa fez cara feia.

— Droga, esqueci disso... São só cicatrizes antiga, está bem? Ignora.

Núbia assentiu, não queria questiona-lo mais, ao menos não naquele momento.

Cissa a levou até o quarto, que era basicamente composto de uma cama de casal simples e um guarda roupa velho ao lado de uma porta que provavelmente levava ao banheiro. Cissa abriu o guarda roupa.

— Você precisa tirar essas roupas molhadas logo, não quero cuidar de ninguém com febre _ disse ele, logo pegou uma camisa branca e olhou Núbia de cima a baixo_ essa camisa é grande o suficiente servir de vestido para você.

Ele jogou a camisa para Núbia que a pegou e a analisou.

— É acho que sim, você é grande.

— Você que é pequena _ retrucou ele com uma risadinha e pegou uma toalha jogando novamente á Núbia. _ Melhor você tomar banho também.

Núbia franziu os olhos.

— Isso é uma indireta?

— Não... Você só está cheirando a carniça de lobisomem.

Núbia fez cara feia, mas sabia que era verdade.

— Onde é o banheiro?

Cissa apontou para porta próxima ao guarda roupa e Núbia foi até lá, mesmo com certo desconforto, o que só piorou ao descobrir algo.

— Não tem tranca?

Cissa estendeu as mãos ao lado: como se disse fazer o que.

— Só espere não entrar vento no quarto, seria uma pena se a porta de abrisse enquanto você toma banho _ Cissa abriu aquele sorriso sapeca o que fez Núbia rosnar. _ Bem, estou saindo, bom banho.

Ele saiu do quarto e Núbia respirou fundo e fechou a porta. O chuveiro era pequeno, mas a água era quente o que já era ótimo. Ela colocou as roupas intimas que não haviam molhado tanto e a camisa de Cissa que realmente lhe ficou como um vestido, um pouco a cima do joelho.

Ela caminhou para fora do banheiro, do quarto e logo encontrou Cissa na cozinha fazendo algo em uma caneca.

— Acho que agora não estou cheirando a carniça de lobo.

Cissa riu, mas não se virou.

— Que bom. Estou fazendo um chá para gente, vai nos ajudar a dormir depois da noite de hoje.

— É tudo que eu preciso _ admitiu ela.

Cissa então se virou e ao fitar Núbia pareceu um tanto abismado. Ele desceu o olhar devagar até as pernas de Núbia, onde, por acaso, seus olhos fixaram mais.

— Cissa _ chamou Núbia grossa.

Ele pareceu acordar de um transe.

— Ah, oi.

— O que estava olhando? _ disse Núbia, mesmo sabendo a resposta.

— Nada, oxi _ disse Cissa voltando-se a caneca. _ Só acho que você ficou... bonita assim. Bem, acho que o chá já está pronto.

Ele desligou o fogão e derramou o chá em duas xícaras já colocadas na pia e entregou uma a Núbia.

Os dois sentaram-se na mesa que ficava na sala. E devagar beberam seus chás quentes com pequenos goles.

— Sabe o que me deixou mais confusa hoje? _ começou Núbia. _ Edgar gostou do que eu fiz. Ele chegou a fazer a proposta de me ensinar feitiçaria! Eu matei o capataz dele e ele quer me dar um prêmio por isso!

— Eu imaginei que ele agiria assim, Messias era só um capataz qualquer, e daí que ele morreu? Logo Edgar arranja outro, agora, uma Cabrall com seu talento não aparece todo dia.

— E o que ele vai querer comigo?

— Exatamente o que ele já deixou claro querer. Uma aprendiz, uma herdeira, sei lá. Bruxos vivem bastante, mas não para sempre. Ter alguém para deixar tudo que ele adquiriu ao longo da vida, material ou imaterial, sempre é bom.

— Até parece que vou querer ser a Edgar da nova geração _ disse Núbia revirando os olhos.

— Diz isso para ele, então. Apesar que eu acho que você devia aceitar a proposta dele vovô.

 Núbia arregalou os olhos.

— O que? Logo você que o odeia dizendo para me juntar a Edgar?

— Não se juntar, mas aproveitar o que ele pode te dar. Aprenda magia se é isso que ele quer te ensinar, mas não necessariamente, você precisa usar da forma que ele espere que use. É aquela história, sabe, “a magia que se voltou contra o feiticeiro”.

Núbia começou a entender a ideia de Cissa.

— Você quer que eu traia Edgar? Que o engane?

Cissa deu de ombros enquanto bebia mais um gole de chá.

— Você tem algum problema com isso?

— É sacanagem.

Cissa revirou os olhos.

— Ok, vou deixar você pensar na ideia. Mas manhã cedo você tem que ir embora, antes que Edgar sinta sua falta.

Núbia bufou.

— ok...

Cissa aproveitou que a mão de Núbia estava acima da mesa e a segurou. O que fez Núbia o fitar.

— Você pode contar comigo, menina.

Núbia sorriu de canto e Cissa sorriu de volta e então afastou as mãos.

— Bem, você vai dormir na minha cama e eu no sofá, ok?

— Não Cissa, você está todo dolorido, não pode dormir no sofá.

— Se você dormir no sofá me sentirei nada cavaleiro.

— Cissa, você não é cavaleiro _ disse Núbia com uma sobrancelha levantada.

— Ah, deixa eu me iludir, menina.

Núbia riu.

— Para de ser idiota. Eu durmo na droga do sofá.

— Falando com essa gentileza, não posso negar o pedido _ concluiu Cissa.

Os dois após terminarem o chá, foram até o quarto, pois Cissa pegaria algumas coisas para Núbia dormir.

Enquanto Cissa procurava as cobertas no guarda roupa, com certa dificuldade já que sequer podia se curvar direito que já sentia dor, Núbia ficou sentada na cama, observando aquelas cicatrizes nas costas dele, não com estranheza, mas com dor, algo naquelas cicatrizes passava uma sensação de imenso sofrimento.

 Cissa pegou dois cobertores dobrados e um travesseiro e colocou na cama.

— Aqui está.

Ele então notou a expressão perdida da garota e sentou de frente a Núbia.

— Você não está nada bem, não é?

— Matei um homem, a única pessoa que parecia gostar de mim no casarão é uma psicopata desaparecida e meu tataravô monstro que tem minha guarda quer me transformar em algo parecido com ele. Estou ótima.

— Hei, eu sou o sarcástico _ reclamou Cissa.

Núbia riu, mas então lembrou de algo e sua expressão se tornou sombria.

— Você, sabia que Edgar era um monstro, digo, literalmente, ele se transforma num monstro e você sabia disso, não é?

Cissa assentiu.

—  É uma maldição de família, mas que afeta só os homens, não se preocupe. Eles se transformam sem data certa, mas sempre á noite, em animais sedentos de sangue. Popularmente chamam a criatura em que Edgar se transforma de chupa-cabra.

Núbia arregalou os olhos.

— Chupa-cabra? Sério? Sempre achei esse bicho tão ridículo, e o Edgar é um chupa-cabra.

O que era para deixa-la assustada a fez rir sem parar.

— É a vida. Em qualquer lugar do mundo criaturas que sugam sangue de outras é nomeada vampiro, chegou no Brasil vira chupa-cabra _ disse Cissa dando de ombros.

— Amo o Brasil _ disse Núbia ainda rindo.

Cissa a olhou com expressão interrogativa.

— Oh menina, tenho quase certeza que não coloquei drogas naquele chá.

— Eu tô rindo para não chorar, Cissa _ explicou ela e agora que ria era Cissa.

 Após rirem por basicamente nada, eles se perderam no olhar um do outro e novamente o impulso atacou os sentidos de Núbia e sem pensar ela pegou o rosto de Cissa e o beijou.

Quando ela parou o viu com expressão pasma, o que a fez se afastar acanhada.

— Me desculpe, sério, não sei o que deu em mim. Desculpa.

Depois de um tempo em silêncio Cissa a fitou daquele jeito que fez quando a viu na cozinha.

— Tudo bem, tudo ótimo na verdade.

Ele então a pegou pela cintura e a beijou e ela obviamente correspondeu. Ela pegou nos cabelos dele e ele apertou a cintura dela. Logo, ele se afastou um pouco, mas deixou os rostos ainda próximos, eles se fitaram por um tempo ofegantes e sedentos de desejo.

Núbia subiu a mão pela nuca dele e ele acariciou o rosto dela.

— Você é linda _ murmurou Cissa voltando a beija-la.

Logo começou a subir mais na cama e pegou as pernas dela colocando-as na cama, depois a fez deitar devagar e se colocou a cima dela, o que o fez soltar um gemido de dor.

— Suas costas _ lembrou Núbia.

— dane-se a dor _ disse ele beijando e sentindo o perfume do cangote de Núbia, que o abraçava com força e os lábios entreabertos.

Logo voltaram a se beijar e Núbia não resistiu em morder os lábios carnudos de Cissa, o que pareceu deixa-lo mais empolgado. Ele pegou com força a coxa de Núbia e tentou se colocar totalmente sobre ela, mas sentiu uma pontada horrorosa nas costas.

— ai _ reclamou ele.

Mas tentou suportar a dor e voltou a beijar o pescoço da garota. Para Cissa, o perfume de Núbia era maravilhoso e seu calor parecia um imã que atraia seu corpo.

Porém além da dor de Cissa, naquele momento Núbia notou que aquilo estava indo um pouco longe de mais e colocou as mãos sobre o peito de Cissa para afasta-lo.

— Cícero...

Ele assentiu compreendendo, tentou segurar a excitação, algo nada fácil, e saiu de cima dela deitando no outro canto da cama.

Os dois olharam para o teto, ofegantes e em silêncio, até Cissa se prenunciar:

— Acho que... Me empolguei um pouquinho.

Núbia mordeu os lábios.

— Nós dois nos empolgamos_ concordou ela.

Núbia Cabrall então se sentou na cama e colocou a mão sobre os cobertores que Cissa lhe emprestara.

— Melhor eu ir pra sala _ murmurou ela pegando os cobertores e o travesseiro, Núbia se levantou, mas ante que fosse, Cissa se esticou o quanto pode e pegou-a pelo braço.

— Menina... Me desculpe. Quero dize... Por favor, não fica brava pelo o que eu fiz.

Núbia pensou no que responder, queria dizer que na realidade ela já queria que ele tivesse feito aquilo muito antes, mas lembrou-se do que Cissa havia dito dias antes, que jamais gostaria de Núbia daquela forma, pois ela era só uma menina qualquer para ele. Aquela afirmação claramente havia sido desmentida naquela noite, então Núbia somente sorriu daquela forma sapeca que Cissa costumava sorrir e disse:

— Tudo bem, tudo ótimo na verdade.

Ela se curvou, deu um selinho nos lábios de Cissa e saiu com um sorrisinho maldoso enquanto Cissa a observava sem intender oque havia acontecido. Teria ele contaminado aquela garota com sua insanidade? Era provável.

Núbia se virou com o sofá e os cobertores e dormiu melhor do que imaginou que conseguiria.

Cissa por sua vez demorou mais para adormecer. Ficou pensando no que havia acontecido e como ele queria que aquilo tivesse sido somente um impulso, além do mais, Núbia era uma garota bonita e estava especialmente sensual naquela noite, seria normal ele fraquejar um pouco naquela situação, porém não, aquilo teve algo a mais, algo que estava começando a deixar Cissa com medo.

— O que está acontecendo comigo, meus orixás? _ sussurrou ele desesperado.

...

Eram três da manhã quando Cissa acordou com um grito, ele se levantou devagar, suas costas ainda doíam muito, mas aquela soneca havia lhe feito bem.

O grito que o acordou não era mais emitido, o que o fez concluir que não havia passado de um sonho. Seja como for, sua garganta estava seca e assim decidiu ir a cozinha beber um copo de água.

Ao passar pela sala viu Núbia dormindo no sofá agarrada a um cobertor mal colocado, enquanto o outro estava jogado no chão. Ele não resistiu em abrir um sorrisinho ao vê-la, tinha que admitir que apesar de descabelada ela ficava fofa dormindo.

Ele caminhou em passos silenciosos até ela, pegou a coberta do chão, e a cobriu com cuidado. Aquela noite estava fria de mais para ela dormir com somente um cobertor.

Núbia pareceu se sentir mais confortável com os dois cobertores sobre ela, pois se acomodou melhor no sofá.

Cissa então enfim foi á cozinha, pegou água da torneira mesmo, considerando que vinha do poço, a água era uma delicia sem precisar ser filtrada

Logo, porém ouviu aquele grito novamente, o mesmo que lhe acordara, mas agora ele sabia de onde vinha. Ele deixou o copo na pia e foi mancando á sala onde Núbia se debatia no sofá, jogando novamente a coberta no chão enquanto berrava.

— Me deixa! Vai embora! Me deixa!

Cissa foi até ela e tentou lhe segurar os braços antes que ela machucasse a si mesma.

— Núbia acorda, menina, é só um pesadelo.

— Eu não quero matar ninguém _ murmurava ela com voz chorosa. _ Me solta!

Ela novamente se debateu do sofá e Cissa notou que teria eu acorda-la na marra.

— Núbia! _ gritou.

Ela abriu os olhos em um sobressalto.

— Calma, eu estou aqui _ disse Cissa acariciando os cabelos ruivos dela.

— Eu... Acho que tive um pesadelo _ murmurou Núbia sonolenta.

— Ah. Você acha? _ ironizou Cissa.

— Eu acordei você? Desculpa.

— Tudo bem. Acho que você gritou outras vezes também durante a noite.

Núbia esfregou os olhos e bocejou.

— Me sinto cansada, mesmo dormindo.

Cissa estendeu a mão para ela.

— Se eu estou machucado fisicamente, você esta ferida psicologicamente, então, também tem que dormir em algo mais confortável que o sofá.

Núbia não entendeu muito bem o que ele queria dizer, estava com sono, sentia-se fora do próprio corpo, então simplesmente se deixou levar. Pegou na mão de Cissa e o acompanhou.

Ele a levou até o quarto e fez um gesto cavalheiro apontando para cama.

Núbia estava exausta de mais para discutir e somente deitou-se na cama, em seguida Cissa se deitou no outro canto, os dois ficaram um de frente com o outro, Cissa a cobriu com o cobertor e acariciou o rosto dela.

— Durma bem, menina _ sussurrou ele.

Núbia sorriu de leve  e pegou na mão Cissa.

— Durma bem, Cissa.

Os dois fecharam os olhos e dormiram de mãos dadas.

...

Na manhã seguinte Núbia acordou com o brilho do sol em seu rosto e uma sensação estranha de felicidade. Quando olhou em volta arregalou os olhos e se sentou na cama. Sua memória estava muito confusa por isso achou ter sido um sonho, mas não, ela realmente estava no quarto de Cissa, havia dormido ali.

Cissa não estava no quarto, provavelmente já havia acordado á algum tempo.

Núbia levantou e foi ao banheiro, lavou o rosto, fez gargarejo com a pasta de dentes que achou e ficou fitando a si mesma no espelho enquanto sua memória clareava. No meio da noite ela teve pesadelos, muitos pesadelos mesmo, todos relacionados a Edgar, ao lobisomem e tudo que havia visto na noite passada, até Cissa leva-la a seu quarto, por algum motivo, dormir ao lado de Cícero fez com seu sono fosse mais tranquilo. Ao menos não havia acontecido nada, eles só dormiram na mesma cama, nada de mais, apesar que... Núbia tinha quase certeza de que em um momento acordou abraçada a Cissa, que também lhe abraçava, mas quem sabe tenha sido só impressão, ao menos, assim ela esperava. Já bastava aquele beijo quente que eles haviam trocado antes de dormir.

Ela respirou fundo e tentou ignorar tudo aquilo. Estava em um novo dia, o que aconteceu devia ficar somente no passado e agora, ela tinha coisas mais sérias para resolver do que atração por Cícero Akilah.

Ela então foi até a cozinha onde Cissa estava na frente do fogão e mesmo virado de costas, sentiu a presença de Núbia se aproximando.

— Bom dia, menina.

— Bom dia _ respondeu ela _. Que horas são?

— Umas nove eu acho.

Núbia arregalou os olhos.

— Eu precisava voltar para o casarão pela manhã, Cissa!

— Eh... Eu sei, mas você estava dormindo tão bonitinha que eu não tive coragem de te acordar.

Núbia revirou os olhos com um sorrisinho.

— Espero que Edgar não venha até aqui me buscar.

— Esperamos _ concordou Cissa _. Olha estou fazendo uma omelete para nós. Você come e volta para casa, Está bem?

Núbia assentiu.

— Obrigada por tudo Cissa _ murmurou  ela.

Cissa se voltou a ela.

— Por nada. Amigos são para essas coisas.

Núbia sorriu de canto tentando ser simpática, mesmo que a palavra “amigo” já não lhe caísse muito bem.

Cissa mostrou que era mais do que um rosto bonito e inteligente, ainda tinha dotes culinários. Sua omelete com fatias finas de babata e tempero leve era ótima. E para Núbia, que sequer havia jantado a noite passada, aquilo era divino.

— Eu sou incrível não sou? _ disse Cissa enquanto comia a omelete junto a Núbia.

— ah, você é.

Os dois se fitaram com sorrisinhos, mas depois ficaram em um silêncio um tanto desconfortável, até Cissa pigarrear e tocar num assunto que não poderia ser ignorado.

— Hum... Menina, sobre ontem, bem, espero que isso não mude as coisas entre nós, sabe. Nossa amizade.

Núbia levantou o olhar.

— Do que exatamente está falando? Do beijo ou do fato de termos dormido juntos.

— Dos dois.

Núbia tentou demonstrar indiferença e deu de ombros.

— Por mim...  O beijo foi um impulso e dormimos juntos como amigos.

— Claro, muito comum amigos dormirem juntos, devíamos fazer isso todos os dias _ disse Cissa com um risadinha sacana, o que fez Núbia dar-lhe uma bofetada no braço _ Está bem, desculpa. Mas é, fizemos isso para... cuidar um do outro.

— Exatamente.

— E se eu te agarrei durante a noite é porque eu estava dormindo.

— Claro _ disse Núbia não muito convencida.

Cissa sorriu sapeca para ela, mas voltou a comer sua omelete.

Logo os dois caminharam em direção ao casarão, Núbia levava sua roupa ainda molhada na mão e vestia somente o tênis (também molhado) e a camisa de Cissa que com um cinto que ele emprestara, estava mais justo na cintura, deixando a camisa com mais aparência de vestido.

 Antes de chegar ao quintal, os dois pararam e ficaram observando o casarão de longe.

— Boa sorte _ disse Cissa _ e se precisar de mim sabe onde me encontrar.

Núbia assentiu.

— O que acha que eu devo dizer a Edgar?

— Vai driblando ele, sabe, aceita ser aprendiz, dá uma de netinha querida, etc. Mas não deixa ele te dominar. Faz umas chantagens daquele jeitinho doce e carinhosos que só você sabe, tipo: “solta a Iara ou não vou ser sua herdeira porra nem uma, velho desgraçado”.

— Eu não falo assim _ disse Núbia cruzando os braços.

— Ah... Fala sim.

— Não falo porra! _ Núbia desviou o olhar notando que sim, ela falava, e Cissa somente deu risada _ Ah esquece. Voltando ao assunto Edgar. Primeiro preciso provar para ele que vale a pena me treinar ne?

— Exatamente, faz Edgar querer profundamente que você seja a herdeira dele, faz ele se apegar a você e só então começa com as manipulações.

Núbia contraiu os lábios, nervosa.

— A Iara sempre falava sobre isso, sobre Edgar se apegar a mim, não sei de onde vocês tiraram a ideia que ele precisa gostar de mim.

— SE não me engano você lembra Taina, acho que por isso Iara tinha essas ideias. Já eu, acho que ele vai gostar de você, porque tu é estranha igual ele.

Núbia fungou, mas deixou a ultima observação de lado.

— Quem é Taina?

— A filha do Edgar...

Cissa iria falar mais, porém logo se calou fitando algo, Núbia seguiu seu olhar e viu o corvo Noite os observando atentamente pela janela da sala.

— Aquele corvo é o amiguinho do Edgar não é? _ perguntou Cissa.

— É, o Noite _ respondeu Núbia.

— Melhor eu ir antes que a ave avise o dono sobre mim e você também precisa voltar logo para casa. Vai.

— Mas e sobre a Taina? Preciso saber mais sobre ela!

— Dá um jeito de sair do casarão mais tarde que a gente conversa.

Cissa repentinamente pegou Núbia pela cintura com força e a beijou.

— Perdão, eu precisava fazer isso _ disse ele com um sorrisinho _. Até, menina.

Ele então foi caminhando floresta adentro.

— Até _ disse Núbia tentando não demonstrar o quão tinha sido pega de surpresa.

Ela então respirou fundo e foi em direção ao casarão.


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Notas finais do capítulo

E ai o que acharam do capítulo? Comente! e Bjs



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