Fluminatte. escrita por Miss B


Capítulo 2
I — Infância e lembranças de um passado deturpado.


Notas iniciais do capítulo

Olá, espero que gostem. Esse é o primeiro capítulo real da fanfic.



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Era manhã de 13 de setembro do ano de 1624. Uma mulher estava dando à luz. Teve contrações durante boa parte da madrugada até sua bolsa estourar. Levou tempo até que as parteiras perceberam o aumento da dilatação e o parto começou. Respire. Força. Gritos de dor e angústia da mamãe soavam pelo quarto. O pai, do lado de fora, andando de um lado para o outro com o primogênito no colo. Respire. Força;

   O choro do bebê rompeu a manhã fria de nevoenta típica de Lakeland. É uma menina, anunciaram. Trocaram os lençóis e toalhas com o sangue da mamãe e a cobriram para que pudessem lhe mostrar sua filha, enrolada em um tecido branco puro. Vai se chamar Alesea, disse a mãe. E vai espalhar seu encanto pelo mundo.

   O pai entrou, sorrindo. Havia coçado demais sua barba ruiva durante a manhã. O menino estava agora nos braços da dama de honra da duquesa de Lakeland, a mamãe, Rosabelle Delsik Valaharis. Garth beijou a esposa olhando a filha. É linda. É morena como você, Rose. A mãe assentiu, entregando a filha às parteiras para que pudessem banhá-la.

   Sebastian, o primogênito, soltou-se da mão de Trina, a dama de honra, e correu a passinhos pequenos até a mãe. A mulher o segurou nos braços, passando a mão pelo seu cabelo negro como o dela e de Alesea.

   — Você tem uma irmãzinha, que vai te amar assim como nós te amamos.

   Demorou tempo para que Sebastian se acostumasse com a presença de uma nova criança na casa. De um novo centro das atenções. De uma irmã dois anos mais nova. Ela foi batizada na capela mais importante de Lakeland, Hardriver Church, e foi envolta por flores e joias. A grande bênção de Rosabelle e Garth Valaharis era uma menina, e se chamava Alesea. Não era Sebastian, por mais que fosse o herdeiro ao trono. A menina tinha apenas nascido e o povo já se alegrava. Nas ruas, era possível ouvir a felicidade entoada em cantigas. As crianças brincavam, felizes, e todos faziam suas obrigações com prazer e satisfação. O povo era feliz.

   Durante dois anos, a competição entre os dois irmãos se tornou cada vez mais árdua. Forte. Ele ganhava um presente, e se ela ganhasse um e meio, ele reclamava e chorava. Então nasceu Arthur.

   Pensa que mudou alguma coisa? Ficou pior. Agora tinha uma concorrência séria, era um menino. Um menino com o cabelo do papai, disseram. É o duque escrito, disseram. Os olhos do papai, o cabelo ruivo do papai, tudo que ele não tinha. É guerra.

   Depois de Arthur, Sebastian até conseguiu começar a sentir algo por Alesea. Todas as manhãs, andava de mãos dadas com ela pelo castelo. Ela tropeçava em seus pequenos pés, o vestido balançava, e ela ria profundamente. Sebastian se afeiçoou à menina.

   E à medida que eles cresciam, a harmonia se instalava cada vez mais. Sebastian já tinha sete anos, Alesea cinco e Arthur, três; brincavam na grama baixa do jardim do palácio quando Alesea tropeçou em uma cerca viva e afundou em uma parede de árvores. Ela havia descoberto um lago “secreto”, um vazamento nos lençóis d’água do Grande Hardriver, e cipós pendurados em uma harmonia delicada. Sebastian descobriu que o pequeno lago era fundo em alguns pontos, por isso proibiu os irmãos de irem até lá. Nenhum deles contou nada aos pais.

   Então, houve a Guerra. Grande e terrível guerra, intitulada Massacre do Salão Vermelho. As histórias haviam se espalhado como vento pelos quatro cantos do reino. O jovem Duque Alois VI havia massacrado a Casa Luhtarg em uma estratégia incrível dentro dos muros de Solar Dourado -o palácio desta casa- e assim destruiu o exército, dentro de um salão. "Dava para se nadar no sangue", diziam as histórias. "As paredes douradas ficaram vermelhas. Era um Salão Vermelho.", "Alois ficou até com as ceroulas molhadas de sangue e seus cabelos ficaram ruivos por duas semanas.", "Ele chorava de rir enquanto enfiava a espada nos tripas dos inimigos, só parou quando furaram o joelho dele”, “ele saiu desacordado, mas os soldados quase perderam as mãos de tanto aplaudi-lo e a voz deles sumiu de tanto gritar o seu nome.", essas histórias eram todas verdades. Todas elas. E as crianças as ouviam antes de dormir e desejavam ser como ele era. Forte. Reconhecido.

   Então os Valaharis lhe fizeram uma festa. Ele venceu os Lutharg praticamente sozinho! Foi a primeira festa oficial que Alesea comparecera, e usava um vestido rosa leve, sem os instrumentos para causar volume à saia, o que Lessie carinhosamente chamava de “gaiola”.

   E lá estava Alois Herondale entrando no salão. Ele andava estranho, porque mancava. Seu joelho estava envolto em seda embebida em vinho quente e outras plantas, mas exalava um cheiro maravilhoso. Seu fiel escudeiro, Filip, andava ao lado dele. Olhou-o, sorriu e segurou sua mão, entrelaçando seus dedos. Para os presentes poderia ser um sinal de amizade, mas os dois sabiam que ia muito além daquilo. Então Garth o viu de longe.

   O duque Valaharis saiu de seu trono adornado para ir cumprimentar Alois. A duquesa Rosabelle foi ao seu lado, com a pequena Alesea segurando sua mão. A menina parecia nervosa, olhando para todos os lados como se fosse atacada a qualquer momento.

   — Alois! — Garth exclamou. Acho que estava bêbado. Ele cambaleava lentamente, talvez por seu pé machucado. — Parece que temos mais um manco em Ekaterian. — deu uma risada excessivamente alta, e o cumprimentou.

   — É, fui recrutado para o Clube dos Mancos mas recrutei mais uns trinta —ele se apoiou na bengala para fazer uma reverência ao Duque e a Duquesa — Os outros que se recusaram a entrar para o clube estão em uma vala bem funda. 

   O rosto do jovem não expressava emoções, as lendas eram verdade: Alois nunca sorria.

   — Parabéns, Alois. E que bom que chegou bem. — Rosabelle sorria docemente como sempre, tocando o ombro do marido para que se acalmasse. — Alesea, esse é Alois.

   Alesea saiu de trás do vestido da mãe, olhando-o curiosa.

   — Olá.

   Ao ver a pequena garota sair de atrás do vestido, a sombra do que poderia ser uma torção muscular no canto de sua boca, formando a sombra do esboço de um sorriso, se manifestou. Com as inúmeras medalhas a tilintar em seu peito, ele disse:

   — Você é muito linda, sabia? Parece sua mãe. Se fosse como o seu pai seria uma monstrinha. — Fez uma piada mas a máscara de gelo que era sua face continuou imóvel. O salão riu.

   "Ele sorriu? Ou tentou?" Alesea ficou assustada, e segurou ainda mais forte o braço da mãe. Rosabelle deu um sorriso para Alois.

   — Diga "obrigada" ao tio Alois.

   A menina tombou a cabeça como um gatinho, seu olhar indo de Alois à papai, que sorria de um jeito grotesco, como sempre. Tombou a cabeça para o outro lado, observando mamãe com um olhar que ia de "isso é realmente necessário?" a "posso fugir?". Então olhou para Alois.

   — Obrigada. — ela olhou os sapatinhos. — Você realmente fez tudo que contam?

   Ela parecia um gatinho assustado, dava-lhe vontade de apertá-la. Podia sentir Filip sorrir para a cena e Gwinevere, sua mulher, igualmente.

   — Sim, sim. Eu fiz aquilo, venci a guerra. Mas guerras não são coisas bonitas. — Olhou em volta e estendendo sua mão para ela. — Eu sei que estou um pouco machucado, mas a senhorita me concederia esta dança?

   A menina olhou para o pai, que assentiu escandalosamente, e à mãe, que sorriu e lhe deu um empurrãozinho corajoso. Alesea ofereceu sua mão à Alois.

   — Não importa se você está machucado, se você não se importar se eu errar. — sussurrou pra ele.

   — Não espalha, mas eu não sei dançar muito bem. —Finalmente um sorriso de canto surgiu em sua boca. Ele a segurou pela mão e a guiou para o centro do salão. As pessoas ao redor abriram caminho e espaço para a dança sob aplausos.

   — Pode subir em minhas botas. — Com todo o respeito, ele colocou sua mão em sua cintura.

   Ele começou a conduzi-la pelo salão em um bailar leve, mas que ainda sim pesava sobre o ferimento no joelho, deixando-o escapar algumas caretas de dor. 

   — Um dia, quero ir à Laris. — Alesea soltou, e fez uma careta. — Sem o papai no meu encalço. 

   Alois deu uma risada baixa e abafada. 

   — Vai adorar a cidade. É a maior do reino, sem bem sabe. —Começou a falar da cidade durante a dança. — O seu mar é tão azul quanto os meus olhos e o sol brilha quase todo o ano. Ela é uma acrópole da arte e da ciência, lar de astrônomos, alquimistas, poetas, romancistas, escultores, pintores, físicos, matemáticos, projetada para ter bibliotecas e teatros em cada esquina.

   — Existe lugar para cantores?

   A dança fez um rodopio, o que a fez parar de falar por alguns instantes.

   — Eu queria cantar, mas mamãe diz que não é adequado a uma lady e coisas assim. Eu só sei que eu gosto de cantar, e queria fazer isso. — Assim que ele sorriu, ela franziu o nariz levemente, olhando-o — Me disseram uma vez que você não sorria.

   — É bem verdade. É raro que eu sorria, mas sorri por ver o meu olhar nos seus olhos. — a música acabou, então Alesea desceu das botas dele e o conduziu até a cadeira de honra ao lado do trono de Garth. A menina sentou em seus pés. — Não vai me perguntar que olhar é esse que falei?

   — Eu ia fazer isso. — Ela disse, olhando-o como quem olha um astro importante. 

   — O seu olhar era o meu olhar de quando era mais novo, antes de meu irmão e pai... bom, você sabe. — Sua voz era cortante e fria como gelo, mas os seus olhos azuis feito mar de ressaca reluzia esperança e sonhos em seu salpicado dourado. — O olhar de sonhos e esperanças, fantasias e felicidade. Um olhar aventureiro e livre, mas terno e aconchegante.

   Ela assentiu, segurando os joelhos enquanto o observava em silêncio. Não era capaz de dizer mais, na verdade nem sabia o que dizer. Apenas ficou ali. 

   — Você será uma grande mulher, ouviu? — Alois olhou no fundo dos olhos da menina, que sorriu embaraçada. 

   — É o que papai vive dizendo.

[...]  

 

 Os anos se passaram mudos, sem graça, cinzas, enevoados como o clima da cidade. Ela não via Alois havia três anos. Agora, com oito anos de idade, sua mentalidade estava focada em brigar com Arthur. Ele, de seis, a incomodava tanto quanto Sebastian, de dez, ou Annabeth, de dois. Nem mesmo Anthony, de um, era tão irritante quanto o irmão ruivo sem um dente. Ele puxava seu cabelo sempre que podia, e ela revidava empurrando-o. 

   Arthur nunca mais foi ao pequeno lago com Alesea e Sebastian observar as estrelas. 

   Sebastian e Alesea iam quase todos os dias. Era um lindo lago, lindo lugar, e cada vez mais um deles tropeçava no lago. O instinto da menina pedia para que eles parassem de ir, mas a diversão contrariava. 

   No dia seis de março de 1632, uma planta de água doce enroscou-se no tornozelo de Sebastian e o puxou para baixo sem a presença de Alesea. Ela veio correndo, sorrindo, para entrar no lago, e viu as mãos do irmão mais velho tentarem puxar o ar para se libertar, sem sucesso. A menina ficou imóvel, sem saber o que fazer. Ele estava muito longe. Ela era baixa, por que ele foi tão longe? Ao invés de ajudar, ela se afastou um passo, depois outro, até ver as mãozinhas do irmão pararem de lutar. Correu ao encontro dos pais e lhes contou.

Garth e Rosabelle perdiam seu primogênito em um lago desconhecido em seu próprio palácio. 

   Após o enterro na cripta da família Valaharis, contaram a Arthur que ele seria o herdeiro ao trono. O garoto pôs a língua para a irmã Alesea. Ele era mais que ela, ele seria o duque. Alesea ficou vermelha de raiva. Veremos, Arthur. 


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Notas finais do capítulo

Olá de novo! Se você gostaria de saber quando haverá outro capítulo sobre a adolescência da menina Alesea, clique em "acompanhar"! E se você gostaria de saber quem você seria em "Fluminatte", clique no link:

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