Inlustris escrita por lau


Capítulo 3
O Menino




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III

O MENINO

Quando nós conhecemos o jovem aventureiro, que ao fazer uma aposta impensada, mudará sua vida completamente.

 

Let the wind carry us

To the clouds, hurry up, alright

We can travel so far

As our eyes can see

 

 

Algumas horas depois naquela mesma noite, uma festa começava em um lugar um tanto longe de Hogwarts, um lugar onde não havia seres mágicos, reis e seus conselheiros, profecias, bruxos e nem estrelas despencando do céu. O nosso mundo.

Dover, a cidade onde parte dessa história se passa (mas uma parte tão pequena que em breve nos esqueceremos dela, se tornando apenas uma leve lembrança em nossas mentes), era uma cidade litorânea localizada no Sudeste da Inglaterra que até hoje mantém o maior porto britânico do Canal da Mancha, e naquela época era muito comum ver os grandiosos navios mercantes atracarem lá cheirando a peixes ou especiarias, com homens descarregando sacos e caixas no cais feito de madeira. A cidade era pequena, com casas claras grudadas umas nas outras, uma larga rua principal onde ficavam todos os comércios, bares e bordéis do lugar e aonde as pessoas iam para se divertir e beber. Mais ao Norte ficavam as falésias brancas com toda sua imponência e beleza, contrastando com o mar devido às pedras pretas que cobriam a praia.

E é nessa praia de areias escuras que nosso jovem aventureiro sempre vai. Nessa época ele era apenas um menino é claro, um garoto que sentava nas pedras cobertas de musgo e ficava olhando as ondas quebrarem, vez por outra desenhando navios e ondas na areia com um graveto, imaginando como seria o mundo lá fora e tudo que havia nele de bonito para ser visto.

O nome desse garoto é Abraxas Malfoy. Ele tem dezessete anos e mais altura do que juízo, como diriam as velhas senhoras de Dover. Seu cabelo é muito louro e seus olhos muito claros, mas não acho que isso seja importante agora. O que importa é que nesse momento ele está tentando fugir da festa que seu pai está dando, e pelo que parece está conseguindo.

Os Malfoys eram donos de quase todos os navios que vão e voltam daquela cidade, e mesmo assim Abraxas nunca navegou em um. Mas não foi por falta de tentativa. Quando tinha onze anos ele conseguiu invadir um navio e ficou escondido lá por quase dois dias, até o cozinheiro achá-lo pegando comida na despensa e mandar uma carta, pedindo que alguém viesse de barco buscá-lo. Naquele dia Abraxas ouviu um longo sermão de três horas de seu pai apenas para tentar a mesma coisa uma semana depois. Dessa vez não ouve sermão, mas ele ficou dois meses sem ir jogar bola com os outros garotos.

Abraxas amava sua família, e sabia que mesmo o Sr. Malfoy quase arrancando os cabelos de frustração com sua falta de responsabilidade, ele só queria seu bem. Mas Abraxas não queria seu próprio bem. Não se isso envolvesse uma casa grande e elegante, crianças correndo de um lado para o outro e uma sala empoeirada e abafada no escritório dos Malfoy.

Mas, como ia dizendo, ele agora estava fugindo da festa que acontecia em sua casa e tinha dado certo. O garoto foi até a rua principal onde ficava seu bar favorito, o Fleurs du Mal, e abriu a porta, sorridente. Lá dentro estava quente e barulhento, com pessoas rindo e brindando suas cervejas geladas.

Malfoy jogou a cabeça para o alto e gargalhou, no instante em que o dono do bar e as pessoas que estavam no balcão o viram e acenaram, chamando-o para se sentar ali. Ele foi, é claro, e virou uma caneca de cerveja assim que sentou no banco velho, rindo de sua sorte.

“Ora, vejam só, o jovem Malfoy nos honrou com sua presença está noite.” O dono do lugar falou, arrancando risos dos outros e uma mesura exagerada de Abraxas. Jimmy era um homem todo redondo e vermelho, com um espesso bigode ruivo e uma voz de trovão.

“Claro meu velho bêbado, achou que eu não viria? E minha presença é uma honra mesmo, que bom que sabe.”

“Beba uma cerveja e fique quieto pirralho, o show vai começar!” Alguém gritou ao seu lado no mesmo momento em que as cortinas do palco improvisado se abriam e as vozes iam diminuindo de volume até desparecerem por completo.

Celestina Warbeck entrou e Brax soltou um assobio baixo. Ela era a melhor cantora de ópera da Inglaterra, sem dúvida nenhuma. Usava um vestido que com certeza era a última moda em Londres, azul e brilhante, e tinha os cachos negros presos em um penteado complicado. Todos na cidade sabiam que ela estava hospedada ali depois do escândalo em seu casamento, e o loiro estava se perguntando se ela não gostaria de sua companhia para afogar as lágrimas.

A apresentação foi longa e emocionante. A lua já estava alta no céu, jogando sua luz branca em tudo que podia alcançar, quando a moça negra voltou aos seus aposentos ao som de aplausos ensurdecedores. Logo, todos voltaram a berrar e a música do piano quase não podia ser apreciada com todo aquele alvoroço.

   “Gostaria de estar em Londres, já imaginaram poder ver Celestina se apresentar quase todo final de semana, com sua linda voz ecoando pelas paredes de algum teatro? Seria maravilhoso.” Falou Rosmerta, filha de Jimmy e que ajudava o pai no balcão, de vez em quando. Todos na mesa assentiram, mas Abraxas interveio.

“Eu já estive em Londres diversas vezes e apesar dos bairros nobres serem realmente encantadores, a maior parte da cidade é cinza e suja. Prefiro estar no mar.” Todos no balcão começaram a debochar, mas o garoto apenas revirou os olhos entediado e tomou um gole de sua bebida, já sabendo o que viria.

“Vivendo aventuras, não é?” Falou Jimmy em tom zombeteiro. “Mas o lugar de filhinhos de papai não é em terras desconhecidas, muito menos no mar.”.

“Ora, vou mostrar quem é filhinho de papai, meu caro...”.

“Ele tem razão.” Alguém disse, e todos que estavam envolta pararam para olhar o sujeito que agora se sentava ao lado de Malfoy com um copo de uísque.

Ele era conhecido na cidade. Seu nome era Charlus Potter. Tinha um cabelo que nunca estava arrumada e olhos castanhos esverdeados muito grandes. E detestava Abraxas desde que este roubou sua namorada e sua garrafa de rum em uma festa há dois anos. Brax não sabia se a raiva era mais pela garota ou pela bebida.

“Você não sabe o que fala, eu posso fazer o que quiser, posso ir onde quiser e você não tem nada com isso.” A maior parte do tempo o loiro era indiferente às provocações, mas era sempre irritante quando alguém debochava de seus sonhos.

“Então prove.” Falou Potter, e todos em volta ficaram quietos com o tom de voz do outro. “Prove que pode ir onde quiser sem sofrer as consequências.”

“Eu não sou Deus, mas entendo a confusão. Não posso ir a qualquer lugar sem sofrer as consequências caso seja um lugar perigoso, e eu não tenho que te provar nada.” Brax estava se levantando quando Potter colocou a perna em sua frente, impedindo a passagem. Todos assobiaram ‘a plebe adora a desgraça burguesa’ pensou.

“Algumas pessoas disseram ter visto uma estrela caindo hoje um pouco depois de anoitecer... Perto da Muralha.” Um leve ‘ohhh’ se seguiu a fala de Charlus. A Muralha era uma construção antiga de pedras assimétricas empilhadas uma em cima da outra, com flores silvestres e mato crescendo entre suas barreiras. Ela ficava bem ao Norte de Dover, levava mais de três horas para chegar e caso alguém fizesse não ia ganhar nada em troca. Sempre tinham dois guardas na frente da única fenda da Muralha, e eles impediam qualquer um de passar. Abraxas nunca entendeu muito bem o porquê já que do outro lado do muro só havia um campo com árvores mais ao fundo, mas ao mesmo tempo sempre ficou curioso com o motivo de ninguém ter permissão para passar.

“È, eu ouvi falar. Mas não deve ser verdade. Estrelas não caem assim do nada” Malfoy respondeu e tentou passar de novo, porém o outro jogou o corpo em sua frente. ‘Isso está ficando irritante’.

È verdade. E então, eu tenho uma aposta para fazer com você.” Charlus sorriu. “Vá buscar a estrela e traga para Dover. Você tem duas semanas”

Nessa hora devo dizer que Abraxas gargalhou. Ele já não estava tão sóbrio e ao ouvir aquilo quase caiu de tanto que riu. Aos poucos, os outros clientes começavam a rir também, nervosamente, até estarem gargalhando junto ao loiro. Mas Charlus Potter estava sério.

“Ah claro, estrela, aham. Com licença.” Brax já estava no meio do caminho quando uma frase o fez parar.

“Aceite a aposta e traga a estrela que eu prometo pela vida de minha amada mãe que irei pedir ao seu pai para que se junte a nós na próxima vez que sairmos em uma viajem.” Não tinha mencionado antes, mas Charlus Potter é um dos homens que trabalha para os Malfoy, indo para outros países negociar em nome deles.

Brax voltou rapidamente para a mesa. “Jura?” Ele perguntou ansioso, e o outro homem deu um aceno de cabeça. E ele sendo o homem cheio de honra que andava pela cidade esbanjando toda sua dignidade, Abraxas não duvidou que falasse sério, e não duvidou que seu pai aceitasse um pedido de seu melhor empregado.

“Então, aceita?”

Aquela era uma chance única, com certeza. É um desses momentos em que você para e pensa sobre como sua vida está agora, e os milhares de rumos que ela pode tomar. E então, quando você estiver lá, no glorioso futuro com uma vida completamente diferente e incrível, você olhará para trás, e se lembrará de como foi preciso apenas uma noite de lua cheia, algumas canecas de cerveja, uma aposta idiota e uma palavra, uma simples palavra, para tudo começar a acontecer.

“Aceito.”


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Notas finais do capítulo

*a música do início é Where No One Goes, do Jónsi.



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