Go Rogue! escrita por Dani Tsubasa


Capítulo 37
Capítulo 37 – Quando as ordens estão erradas




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37 – Quando as ordens estão erradas

— O melhor para o bem geral? – A mulher perguntou irritada, embora mantivesse seu tom costumeiramente calmo – Onde está o melhor, general? Um homem inocente foi morto por nós, que devíamos protegê-lo! Mais alguém ficou órfã quando poderíamos ter evitado isso, mais alguém perdeu tudo que tinha depois de todas as coisas ruins que já tinha passado, incluindo ser forçada por nós a participar da missão que matou seu pai. E se não fosse por Cassian ela também estaria morta e a Estrela da Morte continuaria a destruir planetas. Você tomou uma decisão imprudente sem a unanimidade e conhecimento do conselho, ainda persuadindo seu principal agente a cometer o ato. Fico feliz que Cassian tenha tomado a decisão correta, mesmo que um pouco tarde demais. Perdemos uma testemunha vital, provas concretas, e a chance de fazer um bom planejamento que evitasse tantas mortes em Scarif simplesmente por sua incapacidade de acreditar um pouco nos outros. Nossa rebelião não é feita unicamente de esperança, também precisamos de confiança mútua. Isso foi muito grave. Está suspenso de suas atividades e das reuniões do conselho até segunda ordem – Mon Mothma falou por fim.

Draven assentiu em silêncio, e sem olhar nos olhos de sua superior saiu da sala de comando, deixando Mon Mothma sozinha. Ainda que não a estivesse vendo, ele podia sentir o olhar pesado e decepcionado da mulher em suas costas enquanto ele se distanciava no corredor. Mesmo para o general mais rígido e frio da base de Yavin 4 era emocionalmente cansativo levar dois baques no mesmo dia, de sua superior e de seu subordinado. Já começara seu dia na base sendo advertido de que não tinha ordens para executar qualquer função naquele dia e deveria encontrar Mon Mothma o quanto antes, e conversar com Cassian no centro médico antes de encontrá-la não ajudara muito a melhorar seu humor.

{Flash back}

Chegou cedo ao centro médico ao saber que os tripulantes sobreviventes da Rogue One estavam acordados e bem, dias e dias após o ocorrido em Scarif. Dos dois nativos de Jedha o monge permanecia internado, mas se recuperando. Seu companheiro recebera alta no dia anterior, mas não saía de perto dele e dos outros. O piloto desertor também continuava se recuperando das queimaduras da explosão que quase o matou quando pulou para fora da nave, mas seu estado já não era grave. Jyn Erso havia acordado no dia anterior, e Cassian há algumas horas. Todos tinham conseguido se recuperar bem sem perder nenhum membro, sem perder a visão, ou ganhar sequelas, o que ele considerou um verdadeiro milagre depois de ler os relatórios de Scarif. Ainda que tivessem passado dias imersos em tanques de bacta, ainda era um milagre pelo estado terrível em que alguns haviam chegado.

O general empurrou a porta corrediça do quarto, vendo o capitão da inteligência acordado, olhando quase hipnotizado para a mulher dormindo serenamente na cama ao lado e com a mão livre entrelaçada com a dela. Em seus olhos castanhos o general identificou algo que talvez ele nunca tivesse visto em seu subordinado, paz. Não alívio como sempre depois de uma missão difícil, paz, como se finalmente Cassian Andor fosse um homem completo, mesmo dentro de uma guerra. Ambos trajando as roupas brancas do centro médico, com alguns machucados visíveis, e Cassian ainda com soro em uma das mãos e um monitor cardíaco ligado ao peito.

— General – ele falou devagar e baixo com um leve sorriso ao vê-lo.

— Como você está?

— Bem, eu acho.

— Por que ela está aqui? Os outros três estão no quarto da frente.

— Meu estado era muito grave. Deve saber que estive sozinho por algum tempo. Quando Jyn estava sendo cuidada não parava de implorar pra ficar por perto. Ela pediu por isso até desmaiar. No final das contas, acharam que não nos faria mal.

— Conversaremos sobre isso depois.

Cassian ficou em silêncio, engolindo a pontada de raiva que sentiu e analisando o homem a sua frente, havia algo errado.

— O conhecendo como conheço não viria aqui até o meio dia. Está no horário de suas funções.

— Algo aconteceu. Alguns desentendimentos no conselho, você não precisa se preocupar com isso agora.

— O que quis dizer com conversar depois?

— Estamos numa guerra, não num mundo livre e maravilhoso, é bom que se lembre disso se não quiser sair ferido.

— Eu sei... Vivemos em um universo onde é perigoso se sentir feliz. Mas é tarde demais – o capitão falou sem conseguir esconder o tom de mágoa em sua voz – Eu nunca vou me perdoar por aquilo. Eu já fiz muitas coisas erradas pela causa, mas aquela... Sempre vai doer, general. Com todo o meu respeito a sua autoridade, mas é a última pessoa que deveria me dizer isso.

                Um silêncio incômodo se abateu sobre o quarto durante longos segundos.

                - Quando pude ver o que tínhamos feito... Era tarde demais. E Jyn poderia estar morta. A Estrela da Morte não teria sido destruída porque eu duvido que iríamos tão longe sem a bravura dela, e logo estaríamos todos mortos. No final das contas foi só mais um item pra minha bem extensa lista de arrependimentos. Acho que todo mundo tem uma dessas no meio de uma guerra, mas podíamos evitar algumas mortes de inocentes, e nós não fizemos. Jyn confiou em mim, confiou de verdade, e eu quase consumei uma traição contra ela – falou com os olhos brilhando de mágoa e dor consigo mesmo ao se lembrar – Jyn esteve se machucando a vida toda, mesmo antes de perder seus pais. Eu não vou deixá-la sozinha agora só porque estamos no meio de uma guerra ou porque você ou qualquer outro superior pensa que é melhor assim. E no final das contas ainda somos todos humanos. K-2 é o único qualificado pra não se deixar envolver assim. E ainda posso afirmar com certeza que ele arriscaria tudo pra salvar minha vida se fosse necessário, mesmo que pra outras pessoas não tenha importância ele morrer no processo.

                Cassian mostrou um sorriso triste, a dor correndo rapidamente por seus olhos quando citou o droid.

                - É bom se acostumar com Jyn – ele voltou a falar, dessa vez sério – E aceitá-la. Porque ela vai ser minha esposa quando sairmos desse quarto.

                Cassian fez uma pausa, dando tempo para o general absorver suas palavras. Draven arregalou ligeiramente os olhos e não era possível saber exatamente se estava indignado ou apenas surpreso.

                - Vai se casar com uma mulher que conhecemos há menos de dois meses.

                - O que vivemos nesse tempo foram coisas suficientes para preencherem anos de nossas vidas. Eu não vou deixar de lutar pela causa, nem diminuir minha determinação, mas quando eu estava com ela naquela praia, sem nenhuma nave à vista antes de Bodhi aparecer em outra nave pra nos resgatar nos últimos segundos, tudo que eu sabia é que eu ia morrer. Eu pensei que aquela tinha sido minha última missão, que eu tinha deixado meu quarto nessa base pela última vez, que eu nunca mais ia pilotar nenhuma nave, nem falar com Kay, você ou Mon Mothma de novo, que a guerra continuaria sem mim e eu jamais saberia o que aconteceu, se o que fizemos foi realmente de alguma ajuda. Eu podia aceitar tudo isso. Mas Jyn segurou minha mão, eu olhei nos olhos dela, e me vi lá dentro. Tivemos vidas tão diferentes, mas tão parecidas... E quando ela olhou pra mim também, e não dissemos nenhuma palavra, apenas havia o som da destruição, eu percebi que eu nunca quis viver tanto quanto naquele momento. Bodhi estava muito ferido e ficou acordado até onde pode pra pilotar a nave até aqui. Chirrut e Baze perderam a consciência, e se Jyn não tivesse se aguentado acordada cuidando de mim, tenho certeza que eu teria morrido no hiperespaço. Eu não sei por quanto tempo eu fiquei ouvindo a voz dela implorar pra que eu não dormisse, pra que eu aguentasse, mesmo também estando ferida. Foi um alívio acordar ao lado dela hoje. Eu reconheço os riscos da guerra e tenho consciência de todas as possíveis consequências. Há vinte anos o Império me tirou tudo que eu tinha, e eu não podia fazer nada na época pra mudar isso. Mas agora eu posso ao menos tentar, e eu não vou deixar o medo e a incerteza tirarem Jyn de mim. Nunca vou deixá-la sozinha, nem por uma missão. Temos direito a uma tripulação permanente como equipe de estratégia, não é? Mesmo que nos separemos pra algumas coisas de vez em quanto, eu acabei de encontrar a minha.

                - Em uma guerra usar o coração pra pensar ao invés do cérebro o conduzirá à morte. Tenha certeza do que está fazendo.

                - Baze é um excelente guerreiro, Chirrut também, além de ser sábio e bastante sensitivo, isso se mostrou útil em incontáveis momentos. Bodhi é um ótimo piloto. Se ele pode pilotar tantas naves do Império, ele pode pilotar as nossas. E ele também entende de máquinas. Jyn é uma excelente estrategista, lutadora, tem extenso conhecimento sobre armas e sobrevivência com poucos recursos. Seu pouco tamanho também facilita sua furtividade e velocidade. E ela é muito mais forte fisicamente do que parece, como já descobrimos na extração dela de Wobani. Minha tripulação é boa. E dessa vez não estou pedindo permissão ou sugerindo, estou apenas informando. E a propósito... Leia está na base, veio nos ver há duas horas. Ela e Jyn se conhecem desde crianças. Ela me falou do quanto Jyn era uma boa criança, mesmo com a tragédia de sua família tão recente quando as duas se conheceram. E assim como ela, eu tenho certeza que Jyn Erso é, e vai continuar sendo, uma boa mulher. Se tem algum ressentimento com ela, e eu sei que tem, lembre-se que a culpa é toda nossa.

                Cassian sabia que podia ser repreendido e até punido por tal ousadia, especialmente se Draven pensasse que ele estava tentado usar sua condição de “herói da Rebelião”, como alguns vinham chamando os Rogue One, para conseguir o que queria. Por sorte, os dois se conheciam bem o suficiente para o general saber que ele nunca faria isso. O homem mais velho ficou em silêncio, e Cassian viu mil coisas diferentes passarem por seus olhos, incluindo dúvida e desconforto.

                - Comunique isso a Mon Mothma quando falar com ela. E temos um novo droid roubado do Império, poderá reprogramar o seu com os dados salvos quando sair daqui. Eu preciso ir agora, se recuperem logo.

                - Obrigado – o capitão falou com um sorriso sincero antes de Draven sair.

                Não tivera uma resposta, mas ele realmente não se importava em receber a aprovação de seu superior, embora seu silêncio provavelmente indicasse aceitação. Se em todos aqueles anos vivendo e existindo apenas para a Rebelião, Cassian Andor tinha o direito de tomar algumas escolhas por si mesmo, seriam essas. E nada o faria voltar atrás. Olhou novamente para Jyn, ainda dormindo, se perguntando o que ela pensaria se tivesse ouvido a conversa. Contaria a ela depois, achava que ela devia saber. A rebelde exibia um rosto relaxado e um quase sorriso. Apesar dos tormentos de Scarif ainda rondarem sua mente, seus sonhos agora deviam ser bons. Ela havia dito sim ao seu pedido antes de adormecer, e os droids médicos haviam ficado loucos ao constarem os batimentos disparados de felicidade do monitor ligado ao peito de Cassian. Jyn estava pronta para ameaçar atirar qualquer peça de equipamento médico nos droids quando insinuaram querer sedá-lo. Mas coincidentemente a princesa Leia apareceu naquele instante e os convenceu do contrário. O capitão sorriu e se deslocou da melhor forma que podia para beijar a testa de Jyn e deitar mais perto dela.

                {Fim do flash back}

                Draven se dirigia ao galpão que levaria aos dormitórios, em seu terceiro dia de suspensão, após mais uma das visitas regulares que era obrigado a fazer ao conselho, parando subitamente ao notar uma figura pequena o fitando com um olhar indecifrável. Jyn Erso estava parada no hangar a céu aberto, entre os rebeldes que iam e vinham. Sua aparência ainda estava um pouco abatida, como se estivesse cansada, mas não havia mais nenhum único ferimento restante de Scarif. Ele sabia que os tripulantes da Rogue One haviam sido todos liberados do centro médico no dia anterior e teriam semanas livres para sua total recuperação, especialmente Cassian. Mon Mothma lhe informara ocasionalmente que ele e Jyn estavam casados desde poucas horas após deixarem o centro.

O general cogitou que a sargento pudesse estar olhando outra coisa ou apenas perdida em pensamentos, mas ela continuou o encarando quando ele se deslocou alguns passos. Os olhos verdes estavam tão frios e cruéis quanto a neve de Hoth. Mágoa, raiva, ódio e fúria se misturavam neles. Ela sabia a verdade, ele teve certeza. Agora que ela era oficialmente um soldado da Aliança, as situações mal resolvidas entre ela e o conselho precisavam acabar, e certamente tinham lhe dito a verdade. O homem ruivo sentiu mais uma pontada de frustração se abater sobre ele quando diante de toda a base se confirmava algo que ele havia negado muitas vezes, Jyn Erso era uma pessoa civilizada. Caso contrário, ele tinha certeza de que ela o mataria naquele momento, embora nada indicasse que ela não o faria depois, embora ele pensasse que não. Não era possível saber se ela tinha conhecimento de que ele estava sendo punido, mas não demoraria muito tempo para ela descobrir. Isso não a deixaria satisfeita, mas não parecia ser o tipo de pessoa que consumava vinganças, e isso provavelmente a acalmaria de alguma forma.

                Tão rápido quanto ela apareceu, ela sumiu entre as pessoas que passavam como se nunca tivesse estado lá, o que fez Draven pensar se não estaria sendo assombrado por seu feito cruel com ela. A única certeza que ele tinha agora é que jamais esqueceria aquele olhar, como nunca esqueceria a mágoa e a dor na voz de Cassian na conversa de dias atrás. E outra certeza o atingiu como um soco, outro ponto de vista no qual ele jamais havia acreditado antes dos acontecimentos das últimas semanas, a esperança que Mon Mothma acreditava, que podia ser alcançada com diplomacia ao invés de sangue derramado, a chance de um voto de confiança ao invés de resoluções rápidas e egoístas, era possível. Era demais para sua cabeça absorver num único dia depois de tantos anos. Na falta de qualquer possibilidade de saber por quanto tempo estaria suspenso, voltou a caminhar na direção de seus aposentos, agora que tinha tempo livre para pensar em tais questões.


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